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24 de Maio de 2024
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    Razões de Apelação Criminal - Justiça Estadual - Litispendência

    Publicado por Vi Go
    há 4 anos
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    EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA XX VARA CRIMINAL DA COMARCA DA CAPITAL DO ESTADO DA BAHIA





    Autos nº: XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX



    FULANO DE TAL, já qualificado nos autos em epígrafe, vem, por meio de seu advogado subscrito, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, tendo em vista a petição de interposição de recurso de apelação protocolada para este juízo, com fulcro no art. 600 do Código de Processo Penal, tempestivamente, apresentar suas


    RAZÕES DE APELAÇÃO


    em face da respeitável sentença proferida por Vossa Excelência, requerendo-se, portanto, o seu recebimento e remessa ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro para processamento e julgamento.


    Nestes termos,

    pede e espera deferimento.


    Rio de Janeiro, XX de XXXXXXX de XXXX.


    ___________________________________________

    ALESSANDRO FERREIRA GUTMAN

    OAB/RJ 189.927




    RAZÕES DE APELAÇÃO



    ORIGEM: XX Vara Criminal da Comarca da Capital


    AUTOS ORIGINÁRIOS: XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX


    APELANTE: FULANO DE TAL


    APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO



    EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


    COLENDA CÂMARA CRIMINAL


    NOBRES DESEMBARGADORES JULGADORES


    ILUSTRE PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA



    O APELANTE, vem, respeitosamente à presença de Vossas Excelências, por meio de seu advogado subscrito, inconformado com a respeitável sentença do nobre Magistrado da XX vara criminal da comarca da capital que o condenou como incurso nas penas do art. 155, § 4º, II n/f do art. 71 todos do Código Penal, apresentar suas razões de apelação, desejando ao final que o presente recurso seja julgado procedente e a sentença, ora questionada, seja reformada in totum como medida da mais lídima JUSTIÇA!



    I - DOS FATOS



    FULANO DE TAL, ora APELANTE foi denunciado e processado na XX Vara Criminal da Comarca da Capital, pela prática de furto qualificado mediante abuso de confiança, na forma do crime continuado.


    Narra a exordial acusatória de que o APELANTE, em diversas oportunidades ocorridas entre os dias XX de XXXXX e XX de XXXXX de XXXX, na agência XXXX, do banco XXXX, situada na Rua XXXXXX XXXXXXXX, nº XXX, bairro XXXXXX XXXXXXXX, nesta cidade, subtraiu mediante abuso de confiança a quantia aproximada de R$13.604,67 (treze mil, seiscentos e quatro reais e sessenta e sete centavos) de propriedade da senhora BELTRANA.


    Ocorre que, tais fatos já foram objeto de análise perante o Poder Judiciário nos autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX e nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX, que tramitaram apensados perante o juízo da YY vara criminal da comarca da capital e foram julgados conjuntamente na data de XX de XXXXXXX de XXXX, com sentença condenatória proferida em XX de XXXXXXX de XXXX.


    Pois bem, desde da descoberta dos fatos pelas vítimas, e consequentemente da notícia crime apresentada perante a autoridade policial da XX Delegacia de Polícia Judiciária, o APELANTE sempre demonstrou arrependimento do que fez e confessou prontamente o ilícito que praticou tanto para a autoridade judiciária da YY vara criminal quanto da XX vara criminal, ambas da comarca da capital.


    Cumpre ressaltar Excelência, antes de prosseguirmos com a narrativa dos fatos, consignar que o APELANTE, à época do delito, passava por momentos extremamente difíceis em sua vida. Ainda que não sirvam de escusa ou qualquer outra forma de exclusão de sua culpabilidade, servem para denotar os reais motivos que o levaram à prática deste injusto penal.


    Pois bem, o APELANTE vinha sofrendo ameaças de um agiota que exigia dele o pagamento, incialmente, da quantia de R$30.000,00 (trinta mil reais). Ocorre que, por dificuldades financeiras, acabou atrasando as parcelas que devia. Desta forma, a dívida inicial transformou-se no montante de R$50.000,00 (cinquenta mil reais)! Valor este que ele não dispunha de forma alguma. Aliás, à época deste fato, o APELANTE contava com exatos R$600,00 (seiscentos reais) para garantir o seu sustento, visto que o que recebia em sua conta bancária já estava comprometido por empréstimos pessoais e consignados que subtraiam quase 70% de seus proventos!


    Junte-se a isso, o fato de ter um filho portador do vírus da imunodeficiência humana (HIV) que demandava enormes cuidados e gastos com medicamentos, consultas e exames médicos a cada mês.


    Por fim, mas não menos importante, o APELANTE também enfrenta um processo na seara cível referente a ações de cobrança de cotas condominiais atrasadas (inclusive com pedido de penhora de seu único bem), conforme se depreende dos autos do processo nº XXXXXXX-XX-XXXX.X.XX.XXXX que tramita na ZZ vara cível da comarca da capital.


    Por todo o exposto até aqui, verifica-se que o APELANTE não se trata de um criminoso contumaz que faz do crime o seu meio de vida, tampouco cometeu os atos apurados ação penal em epígrafe por razões iníquas para satisfazer desígnios egoístas. A bem da verdade, trata-se de um cidadão extremamente endividado e com responsabilidades aquém de suas forças que, por motivos de extrema necessidade, praticou o ilícito objeto daquela ação penal.


    Pois bem, em sede de instrução criminal, compareceram as vítimas, mas o APELANTE não pôde estar presente no dia da audiência designada por se econtrar internado, conforme laudo médico acostado às fls. XX. Neste sentido, o Magistrado da XX vara criminal declarou o APELANTE revel e passou a colher os depoimentos das vítimas.


    Primeiro, foi ouvida a senhora BELTRANA que, em apertada síntese, afirmou que tinha XX anos de idade na época dos fatos, era vizinha de porta do APELANTE e que havia sido retirado de sua conta bancária o valor de R$X,XX. Contudo, a mesma declarou que tal fato já estava sendo apurado em outro processo.


    Logo após, foi ouvido o senhor SICRANO que, em síntese, corroborou com o alegado pela vítima, afirmando que fora retirado o valor de R$X,XX da conta conjunta que possui com a sua esposa BELTRANA. Afirmou, também, que o APELANTE havia contraído empréstimo bancário em seu nome no valor de R$X,XX, além de dizer que o APELANTE havia subtraído um relógio de ouro, bem como R$X,XX que estariam em um casaco de sua propriedade.


    Ao cabo da instrução criminal, restou-se provado a conduta ilícita praticada nos termos da denúncia e, consequentemente, o APELANTE foi condenado a 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão, no regime semiaberto, além de 21 (vinte e um) dias-multa à razão unitária mínima. O Magistrado sentenciante, para fins de condenação e fixação da pena, fundamentou o seu decreto condenatório com base nos seguintes critérios: 1º) Rejeitou a preliminar arguida pela Defesa Técnica que pedia o reconhecimento da litispendência, pois entendeu que os processos apontados pela defesa tratam-se de indivíduos diferentes, portanto, incabível o seu reconhecimento; 2º) No mérito, julgou improcedente o pedido de desclassificação do art. 155, § 4º, II do Código Penal para o art. 102 do Estatuto do Idoso, pois compreendeu que ainda que tenha ocorrido a apropriação de remuneração ou renda da vítima idosa, o APELANTE não tinha a posse dos bens, portanto, para aquele Nobre Magistrado, estaria configurado o crime de furto e não de apropriação de rendimentos de idoso; 3º) No teor dos depoimentos da vítima BELTRANA e da testemunha SICRANO, aduzindo que, segundo jurisprudência deste Tribunal de Justiça, bem como dos Tribunais Superiores, nos crimes patrimoniais a palavra da vítima goza de especial relevância no âmbito do processo penal; 4º) Na fixação da pena base, entendeu o Magistrado sentenciante que a conduta praticada pelo APELANTE excedeu o normal do tipo, bem como levou em consideração o elevado valor retirado da conta bancária da vítima e as consequências diretas do delito. Neste sentido, exasperou a pena-base na razão de 1/3; 5º) Na fase intermediária, resolveu aplicar o agravante do art. 61, II h, tendo em vista que a vítima possuía 79 anos à época dos fatos, e o atenuante da confissão espontânea do APELANTE, prevista no art. 65, III d do Código Penal. Neste sentido, ante a presença da hipótese do concurso entre agravantes e atenuantes, o Magistrado sentenciante entendeu por compensá-las. 6º) Ao final da aplicação da pena, já na terceira fase da dosimetria penal, foi consignado na sentença a inexistência de causas especiais de aumento ou de diminuição que pudessem agravar a reprimenda aplicada. 7º) Por fim, reconhecendo a presença dos requisitos da continuidade delitiva, e tendo em vista o elevado números de condutas ilícitas praticadas, o Magistrado sentenciante resolveu aplicar o patamar máximo previsto no art. 71 do Código Penal, ou seja, 2/3 (dois terços).


    Em que pese o indiscutível saber jurídico do Douto Magistrado “a quo”, a respeitável sentença prolatada merece reforma, conforme será demonstrado a seguir.



    II - DO DIREITO


    DA LITISPENDÊNCIA


    O processo judicial, como instrumento para a entrega da jurisdição, deve, antes de mais nada, conjugar certos elementos para que ele possa alcançar o seu desiderato máximo: a correta distribuição da justiça. Deste modo, não é estranho à doutrina processual a classificação dos pressupostos processuais como sendo os de existência, de validade e os negativos.

    Não iremos discorrer nesta peça tudo o que a doutrina já apresentou acerca dos pressupostos processuais. Não é nosso objetivo fazer uma exposição acadêmica do assunto, mas tão somente demonstrar o ponto da Defesa Técnica. Para tanto, certa explanação faz-se necessária no que toca os pressupostos negativos para que a relação processual possa ser devidamente constituída.


    Pois bem, entende-se por pressupostos processuais negativos, aqueles que dizem respeito à não incidência de causas capazes de prejudicar o exame de mérito do caso concreto. São autênticos impeditivos da jurisdição, pois uma vez constatados, fulminam a própria razão de ser do processo: a distribuição da justiça. Neste sentido, há dois casos apontados pela doutrina que podem ser classificados como pressupostos negativos. São eles: a coisa julgada e a litispendência. Como havíamos salientado nas linhas acima, não iremos fazer uma exposição acadêmica buscando esgotar o assunto, portanto, vamos nos ater ao cerne desta seção: a litispendência.


    Utilizando as lições de Luiz Rodrigues Wambier e Eduardo Talamini em sua obra Curso de Processo Civil, podemos conceituar a litispendência como sendo:


    “…a existência de dois ou mais processos concomitantemente, com as mesmas partes, o mesmo pedido e idêntica causa de pedir.”


    Pois bem, segundo a definição apresentada, toda vez que dois ou mais processos judiciais forem propostos, concomitantemente, havendo as mesmas partes e a mesma causa petendi, haverá a ocorrência da litispendência. Com efeito, uma vez verificada, por certo prejudica o exame de mérito do processo, pois a contrario sensu, será capaz de gerar decisões conflitantes ou significar desperdício da prestação jurisdicional. Além disso, o não reconhecimento da litispendência quando evidente nos autos, é clara demonstração da mais flagrante injustiça.


    Os elementos da ação, ainda tratando da teoria geral do processo, são doutrinariamente classificados como: partes, causa de pedir e pedido. Elementos estes que, como apontamos na linhas acima, uma vez encontrados identicamente em dois ou mais processos concomitantes, ocorrerá a litispendência.


    Para fins de esmiuçar todo o raciocínio desenvolvido nesta peça, iremos nos socorrer da obra Teoria Geral do Processo de autoria dos celebrados juristas Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco. Insta ressaltar que a referida obra é considerada basilar a qualquer estudante do direito processual, pois o seu pujante conteúdo consegue explicar e esmiuçar em detalhes os conceitos mais básicos deste ramo instrumental do direito público. Neste sentido, trazemos à baila o que os honrados doutrinadores ensinam acerca dos elementos do processo.



    Partes - São as pessoas que participam do contraditório perante o Estado-Juiz. É aquele que, por si próprio ou através de representante, vem deduzir uma pretensão à tutela jurisdicional, formulando um pedido (autor), bem como aquele que se vê envolvido pelo pedido feito (réu), de maneira que uma situação jurídica será objeto de apreciação judiciária. A qualidade de parte implica sujeição à autoridade do Juiz e a titularidade de todas as situações jurídicas que caracterizam a relação jurídica processual. No processo penal, partes são o Ministério Público ou o querelante (no lado ativo) e o acusado, ou querelado (no lado passivo).


    Os eminentes autores trouxeram importante lição acerca do que pode ser compreendido como parte numa relação processual. Data máxima vênia, iremos repetí-la novamente a fim de frisarmos bem o conceito explanado. Para aqueles autores, ser parte num processo judicial: “É aquele que, por si próprio ou através de representante, vem deduzir uma pretensão à tutela jurisdicional, formulando pedido (autor), bem como aquele que se vê envolvido pelo pedido feito (réu), de maneira que uma situação jurídica será objeto de apreciação judiciária”. Logo, autor é aquele que formula o pedido e réu é quem, envolvido pelo pedido feito, se contrapõe ao autor apresentando suas razões de contestação.


    Em suma, o primeiro elemento necessário para a existência de uma relação processual é a presença de partes. Uma formulando o pedido perante a autoridade judiciária, e outra respondendo ao que foi formulado.


    O segundo elemento da relação processual é a causa de pedir. Segundo os doutrinadores acima citados, podemos conceituá-la como: “causa constitutiva do direito deduzido em juízo; a exposição do fato com todas as suas circunstâncias”. A causa de pedir é o que dá o impulso inicial à relação processual, pois o seu nascituro advém de uma violação a direito do ofendido. Ao se examinar a causa de pedir, deve o intérprete ter em mente quais foram as circunstâncias que envolveram o bem da vida ameaçado ou lesado por certa conduta ilícita. São estas circunstâncias que irão embasar o terceiro elemento constitutivo da relação processual: o pedido.


    Com a lesão ou ameaça de lesão a um bem da vida tutelado pelo direito, nasce a causa de pedir como dissemos acima. Logo, há consequentemente um pedido ao órgão jurisdicional de providências que possam sanar esta lesão. Não se admite o ingresso no Poder Judiciário de uma ação sem pedido. Até porque, como há muito se sabe, a jurisdição tem por sua própria natureza a inércia. O órgão jurisdicional precisa ser provocado para que preste o provimento judicial. Inclusive, tal provimento deve ser feito sempre na medida do pedido, sob pena de flagrante injustiça.


    Este provimento judicial que é reclamado nos pedidos pode assumir diversos escopos: pode ser cognição, onde o Magistrado julga o mérito do pedido. Pode ser executiva, onde “o Juiz realiza, na prática, os resultados determinados através da vontade concreta do direito” ou ser de provimento cautelar, a fim de resguardar eventual direito da parte contra possíveis danos irreparáveis.


    Contudo, para que tais provimentos sejam efetivos, é necessário que eles revistam determinado objeto ou bem da vida pretendido pelo autor. Em outras palavras, para que o pedido seja válido, não basta apenas apontar qual providência o autor espera do Poder Judiciário, mas também dizer o que ele pretende. Não se admitem pedidos genéricos, em regra, ao tratamos do direito processual. A única exceção recai justamente no direito processual penal, pois, nas palavras dos citados autores da obra Teoria Geral do Processo, in verbis:


    “Na ação penal condenatória o pedido é sempre genérico, pois o que se pede é a imposição de uma pena, a ser individualizada pelo juiz. Por isso é que o pedido não pode ser considerado elemento diferenciador das ações, no processo penal”.


    Concluímos, assim, nesta breve exposição preliminar, que ao examinarmos o instituto da litispendência é de suma importância identificar os elementos integrantes da relação processual. É fundamental para o exame da questão suscitada pelo autor, saber quem pode ser considerado parte num processo, qual é causa de pedir e quais são os pedidos, pois havendo a sua repetição em ações idênticas e concomitantes, é indiscutível a incidência da litispendência e os seus referido efeitos, sob pena, como já salientamos anteriormente, de se cometer flagrante injustiça.


    Agora, passaremos a examinar o processo penal propriamente dito em relação ao instituto da litispendência e a sua possível incidência no caso posto à apreciação de Vossas Excelências.


    É bem verdade que o Legislador Ordinário não cuidou com o devido apreço do citado instituto no Código de Processo Penal. Ele sequer o definiu adequadamente, limitando-se a abordá-lo como uma das hipóteses de oposição de exceção. Entretanto, o mesmo Legislador ofereceu uma forma de resolver esta questão de técnica legislativa ao permitir a utilização subsidiária do Código de Processo Civil no que couber. Ressaltamos que, de fato, há no Código de Processo Penal o rito que deve ser obedecido para o conhecimento de uma exceção de litispendência, conforme o disposto no art. 110 da Lei Processual Penal. Contudo, salientamos que pela falta de um rigor mais técnico para apresentar, conceituar e definir corretamente o instituto no âmbito do processo penal, iremos nos socorrer do Código de Processo Civil vigente para apresentar o instituto e verificar a sua incidência no caso concreto posto, tendo em mente o permissivo do art. do Código de Processo Penal que autoriza a utilização da interpretação por analogia ou suplementação pelos princípio gerais do Direito na interpretação da lei processual penal.


    De acordo com o art. 337, §§ 1º, e , do NCPC:


    “§ 1º Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada”.

    “§ 2º Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido”.

    “§ 3º Há litispendência quando se repete ação que está em curso”.


    O Legislador Ordinário andou muito bem ao colocar tais dispositivos no Novo Código de Processo Civil, pois traz os seguintes conceitos: 1º) Reprodução de ação anteriormente ajuizada; 2º) Identidade de partes, casa de pedir e pedido; 3º) Repetição de ação já em curso.


    No âmbito do processo penal, pegando emprestado os conceitos apresentados pela lei processual civil, podemos verificar que havendo uma ação penal em curso com as mesmas partes e causa petendi (lembrado que em sede de processo penal o pedidos formulado é sempre genérico, portanto insuscetível de sere eleito como critério para a verificação da litispendência, conforme assinalaram Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco na obra já citada no curso desta peça) ocorrerá a litispendência.


    Segundo a boa doutrina, a litispendência no âmbito do processo penal é o fenômeno processual onde são instaurados diversos processos judiciais visando a apuração de uma mesma conduta criminosa. Segundo o criminalista Eugênio Pacelli de Oliveira, in verbis:


    “Por litispendência há de se entender a repetição de causa já instaurada anteriormente, envolvendo as mesmas partes e o mesmo fato delituoso, que vem a ser a causa petendi”


    Adverte o ilustre doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho que:


    “A litispendência tem como efeito importantíssimo impedir a duplicação da ação, isto é, enquanto houver uma lide pendendo de julgamento, não poderá ser instaurado outro processo contra a mesma pessoa e pelo mesmo fato. Se tal ocorrer, a parte poderá, por meio da exceptio litispendentiae, evitar o bis in idem.


    O nobre doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho ensinou em sua preciosa lição que a ocorrência da litispendência, uma vez arguida pela parte prejudicada, mas não acolhida pelo Poder Judiciário é capaz de gerar o bis in idem, ou seja, a dupla imputação de alguém pelo mesmo fato criminoso. Isto se dá porque o sistema processual vigente reconhece que, com a citação válida, ainda que feita por juiz incompetente, tal fato induzirá a litispendência. Impedindo assim, o ajuizamento de outra ação idêntica com as mesmas partes e causa de pedir. Destarte, o principal efeito do reconhecimento da litispendência é justamente impedir essa duplicação da ação penal.


    Levando-se em conta os esclarecimentos acima, no caso posto à julgamento por Vossas Excelências, é imprescindível a determinação de quem são as partes envolvidas no processo posto e qual a causa petendi, a fim de identificar se está ou não ocorrendo a hipótese de litispendência arguida pela Defesa Técnica.


    Pois bem, partes no processo penal são o Ministério Público ou querelante (nas ações penais privadas), responsáveis por deduzir a pretensão punitiva em juízo, como autores da ação penal e o acusado ou querelado como réu que se defende dos fatos expostos na denúncia. É de bom alvedrio salientar, conforme determina a jurisprudência pátria, de que o acusado não se defende da classificação jurídica apresentada na denúncia, mas sim dos fatos que lhe são imputados.


    Seguindo adiante, nos autos do processo nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX que tramitou na XX vara criminal da comarca da capital, observamos que o autor da ação penal é o Ministério Público, pois se trata de uma ação penal pública incondicionada. Já o réu é o APELANTE, o senhor FULANO DE TAL. A mesma disposição de partes podem ser encontradas nos autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX e XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX que tramitaram conjuntamente perante o juízo da YY vara criminal da comarca da capital. E mais, nos três processos citados, há a mesma causa de pedir, isto é, a imputação do crime previsto no art. 155, § 4º, II n/f do art. 71, todos do Código Penal.


    Ao se examinar cada processo, pode-se verificar que o modus operandi do APELANTE foi exatamente o mesmo, ou seja, ele subtraiu o cartão bancário das vítimas, e, de posse do mesmo, realizou diversas operações bancárias não autorizadas em desfavor delas. Trata-se exatamente do mesmo fato criminoso que se prolongou ao longo do tempo.


    Aliás, é importante salientar que, via de regra, as vítimas não são partes no sentido estrito da doutrina processual penal. Ainda mais para serem usadas como parâmetro para a análise da litispendência que, como dissemos, ocorre no processo penal quando há identificação de partes (Ministério Público ou querelante e Acusado ou querelado) e da causa de pedir (no caso em apreço, a infração ao art. 155, § 4º, II n/f do art. 71, todos do Código Penal).


    Cabe aqui uma pequena digressão em relação às vítimas no processo penal. O ofendido é o titular do direito atingido pela conduta ilícita do autor dos fatos. A ele pertence o interesse na reparação de seu prejuízo. Contudo, a sociedade civilizada já ultrapassou a fase da vingança privada ou da justiça pelas próprias mãos, pois, com a constituição do Estado, delegou-lhe o direito de punir o infrator da norma penal. Daí se dizer que a vítima não é parte no pólo ativo da relação processual penal, servindo, no máximo como forma de meio de instrução do Estado-Juiz acerca dos fatos ocorridos. Afinal, se assim não o fosse, nas exatas palavras de Tourinho Filho, in verbis:


    “Se o particular arrogar-se no direito de fazer justiça com as próprias mãos, sem recorrer ao Estado-Juiz, embora legítima a pretensão, estará, evidentemente, praticando um crime contra a Administração da Justiça”.


    O Legislador Ordinário, sabiamente, com a introdução da Lei nº 11.690/2008, alterou o Código de Processo Penal para bem definir o papel da vítima no curso da ação penal. Segundo o art. 201 caput do CPP, compete a vítima, quando intimada a fazê-lo, informar o Juiz de Direito acerca dos fatos imputados ao réu, suas circunstâncias, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações. Aqui, está mais do que evidente de que a vítima não é parte strictu sensu do processo penal, mas sim um dos meios utilizados para formar a livre convicção do Magistrado. O ofendido/vítima integra os meios subjetivos de prova, isto é, aqueles relacionados com as pessoas. É o que ocorre, igualmente, com a prova testemunhal, com o interrogatório do acusado e com a confissão. Portanto, a vítima não pode ser utilizada como parâmetro para a aferição ou não da litispendência.


    Dadas estas considerações acima, o Magistrado sentenciante da XX vara criminal da comarca da capital, ao prolatar seu decreto condenatório, rejeitou a preliminar arguida pela Defesa Técnica utilizando os seguintes fundamentos, in verbis:


    “Para que se configure a litispendência é necessário que o mesmo autor, invocando o mesmo fato, formule o mesmo pedido contra o mesmo réu".


    O que não ocorre no caso, vez que a conta número XXXXX-X do Banco XXXX é de titularidade de BELTRANA. Já nos autos de número XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX, o acusado subtraiu a quantia de R$X,XX da conta do Banco XXXX pertencente a SICRANO. Logo, verifica-se que as vítimas são diferentes.


    No processo de número XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX, o réu furtou o cartão bancário de titularidade de BELTRANA e SICRANO do banco YYYY e subtraiu o valor de R$X,XX . Contudo, como afirmado por BELTRANA nos autos XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX: esse fato não é discutido nos autos em análise”.


    Percebe-se, Excelências, que o Magistrado sentenciante justificou a rejeição à preliminar levantada unicamente com base nas vítimas, que, como consignamos nas linhas acima, não são partes do processo penal. E, levando-se em conta a definição jurídica de litispendência na seara penal, ela ocorrerá quando identificada as mesmas partes e causa de pedir. O que no caso em apreço são o Ministério Público e o APELANTE.


    Ainda que se considerasse as vítimas como partes num processo penal, o que fazemos aqui somente por amor ao debate, ao se verificar os autos processuais que tramitaram na YY vara criminal da comarca da capital (autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX e XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX), é fácil constatar que:


    • A senhora BELTRANA é casada com o senhor SICRANO;
    • Ambas as vítimas imputam ao APELANTE o mesmo fato delituoso;
    • O modus operandi empregado pelo APELANTE foi exatamente o mesmo, ou seja, subtraiu o cartão bancário das vítimas e, de posse do mesmo, realizou diversas operações bancárias em desfavor das mesmas em várias datas diferentes;
    • Os fatos ocorreram dentro do mesmo lapso temporal.
    • Nos autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX eles ocorreram, segundo a denúncia do Ministério Público, entre XX de XXXXXXX de XXXX a XX de XXXX de XXXX;
    • No autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX, segundo a denúncia do Ministério Público, os fatos ocorreram entre XX de XXXXX de XXXX a XX de XXXXX de XXXX;
    • Nos autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX, segundo a denúncia do Ministério Público, os fatos ocorreram entre XX de XXXXX de XXXX a XX de XXXXX de XXXX;


    Logo, trata-se da mesma conduta criminosa, na forma do crime continuado, que atingiu o patrimônio das mesmas vítimas. Tal fato é tão evidente que, o Magistrado da YY vara criminal da comarca da capital entendeu por determinar que os autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX e nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX fossem apensados e julgados conjuntamente. Ainda que os autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX tratem unicamente da vítima SICRANO e os autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX tratem das vítimas BELTRANA e SICRANO. Constou naquela respeitável sentença o seguinte, in verbis:


    “Isso assentado, deve ser ainda consignado que os processos XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX eXXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX, embora tenham sido autuado separadamente, já vêm tramitando de forma conjunta desde a fase instrutória consoante decisão prolatada nos autos n. XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX em XX/XX/XXXX (fls. 75), por se cuidar da imputação ao mesmo réu (FULANO DE TAL), de delitos cometidos na forma continuada, descritos no mesmo tipo penal (art. 155, § 4º, inciso II, do Código Penal), tendo sido perpetrados contra as mesmas vítimas (SICRANO e BELTRANA), em condições semelhantes de tempo, lugar e maneira de execução, comportando a anteriormente determinada unicidade de instrução e, por via de consequência, de julgamento".


    Percebe-se, Excelências, que o Douto Magistrado da YY vara criminal da comarca da capital entendeu que, muito embora se tratassem de autos diferentes, a conduta perpetrada pelo APELANTE foi a mesma. Uma conduta delituosa que se protraiu no tempo, na exata medida do crime continuado, contra as mesmas vítimas.


    Junte-se a isso, o fato de que as ações penais que tramitaram na YY vara criminal da comarca da capital foram distribuídas anteriormente à da XX vara criminal da comarca da capital. Para ser mais exato, aquelas foram distribuídas na data de XX de XXXXX de XXXX (autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX e nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX - YY vara criminal da comarca da capital) e esta foi distribuída na data de XX de XXXXX de XXXX (autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX - XX vara criminal da comarca da capital). Neste sentido, fixou-se a competência para julgamento a partir da citação válida pelo juízo da YY vara criminal, ordenada em XX de XXXXX de XXXX. Já a decisão ordenando a citação do APELANTE pelo juízo da XX vara criminal da comarca da capital se deu em XX de XXXX de XXXX. Chegamos a esta conclusão mais uma nos socorrendo do Código de Processo Civil, ante o silêncio eloquente do Legislador Ordinário no Código de Processo Penal, ao invocar o art. 240 do NCPC assim que dispõe, in verbis:


    Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor.


    Percebe-se que a norma exposta no aludido artigo do NCPC é clara em definir que a citação válida induz a litispendência. Deste modo, competia ao Juiz de Direito da XX vara criminal da comarca da capital reconhecer, ex officio ou por provocação da parte, a ocorrência desta impeditivo para o exame do mérito da ação proposta naquele juízo. O que, conforme já expusemos, não foi feito.


    Ante o exposto até aqui, concluímos que deve ser acolhida a alegação de litispendência, a fim de evitar uma flagrante injustiça. Sustentamos nossa tese nas seguintes premissas: 1-) Flagrante identidade de partes e causa de pedir; 2-) O fato de que as vítimas não são partes strictu sensu no processo penal; 3-) A atuação das vítimas/ofendidos no processo penal se dá como meio subjetivo de prova, na exata dicção do art. 201 do Código de Processo Penal; 4-) Incorreta decisão do Magistrado da XX vara criminal da comarca da capital, em se ater justamente às vítimas para fundamentar sua decisão de rejeição da litispendência; 5-) Acerto na decisão do Magistrado da YY vara criminal da comarca da capital ao reconhecer que as condutas contidas nos autos nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX e nº XXXXXXX-XX.XXXX.X.XX.XXXX, tratam-se do mesmo fato delituoso que se prolongou ao longo do tempo na modalidade de crime continuado; 6-) A citação válida pelo juízo da YY vara criminal da comarca da capital induziu a litispendência, impedindo o exame de mérito da ação penal proposta na XX vara criminal da comarca da capital.


    Neste sentido, roga a Defesa Técnica para seja reconhecida e decreta a litispendência, a fim de que seja extinta a ação penal que tramitou na XX vara criminal da comarca da capital, com a consequente nulidade da sentença proferida.



    III - DOS PEDIDOS


    Ante o exposto acima, requer-se:


    1. Recebimento e julgamento do recurso de apelação interposto, a fim de reformar a sentença condenatória proferida pelo Magistrado da XX vara criminal, no sentido de reconhecer a incidência da litispendência com a consequente anulação de todo o processo;
    2. Notificação ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, para que, dentro do prazo legal, apresente suas contrarrazões;



    Nestes termos,

    pede e espera deferimento.


    Rio de Janeiro, XX de XXXXXXXXX de XXXX.

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