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30 de Maio de 2024

STJ Mar23 - Perda de Cargo Público por Condenação Criminal não é Automática

ano passado

RECURSO ESPECIAL Nº 1939304 - SE (2021/0154142-3) RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ

DECISÃO

XXXXXXXXXXXXXXX interpõe recurso especial, fundado no art. 105, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região na Apelação Criminal n. 0803258- 24.2017.4.05.8500.

O recorrente foi condenado, em primeira instância, pelo crime do art. 304, c/c o art. 298, ambos do Código Penal, em continuidade delitiva, à sanção de 1 ano e 8 meses de reclusão mais 16 dias-multa, em regime inicial aberto.

A reprimenda foi substituída por duas restritivas de direitos. A Corte antecedente acolheu recurso da acusação para decretar a perda do cargo público.

A defesa aponta violação do art. 92, I, a, do Código Penal. Aduz que não estão presentes os requisitos necessários à decretação da perda do cargo público, pois o delito imputado não é funcional. Requer o provimento do recurso a fim de que seja reformado o acórdão impugnado.

O Ministério Público Federal opinou, em parecer do SubprocuradorGeral da República Antônio Carlos Pessoa Lins, à fl. 698, pelo provimento do recurso. Decido.

I. Perda do cargo público O juízo de primeira instância negou a decretação da perda do cargo público, com base nos argumentos a seguir (fl. 577): [...] No entanto, analisando a especificidade do caso em questão, registro, inicialmente, que não houve um exato abuso do cargo que o réu ocupava, eis que o crime objeto de sua condenação (apresentação de atestado particular falso ao órgão onde exercia suas atribuições) poderia ser praticado por qualquer servidor público, lato sensu – bastando a existência de um vínculo para com a Administração –, não se configurando, portanto, fruto de abuso de poder ou de qualquer privilégio pela prerrogativa da função por ele desempenhada, no exercício da função pública. Penso que a decretação da perda do cargo, como efeito extrajudicial da sentença condenatória, neste caso, resultaria fato mais gravoso para o réu do que a própria pena imposta, sobretudo quando a própria lei lhe agracia com a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Não estou admitindo que todas as vezes em que a lei possibilitar dita conversão esteja afastada a decretação da penalidade da perda do cargo. No entanto, pontuo que a aplicação do comando deve ser analisada dentro do contexto em que o crime foi praticado e o seu afastamento, quando for o caso, mediante devida fundamentação, como ora faço. A Corte antecedente, por sua vez, consignou (fl. 643): [...] Quanto ao ponto de perda do cargo público em específico, a perda do cargo público, efeito extrapenal específico previsto no artigo 92, inciso I, alínea a, do Código Penal, não se restringe aos denominados crimes funcionais, aplicando-se a todos os crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública. [...]Recurso especial improvido."( REsp 1710157/RO, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 08/03/2018). Idônea a fundamentação para a aplicação do art. 92, I, a, do Código Penal, exposta pelo órgão acusatório, porquanto, de fato, a apresentação de documentos falsos pelo funcionário público agride frontalmente seus deveres para com a Administração Pública", porquanto o condenado visou unicamente o benefício próprio em detrimento da coletividade, estando ausente de suas funções ordinárias por razões inautênticas, manchando a imagem da instituição à qual era vinculado. Assim, além da violação da lei penal com a prática delituosa, o acusado violou também os deveres como funcionário público que era à época dos fatos.

A perda do cargo público está entre os efeitos específicos da condenação, os quais não são automáticos, motivo pelo qual deve a sentença, motivadamente, declará-la, nos termos do art. 92, parágrafo único, do Código Penal, diferentemente, portanto, dos efeitos genéricos da condenação, que incidem em todos os casos e independem de especificação na sentença.

Para a perda do cargo, devem ser observados o concurso de dois requisitos, conforme disposto no art. 92, I, a, do Código Penal: a) fixação de pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 1 ano e b) abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública.

Nos crimes comuns, em que não há relação com a Administração Pública, exige-se a aplicação de pena superior a 4 anos. Na hipótese dos autos, o Magistrado de primeira instância considerou que a conduta praticada pelo recorrente não caracterizou abuso de poder ou exercício de prerrogativa inerente ao cargo ocupado.

Entendo que as justificativas apresentadas pelo acórdão recorrido não foram suficientes para desconstituir a convicção explicitada na sentença. Os deveres violados pelo recorrente, embora reprováveis, não o são em grau elevado ou causaram dano irreparável à Administração Pública e, em princípio, são passíveis de punição também na via administrativa. Os demais fundamentos são genéricos, pois foram lastreados na gravidade abstrata do delito imputado. Além disso, na hipótese dos autos, a decretação da perda do cargo público se apresenta desproporcional.

Assim, entendo que o acórdão não explicitou motivação concreta que justificasse a imposição da perda do cargo público, conforme a jurisprudência desta Corte Superior e, por essa razão, deve ser reformado. Ilustrativamente: [...] 4. A perda de cargo público descrita no art. 92, I, a, do Código Penal não é decorrência lógica de sentença condenatória, visto que exige, além de fundamentação concreta, adequação ao princípio da proporcionalidade, devendo ser avaliadas as circunstâncias em que o delito foi praticado e a pena aplicada. 5. Nos termos do art. 92, I, do CP, é inidônea a fundamentação de decisão de perda de cargo público que se limita a apontar ofensa a bem jurídico em decorrência de abuso de poder ou de violação de dever para com a administração pública. 6. Agravo regimental parcialmente provido. ( AgRg nos EDcl no REsp n. 1.868.513/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, 5ª T., DJe de 9/4/2021)

II. Dispositivo À vista do exposto, dou provimento ao recurso especial, para afastar a decretação da perda do cargo público do recorrente. Publique-se e intimem-se. Brasília (DF), 13 de março de 2023. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ Relator

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( Edição nº 0 - Brasília, Publicação: quarta-feira, 15 de março de 2023 Documento eletrônico VDA35621379 assinado eletronicamente nos termos do Art. § 2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário (a): MINISTRO Rogerio Schietti Cruz Assinado em: 14/03/2023 11:46:09 Publicação no DJe/STJ nº 3595 de 15/03/2023. Código de Controle do Documento: 49822387-a6b0-4da5-acc8-5535fda06eb2)

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