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3 de Maio de 2024

STJ Set 22 - Dosimetria Irregular - Personalidade Votada para o Crime - Fração de 1/6 do mínimo legal

há 2 anos

(...)

De igual maneira, no que toca à aventada negativa de vigência aos arts. 288 do Código Penal e 35 da Lei n. 11.343/2006, sob a tese de bis in idem em função da dupla condenação pelos crimes de formação de quadrilha e associação para o tráfico, observa-se que o decidido pelo Tribunal de origem está em fina sintonia com a jurisprudência pacífica deste STJ sobre o tema.

De fato, a respeito da matéria, assim manifestou-se a Corte a quo: Por fim, em atendimento ao princípio da ampla defesa e em atenção ao esforço da nobre defesa, consigna-se que não se vislumbra 'bis in idem' na condenação prolatada em primeiro grau e ratificada em segundo, pelo Ven. Acórdão embargado, já que, a robusta prova colhida durante a instrução criminal dá conta de que os réus associaram-se, em quadrilha armada, para o fim de cometer e controlar o cometimento de inúmeros delitos por todo o estado de São Paulo, distribuindo drogas, controlando a arrecadação financeira da organização, orquestrando as atividades desenvolvidas por um sólido sistema de comunicação e protegidas por um amplo arsenal de armas de fogo.

Patente, ainda, que os acusados compunham o quadro principal de liderança do 'Primeiro Comando da Capital', desempenhando funções de chefia e gerenciamento das atividades criminosas (dentre elas, a associação para o tráfico) praticadas por outros integrantes do bando, estando, portanto, devidamente tipificados os delitos previstos nos arts. 288, do Código Penal e 35, da Lei nº 11.343/06, conforme atenta análise de fls. 2617/2618"(fl. 3213).

Neste contexto, nota-se que o entendimento adotado pelo Tribunal de origem guarda fina sintonia com a jurisprudência pacífica deste STJ, sobre a matéria. De fato, nos termos do assentado pela Corte a quo, é harmônico nesta Corte Superior o entendimento de que"o delito tipificado no artigo 288 do Código Penal e aqueloutros que a quadrilha venha a praticar são autônomos, até porque aquele se aperfeiçoa e é punível independentemente da prática de crimes subseqüentes da quadrilha, pelos quais respondem especialmente os seus agentes e, não, o bando todo"( HC 31687/MS, relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJ de 25/04/2005).

Ainda, fica afastada a alegação de concurso formal de delitos, pois o Tribunal de origem, com ampla cognição fática, decidiu pela autonomia de desígnios dos pacientes quanto à prática dos crimes de associação criminosa e associação para o tráfico.

Por sua vez, a dosimetria da pena é o procedimento em que o magistrado, utilizando-se do sistema trifásico de cálculo, chega ao quantum ideal da pena com base em suas convicções e nos critérios previstos abstratamente pelo legislador. Conforme a orientação jurisprudencial do STJ, o cálculo da pena é questão afeta ao livre convencimento do juiz, passível de revisão por este Tribunal somente nos casos de notória ilegalidade, para resguardar a observância da adequação, da proporcionalidade e da individualização da pena ( AgRg no AREsp n. 1.843.362/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 14/5/2021; HC n. 405.765/SP, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe de 11/10/2017; e AgRg no HC n. 524.277/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe de 18/5/2020).

Na primeira fase da dosimetria da pena, nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, a quantidade, a diversidade e a natureza da droga apreendida, bem como a personalidade e a conduta social do agente, são preponderantes sobre as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal e podem justificar a exasperação da pena-base.

Desse modo, com base no princípio do livre convencimento motivado, por força do quadro fático-probatório que envolve o tráfico de drogas e da aplicação do princípio da especialidade, o julgador poderá concluir pela necessidade de exasperação e escolher a fração que considerar razoável para aplicar ao caso concreto.

Por esse motivo, a revisão da dosimetria da pena pelo Superior Tribunal de Justiça só é admitida em situações excepcionais de manifesta ilegalidade ou de abuso de poder que possam ser aferidas de plano, sem necessidade de dilação probatória ( AgRg no REsp n. 1.492.977/MG, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe de 24/3/2021; e AgRg no HC n. 644.934/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 15/3/2021).

Ressalte-se que, na ausência de previsão legal, o STJ sedimentou a orientação de que a exasperação da pena-base na fração de 1/6 para cada circunstância judicial valorada negativamente atende os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade ( HC n. 458.799/DF, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 10/12/2018). Todavia, com base no princípio do livre convencimento motivado, ainda que valorado um único vetor, considerada sua preponderância, o julgador poderá concluir pela necessidade de exasperação da pena-base em fração superior se considerar expressiva a quantidade da droga, sua diversidade e/ou natureza (art. 42 da Lei n. 11.343/2006).

No caso, quanto ao paciente Jonatas, na sentença que foi mantida em segundo grau, a pena-base do delito de associação criminosa foi exasperada em 1/6 sob os seguintes fundamentos (fls. 524-525):

Para o réu Jonatas: Em relação ao crime de associação ao tráfico de drogas: Considerando os critérios do artigo 59 do Código Penal, fixo a pena-base em: 3 (três) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa. Na segunda fase, ante a reincidência do réu (conforme certidão de fls. 204),aumento a pena em 1/6, perfazendo em 3 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa.

Na terceira fase, a pena permanece inalterada. Em relação ao crime de quadrilha: Na primeira fase da dosimetria penal, considerando os critérios do artigo 59 do Código Penal, a personalidade do réu desviada à prática de crimes, elevo a pena-base em 1/6, perfazendo em 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão.

Na segunda fase, devido à reincidência do réu, (conforme certidão de fls.204), aumento a reprimenda em 1/6 (um sexto), perfazendo a pena em: 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 10 (dez) dias de reclusão. Na terceira fase, a pena permanece inalterada. Considerando o concurso material, somando-se as penas, a pena perfaz em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa.

Como é cediço, a valoração negativa do vetor personalidade requer a observação pelo julgador da índole e do temperamento do agente, seu caráter como pessoa, por isso" resulta da análise do seu perfil subjetivo, no que se refere a aspectos morais e psicológicos, para que se afira a existência de caráter voltado à prática de infrações penais, com base nos elementos probatório dos autos, aptos a inferir o desvio de personalidade "( HC n. 446.920/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 15/8/2018, destaquei).

Dessa forma, há constrangimento ilegal quanto à exasperação da pena-base se der em razão da avaliação negativa da personalidade - que diz respeito à índole do agente de que fora caracterizada como" desviada "com base na" prática de crimes ".

Fica reduzida, assim, no tocante ao paciente Jonatas, a pena-base do delito previsto no art. 288 do Código Penal em 1 ano de reclusão, mantida a fração de reincidência, totalizando 1 ano e 2 meses de reclusão.

Com relação ao regime inicial de cumprimento de pena, o Tribunal de origem manteve o regime fechado nos seguintes termos (fl. 761): Quanto ao regime, outro não poderia ser que não o fechado, para todos os acusados. Até em atenção ao art. 33, § 3º, do Código Penal. E também se sabe, malgrado a edição da Súmula nº 719, pela Corte Máxima, que pode perfeitamente e ainda o regime fechado ser o adotado, quando devidamente justificado.

Exatamente como na espécie. Afinal, a organização a que pertenciam os réus visava obter, distribuir e dispor à comercialização, todos os tipos de substâncias entorpecentes, dentre eles alguns de natureza nefasta: cocaína e" crack "de implacável torpor violento e desmedido, alterador de razões, debilitante do corpo e de desestruturação mental. Tudo a revelar, portanto e enfim, que o tráfico vem, com a falta de rigor na aplicação da Lei, tomando conta da sociedade, a incutir-se como ato corriqueiro e cotidiano, ocorrido aos olhos de todos, sem que o Estado nada faça para punir aqueles que transgridam em plena confiança de impunidade a ordem jurídica em que a legislação se sustenta. [...] Daí que aqueles que se dispõe a se associar a grupo criminoso, com a finalidade de disseminar entorpecentes em larga escala, cujo vício é odiável e de difícil recuperação, a infligir transtornos não apenas ao próprio dependente, como também a todo seu seio familiar e social, contribuem para a destruição da própria sociedade. Merecem, por isso, fixação de regime inicial compatível com as circunstâncias e consequências dos delitos por eles praticados. Ademais, vale dizer. Àqueles que são surpreendidos em circunstâncias tais como as descritas nos autos, não há como aplicar-se regime mais brando, sob pena de violação ao princípio constitucional da individualização da pena (art. , XLVI, da Constituição Federal), o que não se pode permitir.

O art. 33, §§ 2º, a, b e c, e 3º, do Código Penal estabelece a regra geral para fixação do regime inicial de cumprimento da pena, pautando-se pela quantidade da reprimenda imposta ao final da dosimetria: a) fechado para a pena superior a 8 anos e, em casos de reincidência, para a pena igual ou inferior a 8 e superior a 4 anos; b) semiaberto para a pena igual ou inferior a 8 e superior a 4 anos, se primário o condenado; e c) aberto para a pena de até 4 anos. Outrossim, nos termos da Súmula n. 269 do STJ, admite-se o regime semiaberto na hipótese de reincidente condenado a pena igual ou inferior a 4 anos, se a pena-base tiver sido fixada no mínimo legal.

Destaque-se que a escolha do regime fechado com base na hediondez do delito não encontra mais respaldo na jurisprudência das cortes superiores, mormente após a declaração de inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/1990 pelo Supremo Tribunal Federal. Por sua vez, o juiz pode fixar regime inicial mais gravoso do que aquele relacionado unicamente com o quantum da pena ao considerar a eventual existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis, especialmente a natureza ou a quantidade da droga, até mesmo sua forma de acondicionamento, desde que fundamente a decisão ( AgRg no HC n. 536.415/RS, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe de 19/8/2020).

É incabível, todavia, a fixação de regime prisional mais gravoso com base apenas na gravidade abstrata do delito, especialmente quando a pena-base foi estabelecida no mínimo legal. A propósito, confira-se o enunciado da Súmula n. 440 do STJ: Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito. O STF também possui orientação firmada no mesmo sentido.

Vejam-se, respectivamente, as Súmulas n. 718 e 719: - A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada. - A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea.

No presente caso, considerando que a instância ordinária utilizou fundamentação genérica para fixar regime de cumprimento de pena mais gravoso, observados os parâmetros legais previstos no art. 33 do Código Penal, considerando que Jonatas é reincidente e teve a pena final fixada em 4 anos e 10 meses de reclusão, deve ser mantido o regime fechado. Todavia, a condenação aplicada a Alex foi de 4 anos de reclusão impondo a fixação do regime intermediários de cumprimento de pena.

Ante o exposto, com fundamento no art. 34, XX, do RISTJ, não conheço deste habeas corpus, mas concedo a ordem de ofício, nos termos do art. 654, , do Código de Processo Penal, para reduzir pena-base do delito previsto no art. 288 do Código Penal, redimensionando a pena final imposta ao paciente JONATAS GOMES ACCIOLY para 4 anos e 8 meses de reclusão no regime fechado e de 816 dias-multa e, quanto ao paciente ALEX QUEIROZ DE ARAUJO, alterar para semiaberto o regime de cumprimento da condenação de 4 anos de reclusão e 700 dias-multa que lhe foi imposta. Comunique-se com urgência ao Juízo de primeira instância e ao Tribunal de origem para que adotem as providências necessárias. Publique-se. Intimem-se. Cientifique-se o Ministério Público Federal. Após o trânsito em julgado, remetam-se os autos ao arquivo. Brasília, 22 de agosto de 2022. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA Relator

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(STJ - HC: 529348 SP 2019/0253450-0, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Publicação: DJ 24/08/2022)

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