Página 1220 do Diário de Justiça do Distrito Federal (DJDF) de 23 de Abril de 2015

consumerista. A lide deve ser solucionada sob o prisma do sistema jurídico autônomo instituído pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal nº 8.078/90), protetor da parte vulnerável da relação de consumo. A controvérsia reside na possibilidade de a requerente pleitear a restituição de compras realizadas fraudulentamente cinco meses após a operação. Entende a parte requerida ser aplicável o prazo de trinta dias, previstos contratualmente. Contudo, diante das regras mais fundamentais da hermenêutica jurídica, o referido termo (convencional) não deve prevalecer diante de previsão legal diversa. O artigo 26, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor prevê o prazo de noventa dias para reclamação pelo vício, contados a partir do término da execução dos serviços. Na hipótese, a compra questionada foi feita em outubro de 2013, mas parcelada em dez vezes. Desse modo, o término da prestação do serviço dar-se-ia apenas após a última parcela, e a consumidora teria o prazo de noventa dias após o pagamento da décima parcela para reclamar por esse vício do serviço. Outrossim, a ausência de culpa e de má-fé alegada pela ré é irrelevante para a definição de sua responsabilidade. É certo que enquanto fornecedora de serviços (CDC, art. , § 2º), a empresa ré responde objetivamente pelos danos que causar ao consumidor no desenvolvimento de suas atividades (CDC, arts. 14, caput, e 17), levadas a efeito sem a segurança esperada, sendo indiferente o exame de eventual dolo ou culpa. A responsabilidade, no caso em apreço, desloca-se para o terreno do risco do empreendimento, cabendo-lhe suportar as consequências advindas de ato fraudulento praticado contra ela e que causem dano a terceiro. Ressalte-se que o ato fraudulento praticado na celebração do contrato não constitui fato de terceiro passível de eximir a responsabilidade civil do réu, na medida em que não rompe o nexo causal entre o ato comissivo e o dano dele resultante, por caracterizar-se como fortuito interno, o qual não afasta a responsabilidade do fornecedor. Sérgio Cavalieri Filho, ao comentar o tema, afirma que ?O fortuito interno, assim entendido o fato imprevisível e, por isso, inevitável ocorrido no momento da fabricação do produto ou da realização do serviço, não exclui a responsabilidade do fornecedor porque faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos do empreendimento, submetendo-se à noção geral de defeito de concepção do produto ou de formulação do serviço. Vale dizer, se o defeito ocorreu antes da introdução do produto no mercado de consumo ou durante a prestação do serviço, não importa saber o motivo que determinou o defeito; o fornecedor é sempre responsável pelas suas conseqüências, ainda que decorrente de fato imprevisível e inevitável.? (?Programa de Responsabilidade Civil? ? 8ª edição ? São Paulo: Atlas, 2008, p. 490). Apenas o fato de terceiro absolutamente estranho às atividades empresariais da fornecedora poderia eliminar por completo o nexo de causalidade, por estar aí configurado o fortuito externo. Como na hipótese em exame a fraude ocorreu em função da atividade lucrativa da ré, aplicável a já comentada teoria do risco do empreendimento, sendo descabida tentativa de configurar uma excludente de responsabilidade pelo rompimento do nexo causal. É imperioso que a parte requerida tome mais cautelas quando for iniciar a prestação de serviços aos consumidores, checando dados e autorizações, a fim de serem evitados transtornos à comunidade consumerista. Sob esse prisma, constata-se a ilegalidade da dívida cobrada na fatura do seu cartão de crédito, o que confere à autora o direito de ter declarado o débito inexistente. O artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, determina que o consumidor tem direito à repetição de indébito quando o pedido se refere à restituição de valor pago indevidamente à parte requerida, que realizou cobrança desprovida de fundamento. A hipótese amolda-se ao previsto na lei consumerista, eis que, em razão do vício do serviço, a requerente pagou por compra não realizada pela titular do cartão de crédito, o que faz incidir a aplicação do valor dobrado previsto no artigo mencionado. Contudo, deverá a requerente ser restituída apenas dos montantes de R$ 3.187,80 (três mil cento e oitenta e sete reais e oitenta centavos) e R$ 602,84 (seiscentos e dois reais e oitenta e quatro centavos), em dobro, uma vez que o conjunto fático probatório não indica débito na conta do consumidor além daquele evidenciado pelos Ids 230033 e 230021 e fatura Id 373102. O pedido de indenização por danos morais, por seu turno, não merece ser acolhido, haja vista que o requerente não demonstrou qualquer violação a direito da personalidade. Os fatos por ele mencionados, no sentido de que a conduta da parte requerida lhe causou constrangimentos, não ensejam reparação a título de dano moral. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, com resolução de mérito, nos termos do inciso I do artigo 269 do CPC, e DECLARO a inexistência do débito de R$ 3.187,80 (três mil cento e oitenta e sete reais e oitenta centavos) e CONDENO a requerida a pagar à requerente os montantes de R$ 3.187,80 (três mil cento e oitenta e sete reais e oitenta centavos) e R$ 602,84 (seiscentos e dois reais e oitenta e quatro centavos), em dobro, devidamente atualizados pelo INPC, da data do desembolso, e acrescidos de juros legais de 1% ao mês, a partir da citação, nos termos do parágrafo único do art. 42 do CDC Sem custas e honorários advocatícios, conforme disposto no artigo 55, "caput" da Lei Federal nº 9.099/95. Após o trânsito em julgado, a parte requerida terá o prazo de 15 (quinze) dias para cumprir a condenação, sob pena de multa de 10% (dez por cento), nos termos do artigo 475-J, do Código de Processo Civil. Se não cumprida voluntariamente a obrigação de pagamento, cumpre à parte autora solicitar por petição o início da execução, instruída com planilha atualizada do cálculo, conforme regra do art. 475-B do CPC e do art. 52, IV, da Lei nº 9.099/95. Sentença registrada nesta data. Publique-se. Intimem-se.

Nº 070XXXX-71.2015.8.07.0016 - PETIÇÃO - A: BRUNO RODRIGUES ABREU. Adv (s).: DF41514 - ANNA LUIZA DI VASCONCELOS. R: SONY BRASIL LTDA.. Adv (s).: SP131600 - ELLEN CRISTINA GONCALVES PIRES. Número do Processo: 070XXXX-71.2015.8.07.0016 Classe: PETIÇÃO (241) REQUERENTE: BRUNO RODRIGUES ABREU REQUERIDO: SONY BRASIL LTDA. SENTENÇA Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38, "caput", da Lei Federal nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. O autor pretende a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos materiais. Sustenta que adquiriu aparelho celular no exterior da marca Sony, mas não conseguiu utilizar da garantia no Brasil. Inicialmente cumpre registrar que não se aplica ao caso vertente as normas do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o produto objeto dos autos fora adquirido no exterior. As normas de defesa do consumidor apenas seriam eficazes e exigíveis se o produto tivesse sido adquirido no território nacional, com nota fiscal emitida por empresa estabelecida no Brasil. Oportuno registrar que a 1ª Turma Recursal, em caso análogo, entendeu pela não aplicação da lei consumerista, conforme se observa da ementa abaixo colacionada: JUIZADO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. CONFUSÃO COM O MÉRITO. APRECIAÇÃO CONJUNTA. CDC. VIDEOGAME COMPRADO NO EXTERIOR. MAU FUNCIONAMENTO DO PRODUTO. PRAZO DE GARANTIA. INAPLICABILIDADE DA LEI 8.078/90. RECURSO PROVIDO. 1.Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor a produto comprado no exterior, ainda que o fabricante possua representação no território nacional. 2. A previsão de responsabilidade do fabricante, importador ou comerciante é quanto aos produtos importados por eles e revendidos no Brasil (CDC, art. 13). 3.O fornecedor tem compromisso com as regras de produção, qualidade, assistência técnica e garantia do país onde fabrica e vende seu produto, normas que, não raras vezes, reflete o grau de exigência e a estratificação social a ser atingida no mercado. 4.RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA REFORMAR A SENTENÇA E JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS. (Acórdão n.836140, 20140110629370ACJ, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 04/11/2014, Publicado no DJE: 03/12/2014. Pág.: 313) Ad argumenttandum tantum, conforme dispõe o inciso I, do artigo 333, do Código de Processo Civil, "o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito." Nelson Nery Júnior (Código de Processo Civil Comentado. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. p. 758), ao discorrer sobre o ônus da prova inserto no artigo 333 do Estatuto Processual Civil, leciona que "...o não atendimento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de causa. A produção probatória, no tempo e na forma prescrita em lei, é ônus da condição de parte."Mais adiante, o ilustre processualista arremata:"Segundo a regra estatuída por Paulo, compilada por Justiniano, a prova incumbe a quem afirma e não a quem nega a existência de um fato. O autor precisa demonstrar em Juízo a existência do ato ou fato por ele descrito na inicial como ensejador de seu direito." (p. 759). Ocorre que não há, nos autos, quaisquer elementos que comprovem o dano e a prática de ato ilícito pela parte requerida. De fato, o autor não logrou êxito em comprovar os fatos narrados na petição inicial, pois não acostou qualquer suporte probatório capaz de evidenciar o dano ocorrido. Em suma, o aparelho fora importado pelo próprio demandante, sem a participação direta do réu sediado no Brasil. Desta feita, o regramento a ser aplicado ao caso em epígrafe deve ser aquele vigente na localidade da compra associado aos termos da garantia contratual assegurada pelo fornecedor, que sequer foram acostados aos autos. E, de todo modo, inexiste qualquer prova do vício do produto. Destarte, ausente os requisitos da responsabilização civil, impossível a condenação tal qual pretendida pelo demandante. Ante o exposto, julgo improcedente o pedido, com resolução de mérito, apoiado no artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil. Sem custas e honorários advocatícios, conforme disposto no artigo 55, "caput" da Lei Federal nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

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