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7 de Junho de 2024
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    Superior Tribunal de Justiça STJ - AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL: AREsp XXXXX RS XXXX/XXXXX-0

    Superior Tribunal de Justiça
    há 2 anos

    Detalhes

    Processo

    Publicação

    Relator

    Ministro JOEL ILAN PACIORNIK

    Documentos anexos

    Decisão MonocráticaSTJ_ARESP_2006602_2c03a.pdf
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    Ementa

    Decisão

    AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2006602 - RS (2021/XXXXX-0) DECISÃO Trata-se de agravo de DJALMA DOS SANTOS em face de decisão proferida no TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO - TRF4 que inadmitiu seu recurso especial interposto com fundamento no art. 105, III, alínea a, da Constituição Federal - CF, contra acórdão proferido no julgamento de Apelação Criminal n. XXXXX-90.2018.4.04.7002. Consta dos autos que o agravante foi denunciado como incurso nos arts. 334 e 334-A do Código Penal - CP, sendo absolvido em primeiro grau de jurisdição, com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal - CPP (fls. 276/280). Recurso de apelação interposto pela Acusação foi provido para condenar o recorrente, nos termos da denúncia, à pena de 3 anos e 4 meses de reclusão, em regime aberto, além de 25 dias multa, sendo a pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direitos (fl. 351). O acórdão ficou assim ementado: "PENAL. PROCESSO PENAL. 334 CAPUT DO CÓDIGO PENAL. DESCAMINHO. ART. 334-A DO CÓDIGO PENAL . CONTRABANDO. CIGARROS. MEDICAMENTOS SEM REGISTRO NO ÓRGÃO COMPETENTE E CONSTANTE DA LISTA B2 - LISTA DAS SUBSTÂNCIAS PSICOTRÓPICAS ANOREXÍGENAS DA RDC Nº 130 DA ANVISA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. MOTORISTA DE ÔNIBUS. COLABORAÇÃO PARA O TRANSPORTE DAS MERCADORIAS IRREGULARES DEMONSTRADA. RECURSO DA ACUSAÇÃO PROVIDO. CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. CULPABILIDADE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME DESFAVORÁVEIS. REINCIDÊNCIA. REGIME SEMIABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS PENAS RESTRITIVAS DEDIREITOS. 1. Transportar mercadorias de terceiros não afasta a responsabilidade criminal, pois o ato configura consciente colaboração direta para a introdução irregular da mercadoria em território nacional, em crime de descaminho, independente ou não do exercício de atividades comerciais. 2. Para o reconhecimento da autoria do crime de descaminho ou contrabando, em se tratando de acusado motorista de ônibus de passageiros, não basta estar na condução do veículo e inexistir identificação da propriedade das mercadorias, é imprescindível a demonstração nos autos da existência de conluio entre o motorista e o proprietário do veículo, o guia de viagens, ou passageiros para a internalizar irregularmente as mercadorias. 3. No caso concreto, há prova suficiente de que o réu aderiu com vontade e plena consciência da ilicitude à conduta da pessoa que o contratou e dos passageiros, colaborando para o transporte das mercadorias irregulares, atuando decisivamente para a consumação do crime. 4. Comprovadas a materialidade e autoria delitivas, bem assim o dolo do acusado, sendo o fato típico, antijurídico e culpável, e inexistindo causas excludentes, a condenação pela prática do crime de descaminho (art. 334, caput, § 1º e IV, do Código Penal é medida que se impõe. 5. Os cigarros estrangeiros são mercadoria relativamente proibida, conforme a Lei nº 9.532/1997 (art. 44 a 47) e o Decreto-Lei nº 1.593/1977,normas nas quais consta que apenas podem ser importados cigarros cujas marcas sejam comercializadas nos territórios do origem e que a importação somente pode ser feita por pessoas inscritas no registro especial. Configuração do contrabando. Precedentes do STF e do STJ. 6. Denunciado o acusado pela prática do delito de contrabando em face do transporte de cigarros e medicamentos, sob pena de prejuízo à defesa, mantém-se inalterado o enquadramento dos fatos narrados na denúncia no artigo 334-A, § 1º, incisos I, II, II e IV do Código Penal. 7. Comprovadas a materialidade e autoria delitivas, bem assim o dolo do acusado, sendo o fato típico, antijurídico e culpável, e inexistindo causas excludentes, deve o réu ser condenado pela prática do crime de contrabando de cigarros e medicamentos (art. 334-A do Código Penal). 8. A vetorial culpabilidade merece maior reprovação, tendo em vista que o réu optou por utilizar suas habilidades profissionais (exerce atividade remunerada no Transporte Coletivo de Passageiros (motorista profissional de transporte coletivo) para a prática de crimes. 9. Pena provisória aumentada em 1/6 em face da agravante da reincidência. 10. Circunstâncias do crime de contrabando negativada em face de o transporte de cigarros e medicamentos sem registro na ANVISA, além de medicamentos relacionados na LISTA C5 - LISTA DAS SUBSTÂNCIASANABOLIZANTES e na Lista B2 - LISTA DAS SUBSTÂNCIAS PSICOTRÓPICASANOREXÍGENAS da RDC nº 130 da ANVISA, de 02/12/2016, que autoriza a Portaria nº 344/98 - SVS/MS, ensejar maior risco ao bem jurídico que a norma penal tutela, a saber, a saúde pública. 11. Concurso formal e majoração da maior pena in concreto. 12. Condenado o réu, reincidente, às penas de 3 (três) anos, 4 (quatro) meses e 25 (vinte e cinco) dias de reclusão, o regime para iniciar o cumprimento da pena é o semiaberto. 13. Aplicada pena que não supera 4 (quatro) anos de reclusão e atendidos os demais requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal, é cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, as quais proporcionam um meio menos gravoso de cumprimento da pena. 14. Pena privativa de liberdade substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes na prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, nos termos do art. 44, § 2º, do Código Penal."(fls. 353/355) Em sede de recurso especial (fls. 368/377), a Defesa apontou violação ao art. 386, incisos III e VII do CPP, porque o TRF4 manteve a condenou o ora recorrente sem a existência de provas suficientes da autoria do delito. Assevera que o recorrente era apenas o motorista do ônibus de turismo no qual foram apreendidas as mercadorias (cigarros e medicamentos), não havendo indicativos de que o recorrente fosse o responsável pela fiscalização ou recebimento destas. Aponta inexistência de dolo na conduta, considerando que enquanto motorista do ônibus, não era o responsável pelo pagamento dos tributos. Por fim, argumenta que, como não houve lançamento do tributo, não há crime, salientando que, em momento algum foi chamado a adimplir qualquer custo. Requer a absolvição. Contrarrazões da PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA DA 4ª REGIÃO - PRR4 do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF (fls. 384/406). O recurso especial foi inadmitido no TRF4 em razão de: a) ausência de prequestionamento, quanto à necessidade de lançamento dos tributos; b) óbice da Súmula n. 7 do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ (fls. 404/414). Em agravo em recurso especial, a Defesa impugnou os referidos óbices (fls. 422/426). Contraminuta da PRR4 (fls. 430/438) Os autos vieram a esta Corte, sendo protocolados e distribuídos. Aberta vista ao MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF, este opinou pelo não conhecimento do recurso especial (fls. 451/454). É o relatório. Decido. Atendidos os pressupostos de admissibilidade do agravo em recurso especial, passa-se à análise do recurso especial. Sobre a violação ao art. 386, incisos III e VII do CPP, o TRF4 condenou o recorrente nos seguintes termos do voto da relatora: "No caso concreto o réu foi flagrado transportando 8.620 maços de cigarros e aproximadamente 32.228 (trinta e dois mil duzentos e vinte e oito) unidades de medicamentos entre comprimidos e frascos, que estavam desacompanhadas de documentação regular. Os cigarros estrangeiros são mercadoria relativamente proibida, conforme a Lei nº 9.532/1997 (art. 44 a 47) e o Decreto-Lei nº 1.593/1977, normas nas quais consta que apenas podem ser importados cigarros cujas marcas sejam comercializadas nos territórios do origem e que a importação somente pode ser feita por pessoas inscritas no registro especial. Ademais, a importação de cigarros somente pode ser feita nas marcas licenciadas para comercialização pela Anvisa, conforme artigo 20 da Resolução da Diretoria Colegiada nº 90/2007, da Anvisa, vigente até 5/8/2018: [...] Julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça afirmam serem os cigarros estrangeiros mercadoria relativamente proibida (STF HC XXXXX, Relator Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em03/12/2013, processo eletrônico DJe-250, divulg XXXXX-12-2013, public XXXXX-12-2013; STJ, AgRg no REsp XXXXX/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DAFONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 02/02/2017, DJe 10/02/2017; STJ, RHC40.779/PR, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em03/12/2015, DJe 17/12/2015; STJ, REsp XXXXX/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI,QUINTA TURMA, julgado em 02/10/2014, DJe 09/10/2014). No que diz respeito ao medicamentos transportados no julgamento da arguição de inconstitucionalidade 5001968-40.2014.404.0000, a Corte Especial deste Tribunal, assentou que na importação de grande quantidade de medicamentos, deve ser aplicado o art. 273 na sua íntegra; em se tratando de média quantidade, aplicável o preceito secundário do art. 33 da Lei11.343/06 ao crime previsto no art. 273 e parágrafos; e, na importação ilícita de pequena quantidade de medicamentos, não há potencial violação ao bem jurídico tutelado pelo art. 273 do Código Penal, devendo ser desclassificada a conduta, conforme a data da sua prática, para o art. 334, caput, primeira figura, do Código Penal, na anterior redação, ou para o art. 334-A, com a atual redação. Ainda, ficou ressalvado que, sendo ínfima a quantidade de medicamentos apreendidos e não havendo destinação comercial, há a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância. Atualmente a grande controvérsia que se apresenta na 4ª Seção desta Corte é a definição de que quantidade é tida por pequena ou ínfima, para desclassificação para contrabando e aplicação do princípio da insignificância, número que vem cada vez mais se elastecendo, sem relevar a espécie de medicamento, o que é motivo de preocupação e tem, inclusive, gerado reforma de acórdãos pelo Superior Tribunal de Justiça. No caso foram apreendidos os seguintes medicamentos (Evento1 -NOTCRIME4 - pp. 1/3 dos autos do IPL nº XXXXX20154047002): RHEUMAZIN FORTE/LASCA COMPRIMIDO CART. COM 20 COMP (100 unidades), STANAZOL/RWR 20ML, FRASCO/50MG (1 unidade), METANDROSTENOLONA/LANDERLAN COMPRIMIDO COM 10MG FRASCO C/ 100COMP (300 unidades), DIMAGRIR MAZINDOL 3MG CAR. COM 15 COMP (15unidades), SUPLEMENTO ALIMEN. PROIBIDO LIPO 6 BLACK/NUTREX FRASCO C/60 COPR (2 unidades). Foram submetidos à perícia e constatado que todos têm origem estrangeira. O medicamento Rheumazin não possui registro na ANVISA, o Stanazol/RWR, o Metandrostenolona/Landerlan e Suplemento Alimentar Lipo6 black/Nutrex estão relacionados na LISTA C5 - LISTA DAS SUBSTÂNCIASANABOLIZANTES - Portaria nº 344/98 e o medicamento Dimagrir Mazindol, porsua vez, que passou por análise química, é anorexígeno, inibe diretamente a atividade de neurônios sensitivos à glicose no hipotálamo lateral, capaz de causar dependência física e/ou psíquica e se encontra ralacionado na Lista B2 -Lista das Substâncias Psicotrópicas Anorexigenasda RDC nº 130 da Anvisa, de02/12/2016, que autoriza a Portaria nº 344/98 - SVS/MS. Ocorre que o réu foi denunciado pelo crime de contrabando pelas mercadorias transportadas, no caso, cigarros e medicamentos e, sob pena de prejuízo à defesa, mantenho inalterado o enquadramento dos fatos narrados na denúncia no artigo 334-A, § 1º, incisos I, II, II e IV do Código Penal. Portanto, os fatos ora em julgamento apresentam os elementos do artigo 334-A do Código Penal, tendo em vista que os cigarros estrangeiros (mercadorias estrangeiras relativamente proibidas) e os medicamentos foram introduzidos clandestinamente no território nacional ou importados irregularmente sem a documentação pertinente. [...] Descaminho A materialidade restou comprovada pela Representação Fiscal para Fins Penais, pelo Demonstrativo dos Créditos Tributários Evadidos, pelo Auto de Infração e Apreensão de Mercadorias, pela Relação de Mercadorias e pelo Demonstrativo dos Créditos Tributários Evadidos, as imagens do veículo apreendido com as mercadorias (Evento 1 - NOTCRIME3 - pp. 1/7, NOTCRIME4- pp. 1/5, evento 3 - FOTO11/12, FOTO14/44 dos autos do IPLnº XXXXX20154047002). No demonstrativo de créditos tributários evadidos, a Receita Federal do Brasil apurou o valor de R$ 48.325,01 em tributos iludidos. Entretanto, é entendimento pacífico no Superior Tribunal de Justiça que, quando há decreto de perdimento das mercadorias apreendidas - tratamento comumente dado pela Receita Federal do Brasil nas apreensões quando do transporte ou manutenção em depósito das mercadorias estrangeiras - incidem apenas o imposto de importação e o imposto sobre produtos industrializados sobre seu valor, devendo ser excluídos do cálculo as alíquotas relativas ao PIS e a Cofins (artigo , inciso III, da Lei nº 10.865/2004). Nessa linha, os precedentes de longa data REsp XXXXX/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 15/09/2011, DJe10/10/2011; AgRg no REsp XXXXX/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTATURMA, julgado em 16/02/2012, DJe 27/02/2012; AgRg noAREsp XXXXX/RS,Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA,DJe 26/03/2015. A materialidade, pois, é certa. Quanto à autoria, os documentos produzidos pelos servidores públicos da Receita Federal do Brasil, que possuem presunção de legitimidade e veracidade, o depoimento da testemunha em juízo e o interrogatório do réu dão conta de bem demonstrá-la, eis que o acusado confirma que conduzia o veículo apreendido com as mercadorias irregulares e a maior parte sem identificação do proprietário. Nos autos do Inquérito Policial o acusado, em resposta aos quesitos, confirmou que as mercadorias foram encontradas no veículo por ele conduzido e: pelo que o declarante se recorda as mercadorias estavam etiquetadas, mas desconhece o fato de terem nomes que não viajavam nos coletivos, pois é de responsabilidade dos passageiros etiquetarem suas mercadorias; 5) que quem guardou as mercadorias nos bagageiros foi o declarante, mas cada passageiro foi o responsável por colocar as etiquetas com seus respectivos nomes; 6) que não tinha gua e quem organizava eram os próprios passageiros; 7) que não se lembra se o veículo possuía cadastro na ANTT; 8) não se lembra, mas pelo que se recorda o veículo não era cadastrado na ANTT; 9) que devido ao tempo decorrido não se recorda dos detalhes, mas normalmente recebia cerca de R$R$ 350,00 por viagem pagos pelo proprietário do veículo, contudo o declarante afirma que trabalhava como motorista autônomo" freelancer "; (...) 11) que desconhece a empresa GRANSUL LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA-ME e não tem nenhuma relação com ela;(...) que pegou este ônibus vazio no centro de São Paulo, próximo ao Mercadão Municipal de São Paulo (Evento 13 - REL_FINAL_IPL1 - p. 4, p. 7/8). Em juízo, o réu confirmou as declarações prestadas no seu interrogatório no inquérito. Disse que não tinha conhecimento das mercadorias irregulares, pois pertenciam aos passageiros, pegou o veículo em São Paulo, foi contratado pelo proprietário do ônibus, Sr. Daniel, uma moça, contratada pelo proprietário, que se chama Verinha, verificava as bagagens (recebia e identificava as bagagens de cada passageiro), (Evento 107 VIDEO2 da ação penal). O depoimento da testemunha, em juízo, Sra. Lucia Aparecida da Silva Santos (Evento 107 - VIDEO3 da ação penal), passageira, afirmou que fez a viagem para adquirir mercadorias no Paraguai para revender, comprou lingerie, brinquedos e roupas, bem como confirmou que o ônibus não entrou no Paraguai, ficou em Foz do Iguaçu e a moça que lhe convidou para fazer a viagem e lhe vendeu a passagem a conduziu até o Paraguai Afirmou, ainda que havia em torno de uns 22 passageiros no ônibus, que a moça que lhe vendeu a passagem e colocava etiqueta nas mercadorias (identificando com nome e RG). Afirmou, também, que não viu o motorista comprando mercadorias no Paraguai. Como se vê, trata-se de viagem programada para o Paraguai, supostamente pela Sra. Verinha, para aquisição de mercadorias estrangeiras, sendo o réu o condutor do veículo. [...] Importa consignar que transportar mercadorias de terceiros não afasta a responsabilidade criminal, pois o ato configura consciente colaboração direta para a introdução irregular da mercadoria em território nacional, em crime de descaminho, independente ou não de exercerem atividades comerciais. Com efeito, além do"mula"e do"laranja", a figura do transportador também perfectibiliza a conduta típica do artigo 334 do Código Penal, pois, para o delito em questão, é irrelevante a vinculação com a carga. Além disso, o tipo penal não apresenta qualquer especificação quanto à destinação das mercadorias descaminhadas. [...] É certo que para o reconhecimento da autoria do crime de descaminho ou contrabando, em se tratando de acusado motorista de ônibus de passageiros, não basta estar na condução do veículo e inexistir identificação da propriedade das mercadorias, é imprescindível fique demonstrado nos autos conluio entre o motorista e o proprietário do veículo, o guia de viagens, ou passageiros para a internalizar irregularmente as mercadorias. Analisando os autos sob este enfoque, verifica-se que na Representação Fiscal Para Fins Penais nº 12457.722077/2015-40 consta que o veículo conduzido pelo réu é de propriedade da empresa GRAN SUL LOCADORADE VEÍCULO LTDA - ME, CNPJ 04.XXXXX/0001-13, sendo o Auto de Infração emitido em nome da aludida empresa, eis que proprietária do veículo e os volumes não tinham a identificação dos seus respectivos proprietários, conforme disposto art. 74, § 3º, da Lei 10.833/2003 (Evento 1 - NOTCRIME3 -p. 2/3 e NOTCRIME4 - pp. 1/3 do IPL). Consta, também, dos autos do inquérito cópia de ticket, de Miani Transporte e Turismo, de passageiro em nome de Silvio M Silva, RG1392302110, cujos comprovantes de bagagem correspondem aos números390, 398, 389, 412, 415 e 431 (evento 3 - DESP1, p. 17), cópia de comprovantes de bagagem referentes aos números 398, 399 e 400 em nome de Bugido Calhado, RG XXXXX (evento - DESP1, p. 19,), cópia de comprovantes de bagagem referentes aos números 392 e 393, cuja identificação é ilegível, de RG XXXXX (evento 3 - DESP1 - p. 23). Nota-se, da Consulta ao veículo de passageiros que a capacidade de lotação do ônibus conduzido pelo réu é de 46 lugares Evento 3 - OFIC2 - p. 12 dos autos do IPL). Do relatório de Fiscalização de Veículo 2296/14 constata-se que a maior parte das mercadorias não foram identificados os proprietários e portanto o Auto de Infração foi emitido em nome da empresa Gran Sul Locadora de Veículos LTDA, eis que não pertecente a nenhum passageiro (Evento 1 - NOTCRIME3 - p. 2/3 e NOTCRIME4 - pp. 1/3 e evento 3- OFIC2 - p. 37/38 do IPL). Portanto, a tese da defesa, no sentido da não responsabilidade do réu pelos fatos narrados na denúncia, tendo em vista que apenas prestava serviço de motorista, não prospera, sobretudo se considerado que a viagem para o Paraguai foi programada por terceira pessoa, que sequer foi localizada e para quem o acusado admitiu prestar o serviço de motorista, concorrendo, assim, para a importação irregular das mercadorias apreendidas sem identificação do proprietário. [...] No que tange ao dolo, o tipo penal de descaminho apresenta elemento subjetivo na forma de dolo genérico, sem finalidade específica, sendo que, para aferi-lo," basta a comprovação da prática consciente e deliberada da conduta descrita no preceito primário da norma penal. "(TRF4, ACR XXXXX-32.2014.404.7119, Sétima Turma, Relator Márcio Antônio Rocha, juntado aos autos em 25/02/2016). As circunstâncias que envolvem o fato apurado permitem verificar o dolo na conduta do acusado, na medida em que tinha plena ciência da ilicitude da sua conduta e com vontade livre e consciente contribuiu para a importação irregular das mercadorias. Não é razoável crer, como alega a defesa, que o réu não tinha conhecimento da ilicitude, sobretudo se considerada a existência de outros processos administrativos em desfavor do acusado com apreensão de mercadorias em 2014 (Evento 3 - OFIC2 - p. 26 dos autos do IPL). Ademais, a defesa não produziu provas para desconstituir os elementos probatórios que embasam a acusação, limitando-se a requerer a absolvição do réu por ausência de autoria, sob a alegação de que o réu somente prestou serviço de motorista. [...] Por fim, como bem apontado pelo Ministério Público Federal no parecer juntado aos autos no evento 4 da apelação criminal"a inexistência da devida identificação das bagagens é uma inequívoca forma de impedir a atuação da fiscalização e de garantir a impunidade dos passageiros. O volume de mercadorias não identificadas revela a intensão omissiva do réu, não havendo dúvidas de que não foi mera negligência mas, sim, um subterfúgio usado para impedir a fiscalização, tenho o réu agido dolosamente para ocultar os reais proprietários dos bens, apesar de sua obrigação de identificar as bagagens por meio de etiquetagem. A autoria e o dolo no agir, desse modo, estão bem configurados. Presente prova da materialidade, da autoria e do dolo no agir, bem como inexistentes causas excludentes da culpabilidade ou da ilicitude, impõe-se manter a condenação do réu pela prática do crime de descaminho (art. 334do Código Penal). Contrabando [...] É de se considerar, portanto, que os documentos juntados nos autos do inquérito policial são suficientes para demonstrar que as mercadorias apreendidas são relativamente proibidas e estavam sem a documentação que demonstrasse sua importação regular. A materialidade, pois, é certa. Ressalte-se, quanto à autoria, igualmente, conforme fundamentação na análise da autoria do crime de descaminho, os documentos produzidos pelos servidores públicos, da Polícia Federal e da Receita Federal do Brasil, o interrogatório do réu no inquérito policial e em juízo, bem como o depoimento da testemunha dão conta de bem demonstrá-la. No que tange ao dolo, o tipo penal de contrabando apresenta elemento subjetivo na forma de dolo genérico, sem finalidade específica, sendo que para aferi-lo "basta a comprovação da prática consciente e deliberada da conduta descrita no preceito primário da norma penal." (TRF4, ACR XXXXX-32.2014.404.7119, Sétima Turma, Relator Márcio Antônio Rocha, juntado aos autos em 25/02/2016). As circunstâncias que envolvem o fato apurado, permitem, sob o mesmo enfoque da análise do dolo do crime de descaminho, verificar a autoria e o dolo na conduta do acusado no transporte de 8.620 maços de cigarros e e aproximadamente 32.228 (trinta e dois mil duzentos e vinte e oito) unidades de medicamentos entre comprimidos e frascos, que estavam desacompanhadas de documentação regular. Presente prova da materialidade, da autoria e do dolo no agir, bem como inexistentes causas excludentes da culpabilidade ou da ilicitude, impõe-se manter a condenação do réus pela prática do delito de contrabando."(fl. 334/346) Extrai-se dos trechos acima que o TRF entendeu pela condenação do recorrente baseando-se na dinâmica dos fatos e nas provas apuradas na instrução, que demonstraram o preenchimento de todos os elemento do tipo. De fato, para se concluir de modo diverso, seria necessário o revolvimento fático-probatório, vedado conforme Súmula n. 7 do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. No mesmo sentido, citam-se precedentes (grifos nossos): AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TESE DE OFENSA AO ART. 155 DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. DESCAMINHO. TESES DE ATIPICIDADE E AUSÊNCIA DE DOLO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Uma vez que a condenação pelo crime de descaminho se deu com base não apenas em provas colhidas na fase inquisitiva, mas também em provas produzidas judicialmente, sob o crivo do contraditório, tal como o interrogatório do réu na fase judicial, não há falar em violação do art. 155 do CPP. 2. A jurisprudência deste STJ firmou-se no sentido de que é possível a utilização das provas colhidas durante a fase inquisitiva para embasar a condenação, desde que corroboradas por outras provas em juízo, nos termos do art. 155 do CPP. Precedentes. 3. Para fins de caracterização do descaminho, exige-se apenas a internação da mercadoria e a supressão de tributos, total ou parcial, pela entrada em solo brasileiro, sendo que a pretendida revisão do julgado, com vistas à absolvição do réu por atipicidade da conduta ou ausência de dolo, demandaria reexame fático-probatório dos autos, providência vedada em recurso especial nos termos da Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental improvido. ( AgRg no AREsp XXXXX/PR, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 01/12/2020, DJe 07/12/2020) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. INTEMPESTIVIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DE CORRÉU. INOCORRÊNCIA DE SUSPENSÃO DO PRAZO RECURSAL. PRINCÍPIO DO COLEGIADO. DESCAMINHO. OCULTAÇÃO DO VERDADEIRO IMPORTADOR. ABSOLVIÇÃO. NECESSIDADE DE EXAME APROFUNDADO DE PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO CONHECIDO. 1. O prazo para interposição de agravo regimental, em matéria penal, é de 5 dias, nos termos do art. 258, caput, do RISTJ. No caso, a decisão que julgou o recurso especial de ANDREI ALEX VARGAS foi publicada em 16/04/2020. O regimental, contudo, foi protocolizado apenas em 27/04/2010, fora, portanto, do quinqüídio legal. 2. Os embargos de declaração opostos objetivando a análise do especial interposto por corréu não suspende o prazo recursal em relação ao agravante, sendo certo, ainda, que inexiste óbice ao julgamento dos recursos em datas diferentes, posto que diversas as petições defensivas. 3. Não há se falar em usurpação de competência dos órgãos colegiados, no âmbito desta Corte, na hipótese de decisões monocráticas prolatadas com fundamento na jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça. Ademais, a possibilidade de interposição de agravo regimental, com a reapreciação do recurso pelo órgão colegiado, torna superada eventual nulidade da decisão monocrática por suposta ofensa ao princípio da colegialidade. 4. As instâncias ordinárias, após ampla análise do material fático-probatório, entenderam que houve a prática do ilícito de descaminho, destacando que os elementos dos autos demonstram que o recorrente, na qualidade de sócio-administrador da trading IMPORLOG, trabalhava em conjunto com o corréu para iludir tributos em operações internacionais. 5. No âmbito do crime de descaminho, a ilusão tributária está comprovada por intermédio dos atos administrativos realizados pelas autoridades responsáveis pela fiscalização, que gozam de presunção de ilegitimidade e veracidade, somente afastadas a partir de provas produzidas em sentido contrário pelo próprio interessado. 6. Entendendo as instâncias ordinárias, soberanas na análise das circunstâncias fáticas da causa, que estão provadas a materialidade e autoria do crime imputado ao recorrente, afastar essa conclusão implica em exame aprofundado do material fático-probatório, vedado em recurso especial, a teor da Súmula n. 7/STJ. 7. Agravo regimental não conhecido. ( AgRg no REsp XXXXX/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 12/05/2020, DJe 19/05/2020) Ante o exposto, conheço do agravo para conhecer do recurso especial e, com fundamento na Súmula n. 568 do STJ, negar-lhe provimento. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 10 de fevereiro de 2022. JOEL ILAN PACIORNIK Relator
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/1377423402

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