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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Segunda Câmara de Direito Público

Julgamento

Relator

Francisco Oliveira Neto

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-SC_AC_20080709030_d43ef.rtf
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Inteiro Teor



Apelação Cível n. 2008.070903-0, de Blumenau

Relator: Des. Subst. Francisco Oliveira Neto

TRIBUTÁRIO. ISS. SERVIÇOS DE CONFECÇÃO E REPARAÇÃO DE CHAPAS, CORTES E VINCO PARA FINS GRÁFICOS. INDUSTRIALIZAÇÃO POR ENCOMENDA. BENEFICIAMENTO. ATIVIDADE FIM DA EMPRESA PRESTADORA QUE CONSISTE NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ISS. NOVA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA DA MATÉRIA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E ACOMPANHADO POR ESTA CORTE. CDA. ALEGADA NULIDADE. INOCORRÊNCIA. VÍCIOS NÃO DEMONSTRADOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

1. Tendo em vista o novo panorama jurisprudencial emanado pela Corte Superior que, acompanhada por recentes julgados deste Tribunal, passou a entender que as atividades de "beneficiamento" correspondem a mera prestação de serviços realizada sob encomenda de terceiros, configurando, portanto, fato gerador do ISS - aplicando-se, dessa forma, tal posicionamento, inclusive, aos fatos geradores ocorridos na vigência da LC 56/87.

2. No procedimento fiscal, a observância das exigências legais quanto às formalidades tem por escopo garantir ao sujeito passivo da obrigação tributária a ampla defesa. Se nenhum prejuízo resultar ao seu exercício, eventual vício formal não conduzirá à nulidade do lançamento (AgRgAI n. 81.681, Min. Rafael Mayer; AgRgAI n. 485.548, Min. Luiz Fux; REsp n. 271.584, Min. José Delgado) (...). Em favor da dívida tributária regularmente inscrita milita presunção de liquidez e certeza ( CTN, art. 204; Lei 6.830/80, art. 3º). Reforça essa presunção o fato de o lançamento fiscal estar fundado nas declarações prestadas pelo contribuinte em Guia de Informação e Apuração do ICMS (GIA)."(TJSC, AC n. 2010.086624-1, rel. Des. Newton Trisotto, j. 7.6.11).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2008.070903-0, da comarca de Blumenau (Vara da Fazenda Pública), em que é apelante Indústria e Comércio Chapas Corte Vinco Blumenau Ltda, e apelado Município de Blumenau:

A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas de lei.

O julgamento, realizado no dia 17 de setembro de 2013, foi presidido pelo Excelentíssimo Desembargador Cid Goulart, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Desembargador João Henrique Blasi.

Florianópolis, 18 de setembro de 2013.

Francisco Oliveira Neto

Relator


RELATÓRIO

Indústria e Comércio de Chapas Cortes Vinco Blumenau Ltda. ajuizou ação anulatória de lançamento tributário com pedido de antecipação dos efeitos da tutela.

Alegou, para tanto, que sua atividade consiste na confecção e reparação de chapas, corte e vinco para fins gráficos, a qual é executada " a título de etapa necessária ao desempenho da atividade-fim, não se caracterizando, pois, um serviço autônomo e, portanto, não sujeita à incidência tributária ". Aduziu ainda que a notificação não está em consonância com os requisitos constantes no art. 202, II, do CTN, pois o cálculo apresentado é omisso quanto à correção monetária, juros de mora e multa legal. Por fim, diante da inexigibilidade do crédito, requereu o reconhecimento da nulidade da notificação fiscal n. 074/2001 (fls. 2/74).

À fl. 75, a análise da antecipação dos efeitos da tutela foi postergada para depois de efetivado o contraditório.

Citado, o Município contestou, sustentando, em suma: a) a impossibilidade de antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública; b) necessidade de depósito prévio do montante integral devido ao Fisco para possibilitar a discussão da exigibilidade do tributo; c) legalidade da notificação. Ao final, requereu a improcedência do pedido formulado na inicial (fls. 81/93).

Houve réplica (fls. 96/99).

O Ministério Público opinou pela oportunização de as partes indicarem quais provas pretendem produzir (fl. 104).

Às fls. 106/108, foi indeferida a antecipação dos efeitos da tutela.

A parte autora requereu a produção de prova pericial (fls. 120/121), que foi deferida às fls. 134/135.

Após apresentados os quesitos pela parte autora (fls. 142/143), foi realizada a perícia (fls. 167/193), sendo que, em seguida, o réu se manifestou acerca das conclusões do expert (fls. 198/201).

Após apresentadas as alegações finais (fls. 209/216 e 220/224), sobreveio a sentença, em que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, por entender que é devido o ISS, pois a autora presta serviços a terceiros, o qual encomenda seus serviços de corte e reparação para depois utilizar o produto na comercialização do bem aprimorado (fls. 226/229).

A autora opôs embargos de declaração (fls. 232/234), os quais foram rejeitados às fls. 236/237.

Irresignada, a empresa apelou, sustentando, em síntese, que: a) os serviços/objetos são destinados à industrialização e à comercialização, de modo que foram expressamente excluídos pelo item 72 da LC 56/87; b) os serviços prestados são de caráter intermediários (atividade-meio), ou seja, necessário à atividade-fim (gráficas); c) o laudo pericial apresentado esclareceu que as atividades realizadas pela autora não se sujeitam à incidência do ISS; d) a nulidade da notificação, diante da ausência dos requisitos previstos no art. 202 do CTN. Por derradeiro, pugnou pela reforma da sentença (fls. 241/262).

Com as contrarrazões (fls. 267/273), os autos ascenderam a esta Corte.

Lavrou parecer pela Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Procurador de Justiça José Galvani Alberton, que entendeu ser prescindível a atuação ministerial no feito (fls. 279/281).

VOTO

1. O apelo, antecipe-se, há de ser desprovido.

2. Determina o art. 156, II, da CF, que o ISS é da competência do município e tem como fato gerador"serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar", cuja incidência está restrita ao rol previsto na LC n. 56/87, tendo em vista que os fatos geradores ocorreram entre janeiro de 1996 a dezembro de 2000.

Por sua vez, o item n. 72 da lista constante da referida Lei prevê como hipótese de incidência o"recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação e congêneres, de objetos não destinados à industrialização ou comercialização".

A Lei Complementar n. 116/2003, entretanto, suprimiu do texto legal a exceção ("de objetos não destinados à industrialização ou comercialização"), passando a dispor no item 14.05 da lista de serviços anexa que são tributados pelo ISS os serviços de"restauração, recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação, e congêneres, de objetos quaisquer".

De início, poder-se-ia dizer que, em virtude de os fatos geradores terem ocorridos na vigência do Decreto n. 56/87, não haveria, na hipótese, a incidência do ISS, por conta de os objetos produzidos pela autora serem destinados à industrialização.

Contudo, tal entendimento não deve ser aplicado ao caso, em razão do novo panorama jurisprudencial da Corte Superior que, acompanhada por recentes julgados deste Tribunal, passou a entender que as atividades de"beneficiamento"correspondem a mera prestação de serviços realizada sob encomenda de terceiros, configurando, portanto, fato gerador do ISS - aplicando-se, dessa forma, tal posicionamento aos fatos geradores ocorridos na vigência da LC 56/87.

Neste sentido:

"APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. INDUSTRIALIZAÇÃO POR ENCOMENDA. ISS. Havendo previsão sem ressalva na lista anexa ao Dec.-Lei 406/68, a prestação de serviço, mesmo que nela incluído fornecimento de material (art. 8º, § 1º), está sujeita ao ISS. Inteligência do art. 155, § 2º, IX, b, da CF. A conclusão não seria diferente para os fatos geradores ocorridos no período de vigência da LC 116/03. A industrialização por encomenda que envolve as atividades previstas no item 72 da lista anexa ao Dec.-Lei 406/68, e o item 14.05 da lista anexa à LC 116/03, submete-se ao ISS. Precedentes. APELO DESPROVIDO"(Apelação Cível Nº 70048527055, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 23/05/2012).

Extrai-se das razões do entendimento do REsp n. 888.852/ES, de relatoria do Ministro Luiz Fux, julgado em 4.11.08:

"Cinge-se a controvérsia à incidência ou não de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN sobre a atividade de 'industrialização por encomenda', vale dizer operação de acabamento para obtenção de nova mercadoria ou para aperfeiçoamento de produtos destinados a posterior etapa de industrialização ou comercialização.

O artigo 153, III, da Constituição Federal de 1988, dispõe que compete aos Municípios instituir impostos sobre prestação de serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, II, definidos em lei complementar.

O aspecto material da hipótese de incidência do ISS não se confunde com a materialidade do IPI e do ICMS. Isto porque: (i) excetuando as prestações de serviços de comunicação e de transporte transmunicipal, o ICMS incide sobre operação mercantil, que se traduz numa 'obrigação de dar' (artigo 155, II, da CF/88), na qual o interesse do credor encarta, preponderantemente, a entrega de um bem,pouco importando a atividade desenvolvida pelo devedor para proceder à tradição; e(ii) na tributação pelo IPI, a obrigação tributária consiste num 'dar um produto industrializado' pelo próprio realizador da operação jurídica. 'Embora este, anteriormente, tenha produzido um bem, consistente em seu esforço pessoal, sua obrigação consiste na entrega desse bem, no oferecimento de algo corpóreo, materializado, e que não decorra de encomenda específica do adquirente' (José Eduardo Soares de Melo, in 'ICMS - Teoria e Prática', 8ª Ed., Ed. Dialética, São Paulo, 2005, pág. 65).

Deveras, o ISS, na sua configuração constitucional, incide sobre uma prestação de serviço, cujo conceito pressuposto pela Carta Magna eclipsa ad substantia obligatio in faciendo , inconfundível com a denominada obrigação de dar. Desta sorte, o núcleo do critério material da regra matriz de incidência do ISS é a prestação de serviço, vale dizer: conduta humana consistente em desenvolver um esforço em favor de terceiro, visando a adimplir uma 'obrigação de fazer' (o fim buscado pelo credor é o aproveitamento do serviço contratado).

É certo, portanto, que o alvo da tributação do ISS 'é o esforço humano prestado a terceiros como fim ou objeto. Não as suas etapas, passos ou tarefas intermediárias, necessárias à obtenção do fim. (...) somente podem ser tomadas, para compreensão do ISS, as atividades entendidas como fim, correspondentes à prestação de um serviço integralmente considerado em cada item. Não se podem decompor um serviço porque previsto, em sua integridade, no respectivo item específico da lista da lei municipal nas várias ações-meio que o integram, para pretender tributá-las separadamente, isoladamente, como se cada uma delas correspondesse a um serviço autônomo, independente. Isso seria uma aberração jurídica, além de construir-se em desconsideração à hipótese de incidência do ISS.' (Aires Barreto, no artigo intitulado "ISS: Serviços de Despachos Aduaneiros/Momento de Ocorrência do Fato Imponível/Local de Prestação/Base de Cálculo/Arbitramento", in Revista de Direito Tributário nº 66, Ed. Malheiros, págs. 114/115 - citação efetuada por Leandro Paulsen, in Direito Tributário - Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 8ª ed., Ed. Livraria do Advogado e Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul - ESMAFE, pág. 457).

Assim, 'sempre que o intérprete conhecer o fim do contrato, ou seja, descobrir aquilo que denominamos de 'prestação-fim', saberá ele que todos os demais atos relacionados a tal comportamento são apenas 'prestações-meio' da sua realização' (Marcelo Caron Baptista, in 'ISS: Do Texto à Norma - Doutrina e Jurisprudência da EC 18/65 à LC 116/03', Ed. Quartier Latin, São Paulo, 2005, pág. 284).

'In casu', a empresa desenvolve atividades de desdobramento e beneficiamento (corte, recorte e/ou polimento), sob encomenda, de bloco e/ou chapa de granito e mármore (de propriedade de terceiro), sendo certo que, após o referido processo de industrialização, o produto retorna ao estabelecimento encomendante, que poderá exportá-lo, comercializá-lo no mercado interno ou submetê-lo à nova etapa de industrialização.

O Decreto-Lei 406, de 31 de dezembro de 1968, que estabelece normas gerais de direito financeiro, aplicáveis aos impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre serviços de qualquer natureza, assim dispunha em seu artigo :

'Art 8º O impôsto, de competência dos Municípios, sôbre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação , por emprêsa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa.

§ 1º Os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao impôsto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadoria.

§ 2º Os serviços não especificados na lista e cuja prestação envolva o fornecimento de mercadorias ficam sujeitos ao impôsto de circulação de mercadorias.

§ 2º O fornecimento de mercadoria com prestação de serviços não especificados na lista fica sujeito ao impôsto sôbre circulação de mercadorias. (Redação dada pelo decreto Lei nº 834, de 8.9.1969)' (Revogado pela Lei Complementar nº 116, de 31.7.2003)

Na Lista de Serviços, anexa ao Decreto-Lei 406/68, com a redação dada pela Lei Complementar 56, de 15 de dezembro de 1987, encontrava-se elencada a seguinte atividade:

72. Recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação e congêneres, de objetos não destinados à industrialização ou comercialização ;'

A Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, que dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, revogou o artigo 8º e a Lista de Serviços anexa ao aludido decreto-lei, assim preceituando em seu artigo :

Art. 1o O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador .

§ 1o O imposto incide também sobre o serviço proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País.

§ 2o Ressalvadas as exceções expressas na lista anexa, os serviços nela mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.

§ 3o O imposto de que trata esta Lei Complementar incide ainda sobre os serviços prestados mediante a utilização de bens e serviços públicos explorados economicamente mediante autorização, permissão ou concessão, com o pagamento de tarifa, preço ou pedágio pelo usuário final do serviço.

§ 4o A incidência do imposto não depende da denominação dada ao serviço prestado.'

O Item 14, Subitem 14.05, da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar 116/2003, ostenta o seguinte teor:

14 - Serviços relativos a bens de terceiros.

(...)

14.05 - Restauração, recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento , plastificação e congêneres, de objetos quaisquer .'

O Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 20/2007, malgrado disponha sobre as bases de cálculo do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, preceitua que: '(...) considera-se prestação de serviço as operações de industrialização por encomenda quando na composição do custo total dos insumos do produto industrializado por encomenda houver a preponderância dos custos dos insumos fornecidos pelo encomendante' (artigo 1º).

A 'industrialização por encomenda' constitui atividade-fim do prestador do aludido serviço, tendo em vista que, uma vez concluída, extingue o dever jurídico obrigacional que integra a relação jurídica instaurada entre o 'prestador' (responsável pelo serviço encomendado) e o 'tomador' (encomendante): a empresa que procede ao corte, recorte e polimento de granito ou mármore, de propriedade de terceiro, encerra sua atividade com a devolução, ao encomendante, do produto beneficiado.

Ademais, nas operações de remessa de bens ou mercadorias para 'industrialização por encomenda', a suspensão do recolhimento do ICMS, registrada nas notas fiscais das tomadoras do serviço, decorre do posterior retorno dos bens ou mercadorias ao estabelecimento das encomendantes, que procederão à exportação, à comercialização no mercado interno ou à nova etapa de industrialização.

Destarte, a 'industrialização por encomenda', elencada na Lista de Serviços da Lei Complementar 116/2003, caracteriza prestação de serviço (obrigação de fazer), fato jurídico tributável pelo ISSQN, não se enquadrando nas hipóteses de incidência do ICMS (circulação de mercadoria - obrigação de dar - e prestações de serviço de comunicação e de transporte transmunicipal)"

Dita decisão paradigma restou assim ementada:

"TRIBUTÁRIO. ISSQN. 'INDUSTRIALIZAÇÃO POR ENCOMENDA'. LEI COMPLEMENTAR 116/2003. LISTA DE SERVIÇOS ANEXA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO (OBRIGAÇÃO DE FAZER). ATIVIDADE FIM DA EMPRESA PRESTADORA. INCIDÊNCIA.

1. O artigo 153, III, da Constituição Federal de 1988, dispõe que compete aos Municípios instituir impostos sobre prestação de serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, II, definidos em lei complementar.

2. O aspecto material da hipótese de incidência do ISS não se confunde com a materialidade do IPI e do ICMS. Isto porque: (i) excetuando as prestações de serviços de comunicação e de transporte interestadual e intermunicipal, o ICMS incide sobre operação mercantil (circulação de mercadoria), que se traduz numa 'obrigação de dar' (artigo 155, II, da CF/88), na qual o interesse do credor encarta, preponderantemente, a entrega de um bem, pouco importando a atividade desenvolvida pelo devedor para proceder à tradição; e (ii) na tributação pelo IPI, a obrigação tributária consiste num 'dar um produto industrializado' pelo próprio realizador da operação jurídica. 'Embora este, anteriormente, tenha produzido um bem, consistente em seu esforço pessoal, sua obrigação consiste na entrega desse bem, no oferecimento de algo corpóreo, materializado, e que não decorra de encomenda específica do adquirente' (José Eduardo Soares de Melo, in "ICMS - Teoria e Prática", 8ª Ed., Ed. Dialética, São Paulo, 2005, pág. 65).

3. Deveras, o ISS, na sua configuração constitucional, incide sobre uma prestação de serviço, cujo conceito pressuposto pela Carta Magna eclipsa ad substantia obligatio in faciendo, inconfundível com a denominada obrigação de dar.

4. Desta sorte, o núcleo do critério material da regra matriz de incidência do ISS é a prestação de serviço, vale dizer: conduta humana consistente em desenvolver um esforço em favor de terceiro, visando a adimplir uma 'obrigação de fazer' (o fim buscado pelo credor é o aproveitamento do serviço contratado).

5. É certo, portanto, que o alvo da tributação do ISS 'é o esforço humano prestado a terceiros como fim ou objeto. Não as suas etapas, passos ou tarefas intermediárias, necessárias à obtenção do fim. (...) somente podem ser tomadas, para compreensão do ISS, as atividades entendidas como fim, correspondentes à prestação de um serviço integralmente considerado em cada item. Não se pode decompor um serviço porque previsto, em sua integridade, no respectivo item específico da lista da lei municipal nas várias ações-meio que o integram, para pretender tributá-las separadamente, isoladamente, como se cada uma delas correspondesse a um serviço autônomo, independente.

Isso seria uma aberração jurídica, além de construir-se em desconsideração à hipótese de incidência do ISS.' (Aires Barreto, no artigo intitulado 'ISS: Serviços de Despachos Aduaneiros/Momento de Ocorrência do Fato Imponível/Local de Prestação/Base de Cálculo/Arbitramento', in Revista de Direito Tributário nº 66, Ed. Malheiros, págs. 114/115 - citação efetuada por Leandro Paulsen, in Direito Tributário - Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 8ª ed., Ed. Livraria do Advogado e Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul - ESMAFE, pág. 457).

6. Assim, 'sempre que o intérprete conhecer o fim do contrato, ou seja, descobrir aquilo que denominamos de 'prestação-fim', saberá ele que todos os demais atos relacionados a tal comportamento são apenas 'prestações-meio' da sua realização' (Marcelo Caron Baptista, in 'ISS: Do Texto à Norma - Doutrina e Jurisprudência da EC 18/65 à LC 116/03', Ed. Quartier Latin, São Paulo, 2005, pág. 284).

7. 'In casu', a empresa desenvolve atividades de desdobramento e beneficiamento (corte, recorte e/ou polimento), sob encomenda, de bloco e/ou chapa de granito e mármore (de propriedade de terceiro), sendo certo que, após o referido processo de industrialização, o produto retorna ao estabelecimento do proprietário (encomendante), que poderá exportá-lo, comercializá-lo no mercado interno ou submetê-lo à nova etapa de industrialização.

8. O Item 14, Subitem 14.05, da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar 116/2003, ostenta o seguinte teor: '14 - Serviços relativos a bens de terceiros. (...) 14.05 - Restauração, recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação e congêneres, de objetos quaisquer.'

9. A 'industrialização por encomenda' constitui atividade-fim do prestador do aludido serviço, tendo em vista que, uma vez concluída, extingue o dever jurídico obrigacional que integra a relação jurídica instaurada entre o 'prestador' (responsável pelo serviço encomendado) e o 'tomador' (encomendante): a empresa que procede ao corte, recorte e polimento de granito ou mármore, de propriedade de terceiro, encerra sua atividade com a devolução, ao encomendante, do produto beneficiado.

10. Ademais, nas operações de remessa de bens ou mercadorias para 'industrialização por encomenda', a suspensão do recolhimento do ICMS, registrada nas notas fiscais das tomadoras do serviço, decorre do posterior retorno dos bens ou mercadorias ao estabelecimento das encomendantes, que procederão à exportação, à comercialização no mercado interno ou à nova etapa de industrialização.

11. Destarte, a 'industrialização por encomenda', elencada na Lista de Serviços da Lei Complementar 116/2003, caracteriza prestação de serviço (obrigação de fazer), fato jurídico tributável pelo ISSQN, não se enquadrando, portanto, nas hipóteses de incidência do ICMS (circulação de mercadoria - obrigação de dar - e prestações de serviço de comunicação e de transporte transmunicipal). [...]

14. Recurso especial provido"(STJ, REsp n. 888.852/ES, Rel. Min. Luiz Fux, j. em 04.11.2008).

E, ainda:

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ISS. SERVIÇOS DE DESDOBRAMENTO E BENEFICIAMENTO - CORTE, RECORTE E/OU POLIMENTO -,SOB ENCOMENDA (ATIVIDADE-FIM DO PRESTADOR), DE BLOCO E/OU CHAPA DE GRANITO E MÁRMORE (DE PROPRIEDADE DE TERCEIRO).

1. A Primeira Turma/STJ, ao apreciar o REsp XXXXX/ES (Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 1º.12.2008), firmou orientação no sentido de que 'a 'industrialização por encomenda', elencada na Lista de Serviços da Lei Complementar 116/2003, caracteriza prestação de serviço (obrigação de fazer), fato jurídico tributável pelo ISSQN, não se enquadrando, portanto, nas hipóteses de incidência do ICMS (circulação de mercadoria - obrigação de dar - e prestações de serviço de comunicação e de transporte transmunicipal)'.

2. Recurso especial provido"( REsp XXXXX/ES, rel. Min. Denise Arruda, j. 3.11.2009).

Dessa forma, resta saber se as operações confecção e reparação de chapas para fins gráficos desenvolvidas pela empresa apelante se enquadram no conceito de" beneficiamento "e se, consequentemente, haverá a incidência do ISS.

Na caso em análise, a empresa tem como objeto social (fls. 68/73) a " confecção, comércio e reparação de chapas, corte e vinco para fins gráficos ", restando constatado no laudo pericial que " os trabalhos executados em sua grande maioria eram destinados a empresas gráficas, como componente integrante para fins de compor o produto final a comercialização " (fl. 183).

Denota-se que a empresa/cliente ao contratar serviços da apelante a fim de comprar peças que integrarão o produto final (chapas, por exemplo), o faz por meio de encomenda, sendo inviável afastar a incidência do ISS, mormente a considerar que a atividade primordial e preponderante da autora é a prestação de serviço e não a circulação de mercadoria ou simples industrialização.

Neste sentido, colhe-se da jurisprudência:

" APELAÇÃO CÍVEL - TRIBUTÁRIO - IPI E ISS - OPERAÇÃO DE GALVANOPLASTIA - "INDUSTRIALIZAÇÃO POR ENCOMENDA" - BENEFICIAMENTO - PRESTAÇÃO DE SERVIÇO (OBRIGAÇÃO DE FAZER) - ATIVIDADE FIM DA EMPRESA PRESTADORA - HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ISS - NOVA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA DA MATÉRIA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - RECURSO E REMESSA PROVIDOS (TJSC, Apelação Cível n. 2008.047919-9, de São Bento do Sul, rel. Des. Rodrigo Collaço, j. 10-11-2011).

Até porque, conquanto na hipótese em análise se tenha produzido prova pericial, não restou afastado que o processo de industrialização não se dava por encomenda, tampouco comprovou a alegação de transformação da matéria-prima nas operações de industrialização por encomenda, de modo a evidenciar a não incidência do ISS, ônus que competia a autora, nos termos do art. 333, I, do CPC, que não o fez.

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO TRIBUTÁRIO. ISS. ATUAÇÃO DA AUTORA VINCULADA AO BENEFICIAMENTO DE TECIDOS (ENGOMAR, PREPARAR E TINGIR). IMPOSTO QUE DEVE INCIDIR QUANDO O SERVIÇO FOR PRESTADO SOB ENCOMENDA, POR CARACTERIZAR A ATIVIDADE-FIM DA EMPRESA. AUSÊNCIA DE PROVA APTA A REPELIR ESSA CONDIÇÃO. ÔNUS QUE COMPETIA À AUTORA, NA ESTEIRA DO QUE PREVÊ O ART. 333, INCISO I, DO CPC. POSICIONAMENTO ADOTADO COM BASE NOS JULGADOS RECENTES DO STJ. PRECEDENTE DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO. RECURSO PROVIDO.

"Conforme o inc. I do art. 333 do CPC, é do autor o ônus de provar fato constitutivo do seu direito. Não tendo a demandante feito a comprovação da alegação de transformação da matéria-prima em apreço, nas operações de industrialização por encomenda, verifica-se óbice ao julgamento de procedência da lide. Previsão, no item 14.05 da Lista de Serviços, anexa à Lei Complementar n. 116/03, da incidência do ISS sobre as operações de beneficiamento, sem que haja qualquer diferenciação quanto à destinação dada ao bem. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível N. XXXXX, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rejane Maria Dias de Castro Bins, Julgado em 27/05/2010)"(TJSC, Apelação Cível n. 2010.019803-8, de Brusque, rel. Des. José Volpato de Souza, j. 19-01-2012).

Por fim, registra-se que, conforme se infere das notas fiscais das empresas tomadoras do serviço, houve a suspensão do recolhimento do ICMS e do IPI (fl. 35/36), relativo ao posterior retorno das mercadorias ao estabelecimento das encomendantes, que, após a devolução, providenciarão à comercialização ou à nova etapa de industrialização. Logo, a incidência dos ISS sobre a aludida operação não implicará bitributação.

2. Ultrapassada a alegação de inexistência da fato gerador, passa-se a analisar o argumento de nulidade do título.

2.1 No que tange à alegação de que em momento algum foi informado qual o índice de correção monetária a ser aplicado para cobrança de ISS, não assiste razão à apelante. Isso porque, conforme se infere da notificação preliminar juntada à fl. 37, "foram aplicados nesta notificação: juros de mora de 1%, atualização monetária, e multa moratória de 10%, de acordo com o art. 27 da Lei n. 1.989/73, com a redação do art. 6º da LC 146/96 e art. da LC 159/97".

Impede destacar que conquanto tenha havida um equívoco ao elaborar a notificação fiscal, constando LC n. 146/97 ao invés de LC n. 143/97, a própria LC n. 159/97, que também fundamentou a notificação, fez menção à LC n. 143/97, não causando qualquer prejuízo à defesa da contribuinte, contando com a seguinte redação:

Estabelece o art. da LC n. 159/97 que:

"Art. 8º - A alínea a do parágrafo § 2º do artigo 27 da Lei nº 1.989, de 21 de dezembro de 1973, com alterações promovidas pelo artigo , da LEI COMPLEMENTAR Nº 143, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 27 -......

§ 2º -.........

a) multa de até 10% (dez por cento), considerando 0,33% (zero vírgula trinta e três por cento)"pro rata"dia, enquanto o crédito tributário não foi inscrito em dívida ativa, e, de 20% (vinte por cento) após este ato, destinada a cobrir despesas de execução.

b) ........

§ 3º - ........

§ 4º - Quando o devedor oferecer denúncia espontânea para quitação da dívida, a multa de 20% (vinte por cento), referida na letra a do parágrafo 2º deste artigo, será dispensada de pagamento".

Por outro lado, dispõe o art. da LC n. 143/96 que:

"Art. 6º - As alíneas A e B do Parágrafo 2º do artigo 27, da Lei nº 1989, de 21 de dezembro de 1973, com as alterações promovidas pela Lei nº 3.680, de 22 de dezembro de 1989, Lei Complementar nº 47, de 17 de fevereiro de 1993 e Lei Complementar nº 61, de 06 de dezembro de 1993, passam a vigorar com os seguintes termos:

"§ 2º - Expirado o prazo para pagamento dos tributos municipais nos prazos regulamentares, os contribuintes incorrem nos seguintes acréscimos, calculados sobre o valor do débito atualizado monetariamente:

a) - multa de até 10% (dez por cento), considerando 0,33% (zero trinta e três por cento) "pró rata" dia;

b) - juros de mora de 1% (um por cento) ao mês ou fração somente sobre o débito corrigido."

Logo, igualmente não merece prosperar a alegação de que os juros de mora devem ser desconstituídos por ausência de permissivo legal.

2.2 Quanto à aplicação da multa moratória em conjunto com os juros de mora, também não merece guarida à alegação da autora.

Ora, "'A multa reveste-se do caráter de penalidade pelo não recolhimento do tributo na época própria e os juros da mora visam a compensar o Estado pela não disponibilidade do dinheiro representado pelo crédito tributário' (TJSP, AC n. 224.017, Des. Fraga Teixeira). Tendo naturezas distintas, é lícita a cumulação da multa fiscal e dos juros de mora, 'sem prejuízo da incidência de correção monetária sobre a totalidade do débito apurado' (AC n. 1997.010473-1, Des. Eder Graf; Resp n. 220.856/SC, Min. Garcia Vieira)' (AC n. 2001.009571-8, Des. Newton Trisotto; AgRgREsp n. 438.166, Min. Teori Albino Zavascki; Resp n. 624.880, Min. João Otávio de Noronha). 'É legítima a cobrança de juros de mora simultaneamente à multa fiscal moratória, pois esta deflui da desobediência ao prazo fixado em lei, revestindo-se de nítido caráter punitivo, enquanto que aqueles visam à compensação do credor pelo atraso no recolhimento do tributo (Súmula 209 do extinto TFR) (AgRgREsp n. 438.166, Min. Teori Albino Zavascki)" (TJSC, AC n. 2010.005878-9, rel. Des. Newton Trisotto, j. 30.11.10).

In casu, verifica-se que a apelante foi autuada devido à ausência de pagamento do tributo, o que lhe culminou, de forma correta, a condenação ao pagamento de multa de natureza punitiva, fixada no percentual de 10%, como também, por conta da impontualidade do pagamento da exação do débito, foi imputada a aplicação dos juros de mora.

Portanto, a considerar que as penalidades possuem natureza distintas, assim como a sua soma não ofende os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não se verifica qualquer irregularidade na sua cumulação.

Outrossim não trouxe a autora qualquer provas nos autos de que os juros de mora, bem como a multa moratória, foram calculados sobre o valor corrigido do tributo e não sobre o valor principal, ônus que lhe incumbia nos termos do art. 333, I, do CPC.

2.3 No que concerne a impossibilidade de cobrança de multa moratória no percentual de 10% após o prazo de 5 anos, nos termos do art. 42 do CTM ("Cessa em 5 (cinco) anos, o poder de aplicar ou cobrar as multas, por infração, a este Código, exceto nos casos de quantia inferior a 0,1 (um décimo) do salário mínimo regional, quando será de 2 (dois anos)"), não merece guarida o pedido do autor, uma vez que a norma supracitada prevê a preclusão do direito de aplicar ou cobrar a multa por infração, ou seja, aquela de natureza sancionatória, não cabendo estender à hipótese de multa moratória, como pretende o demandante, sob pena de violar o art. 111 do CTN.

3. Por conseguinte, voto pelo desprovimento do recurso.


Gabinete Des. Subst. Francisco Oliveira Neto

MOD (UMM27892S)


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