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28 de Maio de 2024
  • 1º Grau
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TJSP • Ação Penal - Procedimento Ordinário • Crimes do Sistema Nacional de Armas • XXXXX-44.2014.8.26.0564 • 5ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de São Paulo
há 9 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

5ª Vara Criminal

Assuntos

Crimes do Sistema Nacional de Armas

Juiz

Daniela de Carvalho Duarte

Partes

Documentos anexos

Inteiro Teor27646554%20-%20Condena%C3%A7%C3%A3o%20%C3%A0%20Pena%20Privativa%20de%20Liberdade%20SEM%20Decreta%C3%A7%C3%A3o%20da%20pris%C3%A3o%20-%20Senten%C3%A7a%20Completa.pdf
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SENTENÇA

Processo Físico nº: XXXXX-44.2014.8.26.0564

Classe - Assunto Ação Penal - Procedimento Ordinário - Crimes do Sistema Nacional de

Armas

Autor: Justiça Pública

Réu: Jose Cardozo de Oliveira

Juiz (a) de Direito: Dr (a). Daniela de Carvalho Duarte

VISTOS.

JOSÉ CARDOZO DE OLIVEIRA , qualificado nos autos, foi denunciado e processado como incurso nas penas dos artigos 16, parágrafo único, inciso IV, e 14, caput , ambos da Lei nº 10.826/03, porque no dia 18 de maio de 2014, por volta das 03h40min, na Estrada Papagaio, nº 100, Bairro Capivari, nesta cidade e Comarca de São Bernardo do Campo, portava arma de fogo, isto é, um revólver da marca "Ina", calibre 32, com numeração obliterada, de uso permitido, municiada com 04 (quatro) cartuchos íntegros, e uma espingarda, calibre 28, desmuniciada, numeração S579083, bem como 04 (quatro) cartuchos íntegros e 01 (um) deflagrado, calibre 28, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar ( conforme aditamento a fls.65/66, complementado no termo e audiência ).

Segundo o apurado, na data dos fatos, guardas municipais, em patrulhamento pela Represa Billings com vistas a proibir a pesca predatória, ouviram sons semelhantes a disparo de arma de fogo. Como estavam próximo à estrada, decidiram parar a embarcação às margens da represa, momento em que avistaram o acusado trocando o pneu de um veículo.

Realizada a abordagem, foi encontrado, sob as vestes do acusado, um revólver, calibre 32, com numeração obliterada, municiado com 04 cartuchos íntegros.

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Dentro do bolso de sua jaqueta, apreenderam 04 (quatro) cartuchos íntegros e 01 (um) deflagrado, todos calibre 28. Em buscas no interior do veículo, foi localizada uma espingarda, calibre 28, desmuniciada, nº S579083.

Indagado, o acusado assumiu a propriedade das armas de fogo, sem, contudo, apresentar a devida documentação para o porte.

Acompanhada por inquérito policial (fls.02/35), a denúncia foi recebida (fl.38/39). ADITAMENTO A FLS.65/66 , complementado no termo de audiência, foi recebido nesta data. Réu citado a fls.51/52. Do aditamento foi citado nesta data. Após resposta à acusação (fls.57 e termo de audiência), foram afastadas as hipóteses de absolvição sumária (fls.58/59 e termo de audiência). Em instrução, foi ouvida uma testemunha de acusação e interrogado o acusado, após a desistência da oitiva do guarda municipal ausente.

Em debates, a acusação requer a condenação do acusado nos termos da denúncia; ao passo que a defesa pugna pela absolvição e por insuficiência probatória ou, ainda, por inexigibilidade de conduta diversa. O réu não conhecia a lei e agiu para a sua defesa.

É o relatório do essencial.

Fundamento e DECIDO:

A pretensão acusatória comporta integral acolhida, uma vez que a prova dos autos demonstra com clareza a confluência de todas as elementares do delito de porte ilegal de arma, não restando dúvida quanto à autoria.

A materialidade do crime vem consubstanciada nos autos de exibição e apreensão a fl.11 e no laudo pericial a fls.41/44, no qual os peritos assim descreveram o instrumento:

"Trata-se de um revólver, usado, cromado, da marca Ina, de nº obliterado (...).

É de calibre nominal .32.

Examinados os sistemas de percussão, extração e repetição do revólver em questão, verificou-se que o mesmo acha-se apto para a realização de disparos.

Trata-se de uma espingarda...da marca Rossi, nº S579083...

É de calibre nominal .28GA.

Examinados os sistemas de funcionamento da espingarda em que4stão, verificou-se que a mesma acha-se apto para a realização de disparos".

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Quanto à autoria, após a opção pelo silêncio na fase policial (fl.06), em Juízo o acusado confessou a prática do delito nos termos da denúncia. Para justificar a sua conduta, declarou que tinha sido sequestrado e roubado meses atrás e estava temeroso, razão pela qual comprou as armas para a sua defesa. Tinha conhecimento da ilicitude de sua conduta.

Trata-se de réu confesso na presença de Magistrada e sob o pálio de todas as garantias constitucionais.

Nesse sentido:

"Tem se entendido que"a confissão judicial, por presumir-se livre dos vícios de inteligência e vontade, tem valor absoluto e serve como base à condenação, ainda que se constitua no único elemento incriminador, pois só perderá sua força se desmentida por veemente prova em contrário, como na hipótese de autoacusação falsa"(RT 625/338).

Sem margem para divagações doutrinárias ou hermenêuticas, constitui a confissão elemento seguríssimo de prova. Apenas incomum circunstância, aqui não encontrada, que lhe evidencie a insinceridade, justifica sua recusa.

Representa, pois, dado relevantíssimo na formação da convicção, máxime se valorizado seu poder de convencimento pelo restante da prova colhida tal como se verifica no presente caso, nada existindo no sentido de infirmá-la ou de fragilizá-la.

Sob o crivo do contraditório, o guarda municipal Luiz Henrique Vieira, em relato coeso e harmônico com o anterior, informou os passos da diligência encetada na data dos fatos e espancou qualquer dúvida acerca da autoria:

Realizava patrulhamento pela Represa Billings, buscando proibir a pesca predatória, quando ouviu estampidos. Parou a embarcação às margens da represa, momento em que avistou o acusado trocando o pneu de um veículo. Realizada a abordagem, localizou, sob as vestes do acusado, um revólver, calibre 32, com numeração obliterada, municiado. Dentro do bolso de sua jaqueta, apreendeu cartuchos íntegros. Em buscas no interior do veículo, foi localizada uma espingarda, calibre 28, desmuniciada, nº S579083. Inquirido, o réu admitiu a propriedade das armas e declarou que as portava para defesa, pois tinha sido assaltado em data anterior.

O guarda municipal não está legalmente impedido de depor e o valor de seu depoimento não pode ser sumariamente desprezado (STF- HC XXXXX/SP Rel. Min. CELSO DE MELLO DJU 18.10.1996- p. 39.846).

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E seus informes devem ser cridos até prova em contrário, pois não teria sentido o Estado credenciar agentes para exercer serviço público de garantia da segurança da sociedade para, ao depois, negar-lhes crédito quando fossem dar conta de suas tarefas no exercício de funções precípuas.

Salvo prova induvidosa de suspeição ou parcialidade do agente, inexistente nos autos, não se pode recusar eficácia probante a seus testigos que, como outro qualquer, constituem importante elemento de convicção, servindo seus dizeres, à mingua e circunstâncias aptas a lhes comprometer a credibilidade, para a formação do convencimento judicial.

A teor do artigo 156 do Código de Processo Penal, a apreensão das armas de fogo em poder do réu, enseja inversão do ônus da prova, cumprindo à defesa demonstrar convincente versão escusatória de tal circunstância, o que à evidência não ocorreu.

O quadro probatório, portanto, contém elementos de convicção, de modo que a única solução possível para o caso vertente é a condenatória.

Para a configuração do delito previsto no artigo 16, parágrafo único, inciso IV, do Estatuto do Desarmamento, não se exige a demonstração da finalidade do porte da arma, bastando a vontade livre e consciente de possuí-la, guardá-la ou portá-la sem a devida autorização legal.

Nesse passo, não se olvida que a espingarda não estava desmuniciada. Todavia, o fato é típico. Nota-se que o crime em questão é de perigo presumido pelo legislador, abstrato, ínsito ao porte de arma, pois evidente que, em algum momento, cedo ou tarde, era factível de uso e emprego em uma detonação. O próprio laudo pericial afirma que a arma está apta a realização de disparos.

Tal tese, inclusive, já se encontrava refutada mesmo antes da vigência do Estatuto do Desarmamento:

"Arma de fogo Porte ilegal Caracterização Artefato encontrado na residência do réu que o mantinha sob a sua guarda sem autorização legal Constatação, através de perícia, de que o armamento encontrava-se apto a realizar disparos, podendo ser imediata e facilmente municiado Aplicação do artigo 10 da Lei nº 9.437/97 Se após a realização de perícia ficou constatado que a arma encontrada na residência do réu, que a mantinha sob a sua guarda, sem autorização legal para tanto, encontrava-se apta a realizar disparos, podendo ser imediata e facilmente municiada, resta configurado o delito do art. 10 da Lei nº 9.437/97" (TJ/SP Rel. DEBATIN CARDOSO RT 772/568).

O Superior Tribunal de Justiça perfilha tal entendimento:

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"Delito de porte ilegal de arma de fogo - Arma desmuniciada - Irrelevância - Recurso conhecido e provido. A objetividade jurídica dos crimes tipificados na Lei de Porte de Armas não se restringe à incolumidade pessoal, alcançando, também, a liberdade pessoal, protegidas mediatamente pela tutela primária dos níveis da segurança coletiva, o que determina a irrelevância da eficácia da arma para a configuração do tipo penal. Recurso especial conhecido e provido para restabelecer a sentença condenatória" ( REsp nº 1.103.293 - Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima - J. 23/04/09).

"Habeas corpus - Direito penal - Porte ilegal de arma de fogo - Atipicidade - Arma desmuniciada - Irrelevância - Apreensão de munição. O desmuniciamento da arma não conduz à atipicidade da conduta, bastando, como basta, para a caracterização do delito, o porte de arma de fogo sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. A objetividade jurídica, "in casu", é a segurança, que se desdobra em níveis e comporta lesão. E que, nos tipos mistos alternativos, excluídos os casos de atipicidade absoluta, as ações que o integram não devem ser interpretadas isoladamente, não havendo como exigir-se o municiamento da arma de fogo, se o ilícito se caracteriza só com o porte de munição, também apreendida na espécie. Ordem denegada"( HC XXXXX/RJ, Rei. Min. Hamilton Carvalhido).

E não há que se falar em excludente de culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa ou excludente da ilicitude.

Embora crível a tese do roubo anterior, fato é que a agressão futura, por mais verossímil, não passa de uma hipótese, com a qual não pode cooperar o instituto da legítima defesa, que se constitui na reação à agressão séria, atual ou iminente.

Quanto ao estado de necessidade, não se olvida que ao réu é resguardado pelo ordenamento jurídico o direito de portar arma de fogo para se defender, embora moralmente discutível tal opção. Todavia, não ficou demonstrado nos autos perigo atual ou iminente, além de inevitável, a ponto de não terem sido atendidas as exigências legais de registro e obtenção de porte de arma de fogo pelo acusado.

Destarte, o réu realizou conduta típica, antijurídica e, ante a sua culpabilidade, impõe-se-lhe a condenação e a pena, que passo a dosar, nos termos do artigo 68 do Código Penal, eis que não milita qualquer justificativa ou dirimente em seu benefício.

Analisados os fatores de individualização da pena, noto que as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal não são totalmente desfavoráveis ao réu, primário e sem antecedentes criminais, razão pela qual fixo a pena base no mínimo legal de 03 anos de reclusão e pagamento de 10 dias-multa. Embora mais de uma arma tenha sido apreendida em seu poder, fato é que a totalidade das circunstâncias judiciais lhe são favoráveis.

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Não incidem agravantes a considerar. Embora presente a atenuante da confissão espontânea ( CP, art. 65, III, d), deixo de reduzir a reprimenda porque as atenuantes não permitem, a sua fixação abaixo do mínimo legal previsto em lei para o crime (Súmula 231 do STJ).

Na terceira etapa da dosimetria da pena, inexistem causas de aumento e diminuição.

O valor do dia-multa, em face da ausência de elementos nos autos quanto à situação econômica do réu, será calculado no valor unitário mínimo e atualizado nos termos do parágrafo 2 º do artigo 49 do Código Penal, desde a data da infração.

Presentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade imposta por uma pena restritiva de direito, consistente na prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo de 03 anos, mediante indicação do Juízo da Execução e conforme as aptidões do acusado, nos termos do artigo 46 do mesmo diploma legal; e pelo pagamento de 10 dias-multa, no valor unitário mínimo legal. As substituições são socialmente recomendáveis e suficientes para o caso em análise.

Havendo conversão, fixo o regime aberto para o cumprimento da pena, com as condições do artigo 115 da Lei das Execuções Penais.

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido do Estado e o faço para declarar o réu JOSÉ CARDOZO DE OLIVEIRA, filho de José Ferreira de Oliveira e Cecilia Cardos dos Santos, RG nº 14.411.834/SP, qualificado a fls.13 e 118/19, como incurso nos artigos 16, parágrafo único, inciso IV, e art. 14, caput, ambos da Lei nº 10.826/03, razão pela qual o CONDENO ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 03 anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo, e por uma pena restritiva de direito, consistente na prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, mediante indicação do Juízo da Execução e por igual prazo da condenação, conforme as aptidões do acusado, nos termos do artigo 46 do mesmo diploma legal; sem prejuízo do pagamento de 10 dias-multa, no valor mínimo legal, conforme retro detalhado.

Diante da pena e regime fixados, não estão presentes os requisitos da prisão preventiva, razão pela qual concedo ao réu o direito de apelar em liberdade.

Após o trânsito em julgado desta sentença, lance-se o nome do réu no rol dos culpados e expeça-se guia de recolhimento definitiva.

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Comunique-se ao Cartório Distribuidor, ao IIRGD (NSCGJ, arts. 393, V e § 1º e 398) e ao TRE (NSCGJ, art. 3,098, após o trânsito em julgado).

Oficie-se ao Juiz Corregedor do Setor de Arma e Objetos apreendidos, informando que as armas estão disponíveis para destruição.

Custas pelo réu, no valor equivalente a 100 (cem) UFESP ́s, nos termos do artigo , § 9º, a, da Lei nº 11.608/03, sendo que a exigibilidade está suspensa nos termos do artigo 12 da Lei nº 1060/50.

P.R.I.C

São Bernardo do Campo, 28 de janeiro de 2015.

DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006,

CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA

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