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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça de São Paulo
há 13 dias

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

33ª Câmara de Direito Privado

Publicação

Julgamento

Relator

Mário Daccache

Documentos anexos

Inteiro Teor433920ac47916e65d7ff5c183c89f9d7.pdf
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Inteiro Teor

Registro: 2024.0000405645

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº XXXXX-87.2024.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante ESPÓLIO DE MURILO REGIS RAYOL DOS SANTOS (ESPÓLIO), é agravado DENESZCZUK ANTONIO SOCIEDADE DE ADVOGADOS.

ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 33a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores LUIZ EURICO (Presidente) E SÁ DUARTE.

São Paulo, 10 de maio de 2024.

MÁRIO DACCACHE

Relator (a)

Assinatura Eletrônica

Agravo de Instrumento nº XXXXX-87.2024.8.26.0000

Processo originário nº XXXXX-73.1994.8.26.0100

Agravante: Espólio de Murilo Regis Rayol dos Santos

Agravado: Deneszczuk Antonio Sociedade de Advogados

Comarca: São Paulo

Juiz (a): Valdir da Silva Queiroz Junior

Voto nº 8588

Cumprimento de sentença Honorários advocatícios

Agravo de instrumento interposto contra duas decisões Primeira decisão que determinou a expedição de auto de adjudicação Alegação de que a adjudicação se deu com base em avaliação tornada sem efeito Improcedência Avaliação não foi tornada sem efeito Segunda decisão agravada que reconhece a fraude à execução do imóvel denominado "Fazenda Rayol" (matrícula nº 1.520) Imóvel doado pelos proprietários (o executado e uma empresa denominada "Agropecuária Rayol Ltda.") a Rogério Abrahim Rayol dos Santos Fraude à execução Caracterização Súmula 375, do Superior Tribunal de Justiça Má-fé do adquirente provada Consilium fraudis evidenciado Intimação pessoal do adquirente Desnecessidade Adquirente que compareceu espontaneamente ao processo, juntando procuração e dando-se, consequentemente, por intimado Providência determinada pelo artigo 792, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil que se tem por cumprida Consequências penais da fraude à execução que não interferem no reconhecimento da fraude à execução Independência das esferas cível e penal Artigo 935, do Código Civil Desnecessidade de a pessoa jurídica compor a lide, na qualidade de terceira Ao doar o bem, manifesta incontroverso desinteresse no imóvel Único atingido pelo reconhecimento da fraude à execução é Rogério, que compareceu espontaneamente nos autos Em contratos gratuitos, como a doação, não responde o doador pela evicção Artigo 552, do Código Civil Doutrina Decisão mantida Agravo improvido.

1- Agravo de instrumento (p. 1/25) contra duas decisões proferidas nos autos, em p. 1.701/1.702 e 1.704. Na primeira decisão, reconheceu-se a fraude à execução em relação à doação a Rogério Abarahim Rayol dos Santos do imóvel de matrícula nº 1.520, rejeitando-se a impugnação apresentada em p. 1.589/1.600 dos autos de origem, aplicando-se, ainda, multa por ato atentatório à dignidade da justiça. A segunda decisão está assim transcrita: "Em face do decidido a fls. 1681/1695 constato inexistir óbice ao pedido de fls. 1634/1644, que fica agora deferido. Lavre- se auto de adjudicação do imóvel indicado."

Em preliminar, o espólio alega que as decisões são nulas por ausência de fundamentação. Quanto ao mérito, em relação à primeira decisão agravada , afirma que o magistrado de primeiro grau declarou a fraude à execução, reconhecendo a ineficácia do ato em face do exequente, aplicando penalidade, antes da intimação pessoal do adquirente, o que não pode ocorrer. Alega que a fraude à execução constitui crime, o que deve ser apurado por meio de ação penal, prejudicial à ação cível. Com o falecimento da parte, a punibilidade está extinta e, mesmo que não fosse assim, a pretensão punitiva estaria prescrita. Tudo isso prossegue reflete na esfera cível. Alega, no mais, que a Fazenda Rayol (matrícula 1.520, objeto da penhora) é um imóvel rural que nunca pertenceu, de modo integral, a Murilo Rayol. Sempre pertenceu à Agropecuária Rayol Ltda, pessoa jurídica que não faz parte do polo passivo da demanda. A doação não teve objetivo de fraudar credores. Argumenta que, ao tempo daquela transferência, não houve redução do agravante à insolvência, o que impede o reconhecimento da fraude à execução. Questiona o fundamento do juízo singular, segundo o qual não importaria quem é o titular do domínio do bem penhorado, porque a operação sem a devida contraprestação já configuraria confusão patrimonial. Sustenta que o imóvel só poderia ser penhorado se houvesse desconsideração inversa da personalidade jurídica, o que não pode ser deferido de ofício. O terceiro adquirente não agiu de má-fé. Subsidiariamente, pede que a penhora se limite ao imóvel de matrícula nº 719, que realmente pertenceu a Murilo Rayol, a exclusão da multa por ato atentatório à dignidade da justiça.

No que se refere à segunda decisão , o agravante sustenta a nulidade da adjudicação do imóvel de matrícula nº 19.353, conforme determinado em p. 1.704, pelo valor constante na avaliação de p. 1.226/1.228, que fora julgada prejudicada. Pede, assim, a anulação da carta de adjudicação de p. 1.758, "desautorizando a adjudicação deferida até que seja realizada nova avaliação do imóvel de Matrícula nº 19.353."

Deferi o efeito suspensivo (p. 37).

Contraminuta em p. 41/63, com preliminares de ilegitimidade da parte recorrente, ausência de interesse recursal e preclusão consumativa.

É o relatório.

2- Rejeito as preliminares trazidas em contrarrazões.

Tecnicamente, o espólio não seria mesmo parte ilegítima para impugnar a decisão que reconhece a fraude à execução na doação por ele realizada. Contudo, uma vez que os argumentos trazidos são cognoscíveis mesmo de ofício, por se tratar de questão de ordem pública, e porque o resultado do agravo será favorável à parte que aproveitaria decisão de reconhecimento da ilegitimidade recursal do agravante, supero as preliminares de ilegitimidade de parte e ausência de interesse recursal.

Não há razão para acolhimento da alegação de preclusão consumativa . No Agravo de Instrumento nº 2301791- 91.2023.8.26.0000, o espólio impugnava aspectos relativos à penhora do imóvel de matrícula nº 19.353 e o não acolhimento da impugnação à avaliação (julgado, naquela oportunidade, sob a roupagem de "excesso de penhora", como consta no print juntado em p. 47). Nesse recurso, o argumento é diferente. Aqui, diz-se que a avaliação foi declarada prejudicada, o que impediria, em tese, o seu acolhimento para fins de adjudicação.

O efeito suspensivo, no mais, já fora deferido e não houve interposição de recurso por parte do agravado.

Quanto ao mérito, o agravo não tem provimento.

De início, não há qualquer vício de fundamentação nas decisões agravadas. As decisões são suscintas e objetivas, mas seus fundamentos são claros e inteligíveis.

Em primeiro lugar, a decisão de p. 1.704 não merece qualquer reparo.

Quando o magistrado de origem proferiu a decisão de p. 1.524, havia sido deferida a penhora de diversos imóveis (dentre eles, o de matrícula 19.353 ), de propriedade de Murilo Régis Rayol dos Santos. Porém, o executado (Murilo Rayol) não havia sido intimado acerca das penhoras referidas. Foi nesse contexto proferida a decisão de p. 1.524:

"À luz da certidão retro acolho a exceção de fls. 1248/1252 para devolver ao executado prazo para impugnação à penhora, prejudicada a avaliação realizada, bem como o pedido de adjudicação. Anote-se. Fica rejeitada rediscussão sobre o decreto de desconsideração de personalidade, em face da preclusão."

Após isso, o agravante apresentou impugnação à penhora, oportunidade em que fez diversas críticas à penhora do imóvel nº 19.353: alegou nulidade, trespasse da empresa, impenhorabilidade do bem de família; e, ainda, alegou "excesso de penhora" , que nada mais era do que crítica à avaliação do imóvel. Confira-se o trecho abaixo, extraído da referida impugnação (p. 1.541/1.559):

"Embora a avaliação tenha sido reputada prejudicada às fls. 1.524, cabe ressaltar que o Laudo de fls. 1.226 a 1.228 é claramente nulo por diversos fatores, inclusive, por avaliar o imóvel em valor vil. Como bem exposto às fls. 1.263 a 1.269, o preço que mais se aproxima ao valor de mercado do bem é aquele obtido por meio do índice Fipe ZAP+, de

R$20.741.480,20 (vinte milhões, setecentos e quarenta e um mil, quatrocentos e oitenta reais e vinte centavos)."

A questão foi avaliada pelo juízo singular, ocasião em que resolveu rejeitar a impugnação apresentada , nos seguintes termos (decisão de p. 1.579, mantida pela de p. 1.605):

"Fls. 1541/1559: A ausência do termo de penhora e da indicação de depositário são meras irregularidades passíveis de saneamento, não justificando a declaração de nulidade pretendida, ausente disposição legal que assim estabeleça, determinando-se desde já o respectivo registro, via ARISP, e nomeando-se o exequente depositário, consoante dicção do art. 840, II e seu parágrafo primeiro, ambos do CPC. No mais, quanto ao pedido de exclusão de sócio, trata-se de questão preclusa, que busca, pela via oblíqua, a superação do decreto de desconsideração, como já mencionado."

Contra a decisão acima, o agravante manifestou Agravo de Instrumento, julgado por esta Turma Julgadora conforme ementa a seguir:

Cumprimento de sentença Honorários advocatícios Decisão agravada de declaração da validade da penhora do imóvel Agravo do executado Improvimento Decisão fundamentada Nulidade não verificada

Ausência de termo de penhora e indicação de depositário fiel são meras irregularidades formais, passíveis de correção, e não inviabilizam a continuidade da penhora Desconsideração da personalidade jurídica que atinge os sócios responsáveis pela caracterização dos indícios de abuso do direito da personalidade jurídica, e não aqueles que compõem a sociedade atualmente Jurisprudência do STJ Não provada a utilização do imóvel com finalidade exclusiva de moradia Responsabilidade do executado que não é subsidiária

Excesso de penhora não verificado Impugnação à avaliação do imóvel penhorado não realizada na forma do artigo 873, do Código de Processo Civil Decisão mantida Agravo improvido. (Agravo de Instrumento nº XXXXX-91.2023.8.26.0000; Rel. Mário Daccache; 33a Câmara de Direito Privado; j. 05/02/2024).

O fundamento utilizado por esta Turma Julgadora para afastar a impugnação à avaliação foi o seguinte:

Não há excesso de penhora. O valor do imóvel que deve ser considerado é o da avaliação (p. 1226/1228), porque ela não foi impugnada na forma do artigo 873, do Código de Processo Civil.

Dispõe o artigo citado na decisão:

Art. 873. É admitida nova avaliação quando:

I - qualquer das partes arguir, fundamentadamente, a ocorrência de erro na avaliação ou dolo do avaliador ;

II - se verificar, posteriormente à avaliação, que houve majoração ou diminuição no valor do bem ;

III - o juiz tiver fundada dúvida sobre o valor atribuído ao bem na primeira avaliação .

Parágrafo único. Aplica-se o art. 480 à nova avaliação prevista no inciso III do caput deste artigo.

Em outras palavras, considerou-se, naquele julgamento, que não faria sentido declarar a nulidade da avaliação porque o agravante não justificou a necessidade de uma nova avaliação conforme os fundamentos previstos nos incisos acima transcritos.

O argumento agora apresentado pelo agravante é de que a decisão de p. 1.524, ao expressar a "prejudicialidade da avaliação" , estaria tornando-a sem efeito. Isso, contudo, não prospera. O que se disse foi que, naquele momento específico, não haveria razão para prosseguir com a adjudicação e relevar as considerações periciais acerca da avaliação. Era preciso, antes disso, aguardar o decurso de prazo para impugnação à penhora.

Contudo, após tal providência, o agravante se manifestou de forma ampla a respeito da penhora, inclusive sobre a avaliação . Embora, acerca da avaliação, não o fez conforme artigo 873, do Código de Processo Civil, isso não significa que o ato tenha que ser anulado.

Sem qualquer sentido, ainda, dizer que o juízo, de forma implícita, tornou a avaliação sem efeito. Se o juízo tivesse deferido algo nesse sentido, necessariamente, deveria tê-lo feito de forma expressa, o que não foi feito.

Em síntese, a decisão de p. 1.524 não considerou sem efeito a avaliação e as críticas ao referido ato, apresentadas pelo agravante em impugnação específica, foram rejeitadas pelo juízo singular, o que foi, na sequência, revisado e mantido pelo Tribunal .

A sequência lógica é a expropriação do bem, o que foi corretamente determinado por meio da decisão agravada. Nenhuma nulidade na adjudicação do imóvel de matrícula 19.353 , portanto, merece ser reconhecida. O agravo, neste aspecto, não tem provimento.

Em segundo lugar, quanto à decisão de p. 1.701/1.702 , para que seja delimitado o objeto da controvérsia, é importante que se diga que o espólio agravante se insurge contra a penhora da denominada "Fazenda Rayol", que é uma área de terras de 118.859.718,15 m2, registrada no Cartório Extrajudicial da Comarca de Silves (Amazonas), sob o número 1.520, conforme

p. 1.572/1.575 dos autos de origem.

Também é importante observar que a matrícula acima é resultado da reunião de quatro lotes unitários, registrados sob os números 498 (conforme p. 32 destes autos), 719

(p. 33), 490 (p. 34) e 489 (p. 35).

A propriedade pertencia, inicialmente, conforme matrícula unificada (p. 1.572/1.575), a Agropecuária Rayol Ltda e a Murilo Régis Rayol dos Santos (executado). Contudo, ela foi doada a Rogério Abrahim Rayol dos Santos, em 10 de abril de 2018 .

O juiz da causa reconheceu a fraude à execução e ineficácia da doação.

Feita essa introdução, rejeito a alegação do agravante, de necessidade de intimação pessoal do adquirente.

Conforme se identifica em p. 1.560, o adquirente Rodrigo Abrahim Rayol dos Santos que, não é demais lembrar, é inventariante do espólio trouxe aos autos procuração, constituindo os advogados para defesa de seus interesses e as petições apresentadas pelo espólio (representado por ele) já apresentam argumentos para defesa do negócio jurídico, de modo que se tem por cumprida a providência determinada pelo artigo 792, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil.

Assim, seria até mesmo desnecessária a providência que consta na decisão agravada, de intimação pessoal do adquirente.

Também não tem qualquer procedência a alegação de que as consequências penais da tipicidade e punibilidade do artigo 179, do Código Penal, impedem o reconhecimento da fraude à execução e da aplicação das consequências legais previstas pela lei civil no caso concreto.

Como se sabe, a responsabilidade civil independe da criminal (artigo 935, do Código Civil). De qualquer forma, no caso dos autos, nem de responsabilidade civil estamos tratando , mas, sim, das consequências do reconhecimento da fraude à execução, isto é, a possibilidade de penhora, a ineficácia do negócio jurídico em relação ao exequente e a incidência da multa por ato atentatório à dignidade da justiça, conforme define o artigo 774, inciso I, do Código de Processo Civil.

A fraude à execução, no mais, está bem caracterizada nos autos.

O artigo 792, inciso IV, do Código de Processo Civil, dispõe o seguinte:

Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução:

[...]

IV - quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;

Embora o agravante busque alegar que a doação não reduziu o devedor à insolvência à época da celebração do negócio jurídico, não há qualquer prova disso . Como bem observou o juízo singular, as dificuldades de satisfação total da execução tornam evidente que a ação em trâmite na origem tinha o potencial de reduzir o falecido Murilo Rayol à insolvência, de modo a se considerar que a alienação (uma doação espontânea) foi realizada em fraude à execução.

Ademais, mesmo tendo o adquirente se dado por intimado, não apresentou qualquer argumento que pudesse demonstrar a razoabilidade da doação de um bem de valor significativo . O mais lógico é que tenha colaborado com a fraude da execução, protegendo o patrimônio do devedor, seu pai.

Também não é demais lembrar que Murilo Rayol fora incluído no polo passivo da execução por força da decisão proferida em p. 472/473 dos autos de origem, em 13 de setembro de 2010 , isto é, anos antes da "doação" realizada ao próprio filho.

Nos termos da Súmula 375, do Superior Tribunal de Justiça, "o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente ." Na hipótese concreta, como visto acima, a má-fé do adquirente, caracterizada pelo "consilium fraudis", é evidente.

Assim, correta a decisão agravada ao reconhecer a fraude à execução, assim como ao aplicar ao executado a multa por ato atentatório à dignidade da justiça ao espólio, como definido pelo artigo 774, inciso I, do Código de Processo Civil (abaixo transcrito).

Art. 774. Considera-se atentatória à dignidade da justiça a conduta comissiva ou omissiva do executado que:

I - frauda a execução;

Como visto no relatório, o espólio também alega que, à época da doação, o imóvel não pertencia integralmente ao falecido Murilo, mas, também, à empresa Agropecuária Rayol Ltda. Daí que a declaração de ineficácia da doação caracterizaria uma espécie de indevida desconsideração da personalidade jurídica. Entretanto, sem razão.

A desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se quando se busca responsabilizar a pessoa jurídica por dívida da pessoa física .

Essa hipótese não está presente no caso concreto. O imóvel foi doado pelas pessoas jurídica e física a Rogério Rayol, de modo que ele, Rogério, seria o único titular do domínio do imóvel e, consequentemente, o único patrimonialmente atingido pela ineficácia da doação.

Ou seja, reconhecer a ineficácia da doação não implica, em nenhuma medida, responsabilização patrimonial da pessoa jurídica por dívida da pessoa física. O imóvel, após a doação, já não pertence ao conjunto de direitos e deveres da pessoa jurídica. Não há, assim, qualquer razão para se dizer que a ineficácia da doação implica em desconsideração inversa da personalidade jurídica a exigir a participação da empresa na demanda.

A pessoa jurídica, na realidade, não tem interesse

nem mesmo em defender a manutenção da doação, porque, ao doá-lo sem instituição de termo ou condição, manifesta seu completo desinteresse no bem específico.

Diferente seria se a hipótese tratasse de negócio jurídico oneroso (uma venda, por exemplo, ou uma dação em pagamento) a Rogério Rayol , o que, em princípio, poderia caracterizar evicção e colocar a pessoa jurídica na posição de alienante e, assim, de responsável pelas consequências da evicção (artigo 447, do Código Civil).

Contudo, em casos de doação, o doador não está sujeito às consequências da evicção , conforme artigo 552, do Código Civil:

"Art. 552. O doador não é obrigado a pagar juros moratórios, nem é sujeito às conseqüências da evicção ou do vício redibitório. Nas doações para casamento com certa e determinada pessoa, o doador ficará sujeito à evicção, salvo convenção em contrário."

Sobre o tema, a doutrina ensina:

"A evicção se impõe aos contratos onerosos em geral , não apenas na compra e venda, de onde o modelo se originou em Roma. Basta verificar a incidência da evicção na cessão onerosa de crédito (art. 295, do CC), na dação em pagamento (art. 359, do CC) e na transação (art. 845, do CC). Nos contratos gratuitos, como a doação, não se aplica a evicção, pois eventual privação do bem pelo adquirente não representaria um prejuízo propriamente dito, mas apenas a perda de uma vantagem. " (FARIAS, Cristiano Chaves de; NETTO, Felipe Braga; ROSENVALD, Nelson. Manual de Direito Civil: volume único. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Juspodivm, 2023, p. 813) (Grifos meus).

Sendo assim, a participação da pessoa jurídica doadora na lide, no caso dos autos, é prescindível. O único terceiro atingido pelo reconhecimento da fraude à execução e que, consequentemente, deve participar da demanda na qualidade de terceiro é o adquirente Rogério Abrahim Rayol dos Santos, que compareceu nos autos espontaneamente (procuração em p. 26 destes autos) , dispensando-se, assim, a necessidade de intimação pessoal.

Por tudo, a decisão agravada que reconheceu a fraude à execução deve ser confirmada. A interposição desse recurso, ademais, não caracteriza litigância de má-fé.

3- Diante do exposto, proponho o improvimento do

agravo de instrumento. Revoga-se o efeito suspensivo concedido no início do procedimento.

MÁRIO DACCACHE

Relator

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-sp/2481818825/inteiro-teor-2481818831