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27 de Maio de 2024
  • 1º Grau
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TRF2 • XXXXX-03.2008.4.02.5151 • 04º Juizado Especial Federal do Rio de Janeiro do Tribunal Regional Federal da 2ª Região - Inteiro Teor

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

04º Juizado Especial Federal do Rio de Janeiro

Assunto

Procedimento do Juizado Especial Cível - Procedimento de Conhecimento - Processo de Conhecimento - Processo Cível e do Trabalho

Documentos anexos

Inteiro TeorTRF-2__00239780320084025151_c8f02.pdf
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4 o JUIZADO ESPECIAL FEDERAL

PROCESSO: 2008.51.51.023978-7

AUTOR: DANIEL AVILHEIRA SANTOS

RÉU: UNIÃO FEDERAL (MINISTÉRIO DO EXÉRCITO)

SENTENÇA - Tipo A

Cuida-se de ação proposta em face da União Federal, objetivando o pagamento indenização por danos morais e materiais que o Autor reputa ter sofrido em razão de alegado atraso na emissão, pela Ré, da justificativa de sua ausência em votação eleitoral em período que prestava serviço militar obrigatório, de modo que se viu impedido de participar de curso de formação de vigilante, cuja inscrição dependia da apresentação de Certidão da Justiça Eleitoral, segundo alegações.

Dispensado o relatório, na forma do art. 38, da Lei 9.099/95, passa-se a decidir.

No caso em exame, como não se atribui à Re qualquer conduta comissiva, senão que a alegada inércia quanto à emissão de justificativa à ausência do Autor ao processo eleitoral de 2006, não há de se cogitar, propriamente, da aplicação da teoria objetiva da responsabilidade civil do Estado, com fulcro no art. 37, § 6º, da Constituição da Republica. Na verdade, se está diante de eventual conduta omissiva, em caso de suposta falta do cumprimento de um dever legal, de modo que se configura a responsabilidade apenas em caso falha do serviço.

Com efeito, em hipóteses de omissão, como se vislumbra na espécie, faz-se necessária a prova de culpa do serviço (culpa lato sensu), para que se configure a obrigação de indenizar eventuais danos decorrentes da omissão estatal.

De acordo com a inicial, o Autor alega que, pretendendo participar de curso de formação de vigilante, necessitou de certidão negativa relativa à Justiça Eleitoral (fl.8), mas que, ao intentar obtê-la, foi informado de que seu titulo eleitoral estava suspenso (fl. 9), supondo que a Ré não havia justificado sua ausência em votação eleitoral realizada em 2006, quando se encontrava prestando serviço militar obrigatório. Aduz que se dirigiu ao Ministério do Exército, que emitiu tal justificativa, porém quando já encerrado o prazo para a regularização do título naquele ano de 2008, de modo que ficou impedido de realizar o referido curso e, por conseguinte, de exercer a profissão de vigilante ou prestar concurso público, dentre outras sanções a que se sujeitou, no seu entender, em razão da apontada negligência da Ré.

Por certo que a Constituição da Republica de 88, em seu artigo 14, § 2º, proíbe de se alistarem como eleitores os conscritos, durante o período do serviço militar obrigatório. Assim, não serão todos os conscritos que estarão impedidos de se alistar, mas tão somente aqueles que estiverem efetivamente prestando o servido militar obrigatório.

Cumpre destacar, preliminarmente a este tópico, que, no regime constitucional anterior a 1988, a idade para a prestação do serviço militar obrigatório coincidia com a idade para o alistamento eleitoral, ou seja, dezoito anos. Na Constituição de 1988, o constituinte optou por inovar, facultando ao menor entre dezesseis e dezoito anos o exercício do voto e, por conseqüência, o alistamento eleitoral. No entanto, foi mantida a vedação ao alistamento eleitoral dos conscritos, durante o serviço militar inicial, existente no regime constitucional anterior.

Assim, de acordo com o inciso I,do § 1º, do art. 14, da Carta Magna, o alistamento eleitoral e o voto são obrigatórios para os maiores de 18 anos. Porém, o mesmo dispositivo constitucional estabelece casos em que não predomina o princípio da obrigatoriedade, vez que faculta o alistamento e o voto aos analfabetos, aos maiores de 70 anos e aos maiores de 16 e menores de 18 anos, bem assim aos menores que completarem 16 anos. Por outro lado, sucedem as situações dos inalistáveis, que compreendem os conscritos, durante o período de serviço militar obrigatório ( CF, art. 14, § 2º).

Tem-se, pois, que o alistamento eleitoral é permitido aos maiores de 16 anos, que vai se alistar para o serviço militar aos dezoito anos, o que redunda na ocorrência de se ter um conscrito já alistado junto à Justiça Eleitoral, portanto, apto ao exercício do voto.

Contudo, conforme entendimento dominante no Tribunal Superior Eleitoral, exarado na Resolução n.º 20.165, de 07 de abril de 1998, o conscrito que já possua o título de eleitor, ou seja, já alistado, não poderá votar.

Nesta situação, a inscrição do conscrito permanecerá efetiva no cadastro da Justiça Eleitoral, porém com o impedimento de exercer o voto. Caso contrário, não sendo o conscrito eleitor, seu alistamento estará inviabilizado até a cessação do período de conscrição.

Doutrinariamente, há posições discordantes ao entendimento esposado pelo Tribunal Superior Eleitoral, valendo citar as lições de JOEL J CANDIDO, defendendo que não há razão para que se impeça o voto do conscrito já alistado, ao aduzir que "não se poderia tomar esse dispositivo (o autor se refere ao Art. 14, § 2º) como substrato para impedir o voto dos conscritos alistados antes da incorporação, que, nessas circunstâncias, poderiam exercer o direito de voto" - in Direito Eleitoral Brasileiro. 8ª ed., p. 80.

Em que pese o dissenso doutrinário acerca da natureza jurídica da vedação da capacidade eleitoral ativa aos que prestam serviço militar obrigatório, trata-se de evidente limitação temporária dos direitos políticos, que não se enquadra, no entanto, em nenhuma das hipóteses do art. 15 da Constituição da Republica, pelo que a inalistabilidade do conscrito, enquanto presta o serviço militar obrigatório, não se constitui nem em perda nem em suspensão de direitos políticos.

O referido dispositivo constitucional relaciona como numerus clausus as hipóteses previstas para a perda ou suspensão dos direitos políticos, não cabendo à legislação infraconstitucional ou aos órgãos do Judiciário realizar interpretação de modo a acrescer outras hipóteses ao taxativo rol constitucional, ante a premissa de que a interpretação restritiva deve nortear o entendimento das limitações a um direito.

Assim, a restrição contida no artigo 14, § 2º, da Constituição da Republica, há de ser interpretada, simplesmente, como um requisito negativo para se adquirir a capacidade eleitoral ativa, mediante o alistamento eleitoral, que consubstancia a qualidade de eleitor.

Como a outorga do direito de votar e de ser votado opera-se mediante o preenchimento de determinados requisitos básicos, de que se infere a necessidade de prévio alistamento eleitoral, decorre daí, em outros termos, que o alistamento eleitoral é um procedimento administrativo, instaurado perante os órgãos da Justiça Eleitoral, que propicia a aquisição da cidadania e que viabiliza a qualificação e a integração do indivíduo no cadastro nacional de eleitores.

Nessa perspectiva, tanto a Lei Máxima (art. 14, §§ 1º e 2º) quanto o Código Eleitoral (art. 6º) divorciaram os conceitos de alistamento e do voto, afastando os conscritos apenas do alistamento eleitoral. Conclui-se que, numa exegese sistemática, os conscritos são inalistáveis (art. 14 § 6º, CF), mas os já alistados na data da incorporação possuem voto facultativo, haja vista o disposto no artigo , II, c, do Código Eleitoral Brasileiro.

Ocorre que, nos dias de hoje, o internato absoluto não mais vigora em muitos dos comandos militares. Tal regra sofreu atenuação, especialmente por motivos de ordem econômico-financeira, de maneira a permitir que os militares, inclusive os conscritos, deixem a caserna no final de um dia de serviço e mesmo nos finais de semana.

Por essa linha, somente não exerceria o voto o conscrito que estivesse impedido de dirigir-se à sua seção eleitoral para votar, em razão de estar exercendo alguma atividade militar, como o serviço de guarda do aquartelamento. Não é demais ressaltar que esta situação está prevista para os demais militares no Código Eleitoral (Lei Federal nº 4.737/65):

(...)

II - quanto ao voto:

(...)

c) os funcionários civis e os militares em serviço que os impossibilite de votar”.

Portanto, a despeito da norma constitucional restritiva, há, na legislação complementar, escusa expressa ao eleitor ausente ao pleito e que comprova, no prazo legal, justo motivo para o impedimento. O serviço militar está entre as causas justificáveis, conforme se vê do preceito supra transcrito.

Não se pode atribuir à União, contudo, o dever de apresentar tal justificativa, senão que este recai sobre o próprio eleitor que se encontre em tal situação.

No caso dos autos, verifica-se que o Autor já havia promovido seu alistamento eleitoral desde 2005 (fl. 06), ao passo que prestou serviço militar obrigatório no período de 10/03/2006 a 23/02/2007 (fl. 15).

No entanto, sequer verificou a regularidade de sua situação perante a Justiça Eleitoral, deixando de apresentar a justificativa no prazo legal. Muito ao contrário, somente quando necessitou da certidão de quitação eleitoral, providenciou a justificativa perante o Ministério do Exército, que, prontamente, lhe forneceu, conforme admitido na própria inicial.

A rigor, o Autor não comprovou, documentalmente, o alegado atraso no fornecimento, pela Ré, da justificativa de sua ausência no processo eleitoral de 2006, muito ao contrário, juntou a certidão que lhe foi fornecida quando, enfim, solicitada, em 2008.

Tal assertiva restou corroborada pelos documentos de fls. 13, em que consta a data de emissão da certidão da Justiça Eleitoral, em 13/05/2008, e de fl. 10, que comprova a emissão da justificativa em 13/06/2008, portanto, em prazo bastante razoável e célere.

A despeito da garantia à obtenção de certidão, com arrimo no artigo , inciso XXXIV, alínea b da Constituição de 88, o ordenamento jurídico não pode tutelar a inércia do Autor, quanto a exercer o direito de requerê-la, se restou comprovado, no caso vertente, que o fez somente quando passados mais de dois anos da pendência junto à Justiça Eleitoral (fls. 9 e 11).

Sendo assim, se não foi possível ao Autor regularizar seu título de eleitor em tempo hábil para promover sua inscrição no aludido curso de formação de vigilante, tal fato não decorreu de qualquer falha que possa ser atribuída à Ré, senão que foi o próprio Autor que lhe deu causa.

Nesse contexto, há de se considerar, no mínimo, a exclusão do nexo de causalidade por culpa exclusiva da vítima, a afastar a responsabilização da União.

Por tais razões, conclui-se que não há prova alguma de falha por parte da Ré, nem se vislumbra qualquer ilegalidade na sua conduta, daí porque não há falar em dano.

Com efeito, para que o dano possa ser considerado reparável, cumpre que incida sobre um direito, valendo citar, a respeito, as lições do Professor Celso Antonio Bandeira de Mello, in verbis: “Para ser indenizável cumpre que o dano, ademais de incidente sobre um direito, seja certo, vale dizer, não apenas eventual, possível. Tanto poderá ser atual como futuro, desde que certo, real.” (in Curso de Direito Administrativo Brasileiro, 2002, Ed. Malheiros, p. 864 – grifos nossos).

É princípio de responsabilidade civil que, aquele que causa dano ao outrem fica obrigado a reparar os prejuízos decorrentes do seu ato, de forma integral. Além dos prejuízos definidos como danos emergentes e lucros cessantes, em razão de um ato ilícito e injusto praticado por outrem, pode alguém ficar privado da oportunidade de obter determinada vantagem ou então, de evitar um prejuízo. Isso pode dar ensejo a um pleito de indenização pela perda de uma chance ou oportunidade.

Não obstante, para se configurar o dano material, faz-se imprescindível a prova quanto ao prejuízo financeiro. No caso de perda de uma chance, é necessária a prova inequívoca de que, não fora a ocorrência do fato, a vítima teria conseguido o resultado que se diz interrompido.

No caso em apreço, não houve sequer a demonstração provável da ocorrência de dano material, proporcional à possibilidade maior ou menor de obtenção do resultado almejado, uma vez que há elementos suficientes para indicar que o Autor teria obtido colocação no mercado de trabalho, na atividade de vigiliante, não fosse pela pendência da documentação que supostamente não foi fornecida pela Ré.

Assim, não se vislumbra prova suficiente acerca do dano, nem tampouco o nexo de causalidade com o suposto evento atribuído à Ré, de modo que fica afastada sua responsabilização. Nos termos do art. 333, I, do CPC, não tendo o Autor se desincumbido do ônus que lhe competia no sentido da comprovação do fato constitutivo do seu pretenso direito, impende reconhecer a improcedência do pedido formulado na exordial.

Por essas razões, com base no art. 269, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO, nos termos da fundamentação supra.

Sem custas ou honorários, ressalvada a hipótese de recurso à Turma Recursal (art. 55 da Lei nº 9.099/95).

Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se os autos.

P. R. I

Rio de Janeiro, 14 de setembro de 2010.

ANDREA CUNHA ESMERALDO

Juíza Federal Titular

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