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29 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Segunda Câmara de Direito Público

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

Jaime Ramos

Documentos anexos

Inteiro TeorAC_114908_SC_1258806050103.ani
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Inteiro Teor

Dados do acórdão
Classe: Apelação Cível
Processo:
Relator: Jaime Ramos
Data: 2007-05-08

Apelação Cível n. , de Araranguá.

Relator: Des. Substituto Jaime Ramos.

TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - REQUISITOS NECESSÁRIOS À INSTITUIÇÃO DO TRIBUTO - CONSIDERAÇÃO APENAS DO CUSTO DA OBRA SEM LEVAR EM CONTA A VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL - REQUISITO EXIGIDO PELO CTN E PELO DL N. 195/67 RECEPCIONADOS PELA CF/88 - TRIBUTO INEXIGÍVEL - RECURSO NÃO PROVIDO.

A contribuição de melhoria para fazer face ao custo de obra pública só pode ser cobrada se houver valorização do imóvel a que serve, devendo ser delineada por edital previamente publicado, que contenha os requisitos do art. 82, do CTN, incluindo o cálculo de tal valorização, o custo total da obra e o rateio da parcela devida pelo contribuinte beneficiado, que deverá ser notificado do lançamento conforme o disposto no § 2º. O edital que não contém indicações acerca da valorização imobiliária obtida com a obra não é hábil a instrumentalizar o lançamento da contribuição de melhoria, de modo que a cobrança feita pelo ente público é inexigível.

A ausência de previsão, no texto do art. 145, inciso III, da Constituição Federal de 1988, a exemplo do que já constava no art. 18, inciso II, da Carta Magna de 1967, com a redação dada pela EC n. 23/83, da necessidade de valorização do imóvel do contribuinte em decorrência da obra pública, não torna inexigível tal requisito, porque este se encontra previsto no Código Tributário Nacional (art. 81) e no Decreto-lei n. 195/67 (art. 1º), recepcionados pelo art. 34, § 5º, do ADCT, sem qualquer colisão com o texto político magno.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. , da 2a Vara Cível da Comarca de Araranguá, em que é apelante o Município de Araranguá e apelados Salete Monteiro dos Santos e outros:

ACORDAM , em Segunda Câmara de Direito Público, por votação unânime, negar provimento ao recurso e, em reexame, confirmar a sentença.

Custas na forma da lei.

I -RELATÓRIO:

Na Comarca de Araranguá, Salete Monteiro dos Santos, Ângelo Monteiro dos Santos, Adriano Luiz Monteiro dos Santos e Silvana Monteiro dos Santos moveram ação declaratória contra o Município de Araranguá, alegando, em suma, que são proprietários de um imóvel situado na Avenida Padre Antônio Luiz Dias, o qual recebeu pavimentação asfáltica com concreto betuminoso usinado a quente, sendo que os autores foram notificados para efetuar o pagamento da contribuição de melhoria; que a cobrança do referido tributo está eivada de nulidade, porque não se apurou a valorização individual dos imóveis beneficiados com a contribuição de melhoria; que o art. 81 do Código Tributário Nacional estabelece como limite individual o acréscimo de valor que a obra resultar para cada imóvel beneficiado; que a obra realizada não trouxe qualquer vantagem para os moradores da localidade, não subsistindo a razão de ser do tributo. Requereram procedente a demanda.

Citado, O Município de Araranguá contestou asseverando, em preliminar, que está ausente pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, por não terem sido depositados os valores discutidos nos autos como determina o art. 38 da Lei n. 6.830/80; que o pedido dos autores é juridicamente impossível, pois o lançamento fiscal combatido foi cancelado e substituído por outro que levou em consideração a valorização do imóvel de propriedade dos requerentes.

No mérito, disse que é competente para instituir e cobrar contribuições de melhoria; que o cálculo desse tributo obedeceu à legislação tributária pertinente ao caso; que a testada do imóvel é apenas um dos fatores tomados em consideração para se obter o valor da contribuição de melhoria; que cancelou os lançamentos anteriores, adequando o valor do referido tributo de acordo com o custo da obra e a valorização individual do imóvel. Requereu a improcedência do pleito.

Após a réplica e o parecer do órgão Ministerial o Magistrado a quo determinou que os autores depositassem o valor discutido no autos de acordo com o art. 38 da Lei n. 6.830/80.

Inconformados, os autores agravaram a decisão, mas ela foi reconsiderada pela decisão de fl. 151, na qual o Togado de Primeira Instância afastou a referida preliminar e determinou a produção de prova pericial.

Sobreveio o laudo pericial às fls. 262/274, manifestando-se as pares e o Ministério Público logo em seguida.

Sentenciado, o Juiz de Primeiro Grau julgou procedente o pedido para declarar inexigível o tributo oriundo do Edital n. 001/2001 e anular os lançamentos fiscais dele decorrentes. Por fim, condenou o Município ao pagamento dos honorários advocatícios arbitrados em R$

(um mil reais), sem custas processuais.

Irresignado, o Município de Araranguá apelou, sustentado o art. 145, III, da CF/88 não condicionou a cobrança da contribuição de melhoria à valorização imobiliária decorrente da obra pública; que o Decreto-lei n. 196/67 não se presta para definir o fato gerador do referido tributo, porque é um mero ato administrativo expedido pelo Poder Executivo Federal; que presunção de valorização imobiliária é relativa cabendo ao contribuinte demonstrar a sua efetiva ocorrência da vantagem imobiliária; que a testada do imóvel é apenas um dos fatores tomados em consideração para se obter o valor da contribuição de melhoria; que cancelou os lançamentos anteriores, adequando o valor do referido tributo de acordo com o custo da obre e valorização individual do imóvel. Por derradeiro, prequestionou a aplicação do art. 145, III, da CF/88 e requereu o provimento do recurso.

Com as contra-razões, os autos ascenderam a esta Superior Instância, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela confirmação da sentença em reexame.

II -VOTO:

Esclarece-se que a presente demanda comporta o reexame necessário, razão pela qual serão reapreciadas todas as matérias hasteadas na contestação apresentada pelo Estado de Santa Catarina, que foram rechaçadas na sentença.

1. Em preliminar, o réu assevera que o pedido dos autores é juridicamente impossível, uma vez que, tendo alterado a forma como é calculada a contribuição de melhoria discutida nos autos, nada mais restou aos suplicantes para reclamar.

Existente, no ordenamento jurídico nacional, a possibilidade de os autores obterem a satisfação de seu pedido, de plano percebe-se que a referida preliminar se confunde com o mérito razão pela qual sua apreciação ocorrerá junto com o exame do ponto nodal da lide.

2. Insurgem-se os autores contra a cobrança de contribuição de melhoria instituída pelo Município de Araranguá, alegando, em síntese, que o fato gerador da contribuição é a valorização do imóvel e esta não se verificou.

A instituição do tributo denominado contribuição de melhoria decorrente de obras públicas é autorizada pelo art. 145, inciso III, da Constituição Federal de 1988.

É cediço que a cobrança da contribuição de melhoria, em virtude de sua natureza sui generis , exige da Administração Pública a instituição por lei e a adoção de um procedimento detalhado, com uma série de requisitos, sem os quais é nula a tributação.

Prevê o art. 100, do Código Tributário do Município de Araranguá:

"Art. 100. A contribuição de melhoria tem como fato gerador a realização de obra pública da qual resultem beneficiados os imóveis localizados na sua zona de influência."

Em face disso, não há como falar em ausência de lei instituidora da contribuição de melhoria no Município de Araranguá.

Como tem decidido esta Corte de Justiça, a contribuição de melhoria pode ser instituída por lei genérica, como é o Código Tributário Municipal, em que desde logo se faça constar todos os requisitos necessários para o reconhecimento da hipótese de incidência, do fato gerador, da base de cálculo e outros detalhes necessários à exação.

Não é preciso existir uma lei instituindo contribuição de melhoria para cada obra pública realizada:

"A instituição de Contribuição de Melhoria está condicionada à prévia edição de norma legislativa. Não há necessidade de que a cada obra seja editada uma nova lei. O que se exige é a existência de um diploma legal disciplinador do tributo, contendo pelo menos os requisitos específicos delineados no Código Tributário Nacional e no Decreto-lei n. 195/67. Todos os demais atos, principalmente o edital com as especificações técnicas, devem se pautar na referida norma." (TJSC, ACMS n. , de Piçarras, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, julgada em 10.11.2003; idem ACMS n; , de Piçarras, Rel. Des. Newton Trisotto, j. em 25.05.2004).

Mas continua pertinente a necessidade de demonstração, pelo Município, da ocorrência, com a obra pública, de valorização do imóvel do contribuinte.

Estabelece o art. 81 do Código Tributário Nacional, que "a contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado".

O art. 82 fixa os requisitos necessários para implementação da contribuição de melhoria:

"Art. 82 - A lei relativa à contribuição de melhoria observará os seguintes requisitos:

"I - publicação prévia dos seguintes elementos:

"a) memorial descritivo do projeto;

"b) orçamento do custo da obra;

"c) determinação da parcela do custo da obra a ser financiada pela contribuição;

"d) delimitação da zona beneficiada;

"e) determinação do fator de absorção do benefício da valorização para toda a zona ou para cada uma das áreas diferenciadas, nelas contidas;

"II - fixação de prazo não inferior a 30 (trinta) dias, para impugnação, pelos interessados, de qualquer dos elementos referidos no inciso anterior;

"III - regulamentação do processo administrativo de instrução e julgamento da impugnação a que se refere o inciso anterior, sem prejuízo da sua apreciação judicial".

O § 1º, do mencionado artigo também se refere à necessidade de se considerar a valorização do imóvel, quando diz que a contribuição "será determinada pelo rateio do custo da obra [...] pelos imóveis situados na zona beneficiada em função dos respectivos fatores individuais de valorização" .

Verifica-se, então, que a contribuição de melhoria só pode ser instituída em função de valorização (melhoria) do imóvel do contribuinte, decorrente de obra pública realizada. Não basta considerar o custo da obra. É preciso que dela decorra valorização para o imóvel circunvizinho, o que deve constar no edital, com as indicações do fator individual de valorização.

Conforme o ensinamento de Hugo de Brito Machado:

"O fato gerador da contribuição de melhoria é a valorização do imóvel do qual o contribuinte é proprietário, ou enfiteuta, desde que essa valorização seja decorrente de obra pública. Prevalece, no Direito brasileiro, o critério do benefício. Não é a realização da obra pública que gera a obrigação de pagar contribuição de melhoria. Essa obrigação só nasce se da obra pública decorrer valorização, isto é, se da obra pública decorrer aumento do valor do imóvel contribuinte" (Curso de Direito Tributário, 19. ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2001, p. 374).

Ressalte-se que, no presente caso, a cobrança da contribuição de melhoria é indevida exatamente por isso, uma vez que o Município, como ele mesmo admite, deixou de indicar a ocorrência de valorização do imóvel de propriedade dos autores.

Dos Editais colacionados às fls. 17/18, 64/67 e 71/73 extrai-se a mesma redação quanto ao cálculo do tributo:

"3 - Determinação da parcela do custo das obras a serem financiadas pelo contribuição de melhoria: Será efetuada proporcionalmente, levando-se como fator a extensão das testadas dos respectivos imóveis e a metade da largura da pista de rolamento em frente aos imóveis beneficiados, considerando-se o total em metros quadrados". (grifo do original).

O documento é inequívoco ao apontar o custo total da obra orçada em R$ 85.427,94 (oitenta e cinco mil, quatrocentos e vinte e sete reais e noventa e quatro centavos), correspondente a cerca de R$ 23,59 o metro quadrado da obra.

Ora, não restou consignada a exigência disposta no § 1º do artigo 82 do CTN, qual seja, a valorização (melhoria) do imóvel de cada contribuinte, que é o fato gerador da contribuição de melhoria.

Veja-se que a própria Lei Complementar Municipal n. 006/1997, que instituiu o Código Tributário do Município de Araranguá, prevê, em seu art. 100 que a instituição da contribuição de melhoria "tem como fato gerador a realização de obra da qual resultem beneficiados os imóveis localizados na sua zona de influência" . Da mesma forma, no art. 104 o CTM estabelece que o "contribuinte da contribuição de melhoria é o proprietário, o titular do domínio útil ou possuidor, a qualquer título, de imóvel beneficiado pela obra". Notadamente, a efetiva valorização do imóvel precisa ser confirmada faticamente comprovada, a fim de que se possa ter por ocorrido o fato gerador imponível.

Leciona Paulo de Barros Carvalho que "as contribuições de melhoria levam em conta a realização de obra pública que, uma vez concretizada, determine a valorização dos imóveis circunvizinhos. A efetivação da obra pública, por si só, não é suficiente. Impõe-se um fator exógeno que, acrescentado à atuação do Estado, complemente a descrição factual. E a valorização nem sempre é corolário da realização de obras públicas. Muitas há que, sobre não acarretarem incremento de valor nos imóveis adjacentes, até colaboram para a diminuição de seu preço de mercado. Por isso, do crescimento valorativo que o imóvel experiente, em razão da obra efetuada pelo Estado, quer o direito positivo brasileiro que seu proprietário colabore com o erário, pagando a chamada contribuição de melhoria" (Curso de Direito Tributário, 10. ed., São Paulo: Saraiva, 1998, p. 32/33).

Como se viu, o tributo deve ser cobrado com base na valorização individual da propriedade imobiliária de cada contribuinte. Além disso, a cobrança tem como limite geral o total da despesa realizada, conforme dicção da parte final do art. 81 do Código Tributário Nacional, e do art. 100 do Código Tributário do Município de Araranguá.

O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, tem decisão no sentido de que a entidade tributante, ao exigir o pagamento da contribuição de melhoria, tem de demonstrar o amparo das seguintes circunstâncias: "a) exigência fiscal relativa a despesas decorrentes de obra pública realizada; b) a obra pública tenha provocado a valorização do imóvel; c) a base de cálculo seja a diferença entre os dois momentos: o primeiro, o valor do imóvel antes de a obra ser iniciada; o segundo, o valor do imóvel após a conclusão da obra". Entendeu, também, corretamente, que é da natureza da contribuição de melhoria a valorização imobiliária, bem como acolheu o entendimento doutrinário de que para definir a sua hipótese de incidência deve-se adotar o critério da mais valia"(REsp. n.º 169131/SP, Rel. Min. José Delgado, julgado em 02.06.1998).

A matéria, ademais, tem sido objeto de freqüente apreciação nesta Corte de Justiça:

"TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - CF, ART. 145, III - CTN, ART. 81 - PRESSUPOSTOS NÃO DEMONSTRADOS

""O fato gerador da contribuição de melhoria é a valorização do imóvel do qual o contribuinte é proprietário, ou enfiteuta, desde que essa valorização seja decorrente da obra pública"(Hugo de Britto Machado)".

Apanha-se do teor do acórdão:

"3. No caso sub examine, o impetrado informou que,"com o advento da Constituição de 88, não mais persiste a necessidade de valorização do imóvel". Expressamente reconheceu que" o critério adotado para cobrança da contribuição de melhoria foi necessariamente o custo da obra, tão somente "(fl. 54). Nessas circunstâncias, é forçoso concluir que assiste razão aos impetrantes; que não se encontram presentes os pressupostos autorizadores do lançamento da contribuição de melhoria" (TJ-SC, Apelação Cível em Mandado de Segurança n. , de Lages, Rel. Des. Newton Trisotto, julgado em 20.04.2004).

E mais:

"APELAÇÃO CÍVEL - MANDADO DE SEGURANÇA - TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - CALÇADAS DE PASSEIO - OBRA PÚBLICA NÃO FINALIZADA - VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL NÃO DEMONSTRADA - INOCORRÊNCIA DOFATO GERADOR DO TRIBUTO - BASE DE CÁLCULO - ÁREA CONSTRUÍDA - ILEGALIDADE DA COBRANÇA - RECURSO PROVIDO.

"O fato gerador da contribuição de melhoria é a valorização do imóvel frente ao mercado imobiliário, provocada pela realização de obra pública. E é justamente a partir da valorização imobiliária que decorrerá a base de cálculo do tributo, extraída da diferença do valor do imóvel antes e depois do investimento feito em prol da coletividade.

"Em razão disso, faz-se necessária a individualização de cada imóvel para calcular a contribuição de cada munícipe, sendo vedado o lançamento de contribuição de melhoria antes da conclusão da obra que a justifique"

(...) (TJ-SC, Apelação Cível em Mandado de Segurança n. , de Lages, Rel. Des. Rui Fortes, julgado em 20.04.2004).

É forçoso dizer que "sem a valorização imobiliária, decorrente de obra pública, não há contribuição de melhoria, porque a hipótese de incidência desta é a valorização e a sua base de cálculo, é a diferença entre dois momentos: o anterior e posterior, vale dizer, o quantum da valorização imobiliária - precedentes: STFRRE 15.863 SP, RTJ 138/600 e 614, RE 634.0 - IOB 10/94, p. 190 - texto 17/46" (TJ-SC, AC n.º , de São José do Cedro, Rel. Des. Anselmo Cerello, julgado em 21.09.2000).

Portanto, a contribuição de melhoria que leva em conta somente o custo da obra rateado entre os proprietários e o próprio Município, afronta os dispositivos legais que regem o tributo, já que a valorização do imóvel de cada contribuinte é elemento indispensável à imposição tributária.

O valor rateado entre os proprietários poderia até mesmo ser inferior à mais valia do imóvel, mas não pode ser cobrado dessa maneira.

Como já visto, a cobrança da contribuição de melhoria obedece a um minucioso procedimento que não pode ser subvertido, sob pena de inexigibilidade do tributo.

É por isso que o eminente Des. Trindade vem dizendo que "a contribuição de melhoria é tributo sui generis, que tem como fator determinante de imposição a valorização que, em face de obra pública realizada no local, venha a ser auferida pelo imóvel de propriedade do tributado. Na forma da lei, para ser juridicamente válida a imposição, precedentemente à realização da obra deve o Município apresentar e divulgar o memorial descritivo do projeto da obra, o seu orçamento e custo, a parcela desse custo a ser financiada pela contribuição, a delimitação da zona beneficiada, com a determinação do fator de absorção do benefício de valorização para toda a zona ou para cada uma das áreas beneficiadas, nela contidas, a fixação de prazo, não inferior a trinta dias, para impugnação, pelos interessados, de qualquer dos elementos referidos, bem como a regulamentação do processo administrativo de instrução e julgamento da impugnação. Ressentindo-se da ausência de qualquer um desses pressupostos, a contribuição de melhoria é inexigível" (TJ-SC, Apelação Cível n. 97.012400-7, de São Miguel do Oeste, Relator Des. Trindade dos Santos, julgado em 15.12.1998).

É impertinente a alegação da Administração Municipal no sentido de que os autores impetrante não produziram prova da não valorização de seu imóvel.

Ora, como sobejamente visto, é do ente tributante o encargo de provar o acréscimo patrimonial decorrente da obra por ele realizada. Sem a prova da mais valia de cada imóvel beneficiado não nasce para o contribuinte a obrigação tributária. Aliás, a valorização imobiliária como fato gerador da contribuição de melhoria, que é, há de constar na lei instituidora como um dos requisitos para a imposição tributária, e ser distinguida no edital, com a respectiva avaliação.

Alega o Município que a exigência de valorização do imóvel para a instituição de contribuição de melhoria contida no art. 1º do Decreto-lei n. 195/87 e no arts. 81 e 82, do Código Tributário Nacional, não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, uma vez que a Emenda Constitucional n. 23/83 alterou a Constituição Federal de 1967 emendada pela EC n. 01, de 17.10.1969, para excluir dela a parte que até então dizia respeito à citada valorização imobiliária, e desde então o texto constitucional não mais alude a essa parte do fato gerador.

Tal como já se previa no art. 30 e seu parágrafo, da Constituição de 1946, o Código Tributário Nacional instituído pela Lei n. 5.172, de3 25.10.1966, estabeleceu nos seus arts. 81 e 82 as regras necessárias para a exação da contribuição de melhoria, exigindo que no cálculo do que toca a cada um dos contribuintes seja considerada a valorização do respectivo imóvel.

A Constituição de 24.01.1967 repetiu, no art. 19, inciso III, e seu § 3º, em sua redação original, o que dispusera a Carta precedente:

"Art. 19 - Compete à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios arrecadar:

" (...)

"III - contribuição de melhoria dos proprietários de imóveis valorizados pelas obras públicas que os beneficiaram.

"(...)

"§ 3º - A lei fixará os critérios, os limites e a forma de cobrança, da contribuição de melhoria a ser exigida sobre. cada imóvel, sendo que o total da sua arrecadação não poderá exceder o custo da obra pública que lhe der causa".

A "lei" referida no § 3º da Carta Magna de então é o Decreto-lei n. 195, de 24.02.1967, cujo art. 1º assim dispôs:

"Art. . A contribuição de melhoria, prevista na Constituição Federal, tem como fato gerador o acréscimo do valor do imóvel localizado nas áreas beneficiadas direta ou indiretamente por obras públicas".

A Emenda Constitucional n. 1, de 17.10.1969, trazendo nova redação à Constituição de 1967, autorizou a instituição de contribuição de melhoria no novo art. 19, inciso II:

"Art. 19. Além dos impostos previstos nesta Constituição, compete à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir:

" (...)

"II - contribuição de melhoria, arrecadada dos proprietários de imóveis valorizados por obras públicas, que terá como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.

Alterando mais uma vez a redação do dispositivo, a Emenda Constitucional n. 23, publicada em 02.02.1983 assentou:

"Art. 18.

"(...)

"II - contribuição de melhoria, arrecadada dos proprietários de imóveis beneficiados por obras públicas, que terá como limite total a despesa realizada.

A Constituição Federal de 1988 autoriza a instituição de contribuição de melhoria, da seguinte forma:

"Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

" (...)

"III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas." .

Em face dessa redação simplificada o Município manifesta seu entendimento no sentido de que o fato gerador da contribuição de melhoria deixou de ser a valorização do imóvel beneficiado pela obra pública, porque tal requisito não mais consta do texto constitucional.

Não é correta essa orientação.

É a própria Constituição Federal de 1988 que no art. 146, inciso III, letra a, determinou que se edite lei complementar para "estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, e dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes" .

Mas o art. 34, § 5º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da CF/88 assegurou expressamente a aplicação da legislação tributária anterior à vigência da Carta de 1988, no que com esta fosse compatível, vale dizer, no que fosse por ela recepcionado.

Então, o Código Tributário Nacional e o Decreto-lei n. 195/97 foram guindados à condição de lei complementar em matéria de Direito Tributário, recepcionados que foram pela atual Constituição Federal, já que com o texto desta não há qualquer colisão, especialmente no particular da exigência de valorização imobiliária para a ocorrência do fato gerador imponível da contribuição de melhoria.

Assim, não é porque o art. 145, III, da Constituição Federal de 1988 dispôs que a União, os Estados e o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir "contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas" , sem fazer menção à valorização imobiliária, que tal requisito deixou de existir.

Se é o Código Tributário Nacional a legislação responsável pela definição do fato gerador de tributo existente na Constituição Federal (art. 146, III, a, da CF/88), e a contribuição de melhoria é um deles, basta ler a redação do artigo 82, § 1º, do CTN que se verá a clara menção à valorização imobiliária como fato gerador do tributo em debate. O mesmo se apanha do art. , do Decreto-lei n. 195/67.

A propósito, a questão aqui examinada já foi objeto de perspicaz análise pelo tributarista Hugo de Brito Machado, o que motiva a transcrição de trecho de sua obra Curso de Direito Tributário:

"Diferentemente das anteriores, que a propósito da contribuição de melhoria referiam-se a valorização de imóveis, a Constituição Federal de 1988 simplesmente atribuiu competência à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para instituir"contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas"(art. 145, inc. III). Em face disto, há quem cogite da possibilidade de haver contribuição de melhoria independentemente de valorização imobiliária. Seria bastante a obra pública. Isto é um despautério que desmerece qualquer exame. Demonstra simplesmente o inteiro desconhecimento da contribuição de melhoria, sua origem e sua finalidade específica. Entretanto, diante de tantos despautérios que se têm visto em matéria de tributação, não podemos afastar a possibilidade até de ter havido, na citada mudança do texto constitucional, o propósito de ensejar aquele absurdo entendimento, que por isto mesmo vamos examinar.

"Em primeiro lugar, lembramos que a vigente Constituição recepcionou a legislação anterior, e o fez, aliás, expressamente, quanto à matéria tributária (art. 34, § 5º, do ADCT). Assim, enquanto não alteradas por normas do mesmo nível hierárquico, continuam em vigor as disposições do Código Tributário Nacional e do Decreto-lei n. 195, o que de pronto afasta a possibilidade de instituição de contribuição de melhoria sem valorização imobiliária.

"Resta, porém, a questão de saber se é possível, com a alteração do Código e da lei ordinária, tal forma de tributação.

"A contribuição de que se cuida é de melhoria. Isto significa dizer exatamente que ela está ligada a uma melhoria, que corresponde precisamente ao incremento de valor do imóvel daquele que será obrigado a seu pagamento.

"Não é razoável contribuição de melhoria se não há melhoria alguma. E não se trata, como poderia parecer aos menos informados, de simples questão terminológica. O nome da espécie tributária em questão está intimamente ligado à sua finalidade específica, que, como já foi demonstrado, é a de evitar a injusta apropriação individual de uma valorização imobiliária decorrente de obra pública, que por ser pública foi realizada com os recursos do Tesouro Público e deve beneficiar a todos, sem privilégios. A contribuição de melhoria é precisamente o instrumento adequado para que o proprietário do imóvel valorizado reponha, em favor da coletividade, no Tesouro Público o que foi por este gasto na obra, na medida, tanto quanto possível exata, do incremento de valor auferido.

"É induvidosa, portanto, a impossibilidade jurídica de contribuição de melhoria sem valorização imobiliária. Um tributo que, com esse nome, seja instituído, indecentemente, de melhoria, será verdadeiro imposto, e assim, salvo o exercício da denominada competência residual, com as limitações a ela inerentes, será inconstitucional"(Curso de Direito Tributário, 25. ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 26).

A matéria já foi examinada neste Tribunal e recebeu do eminente Des. Volnei Carlin, como Relator da Apelação Cível n. 99.012713-3, da Capital, julgada em 25.10.2001, o seguinte tratamento:

"APELAÇÃO CÍVEL - CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - FATO GERADOR É A VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL - ARTIGO 81 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL E 1º DO DECRETO-LEI N. 195/67 RECEPCIONADOS PELA CARTA MAGNA - INTELIGÊNCIA DO § 5º, DO ART. 34 DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS.]

"O fato gerador da contribuição de melhoria, que é a valorização do imóvel, permaneceu intocado mesmo com a promulgação da Constituição da Republica Federativa do Brasil ( CRFB), uma vez que o art. 81 do Código Tributário Nacional e o 1º do Decreto-lei n. 195/67 foram por ela recepcionados, na forma do § 5º, do art. 34 da ADCT."

No corpo do aresto Sua Excelência transcreve precedente do Supremo Tribunal Federal assim vazado:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Constitucional. Tributário. Contribuição de melhoria. Art. 18, II, CF/67, com a redação dada pela EC n. 23/83. Não obstante alterada a redação do inciso II do art. 18 pela Emenda Constitucional n. 23/83, a valorização imobiliária decorrente de obra pública - requisito ínsito a contribuição de melhoria - persiste como fato gerador dessa espécie tributária. RE conhecido e provido." (STF 2ª TURMA. RE - 116147/SP. Ministro Célio Borja. Julgado em 29/10/1991).

Por derradeiro, cumpre colacionar escorreita jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

"TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. FATO GERADOR. VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL.

"1. A contribuição de melhoria tem como fato gerador a real valorização do imóvel, não servindo como base de cálculo tão-só o custo da obra pública realizada. ( REsp n. 280.248/SP, relator Ministro Francisco Peçanha Martins, Segunda Turma, DJ de 28.10.2002).

"2. Recurso especial provido" (STJ, REsp n. 629.471/RS, Relator: Min. João Otávio de Noronha, julgado em 13.02.2007).

"TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. OBRA INACABADA. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA E FATO GERADOR DA EXAÇÃO. OBRA PÚBLICA EFETIVADA. VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL. NEXO DE CAUSALIDADE. INOCORRÊNCIA. DIREITO À RESTITUIÇÃO.

"1. Controvérsia que gravita sobre se a obra pública não finalizada dá ensejo à cobrança de contribuição de melhoria.

"2. Manifesta divergência acerca do atual estágio do empreendimento que deu origem à exação discutida, sendo certo é vedado à esta Corte Superior, em sede de Recurso Especial, a teor do verbete Sumular n.º 07/STJ, invadir a seara fática-probatória, impondo-se adotar o entendimento unânime da época em que proferido o julgamento pelo Tribunal a quo, tanto pelo voto vencedor, como pelo vencido, de que quando foi instituída a contribuição de melhoria a obra ainda não havia sido concluída porquanto pendente a parte relativa à pavimentação das vias que circundavam o imóvel de propriedade da recorrente.

"3. A base de cálculo da contribuição de melhoria é a diferença entre o valor do imóvel antes da obra ser iniciada e após a sua conclusão (Precedentes do STJ: RESP n.º 615495Rel. Min. José Delgado, DJ de 17.05.2004; RESP XXXXX SP ; Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 06.12.1999)

"4. Isto porque a hipótese de incidência da contribuição de melhoria pressupõe o binômio valorização do imóvel e realização da obra pública sendo indispensável o nexo de causalidade entre os dois para sua instituição e cobrança.

"5. Consectariamente, o fato gerador de contribuição de melhoria se perfaz somente após a conclusão a obra que lhe deu origem e quando for possível aferir a valorização do bem imóvel beneficiado pelo empreendimento estatal.

"6. É cediço em doutrina que:" (...) Só depois de pronta a obra e verificada a existência da valorização imobiliária que ela provocou é que se torna admissível a tributação por via de contribuição de melhoria. "(Roque Antonio Carrazza, in" Curso de Direito Constitucional Tributário ", Malheiros, 2002, p. 499)

"7. Revela-se, portanto, evidente o direito de a empresa que pagou indevidamente a contribuição de melhoria, uma vez que incontroversa a não efetivação da valorização do imóvel, haja vista que a obra pública que deu origem à exação não foi concluída, obter, nos termos do art. 165, do CTN, a repetição do indébito tributário.

"8. Precedentes: RESP XXXXXRel. Min. José Delgado, DJ de 17.05.2004; RESP XXXXXRel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 06.12.1999.

"9. Recurso Especial provido."(STJ, REsp n. 647.134/SP, Relator: Min. Luiz Fux, julgado em 10.10.2006).

Assim, não há dúvida sobre a exigência ainda presente da valorização do imóvel beneficiado pela obra pública, para que o Município possa instituir a respectiva contribuição de melhoria.

Por tudo quanto se viu conclui-se ser inexigível a contribuição de melhoria instituída pelo Município de Araranguá. Estando devidamentecomprovado o direito dos apelados em não se submeter à indevida exação, já que o lançamento tributário da contribuição de melhoria não obedeceu a regular trâmite, daí porque correta a sentença proferida no primeiro grau.

Diante do exposto, vota-se pela não provimento do recurso e pela confirmação da sentença em reexame. III -DECISÃO:

Nos termos do voto do relator, por votação unânime, a Câmara negou provimento ao recurso e, em reexame, confirmou a sentença.

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Francisco Oliveira Filho e Cid Goulart.

Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, lavrou parecer a Exma. Sra. Dra. Lenir Roslindo Piffer.

Florianópolis, 8 de maio de 2007.

Francisco Oliveira Filho

PRESIDENTE

Jaime Ramos

RELATOR


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