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15 de Maio de 2024

STJ Set 22 - Dosimetria Irregular - Homicídio - comoção social e familiar são consequências inerentes ao delito

há 2 anos

HABEAS CORPUS Nº 754324 - PE (2022/0207285-0)

DECISÃO Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, sem pedido de liminar, impetrado em benefício de PAULO CEZAR DEODATO FREIRE contra acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO, proferido na Apelação n. 0000202-32.2020.8.17.1390. Consta dos autos que o paciente foi condenado, em primeiro e segundo graus, a 21 anos de reclusão, pela prática do crime de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, I, e IV, do Código Penal).

No presente writ, a defesa alega a (I) existência de nulidade pelo uso de algema durante a sessão de julgamento no tribunal do júri, visto que não teria sido apresentada fundamentação idônea para tanto; (II) ocorrência de indevido bis in idem pela utilização da mesma fundamentação para qualificar o delito e negativar o vetor judicial das circunstâncias do crime; (III) utilização de elementos inerentes do tipo penal para valorar negativamente as consequências do crime; (IV) aplicação de agravante (art. 61, II, e, do Código Penal) não reconhecida na pronúncia e não debatida em plenário. Requer, assim, o reconhecimento da nulidade absoluta do julgamento ou, subsidiariamente, a redução da reprimenda. Dispensadas as informações, o Ministério Público Federal opinou pela concessão parcial da ordem (fls. 95/102).

É o relatório. Decido.

Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração sequer deveria ser conhecida, segundo orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal - STF e do próprio Superior Tribunal de Justiça - STJ. Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável a análise do feito para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal que justifique a concessão da ordem de ofício.

A primeira controvérsia refere-se à suposta nulidade por uso de algemas durante a sessão do plenário do júri.

Quanto ao tema, asseverou o Tribunal a quo: "[...] O suscitante impugnou o uso das algemas durante a Sessão de Julgamento, tendo o magistrado fundamentado o indeferimento da impugnação nos seguintes termos: Concluído o interrogatório, o magistrado pontuou, conforme gravação na mídia em anexo, que o acusado encontra-se em unidade prisional (PABA) e a necessidade de utilização das algemas só pode ser feita pela direção da referida unidade, em observância da segurança e estabilidade do local, já que se trata de um presídio cuja determinações de segurança não podem ser determinadas pelo Juízo. De fato, a visualização da mídia de fl. 217v, onde consta a gravação da Sessão de Julgamento, revela que o acompanhamento do julgamento e o interrogatório do réu se deram por videoconferência. Na oportunidade, o acusado pôde exercer seu direito de autodefesa, falando em ambiente diverso da cela, com uma vestimenta normal branca, sendo digno de nota que o enquadramento da câmera não mostrava suas mãos, apenas se vendo as algemas em poucos segundos, quando o réu as levantou. Também é correto o entendimento do magistrado, no sentido de que não poderia decidir pela retirada das algemas em ambiente que não estava sob seu controle, especialmente por não ter conhecimento dos protocolos de segurança e das circunstâncias específicas da oitiva do acusado por videoconferência, em local exterior ao da Unidade Jurisdicional. Analisando todo esse contexto, notadamente a situação excepcional de oitiva do réu por meio de sistema de transmissão audiovisual, em vista da necessidade de distanciamento em razão da pandemia de Covid 19, bem como observando atentamente a mídia com a gravação da Sessão, percebe-se que, no caso concreto, não houve prejuízo à defesa, não se podendo inferir que o uso de algemas tenha sido capaz de influenciar os jurados em tais circunstâncias" (fls. 84/85).

Verifica-se que o Juiz, durante sessão de julgamento realizada por meio de videoconferência, determinou a manutenção da utilização de algemas acolhendo a avaliação feita pelos agentes da unidade prisional, considerando a sua necessidade para a segurança e estabilidade do local.

Assim, mostrou-se devidamente justificada a precaução tomada pela origem.

Nesse sentido: PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. NÃO CABIMENTO. TRIBUNAL DO JÚRI. NULIDADE. USO DE MARCA-PASSO (ALGEMA DE CALCANHAR) DURANTE O JULGAMENTO. VIOLAÇÃO À SÚMULA VINCULANTE N. 11 DO STF. NÃO OCORRÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. PRINCÍPIO PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE PATENTE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça não têm admitido o habeas corpus como sucedâneo do meio processual adequado, seja o recurso ou a revisão criminal, salvo em situações excepcionais, quando manifesta a ilegalidade ou sendo teratológica a decisão apontada como coatora. 2. O emprego de algemas é excepcional, sendo que a sua utilização depende de motivada decisão judicial, como na espécie, em que o juiz fundamentou adequadamente a restrição em razão das peculiaridades do local em que realizado o ato processual, e na insuficiência de policiamento. Inocorrência de violação da Súmula vinculante n. 11. 3. Vigora no processo penal o princípio pas de nullité sans grief, segundo o qual ''nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para acusação ou defesa'' (art. 563 CPP). 4. Habeas corpus não conhecido. ( HC n. 314.781/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 2/2/2017, DJe de 10/2/2017).

Noutro ponto, constata-se que os temas relativos ao suposto bis in idem por utilização dos mesmos fundamentos para qualificar o delito e negativar as circunstâncias do crime, bem como o indevido reconhecimento da agravante prevista no art. 61, II, e do Código Penal, não foram apreciados pelo Tribunal a quo.

Assim, a sua análise, diretamente por esta Corte, acarreta indevida supressão de instância. Nesse sentido: PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. NECESSIDADE DE SE INTERROMPER OU DIMINUIR A ATUAÇÃO DE MEMBROS DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ANTE O FUNDADO RECEIO DE REITERAÇÃO DELITIVA. ALEGADA EXTEMPORANEIDADE DO DECRETO. INOCORRÊNCIA. PRISÃO DECRETADA ASSIM QUE CONHECIDOS OS FATOS PELO PODER JUDICIÁRIO MEDIANTE REPRESENTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CRIME PERMANENTE. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. NÃO REALIZADA EM RAZÃO DA PANDEMIA DE COVID-19. RECOMENDAÇÃO N. 62/2020 DO CNJ. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. SUPOSTA COCRRÊNCIA DE BIS IN IDEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE NOVOS ARGUMENTOS APTOS A DESCONSTITUIR A DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO DESPROVIDO. [...] VII - No atinente à suposta ocorrência de bis in idem na denúncia, verifica-se que tal matéria sequer foi analisada pelo eg. Tribunal a quo, nos autos do HC n. 5043620-02.2021.8.24.0000, objeto do presente recurso, de maneira que sua análise diretamente por esta Corte Superior fica impossibilitada, sob pena de indevida supressão de instância. Precedentes. VIII - E assente nesta Corte Superior que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. Precedentes. Agravo regimental desprovido. ( AgRg no RHC 154.553/SC, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), QUINTA TURMA, DJe 19/11/2021).

Por fim, no que se refere à negativação das consequências, asseverou o Tribunal a quo:

"[...] Em relação às consequências, foi correto o entendimento do Juízo sentenciante no sentido de que"merecem avaliação negativa, já que houve forte comoção familiar, tendo havido, inclusive, manifestação pública dos familiares na frente do fórum, por conta do fratricídio ocorrido", sendo certo que o crime provocou grande trauma familiar" (fls. 89/90).

O acórdão impugnado está em dissonância com o entendimento desta Corte, segundo o qual a "comoção social e os reflexos nos familiares da ofendida são conseqüências abstratas e inerentes ao delito, razão pela qual não podem justificar elevação da pena base" ( AgRg no REsp n. 1.636.954/CE, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 23/8/2017).

Destarte, mostra-se necessário afastar o desvalor aplicado sobre o vetor judicial em questão. Ante o exposto, não conheço do habeas corpus, mas concedo a ordem, de ofício, para, afastada a negativação sobre as consequências do crime e mantidos os demais termos fixados pela origem, reduzir a pena para 17 anos e 6 meses de reclusão. Publique-se. Intimações necessárias. Brasília, 02 de setembro de 2022. JOEL ILAN PACIORNIK Relator

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(STJ - HC: 754324 PE 2022/0207285-0, Relator: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Publicação: DJ 05/09/2022)

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