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1 de Maio de 2024

STF Set23 - Dosimetria Irregular - culpabilidade, às circunstâncias e consequências do crime inidôneas - Homicídio Qualificado

há 8 meses

Ementa: SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. MATÉRIA CRIMINAL. WRIT UTILIZADO COMO SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA PARCIALMENTE PARA AFASTAR CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE CONCURSO FORMAL. INVIABILIDADE. PLURALIDADE DE CONDUTAS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. No caso concreto, por contrariar frontalmente a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o habeas corpus não merece conhecimento, na medida em que funciona como sucedâneo de revisão criminal. Precedentes. 2. Não há ilegalidade na decisão que aplica a regra do concurso material de crimes (art. 69 do CP) aos delitos de homicídio e tentativa de homicídio, tendo em vista que o agente, mediante pluralidade de ações, atinge a integridade física e a vida de vítimas diversas. 3. Agravo regimental desprovido.

(STF - HC: 228017 PE, Relator: EDSON FACHIN, Data de Julgamento: 22/08/2023, Segunda Turma, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01-09-2023 PUBLIC 04-09-2023)

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Inteiro Teor

AG.REG. NO HABEAS CORPUS 228.017 PE RNAMBUCO

RELATOR : MIN. EDSON FACHIN

Decisão:

Trata-se de agravo regimental (eDOC 11) interposto contra decisão monocrática que, forte na hipótese de não conhecimento, por entender que a impetração figura como sucedânea de revisão criminal, negou seguimento ao habeas corpus (eDOC 10).

Nas razões recursais, sustenta-se que: a) "a deflagração de mais de um disparo de arma de fogo evidentemente não torna a conduta plural, persistindo a compreensão de tratar-se de uma única ação, ainda que desdobrada em mais de um ato"; b) as circunstâncias judiciais (culpabilidade do agente e consequências, motivos e circunstâncias do crime) foram desvaloradas com base em elementos abstratos e ínsitos ao tipo penal.

À vista do exposto, requer o provimento do recurso para reconhecer o concurso formal e fixar a pena-base no mínimo legal.

É o relatório. Decido.

Tendo em vista a permissão contida no art. 317, § 2º, do RISTF, reconsidero a decisão agravada e passo à reanálise dos autos.

1. Embora o presente habeas corpus funcione como sucedâneo de revisão criminal, em razão dos argumentos lançados no agravo regimental, verifico hipótese de constrangimento ilegal a autorizar a concessão do habeas corpus de ofício, nos termos do art. 654, § 2º, do CPP.

2. Análise da possibilidade de concessão da ordem de ofício no caso concreto:

De plano, ressalto que, no tocante à aplicação do concurso formal, não verifico ilegalidade flagrante, passível de autorizar a concessão da ordem de ofício, porquanto o Magistrado de 1º grau entendeu pela aplicação do concurso material em razão da pluralidade de ações, resultados e desígnios, o que encontra respaldo na jurisprudência desta Suprema Corte. Quanto ao ponto, a análise das premissas de tal conclusão demandaria o revolvimento de fatos e provas, providência inviável em sede de habeas corpus.

Além disso, quanto à valoração negativa do motivo do crime ("briga de bar"), considerando que os recorrentes foram pronunciados e condenados pela prática do art. 121, § 2º, II e IV, do CP, é possível a consideração da qualificadora referente ao motivo fútil na primeira etapa da dosimetria, uma vez que o STF já assentou que "[r]econhecidas, pelo Júri, duas qualificadoras, a consideração de uma delas na fixação da pena-base, não caracteriza dupla tomada" ( HC 175151, Relator (a): MARCO AURÉLIO, Primeira Turma).

Noutro giro, muito embora o habeas corpus, a rigor, não comporte conhecimento, por figurar como sucedâneo de revisão criminal, no tocante à culpabilidade, às circunstâncias e consequências do crime depreendo a existência de ilegalidade aferível de pronto, hábil a autorizar a concessão da ordem de ofício, nos termos do art. 654, § 2º, do CPP.

Quanto à dosimetria da pena, a jurisprudência desta Corte é consolidada no sentido de que "o juízo revisional da dosimetria da pena fica circunscrito à motivação (formalmente idônea) de mérito e à congruência lógico- jurídica entre os motivos declarados e a conclusão" ( HC nº 69.419/MS,

Primeira Turma, da relatoria do Ministro Sepúlveda pertence, DJ de 28/8/92).

Não bastasse, merece ponderação o fato de que "é vedado subtrair da instância julgadora a possibilidade de se movimentar com certa discricionariedade nos quadrantes da alternatividade sancionatória" ( HC 97256, Relator (a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 01/09/2010).

Diante desse limite cognitivo, a revisão da dosimetria não permite incursão no quadro fático-probatório, tampouco a reconstrução da discricionariedade constitucionalmente atribuída às instâncias ordinárias. Quando o assunto consiste em aplicação da pena, a atividade do Supremo Tribunal Federal, em verdade, circunscreve-se "ao controle da legalidade dos critérios utilizados, com a correção de eventuais arbitrariedades" ( HC 128446, Relator (a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 15/09/2015).

Efetivamente, como bem ponderam os agravantes, a dosimetria operada pelo Juízo de origem merece reparo na parte em que é manifestamente contrária à jurisprudência desta Corte.

Com efeito, os recorrentes foram condenados pela prática dos crimes de homicídio e tentativa de homicídio, qualificados pelo motivo fútil e pela utilização de recurso que impossibilitou a defesa da vítima.

Na primeira fase da dosimetria da pena, o Juízo singular decidiu por considerar negativamente a culpabilidade do agente, bem como o motivo, as circunstâncias e as consequências do crime, sob a seguinte fundamentação (eDOC.05, p. 1-3, grifei):

"Assim, com base na soberana decisão do Conselho de Sentença, CONDENO, como condenados tenho, os acusados

XXXXXXXXXXXX, já devidamente qualificados, pela prática dos crimes previstos nos arts. 121, § 2º, incs. II e IV, e 121, § 2º, incs. II e IV, c/c os arts. 14, inc. II, 29, 69, todos do Código Penal Brasileiro, e art. 492, inc. I, do Código de Processo Penal. Impõe- se análise indispensável das circunstâncias judiciais ditadas no art. 59, do CPB, para dosimetria e fixação das penas, na forma individualizadora com relação aos réus, na forma que segue.

Com relação a FXXXXXXXXXXXXXXES e a vítima XXXXXXXXXXXXXXs.

Pelo que consta do processo a culpabilidade restou evidenciada e deve ser aferida com extrema reprobabilidade, a considerar a situação de fato em que ocorreu a conduta do acusado.

O réu não responde a outro processo crime. Inexiste informações nos autos acerca de condenação anterior do acusado. Não registra antecedentes criminais.

Demonstra, ainda, personalizada condizente com a do homem comum, com comportamento regular e conduta social sem reprovação, a considerar que durante o período que respondeu ao processo não voltou a delinquir, apesar de se encontrar em liberdade.

As consequências do crime foram graves, em virtude da morte da vítima, que teve sua vida interrompida em plena idade produtiva.

Os motivos do crime foram totalmente definidos nos autos, briga de bar, desfavorecendo o acusado.

As circunstâncias do crime são inaceitáveis e de repercussão social, desfavorecendo ao réu na aplicação da pena.

Por fim, o crime foi praticado em concurso de agente, bem como foram reconhecidas duas circunstâncias qualificadoras, o que não o beneficia.

Assim, sopesadas as circunstâncias judiciais acima ditadas pelo art. 59 do CP, fixo-lhe a pena base além do mínimo legal, em razão das circunstâncias qualificadoras e da conduta do acusado, acima delineada, que, pela maioria dos elementos colhidos, ora descritos, não foi de excessiva reprovação, para o delito em tela, cuja pena varia de 12 (doze) a 30 (trinta) anos de reclusão, ou seja, aplico-lhe a pena base em 15 (quinze) ANOS DE RECLUSÃO, a qual torno-a concreta e definitiva, à míngua de circunstâncias modificadoras da reprimenda.

Com relação ao acusado FXXXXXXXXXXXS e a vítima Victor Maciel Ferreira de Alcântara, tomando por base as circunstâncias judiciais acima ditadas pelo art. 59 do CPB, c/c art. 387 do CPP, fixo-lhe a pena base além do mínimo legal, em razão da circunstância qualificadora e da conduta do acusado, acima delineada, que, pela maioria dos elementos colhidos, ora descritos, não foi de excessiva reprovação, para o delito em tela, cuja pena varia de 12 (doze) a 30 (trinta) anos de reclusão, ou seja, aplico-lhe a pena base em 15 (quinze) ANOS DE RECLUSÃO, diminuindo-a de 1/3 (um terço), em observância aos preceitos estabelecidos no art. 59, acima ditados, e à modalidade do delito imputado ao réu, tomando-a concreta e definitiva, à míngua de circunstâncias modificadoras da reprimenda em 10 (DEZ) ANOS DE RECLUSÃO.

Com relação ao acusado EXXXXXXXXXXXXO a vítima vítima XXXXXXXXXtos.

Pelo que consta do processo a culpabilidade restou evidenciada e deve ser aferida com extrema reprobabilidade, a considerar a situação de fato em que ocorreu a conduta do acusado.

O réu não responde a outro processo crime. Inexiste informações nos autos acerca de condenação anterior do acusado. Não registra antecedentes criminais.

Demonstra, ainda, personalizada condizente com a do homem comum, com comportamento regular e conduta social sem reprovação, a considerar que durante o período que respondeu ao processo não voltou a delinquir, apesar de se encontrar em liberdade.

As consequências do crime foram graves, em virtude da morte da vítima, que teve sua vida interrompida em plena idade produtiva.

Os motivos do crime foram totalmente definidos nos autos, briga de bar, desfavorecendo o acusado.

As circunstâncias do crime são inaceitáveis e de repercussão social, desfavorecendo ao réu na aplicação da pena.

Por fim, o crime foi praticado em concurso de agente, bem como foram reconhecidas duas circunstâncias qualificadoras, o que não o beneficia.

Assim, sopesadas as circunstâncias judiciais acima ditadas pelo art. 59 do CP, fixo-lhe a pena base além do mínimo legal, em razão das circunstâncias qualificadoras e da conduta do acusado, acima delineada, que, pela maioria dos elementos colhidos, ora descritos, não foi de excessiva reprovação, para o delito em tela, cuja pena varia de 12 (doze) a 30 (trinta) anos de reclusão, ou seja, aplico-lhe a pena base em 15 (quinze) ANOS DE RECLUSÃO, a qual torno-a concreta e definitiva, à míngua de circunstâncias modificadoras da reprimenda.

Com relação ao acusado EXXXXXXXXXXXO e a vítima Victor Maciel Ferreira de Alcântara, Tomando por base as circunstâncias judiciais acima ditadas pelo art. 59 do CPB, c/c art. 387 do CPP, fixo-lhe a pena base além do mínimo legal, em razão da circunstância qualificadora e da conduta do acusado, acima delineada, que, pela maioria dos elementos colhidos, ora descritos, não foi de excessiva reprovação, para o delito em tela, cuja pena varia de 12 (doze) a 30 (trinta) anos de reclusão, ou seja, aplico-lhe a pena base em 15 (quinze) ANOS DE RECLUSÃO, diminuindo-a de 1/3 (um terço), em observância aos preceitos estabelecidos no art. 59, acima ditados, e à modalidade do delito imputado ao réu, tomando-a concreta e definitiva, à míngua de circunstâncias modificadoras da reprimenda em 10 (DEZ) ANOS DE

RECLUSÃO.

Adotando-se entendimento pacífico dos Tribunais Pátrios, quanto ao concurso material, a ser aplicado ao caso em concreto, se posicionando nos seguintes termos:" O que distingue o concurso material ou real é a pluralidade de resultados puníveis e decorrentes de duas ou mais ações ou omissões típicas, e cada qual configurando resultado autônomo, mas todas vinculadas pela identidade do sujeito, sendo independente para cada crime o momento executivo "TACRSP (JTACRIM 89/386). Mirabete, Júlio Fabrini. Código Penal Interpretado. São Paulo: Atlas, 1999, p. 397.

Dessa forma, com base no artigo 69 do Código Penal, ADICIONO as penas anteriormente aplicadas aos sentenciados, a consideração do concurso material de crimes concomitantes neste processo, perfazendo o total de 25 (VINTE E CINCO) ANOS DE RECLUSÃO com relação ao réu FXXXXXXXXXXS, e 25 (VINTE E CINCO) ANOS DE RECLUSÃO com relação ao réu EXXXXXXXXXXXXXXO."

Interposto recurso de apelação criminal no TJPE e, posteriormente, agravo em recurso especial no STJ, a defesa sustentou apenas teses de nulidade por violações de regras relativas ao Tribunal do Júri e alegou ser a sentença condenatória manifestamente contrária à prova dos autos, tendo suas pretensões negadas em ambas as instâncias.

Impetrado habeas corpus na Corte de origem para pleitar a reforma da dosimetria da pena, o writ não foi conhecido sob a seguinte fundamentação (eDOC.02, p. 9-10):

"Quanto a alegação de ilegalidades na dosimetria da pena, percebe-se que a sentença condenatória (fls. 63/65) foi objeto da Apelação nº 0188518-5, a qual, à unanimidade, foi julgada improcedente pela 3a Câmara Criminal do TJPE (fls. 34/35).

Como é sabido, o recurso da defesa devolve toda a matéria ao Tribunal, o qual deve analisar todas as possíveis ilegalidades existentes no processo e, se for o caso, conceder, de ofício, a ordem de habeas coreus, nos termos do art. 654, § 2º, do CPP.

Desse modo, observa-se que no julgamento da Apelação no 0188518-5, embora os Apelantes não tenham se insurgido diretamente contra a reprimenda imposta, a dosimetria da pena e a aplicação do instituto do concurso material foram devidamente revisadas no momento da apreciação do pedido referente ao protesto por novo júri, ocasião em que não se vislumbrou qualquer ilegalidade patente no tocante a dosimetria da pena, bem como a aplicação da regra do concurso material, a qual, inclusive, funcionou como óbice para o pedido do apelo.

Ademais, em consulta ao sistema informatizado deste Tribunal, constatou-se que os autos originários encontram-se com remessa ao Superior Tribunal de Justiça, estando a matéria, portanto, afeta à jurisdição superior

Por fim, como bem destacou a Procuradoria de Justiça em seu parecer, observa-se que o impetrante busca, tardiamente, utilizar o writ em substituição de recurso ordinário, o que não é admitido pela jurisprudência."

Inconformada, a defesa interpôs recurso ordinário em habeas corpus no STJ relativo à mesma matéria, que assentou pela impossibilidade de provimento da pretenção, porquanto "o acórdão da origem do recurso de apelação, já foi submetido à apreciação no julgamento do Agravo em Recurso Especial n. 476.540/PE, também de minha relatoria, no qual já proferi decisão com posterior trânsito em julgado", de modo que "esta Corte já esgotou sua jurisdição, não havendo que se falar em nova causa petendi apta a reformar decisão já prolatada".

Como se vê, as questões alusivas à dosimetria da pena não foram

analisadas pelo STJ, tampouco pelo Tribunal local, o que, em regra, impediria o conhecimento da matéria originariamente por esta Suprema Corte.

Contudo, há ilegalidade patente na fixação da reprimenda realizada pelo Juízo de origem no que tange à valoração negativa da culpabilidade, consequências do crime e circunstâncias do delito, o que autoriza a concessão da ordem de ofício.

Os argumentos empreendidos pelo Magistrado, por sua generalidade, não satisfazem a necessidade de motivação das decisões judiciais, razão pela qual merecem reparo.

2.1. Primeiramente, no tocante à culpabilidade e às circunstâncias do crime, o magistrado não indicou os motivos pelos quais considerou a culpabilidade com "extrema reprobabilidade" e as circunstâncias "inaceitáveis e de repercussão social".

Tais fundamentos, por sua generalidade e abstração, não satisfazem a necessidade de motivação das decisões judiciais. Logo, os respectivos vetores, que não estão embasados em dados empíricos e não desbordam dos elementos ínsitos ao crime, devem ser afastados.

Nesse sentido:

"Ausente motivação idônea para valoração negativa da culpabilidade, da conduta social e da personalidade do agente impõe-se seu decotamento da pena-base. 5. O recurso à expressão genérica os elementos demonstram para a majoração da pena-base, sem sua concreta indicação, é incompatível com o dever de motivação expressa. 6. Embora desfavoráveis, os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime, na espécie, não conduzem, por si sós, ao regime prisional mais gravoso, haja vista que o recorrente é primário, tem bons antecedentes e a quantidade de pena imposta autoriza o regime aberto. 7. Recurso não provido. Concessão, de ofício, de ordem de habeas corpus, para o fim de reduzir a pena imposta ao recorrente e fixar o regime inicial aberto."( RHC 123529, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 30/09/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-225 DIVULG 14-11- 2014 PUBLIC 17-11- 2014)

Na mesma linha, merece reprodução o emblemático precedente em que se assentou que "a melhor prova da ausência de motivação válida de uma decisão judicial - que deve ser a demonstração da adequação do dispositivo a um caso concreto e singular - é que ela sirva a qualquer julgado, o que vale por dizer que não serve a nenhum." ( HC 78013, Relator (a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 24.11.1998).

2.2. Quanto às consequências do crime, entendo que a sua desvaloração decorre de aspectos criminais associados ao próprio tipo penal imputado aos recorrentes (art. 121 do CP), de modo que a motivação não explicita as especificidades do caso concreto.

Com efeito, a jurisprudência desta Corte compreende que configura bis in idem a utilização de um mesmo elemento como fundamento para caracterizar a prática delitiva, e simultaneamente, para justificar o recrudescimento da pena-base. Nesse sentido:

"HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSO PENAL. SUBSTITUTIVO DE RECURSO CONSTITUCIONAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ARTIGO 302 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO NACIONAL. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS ELEMENTARES DO DELITO. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. 1. Contra a denegação de habeas corpus por Tribunal Superior prevê a Constituição Federal remédio jurídico expresso, o recurso ordinário. Diante da dicção do art. 102, II, a, da Constituição da Republica, a impetração de novo habeas corpus em caráter substitutivo escamoteia o instituto recursal próprio, em manifesta burla ao preceito constitucional. 2. A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena. Cabe às instâncias ordinárias, mais próximas dos fatos e das provas, fixar as penas. Às Cortes Superiores, no exame da dosimetria das penas em grau recursal, compete o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, bem como a correção de eventuais discrepâncias, se gritantes ou arbitrárias, nas frações de aumento ou diminuição adotadas pelas instâncias anteriores. 3. A ponderação das circunstâncias elementares do tipo no momento da aferição do cálculo da pena-base configura ofensa ao princípio do non bis in idem.

4. A inobservância do dever de cuidado caracterizador da imprudência decorreu da condução do veículo, pelo paciente, em via pública com desrespeito aos limites de velocidade, ocasionando a morte da vítima, circunstâncias elementares do tipo. 4. À míngua de outras circunstâncias judiciais desfavoráveis, a pena-base há de permanecer no mínimo legal.

5. Ordem concedida de ofício."( HC 117599 AgR, Rel. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 14.02.2014, grifei)

"HABEAS CORPUS. PACIENTE CONDENADO EM AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA POR TRIBUNAL ESTADUAL. DECISÃO DA SEXTA TURMA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA -- STJ, QUE NÃO CONHECEU DE WRIT AO FUNDAMENTO DE AINDA SEREM CABÍVEIS EMBARGOS INFRINGENTES, BEM COMO DE NÃO SER POSSÍVEL A UTILIZAÇÃO DE HABEAS CORPUS COMO SUBSTITUTO DE RECURSO ESPECIAL. Patente o constrangimento ilegal por parte da decisão impugnada, seja ao mencionar a interposição de recurso incabível, seja ao condicionar a impetração de habeas corpus à não interposição de recurso especial, diminuindo a envergadura dada pela Carta Magna à ação mandamental. Sempre que houver a possibilidade de concessão do writ ex officio, nos casos em que o constrangimento ilegal se mostrar flagrante, nada obsta que a Turma acolha de pronto o pedido sem a necessidade de remetê-lo ao STJ, evitando, assim, a postergação de seu exame e a conseqüente manutenção desnecessária do constrangimento ilegal já constatado. Hipótese em o acórdão condenatório, para aumentar a pena, considerou exclusivamente o fato de o acusado ser prefeito, afirmando expressamente serem favoráveis as demais circunstâncias judiciais. Sendo a qualidade de prefeito inerente ao tipo inserto no art. , inciso I, do DL n.º 201/67 -- e, como tal, considerada pelo legislador ao estipular os dois anos para sanção mínima --, não pode ser levada em consideração para aumentar a reprimenda, sob pena de bis in idem. Habeas corpus deferido para desde logo reduzir a pena aplicada ao mínimo legal e, em conseqüência, declarar extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, à base da pena concreta, calculada da data do fato à do recebimento da denúncia." ( HC 83510, Relator (a): Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 07.10.2003, grifei)

Efetivamente, conforme acima consignado, não é possível se valer de um elemento inerente ao tipo penal de homicídio (morte da vítima) para, novamente, desvalorar tal fato como consequência do crime. Se os agentes não tivessem provocado a morte das vítimas, a rigor, sequer poderiam ser penalizados, à luz do conceito estratificado de crime. Da mesma forma, o fato de a vítima estar em "plena idade produtiva" é circunstância genérica, sobretudo porque, a respeito da idade da vítima, o legislador optou por conferir maior reprovabilidade somente aos casos de vítimas menores de 14 (quatorze) ou maiores de 60 (sessenta) anos (art. 121, § 4º, CP).

Ademais, observo que o Juízo de origem fixou a mesma pena-base para o homicídio tentado, sem ao menos decotar tal circunstância, e, por conseguinte, redimensionar a pena, considerando que, por óbvio, não houve resultado morte.

Destarte, à vista de tais considerações, resta claro que a fundamentação exarada para o agravamento da pena-base , especificamente quanto às consequências do crime, deve ser afastada por lastrear-se em elementos ínsitos à própria conduta delitiva.

3. Assim, considerando que remanesce a valoração negativa do motivo do crime (segunda circunstância qualificadora), fixo a pena-base em 12 (doze) anos e 09 (nove) meses para ambos os delitos.

Em relação ao crime cometido contra a vítima XXXXXXXXXX , ante a ausência de agravantes e atenuantes, bem como de causas de aumento e de diminuição de pena, torno definitiva a pena de 12 (doze) anos e 09 (nove) meses , em regime inicial fechado, conforme art. 33, § 2º, a, e § 3º, c/c art. 59, ambos do CP.

Em relação ao crime praticado contra a vítima XXXXXXXXXXXa, deve incidir a causa de diminuição de pena na fração de 1/3 aplicada pelo Juízo de origem. Logo, torno definitiva a pena de 08 (oito) anos e 06 (seis) meses de reclusão , em regime inicial fechado, conforme art. 33, § 2º, a, e § 3º, c/c art. 59, ambos do CP.

4. Considerando o somatório das penas em razão do concurso material de crimes, com base no artigo 69 do Código Penal, torno definitiva a pena privativa de liberdade de 21 (vinte e um) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial fechado, conforme art. 33, § 2º, a, e § 3º, c/c art. 59, ambos do CP.

5. Diante do exposto, com fulcro no art. 317, § 2º, do RISTF, reconsidero a decisão agravada e não conheço do writ , mas concedo a ordem, de ofício, a fim de afastar a valoração negativa da culpabilidade, das circunstâncias e das consequências do delito e, consequentemente, fixar a pena-base em 12 (doze) anos e 09 (nove) meses para ambos os delitos e, com base no art. 69 do CP, tornar definitiva a pena privativa de liberdade de 21 (vinte e um) anos e 03 (três) meses, em regime inicial fechado, nos termos do art. 33, §§ 2º, a , e 3º, do CP, para XXXXXXXXXXXXXXX.

Comunique-se, com urgência, ao Juízo da condenação, a quem incumbirá notificar a decisão ao Juízo da Execução Penal.

Publique-se. Intime-se.

Brasília, 31 31 de maio de 2023.

Ministro EDSON FACHIN

Relator

Documento assinado digitalmente

Detalhes

Processo

HC 228017 PE

Partes

AGTE.(S) : ENEDINO DAVI DE SOUZA FILHO AGTE.(S)

Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01/06/2023 PUBLIC 02/06/2023

Julgamento

31 de Maio de 2023

Relator

EDSON FACHIN

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