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2 de Maio de 2024

O Afastamento da Criança e do Adolescente do Convívio Familiar

Como o Direito brasileiro trata o tema.

Publicado por Ana Luiza Castro
há 8 anos

A convivência familiar para a criança e o adolescente é um direito, segundo Antonio Cezar Lima da Fonseca[1], fundamental strictu sensu, ou seja, no mesmo plano do direito à vida e à saúde. Isto porque é no seio familiar que a criança se desenvolve.

Nos dizeres de Maria do Rosário Leite Cintra[2],

É no dia a dia do pequeno núcleo familiar e no círculo mais amplo das relações de vizinhança, de bairro e cidade, na escola e no lazer que a criança e o adolescente vão abrindo para o mundo e assimilando valores, hábitos e modos de superar as dificuldades, de formar o caráter e de se introduzir na vida social.

Conforme prescreve o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90 - ECA), o ambiente familiar deve ser saudável e livre da presença de substâncias entorpecentes. Quando for este o caso, medidas protetivas em favor da criança e contra os genitores podem ser adotadas, mas sempre visando o retorno do menor ao seio familiar assim que sanada a situação de abuso de drogas.

A convivência familiar e a manutenção da criança e do adolescente junto de sua família natural será sempre a prioridade no atendimento: somente após o esgotamento de todas as vias para a recomposição do vínculo familiar sadio é que se partirá para a forma excepcional de convivência familiar, qual seja, a família substituta.

Assim o é por força do princípio da proteção integral, pois entende-se que é junto da família natural que “a criança e o adolescente poderão desenvolver-se plenamente [...][3]”. A convivência familiar é, além de um direito, uma necessidade. Por conta disto que se criou o Plano Nacional de Promoção, Defesa e Garantia do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar, em 2004.

Logo no texto em que se apresentam os antecedentes que levaram à criação do plano, tem-se determinada a política de proteção ao vínculo familiar[4]:

Crianças e adolescentes têm o direito a uma família, cujos vínculos devem ser protegidos pela sociedade e pelo Estado. Nas situações de risco e enfraquecimento desses vínculos familiares, as estratégias de atendimento deverão esgotar as possibilidades de preservação dos mesmos, aliando o apoio socioeconômico à elaboração de novas formas de interação e referências afetivas no grupo familiar. No caso de ruptura desses vínculos, o Estado é o responsável pela proteção das crianças e dos adolescentes, incluindo o desenvolvimento de programas, projetos e estratégias que possam levar à constituição de novos vínculos familiares e comunitários, mas sempre priorizando o resgate dos vínculos originais ou, em caso de sua impossibilidade, propiciando as políticas públicas necessárias para a formação de novos vínculos que garantam o direito à convivência familiar e comunitária.

Este instrumento entende também que para a preservação dos vínculos familiares é preciso compreender que o modelo de família atualmente está mudado. Novos arranjos familiares surgiram além daquele patriarcal típico de quando o Estatuto da Criança e do Adolescente nasceu:

As mudanças nas configurações familiares estão diretamente relacionadas ao avanço científico e tecnológico bem como às alterações vividas no contexto político, jurídico, econômico, cultural e social no qual a família está inserida. Historicamente, a família nuclear tem co-existido com diversas outras formas de organizações familiares – famílias monoparentais, chefiadas pela mulher ou pelo homem; descasadas; recasadas; com membros de diferentes gerações; casais homossexuais, entre outros.

Nesta mesma toada prescreve a Lei n. 12.010 de 2009[5]:

Art. 1o Esta Lei dispõe sobre o aperfeiçoamento da sistemática prevista para garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes, na forma prevista pela Lei no8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e do Adolescente. § 1o A intervenção estatal, em observância ao disposto no caput do art. 226 da Constituição Federal, será prioritariamente voltada à orientação, apoio e promoção social da família natural, junto à qual a criança e o adolescente devem permanecer, ressalvada absoluta impossibilidade, demonstrada por decisão judicial fundamentada.

Por tal razão, antes de o Estado intervir no núcleo familiar, deverá compreender as particularidades de cada modelo de família, refutando a ideia de “família ideal”, permanecendo, entretanto, sempre atento à preservação dos direitos da criança e do adolescente. Somente em último caso é que os infantes e o jovens serão levados à acolhimento institucional, podendo ter seu vínculo com sua família original excluídos definitivamente.

1.1 o afastamento do convívio familiar

1.1.1 Poder Familiar

Com a Lei 12.010, de 2009, a antiga expressão “pátrio poder” foi substituída pela expressão “poder familiar”. Isto porque os direitos e deveres inerentes aos pais sobre os filhos são atualmente exercidos em igualdade de condições, não havendo mais a figura do “chefe de família”, sendo este o entendimento do § 5º do art. 226 da CF/88: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.

Segundo o entendimento de Luiz Paulo Vieira de Carvalho,

Em virtude do hoje princípio constitucional da igualdade entre os sexos, entre nós o poder familiar abrandou-se, deixando de revestir aquele caráter quase absoluto nos moldes do diploma civil anterior, passando a ser exercido por ambos os pais visando primordialmente à proteção e à satisfação dos interesses dos filhos, em especial quanto ao indispensável convívio familiar, base angular do direito à afetividade [...].

O poder familiar pode ser definido como “[...] o conjunto de direitos e deveres que são atribuídos aos pais em relação às pessoas e aos bens dos filhos não emancipados, para sua proteção[6].” É exercido simultaneamente pelo pai e pela mãe, sendo-lhes assegurado o direito de recorrer ao Poder Judiciário sempre que houver necessidade ou discordância efetiva em relação ao interesse da criança[7].

Segundo Marco Aurélio S. Viana[8],

O pátrio poder é exercido no sentido de proteção da prole, cumprindo aos pais assegurar o desenvolvimento integral da criança e do adolescente, de forma que atinjam a idade adulta cercado de todos os cuidados adequados.

Os artigos 21 e 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelecem as obrigações dos pais para com seus filhos, sendo que, segundo com este último, “aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”.

O ECA estabelece ainda que a falta de recursos materiais por si só não dará causa à extinção do poder familiar, conforme prescreve seu art. 23:

Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar. Parágrafo único. Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de auxílio.

Quando houver insuficiência de recursos nas famílias, cabe ao Estado prestar-lhes por meio de programas sociais o apoio necessário para assegurar condições de atendimento às necessidades básicas dos infantes e jovens[9].

1.1.2 Suspensão ou extinção do poder familiar

A suspensão ou a extinção do poder familiar são medidas últimas e drásticas, sendo a mais grave sanção imposta aos genitores quando ocorre a violação dos direitos das crianças e adolescentes.

Distinguem-se entre si pela duração: a suspensão se trata de medida provisória, podendo ser restaurada assim que sanada o situação que a deu causa, enquanto que a extinção se caracteriza por ser definitiva. Também distinguem-se pela gravidade do fato as enseja[10].

O Código Civil arrola casos em que o Poder Judiciário poderá privar os genitores de seu exercício temporariamente, por prejudicar seu filho com seu comportamento[11]:

Art. 1.637: Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha. Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.

De caráter transitório, a suspensão poderá ocorrer de forma liminar ou incidental[12], sendo possível requerer tutela antecipada para afastamento do agressor do convívio familiar.

A extinção ou perda do poder familiar, por sua vez, se dará na ocorrência das hipóteses previstas no art. 1.638, também do Código Civil:

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; II - deixar o filho em abandono; III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

O rol previsto na lei civil não é taxativo. A ocorrência reiterada de faltas puníveis com suspensão podem levar também à destituição, pois, segundo Maria Helena Diniz, indicam a “impossibilidade de uma perspectiva de vida melhor e da melhora da conduta do pai e da mãe”[13].

A extinção do poder familiar sempre será decretada judicialmente, mediante procedimento contraditório, “nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações[14]” que incumbem aos pais e resultará na exclusão de qualquer direito ou dever destes sobre o filho. Pode, entretanto, ser reestabelecida quando houver a regeneração do genitor excluído[15].

1.1.3 Política de atendimento à criança e ao adolescente

Como se extrai do art. 86 do ECA, a execução de políticas para a defesa dos interesses de crianças e adolescentes se dará através de “conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios”.

Para que fosse possível atingir o objetivo buscado pelo Estatuto, entendeu o legislador pela criação de um rol de ações a serem tomadas no atendimento infanto-juvenil[16]:

Art. 87. São linhas de ação da política de atendimento: I - políticas sociais básicas; II - políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, para aqueles que deles necessitem; III - serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão; IV - serviço de identificação e localização de pais, responsável, crianças e adolescentes desaparecidos; V - proteção jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente; VI - políticas e programas destinados a prevenir ou abreviar o período de afastamento do convívio familiar e a garantir o efetivo exercício do direito à convivência familiar de crianças e adolescentes; VII - campanhas de estímulo ao acolhimento sob forma de guarda de crianças e adolescentes afastados do convívio familiar e à adoção, especificamente inter-racial, de crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos.

Embora a atuação se dê de forma conjunta entre os entes da Federação, a atuação direta será municipal. Caberá ao Município a gestão e a execução de políticas e à União exercerá poder de coordenação e elaboração de normais gerais[17]. Neste sentido, o ECA prescreveu a criação de Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente:

Art. 88. São diretrizes da política de atendimento: I - municipalização do atendimento; II - criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal, estaduais e municipais; III - criação e manutenção de programas específicos, observada a descentralização político-administrativa; [...]

Isto porque há a previsão da descentralização do atendimento, cabendo, portanto ao Município precipuamente a tarefa de organizar e instituir sua política de atendimento à criança e ao adolescente, seguindo as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), instituído pela Lei nº 8.242/1991.

Para Maria Inês França Ardigó[18],

Os Conselhos de Direitos têm caráter deliberativo e controlador das ações, e são organizados nas três esferas do Poder Público. Esse novo arranjo institucional vem assegurar legitimidade à participação da sociedade civil em fóruns, no controle social dessas políticas, de acordo com o ECA, Livro II, Título I, que trata da Política de Atendimento, artigo 88, § 2º [...].

Desta forma, o CONANDA é instância máxima na formulação, deliberação e controle das políticas públicas destinadas à criança e adolescente, exercendo também papel fiscalizador sobre os Conselhos estaduais e municipais.

Além disso, compete aos Conselhos Municipais o registro e a responsabilidade pelas entidades de atendimento governamentais e não governamentais, e a inscrição dos programas a serem exercidos. Tão logo seja efetuada o registro e a inscrição, deverá o Conselho Municipal informar o Poder Judiciário e o Conselho Tutelar para que tomem ciência das políticas ofertadas[19].

Como se viu, a responsabilidade pelas entidades de atendimento à criança e ao adolescente, incluindo-se as instituições de acolhimento, são dos Conselhos Municipais. Daí que não poderão permitir que instituições inaptas a proteger os jovens e infantes consigam seu registro[20]. Para tanto, o ECA elencou hipóteses onde o registro e a inscrição serão negados:

Art. 91. As entidades não-governamentais somente poderão funcionar depois de registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, o qual comunicará o registro ao Conselho Tutelar e à autoridade judiciária da respectiva localidade. § 1o Será negado o registro à entidade que a) não ofereça instalações físicas em condições adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança; b) não apresente plano de trabalho compatível com os princípios desta Lei; c) esteja irregularmente constituída; d) tenha em seus quadros pessoas inidôneas. E) não se adequar ou deixar de cumprir as resoluções e deliberações relativas à modalidade de atendimento prestado expedidas pelos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, em todos os níveis disposto no § 1o. § 2o O registro terá validade máxima de 4 (quatro) anos, cabendo ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, periodicamente, reavaliar o cabimento de sua renovação, observado o disposto no § 1odeste artigo.

E, ainda de acordo com o artigo acima transcrito, o registro das entidades não governamentais terá validade máxima de quatro anos, cabendo ao Conselho Municipal reavaliar o cabimento da sua renovação, atentando-se aos critérios anteriormente mencionados.

Por fim, vale mencionar que, caso no Município não haja um Conselho de Direito da Criança e do Adolescente, tal atribuição será exercida pelo Poder Judiciário (art. 261 ECA).

1.1.4 Modalidades de acolhimento institucional

Embora a convivência familiar seja de grande importância para jovens e infantes, nem sempre é no seio da família que estarão disponíveis as condições ideais para o seu desenvolvimento sadio. Isto porque muitas famílias não têm estrutura para a criação de seus filhos, ou não querem tal encargo, levando à institucionalização de crianças e adolescentes.

O atendimento previsto no ECA varia de acordo com a situação de cada criança e adolescente e sua família, com a aplicação de medidas de proteção, isoladas ou cumuladas[21], havendo casos em que os laços familiares não precisam ser rompidos. O art. 90 do Estatuto traz os regimes em que as crianças e adolescente serão atendidos: orientação e apoio sócio-familiar; apoio sócio-educativo em meio aberto; colocação familiar; acolhimento institucional; prestação de serviços à comunidade; liberdade assistida; semiliberdade; e internação.

Segundo a definição do Ministério do Desenvolvimento Social,

O Serviço de Acolhimento Institucional é o acolhimento em diferentes tipos de equipamentos, destinado a famílias e/ou indivíduos com vínculos familiares rompidos ou fragilizados, a fim de garantir proteção integral. A organização do serviço deverá garantir privacidade, o respeito aos costumes, às tradições e à diversidade de: ciclos de vida, arranjos, raça/etnia, gênero e orientação sexual. O atendimento prestado deve ser personalizado e em pequenos grupos e favorecer o convívio familiar e comunitário, bem como a utilização e serviços disponíveis na comunidade local. As regras de gestão e de convivência deverão ser construídas de forma participativa e coletiva, a fim de assegurar a autonomia dos usuários, conforme perfis[22].

Não obstante haja a internação de menores infratores, para os fins deste trabalho serão consideradas apenas as hipóteses de acolhimento institucional em que há o distanciamento do vínculo com a família natural por medida de proteção e em situação de risco pessoal e social, onde famílias ou responsáveis encontrem-se temporariamente impossibilitados de cumprir sua função de cuidado e proteção.

Para Bruna Vieira Coradine e Anarita Araújo da Silveira,

Entendem-se estarem em situação de risco pessoal e social aquelas crianças e aqueles adolescentes expostos à violência sexual, física e psicológica, abuso, situação de rua, trabalho infantil, uso abusivo de substâncias psicoativas [...][23].

Quando verificada a situação de risco pessoal e social, por iniciativa do Conselho Tutelar ou do Poder Judiciário, medidas protetivas de acolhimento poderão ser propostas, ensejando as ações competentes para suspensão ou perda do poder familiar[24].

1.1.4.1 Medida de colocação familiar (ECA, art. 90, III)

Conforme já dito, explorar-se-ão aquelas medidas de acolhimento que visam afastar a crianças ou o adolescente de um ambiente familiar hostil.

A colocação familiar visa atender aqueles menores privados, temporária ou definitivamente, do convívio com sua família natural. Implica no encaminhamento da criança ou adolescente à uma família acolhedora, previamente cadastrada e preparada, que servirá como uma forma de transição à reinserção familiar ou à colocação de família substituta[25].

Tal medida não se configura como acolhimento institucional propriamente dito, pois se realiza em ambiente familiar e trata-se de medida preferencial em relação ao primeiro. É de caráter temporário e excepcional e coordenado por instituições responsáveis[26].

1.1.4.2 Medida de acolhimento institucional (ECA, art. 90, IV)

Realizado em entidade de atendimento voltado à jovens e infantes com necessidade de afastamento provisório ou definitivo de sua família natural, o acolhimento institucional pode ser oferecido em diversas instituições: casa-lar; casa de passagem; acolhimento institucional para pequenos grupos; orfanatos etc[27].

O abrigamento em instituição também é medida de proteção constitucional para que não haja crianças ou adolescentes morando na rua, expostos ao consumo de drogas, à mendicância ou exploração por adultos[28]. A iniciativa para aplicação da medida partirá do Conselho Tutelar assim que verificar a vulnerabilidade de adolescentes e crianças, dando imediato conhecimento à autoridade judiciária.

De acordo com o art. 92 do ECA, o responsável pela entidade de acolhimento obterá a guarda legal de todos aqueles ali abrigados, guiando-se pelos seguintes princípios: preservação dos vínculos familiares e promoção da reintegração familiar (inciso I); integração em família substituta, quando esgotados os recursos de manutenção na família natural ou extensa (inciso II); atendimento personalizado e em pequenos grupos (inciso III); desenvolvimento de atividades em regime de co-educação (inciso IV); não desmembramento de grupos de irmãos (inciso V); evitar, sempre que possível, a transferência para outras entidades de crianças e adolescentes abrigados (inciso VI); participação na vida da comunidade local (inciso VII); preparação gradativa para o desligamento (inciso VIII) e participação de pessoas da comunidade no processo educativo (inciso IX).

Ainda que a regra para acolhimento determine que a iniciativa para do Conselho Tutelar ou pela autoridade judiciária, o art. 93 do ECA estabelece a hipótese do acolhimento emergencial, prevendo a urgência de determinados casos:

Art. 93. As entidades que mantenham programa de acolhimento institucional poderão, em caráter excepcional e de urgência, acolher crianças e adolescentes sem prévia determinação da autoridade competente, fazendo comunicação do fato em até 24 (vinte e quatro) horas ao Juiz da Infância e da Juventude, sob pena de responsabilidade. Parágrafo único. Recebida a comunicação, a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público e se necessário com o apoio do Conselho Tutelar local, tomará as medidas necessárias para promover a imediata reintegração familiar da criança ou do adolescente ou, se por qualquer razão não for isso possível ou recomendável, para seu encaminhamento a programa de acolhimento familiar, institucional ou a família substituta, observado o disposto no § 2o do art. 101 desta Lei.

Faz parte da política proposta pelo ECA o caráter provisório do abrigamento institucional, pautada no princípio da excepcionalidade do acolhimento, e o atendimento da família natural do abrigado, visando sempre a reinserção da criança e do adolescente ao seu ambiente familiar ou, em último caso, em família substituta. Tal política está embasada justamente no preceito constitucional de que a família é a base da sociedade[29] e de que sempre será mais benéfico ao jovem e à criança a vida em família[30].

Referências

[1]FONSECA. Antonio Cezar Lima da. Direitos da criança e do adolescente. P. 65.

[2]Maria do Rosário Leite Cintra Apud NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. P.73

[3]FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Direitos da criança e do adolescente. P. 67.

[4]BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Plano nacional de promoção, proteção e defesa do direito de crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária. Disponível em <http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/planonacional_direitocriancas>. Acesso em 14 de fevereiro de 2014.

[5]BRASIL. Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. Dispõe sobre adoção; altera as Leis nos 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente, 8.560, de 29 de dezembro de 1992; revoga dispositivos da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, e da Consolidação das Leis do TrabalhoCLT. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12010.htm> Acesso em 14 de fevereiro de 2014.

[6]NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. P. 75.

[7]Art. 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

[8]VIANA. Marco Aurélio S. Da guarda, da tutela e da adoção. 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. P. 30.

[9]NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. P. 76.

[10]MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. 6ª ed. São Paulo: Saraiva. 2013. P. 189.

[11]DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 5º volume: direito de família. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. P. 525.

[12]Art. 157 do Estatuto da Criança e do Adolescente

[13]DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 5º volume: direito de família. P. 529.

[14]Art. 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

[15]CARVALHO, Luiz Paulo Vieira de. Direito Civil: questões fundamentais e controvérsias na parte geral, no direito de família e no direito das sucessões. 4. Ed. Niterói: Impetus, 2010. P. 238.

[16]MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. P. 381.

[17]NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. P. 161

[18]ARDIGÓ, Maria Inês França. Estatuto da criança e do adolescente: direito e deveres. Leme: editora Cronus, 2009. P. 80-81.

[19]MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. P. 453.

[20]DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 5º volume: direito de família. P. 635.

[21]MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. P. 646.

[22]BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social. Acolhimento Institucional: o que é acolhimento institucional. Disponível em <www.mds.gov.br> Acesso em 17 de fevereiro de 2014.

[23]CORADINE, Bruna Vieira e SILVEIRA, Anarita Araújo da. (Des) judicialização das demandas de crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social: em busca da concretização de direitos infanto-juvenis. in: PES. João Hélio Ferreira (coord.). Direitos humanos: crianças e adolescentes. Curitiba: Juruá. 2012. P. 241

[24]DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 5º volume: direito de família. P. 638.

[25]MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. P. 412.

[26]FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Direitos da criança e do adolescente. P. 101.

[27]MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. P. 413.

[28]NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. P. 199.

[29]“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado [...]”. BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988.

[30]ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: doutrina e jurisprudência. P. 233.

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