Página 749 do Diário de Justiça do Estado do Maranhão (DJMA) de 18 de Setembro de 2019

SENHOR DESEMBARGADOR JOSEMAR LOPES DOS SANTOS): "Não estando vedada pelo ordenamento jurídico, é lícita a contratação de quaisquer modalidades de mútuo financeiro, de modo que, havendo vício na contratação, sua anulação deve ser discutida à luz das hipóteses legais que versam sobre os defeitos do negócio jurídico (CC, arts. 138, 145, 151, 156, 157 e 158) e dos deveres legais de probidade, boa-fé (CC, art. 422) e de informação adequada e clara sobre os diferentes produtos, especificando corretamente as características do contrato (art. , IV e art. , III, do CDC), observando-se, todavia, a possibilidade de convalidação do negócio anulável, segundo os princípios da conservação dos negócios jurídicos (CC, art. 170)". Passo ao mérito, observando as teses jurídicas firmadas no referido IRDR e transfiro a análise das preliminares para o mérito, com fulcro na teoria da asserção, haja vista a necessidade de se analisar a documentação probatória juntada aos autos. Da análise das provas documentais apresentadas em juízo, o banco demandado não comprovou o ato impeditivo e modificativo do direito do consumidor/autor (CPC, art. 373, II), e que houve a contratação do empréstimo consignado, haja vista que sequer procedeu a juntada do instrumento do contrato de empréstimo consignado devidamente assinado pelo demandante, tampouco foram juntados meios de prova ordinários que indiquem o recebimento dos valores pelo demandante, quais sejam: juntada do contrato, documentos pessoais da demandante e eventual comprovante do crédito em benefício do demandante. Além disso, é cabível a repetição do indébito em dobro nos casos de empréstimos consignados quando a instituição financeira não conseguir comprovar a validade do contrato celebrado com a parte autora, restando configurada má-fé da instituição, resguardas as hipóteses de enganos justificáveis, o que não foi comprovado nos autos.Logo, verifico que assiste razão à parte autora que comprovou a existência, através dos documentos anexados aos autos que houveram descontos indevidos nos seus proventos em razão de suposto empréstimo consignado, conforme narrado nos autos, sem havido qualquer manifestação da demandante neste sentido, razão pela qual deve ser restituído no dobro da quantia paga indevidamente.Em sendo assim, entendo pela aplicação no caso dos autos do art. 42, parágrafo único do CDC, senão vejamos: "Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável." Outrossim, entendo que a demandada não comprovou o fato da demandante ter realmente assinado qualquer contrato, trazendo aos autos apenas afirmações vagas e gerais em sua peça contestatória, sem qualquer possibilidade de comprovar suas alegações. Inclusive não apresentou o contrato firmado entre as partes, restando precluso o momento oportuno de apresentação conforme reza a Lei dos Juizados. Em sendo assim, entendo que o consumidor demandante nunca teve acesso ao contrato, razão pela qual não deve ser obrigado ao cumprimento de suas cláusulas, nos termos do art. 46 do CDC: "Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance." Portanto, entendo que deve ser garantido à parte autora a restituição dos valores pagos indevidamente, em dobro, devidamente corrigidos, bem como ser declarada a nulidade do contrato em razão da ausência de conhecimento pelo consumidor. Passo à análise da ocorrência dos danos morais. Cumpre, ab initio, perquirir-se a acepção da palavra DANO. Consoante a assertiva propalada por José de Aguiar Dias: "O conceito de dano é único, e corresponde à lesão de um direito". Por MORAL, na dicção de Luiz Antônio Rizzatto Nunes, entende-se "... tudo aquilo que está fora da esfera material, patrimonial do indivíduo". Destarte, DANO MORAL exprime sofrimento, "dor", é uma lesão que atinge o indivíduo em seu patrimônio íntimo, extrapatrimonial, eis que atingido o psíquico, o intelecto ou o físico de uma pessoa, sendo, no presente caso, pessoa física, já que a pessoa jurídica também está sujeita a experimentar danos morais. Neste sentido, preleciona, Yussef Said Cahali: "Dano moral, portanto, é a dor resultante da violação de um bem juridicamente tutelado, sem repercussão patrimonial. Seja dor física - dor-sensação, como a denomina Carpenter - nascida de uma lesão material; seja a dor moral - dor-sentimento, de causa imaterial". É consentâneo salientar que a reparação de danos morais exerce função distinta daquela dos danos materiais. Tem-se por escopo oferecer uma espécie de compensação ao lesado a fim de atenuar seu sofrimento (caráter satisfativo). No que tange à figura do lesante, objetiva-se com a fixação do quantum indenizatório, aplicar-lhe uma sanção para que seja desestimulado a praticar atos lesivos à personalidade de outrem, daí exsurge o caráter punitivo da reparação dos danos morais. Desse modo, o valor da reparação assume um duplo objetivo, qual seja, satisfativo-punitivo. Contudo, no caso dos autos, entendo que não restou comprovada a existência do dano moral sofrido pelo demandante, haja vista que entendo que houve mero aborrecimento nas relações diárias entre os particulares não passível de ensejar violação na esfera íntima da parte autora a caracterizar o ressarcimento por violação em sua esfera íntima. Outrossim, é temerário o reconhecimento do dano moral em casos de desfalque nos rendimentos mensais dos cidadãos, sob pena de banalizar o real sentido do dano moral que é o restabelecimento da violação aos direitos da personalidade dos indivíduos, bem como o uso indevido do Poder Judiciário para o enriquecimento ilícito em casos que não houve prejuízo à esfera íntima do indivíduo, não adotando o sistema brasileiro pátrio os denominados danos punitivos (punitive demage). III - DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo demandante e extingo o processo, com resolução de mérito, em desfavor do BANCO BRADESCO S/A, nos termos do art. 487, I, do NCPC, e declaro a nulidade do contrato de empréstimo consignado 011320271, bem como condeno o demandado, ao pagamento em dobro dos valores cobrados indevidamente, a título de indenização pelos danos materiais sofridos, (02/2013 a 11/2018) que totaliza o montante de R$ 1.948,80 - (valor correspondente ao dobro dos descontos indevidos), acrescidos de juros de mora de 1% ao mês e correção monetária com base no INPC, a partir da data da citação. Transitada em julgado, arquive-se, com baixa. Sem custas e honorários. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Buriticupu, 27 de agosto de 2019.RAPHAEL LEITE GUEDESJUIZ DE DIREITO TITULAR Resp: 183160

PROCESSO Nº 000XXXX-11.2016.8.10.0028 (27222016)

AÇÃO: PROCEDIMENTO DE CONHECIMENTO | PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL

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