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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça do Paraná TJ-PR - Apelação: APL XXXXX-36.2020.8.16.0149 Salto do Lontra XXXXX-36.2020.8.16.0149 (Acórdão)

Tribunal de Justiça do Paraná
há 3 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

2ª Câmara Criminal

Publicação

Julgamento

Relator

Francisco Cardozo Oliveira

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-PR_APL_00009823620208160149_dbcd3.pdf
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Ementa

APELAÇÃO CRIME – DELITOS DE RESISTÊNCIA (ART. 329, CP) E AMEAÇA (ART. 147, CP)– PLEITO DE ABSOLVIÇÃO COM A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO - ACUSADO QUE FOI ABORDADO POR POLICIAIS NO CUMPRIMENTO DE MANDADO DE PRISÃO E, DEPOIS DE PRESO, ALGEMADO E CONDUZIDO NA VIATURA, TERIA PROFERIDO AMEAÇAS E ESBOÇADO RESISTÊNCIA A PRISÃO NO DESTACAMENTO DA POLÍCIA MILITAR – AUSÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES A AMPARAR A CONDENAÇÃO – OITIVA DOS INFORMANTES E DO ACUSADO QUE CONTRADIZEM AS DECLARAÇÕES DOS POLICIAIS MILITARES – DESDOBRAMENTO DOS FATOS NARRADOS QUE PROVOCA DÚVIDA RAZOÁVEL SOBRE A MATERIALIDADE DOS DELITOS INVESTIGADOS - ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO COM BASE DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 2ª C.

Criminal - XXXXX-36.2020.8.16.0149 - Salto do Lontra - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU FRANCISCO CARDOZO OLIVEIRA - J. 02.09.2021)

Acórdão

RELATÓRIO1. O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia em 12/05/2020 contra Adriano dos Santos pela suposta prática dos delitos previstos nos artigos 329, caput, (Fato 01 - resistência) e 147, caput, do Código Penal (Fato 02 - ameaça), na forma do artigo 69 do Código Penal (concurso material), conforme a seguinte narrativa fática (mov. 34.2 – autos de origem):‘’FATO 1 (RESISTÊNCIA) Na data de 08 de maio de 2020, por volta das 22h45min, na Rua Pedro Bernardi, nº 109, Centro, no Município e Comarca de Salto do Lontra/PR, o denunciado, ADRIANO DOS SANTOS, agindo com consciência e vontade, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, opôs-se a execução de ato legal mediante violência a funcionário público competente para a sua execução, ao investir com socos e chutes contra os policiais que atenderam a ocorrência (Ronaldo Machado e Jonir Jorge Palavesini), ao realizarem o cumprimento de mandado de prisão expedido pelo Juízo da Vara Criminal da Comarca de Salto do Lontra/PR, conforme narra o boletim de ocorrência nº 2020/479546 (mov. 1.12) e termo de declaração dos policiais militares (mov. 1.4 e 1.5). FATO 02 (AMEÇA) Nas mesmas circunstâncias de tempo e local descritas no FATO 1, o denunciado ADRIANO DOS SANTOS, agindo com consciência e vontade, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, ameaçou, por palavras, causar mal injusto e grave aos policiais que atenderam a ocorrência (Ronaldo Machado e Jonir Jorge Palavesini), ao dizer, em tom intimidador, que “as coisas não ficariam assim” e que “já deu muito tiro na cabeça”, conforme narra o boletim de ocorrência nº 2020/479546 (mov. 1.12) e termo de declaração dos policiais militares (mov. 1.4 e 1.5).’’A prisão em flagrante, executada em 09/05/2020, foi convertida em preventiva no mesmo dia (mov. 12.1 – autos de origem).A denúncia foi recebida em 13/05/2020 e o acusado apresentou resposta à acusação (movs. 45.1 e 60.1 – autos de origem).Deferiu-se o pleito do acusado relativo ao fornecimento das imagens de câmera de vigilância do Supermercado Penso e do Batalhão de Polícia Militar do Município de Salto do Lontra, referentes ao dia do cumprimento do mandado de prisão (mov. 78.1 – autos de origem).O denunciado pediu a busca e apreensão de câmeras em posse dos policiais que executaram a prisão, além dos sistemas de armazenamento de vídeo do Supermercado Penso e do Destacamento da Polícia Militar de Salto do Lontra, o que foi indeferido (mov. 89.1 e 98.1 – autos de origem).O Batalhão de Polícia Militar do Município de Salto do Lontra informou que as imagens de câmeras de vigilância ficam armazenadas pelo prazo de 9 (nove) dias, o que impede o acesso às gravações em razão do decurso do tempo, enquanto o Supermercado Penso também informou a impossibilidade de acesso devido ao decurso do prazo de 30 (trinta) dias (mov. 91.1, 141.1 e 177.1 – autos de origem).A audiência de instrução foi realizada em 18/08/2020, em que foram ouvidas as supostas vítimas Ronaldo Machado e Jonir Jorge Palavesini, os informantes Marines Chagas e Marcio Antonio Mendes (mov. 192 – autos de origem), e o interrogatório do acusado em 24/08/2020 (mov. 201.2 – autos de origem).O Ministério Público e a defesa apresentaram alegações finais (movs. 206.1, 211.1, 263.1 – autos de origem). Sobreveio sentença que condenou o requerido por infração ao artigo 329, caput, e ao artigo 147, ambos do Código Penal na pena privativa de liberdade de 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de detenção, em regime inicial semiaberto (mov. 266.1 – autos de origem).Adriano dos Santos interpôs recurso de Apelação Crime.Nas razões de apelação busca-se a reforma da sentença sob os seguintes argumentos: i) há cerceamento de defesa em razão da ausência de acesso às imagens de câmera de segurança que comprovam o que houve no momento da suposta consumação dos delitos; ii) o acusado deve ser absolvido, devido à ausência de comprovação de dolo e à fragilidade da narrativa dos Policiais Militares, cujas versões não são uníssonas e contradizem o teor do Boletim de Ocorrência, do vídeo juntado aos autos (mov. 194) e do laudo (mov. 44.2); iii) os agentes públicos, de posse de um mandado judicial conduziram o acusado ao Destacamento da Polícia Militar, o que configura ilegalidade e foi demonstrado por vídeo de posse da Corporação, ao qual não teve acesso; iii) há insuficiência probatória para subsidiar a condenação, pois não resistiu ao cumprimento da ordem judicial, tampouco ameaçou os agentes públicos; iv) inexiste certeza quanto à ocorrência dos fatos ou mesmo a autoria, não tendo o Ministério Público se desincumbido de comprovar os fatos delituosos imputados ao acusado, razão pela qual deve ser aplicado o princípio in dubio pro reo (mov. 285.1 – autos de origem).O Ministério Público do Estado do Paraná apresentou contrarrazões para pleitear o conhecimento e desprovimento do recurso (mov. 290.1 – autos de origem). A Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer subscrito pelo Procurador de Justiça José Carlos Dantas Pimentel Júnior, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (mov. 12.1) O acusado pleiteou a revogação da prisão preventiva, enquanto o Ministério Público se manifestou pela manutenção da segregação cautelar (mov. 15.1 e 21.1).O pedido foi indeferido, sob o fundamento de que os motivos que ensejaram a custódia provisória ainda se fazem presentes, sendo a sua manutenção medida que se impõe, sobretudo porque o acusado é multirreincidente (mov. 24.1). ADMISSIBILIDADE2. O recurso é tempestivo, o que se extrai do cotejo entre a data de intimação da sentença, em 29/01/2021 (mov. 276 – autos de origem), e a data de interposição do recurso, em 01/02/2021 (mov. 277.1 – autos de origem) Deste modo, presentes os pressupostos de admissibilidade objetivos e subjetivos, o recurso comporta conhecimento.FUNDAMENTAÇÃO 3. Trata-se de Apelação Crime nº XXXXX-36.2020.8.16.0149, originários da Vara Criminal da Comarca de Salto do Lontra, em que figuram como apelante Adriano dos Santos e apelado Ministério Público do Estado do Paraná.3.1. Adriano dos Santos sustenta no recurso de Apelação Crime que deve ser absolvido devido à insuficiência de provas da consumação dos delitos de ameaça e resistência. A solução normativa do recurso, neste aspecto, reclama em um primeiro momento a análise e valoração do conjunto probatório.Houve a juntada aos autos do Auto de Prisão em Flagrante (mov. 1.3 – autos de origem), Boletim de Ocorrência nº 2020/479546 (mov. 1.12 – autos de origem), além das oitivas das testemunhas. Para analisar a coerência entre os elementos probatórios, convém colacionar o teor do Boletim de Ocorrência, que atesta em 08/05/2020 que a equipe policial realizou o cumprimento de mandado de prisão contra o acusado, quando então supostamente houve a resistência à ordem dos policiais e as ameaças (mov. 1.12 – autos de origem):A testemunha Ronaldo Machado, policial militar, confirmou a narrativa fática veiculada na denúncia (mov. 192.4 e 266.1- autos de origem): ‘’Que realizavam patrulhamento, quando visualizaram um Gol e dentro estava o requerido; sabiam que havia contra o mesmo um mandado de prisão; foi dada voz de abordagem e foi acatada; comunicada a prisão, o mesmo foi algemado e colocado no local apropriado da viatura; quando chegaram ao destacamento, ao abrir a porta da viatura, ele tinha tirado a algema e tentou fugir e agredir a equipe policial; no local também estava a companheira do réu, a qual começou a discutir com ele porque tinha visto uma mensagem com outra mulher; como foi necessário contê-lo e este começou a resistir, como socos e chutes, à atuação policial e ameaçou os policiais; o acusado também ameaçou os policiais dizendo que as coisas não ficariam assim e que já tinha dado muito tiro na cabeça quando foi levado à Delegacia, ao entrar na carceragem, tentou cuspir na face do depoente; pelo acusado também foi dito que conhecia o sistema e diria na audiência de custódia que foi agredido e torturado com saco plástico; os policiais não sofreram lesões, pois no momento em que tentou atacar a equipe, foi utilizado o spray de pimenta; os fatos ocorreram no destacamento, no momento da lavratura do B.O. e na Delegacia e Polícia; sentiram receio da ameaça proferidas pelo acusado, principalmente por conhecer o histórico policial do mesmo; as câmeras do destacamento estão voltadas para a via pública; a resistência ocorreu próximo a porta de acesso e, por isso, as câmeras não filmaram; na parte do supermercado não houve resistência; tem imagens do acusado, quando da lavratura do B.O., que demonstra que ele não foi agredido e, ainda, que dispensou atendimento médico; no veículo com o réu, tinham duas pessoas; antes de entregar o preso, é de praxe elaborar o B.O. pela PM, que acontece no destacamento, para depois entregar o preso na Delegacia; os familiares do preso foram comunicados da prisão no mesmo momento; a cônjuge do acusado também foi comunicada e compareceu ao destacamento; se a PM não lavrar o B.O. a Polícia Civil não recebe o preso; não se recorda quem algemou o acusado e nem de quem era a algema; não é comum a algema se soltar; provavelmente ele usou alguma técnica; inclusive o preso disse, quando foi algemado, que poderia utilizar duas algemas que ele conseguiria se soltar; não se recorda precisamente o horário da prisão e o horário que prestou o depoimento na PM; todas as munições que utiliza são marcadas e, quando disparada, precisa ser feita uma documentação e comunicado o superior; no dia da abordagem não houve disparo de arma de fogo; nem mesmo naquela semana houve disparo; além da esposa, os ocupantes do veículo Gol estiveram presentes no destacamento; às vezes faz uso de câmera, mas nesse dia não estava usando o colete que tem a câmera; nesse dia fez as filmagens com o celular; em razão do comportamento do acusado, demorou para elaboração do B.O. para que os fatos fossem relatados; nunca teve problema pessoal com o réu.’’ No mesmo sentido está o teor da oitiva judicial do policial militar Jonir Jorge Palavesini (mov. 192.2 e 266.1- autos de origem): ‘’Que o acusado, quando chegou no destacamento, empurrou a porta da viatura com os pés e tentou agredir os policiais; os fatos aconteceram no pelotão, após a esposa dele chegar lá e acusa-lo de ter um caso com outra mulher; durante o percurso entre a abordagem e o pelotão, ele conseguiu tirar a algema de uma das mãos; depois de empurrar a tampa da viatura, ele tentou desferir chutes e socos contra os policiais e foi contido com o spray de pimenta; o acusado ameaçou os policiais dizendo que ele atiraria na cabeça de polícia igual ao que ele atirava na cabeça de boi no Pará; teme pelas ameaças, também por conta da sua família; não tem nenhum problema pessoal contra o réu; o mandado de prisão estava no interior da viatura; não se lembra quem fez a leitura do mandado; no veículo onde estava o acusado estava o motorista e outra feminina; não viu outras pessoas que tenham presenciado a prisão; não é costume chamar testemunhas para acompanhar a prisão; após a prisão, o acusado foi conduzido até o pelotão para lavratura do B.O., o qual é documento necessário para entrega do preso; não teve contato com o réu na época de escola ou adolescência; o depoente joga futebol nos campeonatos da cidade; não se desentendeu com o réu por causa de jogo de futebol; não se lembra de ter abordado o acusado e sua esposa, em outra oportunidade, perto do Adair; o réu foi levado ao hospital após a lavratura do B.O.; recusou atendimento e foi levado à Delegacia de Polícia.’’ O informante Márcio Antônio Mendes declarou o seguinte em juízo (mov. 192.5 e 266.1 – autos de origem): ‘’Que veio prestar o depoimento para ajudar o acusado; estava próximo ao hospital e lá o acusado pediu carona, dizendo que estava vindo do serviço; ele pediu o favor de que, antes de deixa-lo em casa, passasse na farmácia para comprar fraldas para sua filha; foram abordados próximo ao supermercado Penso; Adriano saiu do carro, com as mãos na cabeça; ele não reagiu; os policiais algemaram-no e o levaram para dentro da viatura; o depoente foi liberado e foi avisar a esposa do Adriano; pegou a esposa dele e a levou ao destacamento; chegando lá, os policiais estavam batendo no acusado; falou para eles pararem de bater e estes disseram que ele não falasse mais nada, pois caso contrário colocaria o depoente lá dentro; depois disso foi avisar a mãe do acusado; não sabe se os policiais apresentaram o mandado de prisão para o Adriano; para o depoente não foi apresentado; não sabe como o réu foi algemado, se com as mãos para frente ou para trás; durante a abordagem, o depoente não poderia olhar para trás; quando chegou no destacamento os policiais estavam tirando o Adriano, mas o agredindo; no momento da agressão o acusado estava algemado; as agressões eram verbais e físicas; logo depois de ser repreendido pelos policiais, foi até a casa da mãe do acusado avisá-la e não viu mais nada; chegou no destacamento bem na hora que os policiais estavam tirando o Adriano da viatura; quando chegou no destacamento, viu a porta sendo aberta; depois que estacionou, a porta da viatura, onde estava o Adriano, já estava aberta e presenciou as agressões; a mulher do Adriano procurou o depoente para ele vir ser testemunhas.’’ (mov. 266.1- autos de origem). A informante Marines Chagas afirmou em juízo (mov. 192.3 e 266.1- autos de origem).: ‘’Que tem interesse em ajudar o Adriano; é esposa do Marcio Antonio Mendes; o Adriano pediu carona; a polícia mandou parar o carro e o Adriano desceu e se entregou; conhece o policial Palavesini; este policial não apresentou nada; o acusado foi algemado com as mãos para trás e foi colocado na viatura; não ouviu os policiais dizer os direitos do réu; no destacamento a depoente não desceu do carro; lá no destacamento não viu o Adriano desembarcando da viatura; os policiais tiraram o Adriano da viatura porque a mulher dele queria conversar com ele; eles desembarcaram o Adriano para ele conversar com a mulher; isso foi lá dentro; Adriano estava algemado e tinha um policial de cada lado segurando ele; estacionaram o carro do lado de cima do destacamento; Adriano estava gritando na viatura; não sabe se ele estava apanhando; Adriano gritava socorro; é verdade que, no momento da abordagem, após algemar Adriano, os policiais mandaram a depoente e seu marido ficarem de costas; não presenciou nenhum ato de agressão dos policiais.’’O acusado Adriano dos Santos, interrogado em juízo, afirmou que não cometeu os delitos a ele imputados e reiterou ter sofrido agressões dos policiais (mov. 201.2 e 266.1- autos de origem): ‘’Que Tudo isso aconteceu porque, no final de um campeonato de futebol, o Sd. Cristian parou o carro atrás do réu e lhe disse se não queria bater na viatura naquele momento; logo em seguida o réu foi abordado por dois policiais que não são de Salto do Lontra e, na sequência, chegaram o Ronaldo, o Palavesini e o Cezerio, todos policiais; neste momento eles deixaram bem claro que iriam “arrumar uma cadeia para o réu”; foi ameaçado pelos policiais nessa oportunidade; já no dia dos fatos objeto da acusação, quando abordado, já saiu do carro com as mãos na cabeça; foi algemado e colocado na viatura; do supermercado penso até o destacamento demoraram uns 10 min, quando seria suficiente 5 min; no percurso ficaram insultando o acusado; no destacamento, abriram a porta da viatura e já bateram no acusado e começaram a proferir ofensas contra o réu; quando a sua esposa e o Márcio chegaram no destacamento, os policiais o tiraram da viatura e o levaram até o interior; foi levado para fazer o exame de lesões, mas se recusou a fazer o exame; quando voltaram ao destacamento, foi jogado no chão; o Palavesini usou o spray de pimenta sem qualquer reação do acusado; o Ronaldo disparou a arma de fogo; também foi sufocado com uma sacola pelos policiais; foi espancado e torturado pelos policiais; todos que são levados para o destacamento são espancados; no dia da prisão, os policiais nem mandaram parar o veículo; quando o Márcio viu a viatura, o réu pediu para parar o carro e já desceu; no destacamento só tinha os dois policiais; eles utilizaram o celular para filmar; os policiais não leram o mandado de prisão; só disseram que o juiz tinha determinado a prisão; depois da prisão defronte ao supermercado, os policiais levaram o acusado direto para o destacamento; as duas vezes foi o Ronaldo que abriu o camburão; é mentira que tenha escapado das algemas; negou tenha ameaçado e resistido à prisão.’’ Existem, ainda, vídeos gravados pelos policiais em momento posterior à prisão do acusado (mov. 194 – autos de origem). 3.3. Adriano dos Santos busca a absolvição em relação aos crimes de resistência e ameaça, devido à ausência de comprovação de dolo e à fragilidade da narrativa dos Policiais Militares, cujas versões não são uníssonas e contradizem o teor do Boletim de Ocorrência, do vídeo juntado aos autos (mov. 194) e do laudo (mov. 44.2). Argumenta-se que os agentes públicos, de posse de mandado judicial, fizeram a condução ao Destacamento da Polícia Militar, o que configura ilegalidade e ficou demonstrado por vídeo de posse da Corporação, ao qual não teve acesso. Reitera-se a insuficiência probatória para subsidiar a condenação, pois a parte não resistiu ao cumprimento da ordem judicial, tampouco ameaçou os agentes públicos. Assim, inexistiria demonstração de certeza quanto à ocorrência dos fatos ou mesmo a autoria, não tendo o Ministério Público se desincumbido de comprovar os fatos delituosos imputados ao requerido, razão pela qual deve ser aplicado o princípio in dubio pro reo.O artigo 329, do Código Penal (resistência), disciplina o seguinte “Art. 329 - Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio: Pena - Detenção, de dois meses a dois anos”.Ao interpretar este tipo penal, Guilherme de Souza Nucci esclarece a diferença entre a resistência ativa, que se enquadra no tipo objetivo, e a resistência passiva, conforme o seguinte trecho:há diferença entre resistência ativa (vis corporalis ou vis compulsiva) e resistência passiva (vis civilis). A ativa consiste justamente no emprego de violência ou ameaça contra o funcionário público, servindo para configurar o crime; a passiva é a oposição sem ataque ou agressão por parte da pessoa, que se pode dar de variadas maneiras: fazendo “corpo mole” para não ser preso e obrigando os policiais a carregá-lo para a viatura; não se deixar algemar, escondendo as mãos; buscar retirar o carro da garagem antes de ser penhorado; sair correndo após a voz de prisão ou ordem de parada, entre outros.[1]A configuração do delito exige, portanto, ação de cunho violento ou ameaça em direção aos agentes públicos. Por outro lado, o delito de ameaça, previsto no artigo 147 do Código Penal está assim definido: “Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único - Somente se procede mediante representação”.Feitas essas considerações, infere-se do caso concreto que o acusado afirma ter atendido à ordem emanada dos Policiais Militares, em cumprimento a ordem de prisão, e colaborado passivamente com sua detenção e imobilização por algemas. Essa narrativa foi confirmada pelos policiais militares e pelos informantes. Todavia, os policiais afirmam que a resistência e ameaça ocorreram quando a viatura chegou no Destacamento da Polícia Militar e o acusado, após ter retirado as algemas, tentou fugir e agredir a equipe policial. Por outro lado, o informante Márcio Antônio Mendes alegou que durante a abordagem, os policiais proibiram o depoente e sua esposa de olhar para trás; quando chegou no Destacamento os policiais estavam batendo no acusado e, após ter falado para eles pararem, passou a ameaça-lo.A informante Marines Chagas, apesar de não ter presenciado as agressões, afirmou ter ouvido pedidos de socorro do acusado quando estava na viatura e que, no momento da abordagem, pediu a ela e seu marido para ficarem de costas.Os dois informantes e o acusado relataram que não houve leitura do mandado no momento da prisão. Infere-se dessas narrativas, de forma uníssona, que o acusado, quando estava com pessoas conhecidas e avistou os policiais em sua direção, não ofereceu resistência, não proferiu ameaças e seguiu as ordens dos policiais ao entrar na viatura. Nesse momento, parece que o acusado tinha maiores chances de êxito em eventual resistência à prisão, pois teria a possibilidade de fugir quando viu os policiais. É possível intuir, ainda, que ameaças a agentes públicos armados é mais provável que ocorra em espaço público e com pessoas conhecidas, cujo olhar pode coibir eventual desproporcionalidade da reação policial.Ocorre que na situação concreta os policiais afirmam que tanto as ameaça quanto a resistência ocorreram quando o acusado estava sozinho com os agentes públicos, em situação de evidente fragilidade de força quando comparado com o aparato de segurança que detinham os agentes públicos.Nesse cenário, diante das supostas resistência e ameaça, o acusado foi contido, conforme afirmaram os agentes públicos em suas oitivas e também demonstrado pelo laudo médico de mov. 44.2 dos autos de origem.Não houve gravação das supostas ameaças e resistência no momento da abordagem, o que poderia ter sido feito inclusive por câmera aclopada no uniforme do policial. No entanto, o policial Ronaldo Machado (mov. 192.4 e 266.1- autos de origem) afirmou que embora utilize a câmera em suas abordagens, naquele dia não estava com o colete em que encaixa o aparelho. Esse instrumento existe justamente para proteger tanto o agente público quanto as pessoas a quem se direciona a atuação policial, de modo a coibir eventuais abusos. Não se olvida da presunção de veracidade dos depoimentos dos policiais, que devem, todavia, estar em consonância com os demais elementos probatórios existentes nos autos. O acusado, por outro lado, pleiteou em 18/05/2020 o deferimento de acesso aos vídeos de câmeras de segurança do Batalhão de Polícia Militar do Município de Salto do Lontra e do Supermercado Penso (mov. 60.1 – autos de origem). Posteriormente, o acusado pediu a busca e apreensão de câmeras na posse dos policiais que executaram a medida de prisão, além dos sistemas de armazenamento de vídeo do Supermercado Penso e do Destacamento da Polícia Militar de Salto do Lontra, o que foi indeferido (mov. 89.1 e 98.1 – autos de origem). Entretanto, o Batalhão de Polícia Militar do Município de Salto do Lontra informou que as imagens de câmeras de vigilância ficam armazenadas pelo prazo de 9 (nove) dias, o que impede o acesso às gravações em razão do decurso do tempo, enquanto o Supermercado Penso também informou a impossibilidade de acesso devido ao decurso do prazo de 30 (trinta) dias (mov. 91.1, 141.1 e 177.1 – autos de origem), embora o acusado tenha pleiteado o acesso 9 (nove) dias após os fatos narrados na denúncia.Assim, o acusado empregou esforços na produção de provas para subsidiar o pleito absolutório, enquanto o órgão acusatório não procurou desde logo buscar acesso a vídeos de câmeras de segurança que viabilizassem eventualmente tornar mais robusto o acervo probatório. Em face desse cenário, do cotejo entre os elementos probatórios dos autos de origem, não se constata suficiência das oitivas dos Policiais Militares para subsidiar a decisão e conferir a confiança que se coloca nas decisões proferidas pelo Poder Judiciário, na perspectiva do standard probatório, principalmente se levar em conta que o acusado já estava preso e algemado e mantido na viatura policial. Inexplicavelmente, o acusado teria se soltado das algemas e investido contra os policiais. A valoração dessas provas não ultrapassa a dúvida razoável (beyond a/any reasonable doubt)[2] provocada pelas oitivas do acusado e dos informantes, além da fragilidade da narrativa acusatória quando analisada a sequência dos fatos alegados pelos policiais.Não é demais ressaltar que a dúvida deve ser sempre interpretada em benefício do acusado, dado que a condenação exige prova robusta e que supere qualquer dúvida razoável.Convém ressaltar também que o mandado de prisão que os policiais visaram cumprir (mov. 1.9 – autos de origem) se refere aos autos de Ação penal nº XXXXX-81.2020.8.16.0149 e tem como objeto a persecução penal do acusado quanto aos supostos crimes de resistência, ameaça e desacato contra policiais militares. Todavia, o acusado foi absolvido naqueles autos em razão da insuficiência probatória (mov. 456.1 – autos nº XXXXX-81.2020.8.16.0149).Quando há dúvida razoável em relação a materialidade delitiva, as Câmaras Criminais desta Corte entendem ser o caso de aplicação do princípio in dubio pro reo, conforme demonstram os seguintes julgados: APELAÇÃO CRIME. ARTIGO 14, DA LEI Nº 10.826/03 ( ESTATUTO DO DESARMAMENTO). POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DA DEFESA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. IN DUBIO PRO REO. TIPICIDADE PRESENTE. DÚVIDA RAZOÁVEL ACERCA DA AUTORIA DELITIVA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. PROVA TESTEMUNHAL QUE NÃO APONTA CERTEZA QUANTO À AUTORIA DO DELITO. CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL E INSUFICIENTE A EMBASAR O DECRETO CONDENATÓRIO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 2ª C.Criminal - XXXXX-84.2014.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADORA PRISCILLA PLACHA SÁ - J. 10.05.2021) APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE PECULATO-DESVIO. FEITO DESMEMBRADO EM RELAÇÃO À ORA APELANTE. ABSOLVIÇÃO. INSURGÊNCIA MINISTERIAL. PRETENSÃO CONDENATÓRIA. DESACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES A AMPARAR UMA CONDENAÇÃO. ACUSADA QUE FOI NOMEADA PARA EXERCER CARGO COMISSIONADO NA ALEP POR APENAS QUATRO MESES. PROVAS QUE NÃO FORAM SUFICIENTES EM DEMONSTRAR QUE NUNCA EFETIVOU A CORRESPONDENTE CONTRAPRESTAÇÃO LABORATIVA. ELEMENTOS INDICIÁRIOS APONTANDO QUE LABOROU AINDA QUE INDIRETAMENTE NO INTERESSE DA AUTORIDADE NOMEANTE. TESTEMUNHAS QUE NÃO FORAM UNÂNIMES EM AFERIR QUE A RÉ TRABALHAVA COM EXCLUSIVIDADE EM ESCOLA PARTICULAR DURANTE TODO O PERÍODO NA ÉPOCA EM QUE NOMEADA JUNTO À ALEP. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE CONDUTA DOLOSA APTA A CONFIGURAR O CRIME DE PECULATO-DESVIO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.(TJPR - 2ª C.Criminal - XXXXX-79.2015.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR LAERTES FERREIRA GOMES - J. 25.03.2021) APELAÇÃO CRIME – CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. , INCISOS I, II E IV, DA LEI Nº 8.137/90)– ABSOLVIÇÃO.APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – SENTENÇA ABSOLUTÓRIA POR NÃO EXISTIR PROVA DE TER O RÉU CONCORRIDO PARA A INFRAÇÃO PENAL E POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO, PELA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA AUTORIA DELITIVA – NEGATIVA DE PRÁTICA DE QUALQUER ATIVIDADE NA EMPRESA - INEXISTÊNCIA DE PROVA ISENTA DE DÚVIDA DE QUE O ACUSADO POSSUÍA O DOMÍNIO DO FATO - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO - MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO - RECURSO DESPROVIDO. Tendo em vista que inexiste nos autos prova isenta de dúvida de que o apelado fora o autor do crime contra a ordem tributária, não se comprovando possuir domínio do fato, impõe-se a manutenção da absolvição.(TJPR - 2ª C.Criminal - XXXXX-27.2016.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR LUIS CARLOS XAVIER - J. 11.02.2021) APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO DE ENERGIA ELÉTRICA (ART. 155, § 3º, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. ALEGADA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. MATERIALIDADE EVIDENCIADA. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS, MAS NÃO DE PROVAS CONTUNDENTES DA AUTORIA DELITIVA. NEGATIVA DA RÉ. PROVA TESTEMUNHAL FRÁGIL E INCONCLUSIVA. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA CONSTATADA. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. APLICAÇÃO DO ART. 386, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ABSOLVIÇÃO OPERADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 3ª C.Criminal - XXXXX-86.2017.8.16.0034 - Piraquara - Rel.: Desembargador Paulo Roberto Vasconcelos - J. 07.04.2020) Apelação crime – tráfico de drogas – exegese do artigo 33, caput, da lei de drogas e artigo 244-b do eca – Mérito – pretensa condenação - ausência de provas quanto à autoria – não demonstração por meio de prova segura de que o apelado tivesse cometido o crime de tráfico -prova testemunhal frágil - aplicação do princípio do in dubio pro reo – dúvida razoável - honorários - fase recursal - fixação. RECURSO DE APELAÇÃO NÃO PROVIDO. (TJPR - 3ª C.Criminal - XXXXX-47.2013.8.16.0129 - Paranaguá - Rel.: Desembargador Gamaliel Seme Scaff - J. 31.08.2020) A conclusão que se impõe é pela absolvição em razão da ausência de prova suficiente para a condenação, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.Vota-se, portanto, para CONHECER do recurso de Apelação Criminal para DAR-LHE PROVIMENTO, para reformar a sentença e decretar a absolvição do acusado relativo aos crimes de resistência e ameaça, em razão da ausência de prova suficiente para a condenação, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.
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