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4 de Maio de 2024

STJ Out22 - Absolvição em Crime Tributário

ano passado

Inteiro Teor

RECURSO ESPECIAL Nº 1953696 - SC (2021/0258677-0)

DECISÃO

VALDIR PADOIN interpõe recurso especial, fundado no art. 105, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina na Apelação Criminal n. 0900104-44.2017.8.24.0028/SC.

O recorrente foi condenado pelo crime do art. , II, da Lei n. 8.137/1990, em continuidade delitiva, a sanção de 6 meses de detenção mais 10 dias-multa, em regime inicial aberto. A reprimenda foi substituída por uma restritiva de direitos.

O insurgente alega violação do art. 386, III e VI, do Código de Processo Penal. Sustenta a absolvição pela aplicação do princípio da insignificância (parâmetro federal previsto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002) ou pelo reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa (dificuldade financeira).

O Ministério Público Federal, em parecer do Subprocurador-Geral da República Paulo Eduardo Bueno, às fls. 476-478, opinou pelo provimento do recurso especial.

Decido.

I. Insignificância - atipicidade da conduta Conforme antes relatado, o recorrente foi condenado pelo crime do art. , II, da Lei n. 8.137/1990. O Tribunal de origem consignou (fls. 405-712):

[...] 2 - Do mérito.

Prentende sua absolvição, primeiramente, pautada na alegação de que sua conduta foi materialmente atípica, pois possível a aplicação do princípio da insignificância, considerando o ínfimo valor supostamente sonegado.

No entanto, sem razão.

Acerca da aplicação do princípio da insignificância, veja-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal:

[...] No caso sob exame, a persecução penal foi instaurada porque o réu, em tese, teria deixado de recolher aos cofres públicos valores referentes ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, totalizando a importância de R$ 12.055,85 (doze mil e cinquenta e cinco reais e oitenta e cinco centavos).

Verifica-se, portanto, que o valor não repassado ao Fisco pelo acusado, de fato, é abaixo daquele previsto no art. 20, da Lei n. 10.522/2002, in verbis:

[...] Ocorre que o tributo sonegado, qual seja, o ICMS, possui como ente imbuído da capacidade tributária ativa o Estado, não a União, nos termos do art. 155 5, inciso II, da Constituição Federal l.

Daí que não há como reconhecer a atipicidade da conduta por meio de parâmetro fixado pela legislação federal, porquanto União e Estados são autônomos, consoante determina o art. 18, caput, da Carta Magna.

E a Lei Estadual n. 12.646/2003 determina a quantia mínima para a inscrição em Dívida Ativa:

Art. 5º Independentemente do transcurso do prazo prescricional, não será encaminhada à Procuradoria Geral do Estado para ajuizamento a Dívida Ativa:

I - de valor inscrito até R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), relativa ao ICMS, exceto quando decorrente de multas não proporcionais ao valor do imposto ou da mercadoria;

Com efeito, a importância sonegada pelo réu supera R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), ultrapassando, portanto, o parâmetro utilizado por esta Corte para a apreciação do cabimento ou não do princípio da insignificância, consoante estabelecido na Lei Estadual 12.646/2006.

Nesse sentido, colhe-se do STJ:

[...] Desse modo, inviável a absolvição nos moldes conforme pretendido, pois não é caso de aplicação do princípio da insignificância.

O STJ entende ser possível aplicar o parâmetro estabelecido no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, efetivado nas Portarias n. 75 e 130 do Ministério da Fazenda, atualmente de cerca de R$ 20.000,00, aos casos relativos a tributos estaduais, para fins de aplicação do princípio da insignificância.

Na hipótese, atribui-se ao recorrente: "em data de 10 de fevereiro de 2015, de efetuar o recolhimento de R$ 12.055,85 (doze mil e cinquenta e cinco reais e oitenta e cinco centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias - ICMS cobrado de consumidores finais" (fl. 80).

O acórdão consignou a existência da Lei Estadual n. 12.646/20063, a qual estabelece valores mínimos no Estado de Santa Catarina para fins de inscrição de débitos em dívida ativa, semelhante, portanto, à referida lei federal.

Ainda que assim não fosse, o inadimplemento de apenas uma obrigação mensal não seria suficiente para caracterizar a contumácia e o dolo de apropriação necessários à caracterização do delito previsto no art. , II, da Lei n. 8.137/1990.

Dessa forma, a absolvição do recorrente é medida que se impõe.

Sobre o tema, cito os seguintes julgados:

HABEAS CORPUS. PENAL. ART. 1.º, INCISO II, DA LEI N. 8.137/1990.

REITERAÇÃO OU HABITUALIDADE DELITIVAS NÃO CARACTERIZADAS. EXISTÊNCIA DE APENAS UMA AUTUAÇÃO FISCAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. POSSIBILIDADE. TRIBUTO ESTADUAL: HIPÓTESE EM QUE TAMBÉM INCIDE A INTELIGÊNCIA DO QUE DECIDIDO POR ESTA CORTE AO APRECIAR O TEMA N. 157 DO REGIME DE RECURSOS REPETITIVOS. TESE FIRMADA NO JULGAMENTO DO HC 535.063/SP, REL. MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR (STJ, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 25/08/2020). ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA.

1. Não se descura que na hipótese a supressão de imposto ocorreu entre os meses de janeiro a dezembro de 2010. Ocorre que o débito de ICMS de R$ 11.670,45 corresponde ao total do ano de 2010, que foi apurado em circunstância única, nos termos do que fora consignado no Auto de Infração e Imposição de Multa n. 4.020.536-8, e gerou apenas uma certidão de dívida ativa (CDA nº 1.110.422.935).

2. É certo que a reiteração criminosa obsta a aplicação do princípio da insignificância nos crimes tributários. Na hipótese, todavia, o entendimento adotado pela Corte de origem destoa da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, fixada no sentido de que tal condição somente se caracteriza ante a multiplicidade de procedimentos administrativos, ações penais ou inquéritos policiais em curso. No caso, fora considerada apenas uma autuação fiscal.

Portanto, não está demonstrada a habitualidade delitiva.

3. Embora trate-se de tributo estadual, incide a inteligência do que decidido pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Tema Repetitivo n. 157, de que está caracterizada a atipicidade material da conduta no caso de "crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda" ( REsp 1.709.029/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, julgado em 28/02/2018, DJe 04/04/2018).

4. "Ainda que a incidência do princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho, quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00, tenha aplicação somente aos tributos de competência da União, à luz das Portarias n. 75/2012 e n. 130/2012 do Ministério da Fazenda, parece-me encontrar amparo legal a tese da defesa quanto à possibilidade de aplicação do mesmo raciocínio ao tributo estadual, especialmente porque no Estado de São Paulo vige a Lei Estadual n. 14.272/2010, que prevê hipótese de inexigibilidade de execução fiscal para débitos que não ultrapassem 600 (seiscentas) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo - UFESPs, podendo-se admitir a utilização de tal parâmetro para fins de insignificância" (STJ, HC 535.063/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/06/2020, DJe 25/08/2020).

5. Ordem de habeas corpus concedida, para restabelecer os efeitos da sentença que absolveu sumariamente os Acusados.

( HC n. 564.208/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, 6ª T., DJe 18/8/2021.)

RECURSO EM HABEAS CORPUS - CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA - SONEGAÇÃO FISCAL - ATIPICIDADE - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ICMS.

TRIBUTO ESTADUAL. LEIS ESTADUAIS REGULANDO A MATÉRIA. ADOÇÃO DO MESMO PARÂMETRO DEFINIDO PELO STJ NO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA N. 1.112.748. POSSIBILIDADE. JULGAMENTO AFETADO EM RAZÃO DA MATÉRIA À TERCEIRA SEÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL MANIFESTO.

TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. RECURSO PROVIDO.

1. O trancamento da ação penal é medida excepcional, só admitida quando restar provada, de forma clara e precisa, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, a atipicidade da conduta, a ocorrência de causa extintiva da punibilidade, ou, ainda, a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade.

2. Segundo entendimento recente desta Corte, ainda que a incidência do princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho, quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00, tenha aplicação somente aos tributos de competência da União, à luz das Portarias n. 75/2012 e n. 130/2012 do Ministério da Fazenda, parece-me encontrar amparo legal a tese da defesa quanto à possibilidade de aplicação do mesmo raciocínio ao tributo estadual, especialmente porque no Estado de São Paulo vige a Lei Estadual n. 14.272/2010, que prevê hipótese de inexigibilidade de execução fiscal para débitos que não ultrapassem 600 (seiscentas) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo - UFESPs, podendo-se admitir a utilização de tal parâmetro para fins de insignificância.

Precedentes.

3. Verifica-se constrangimento ilegal a ser sanado, pois o débito tributário apontado na denúncia é da monta de R$ 6.213,60, portanto, abaixo do parâmetro de R$ 20.000,00, que, embora seja aplicado no âmbito da União, pode, no caso, por simetria, caracterizar a atipicidade material para o débito tributário estadual em discussão (ICMS/SP), a incidir o princípio da insignificância, o que importa no trancamento da ação penal.

4. Recurso em habeas corpus provido para para reconhecer a aplicação do princípio da insignificância e determinar o trancamento da Ação Penal n. 0028909-45.2012.8.26.0224, em trâmite na 4ª Vara Criminal da Comarca de Guarulhos/SP.

( RHC n. 130.853/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, 6ª T., DJe 26/10/2020.)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. , II, DA LEI N. 8.137/1990. ICMS DECLARADO E NÃO PAGO. TIPICIDADE. NÃO RECOLHIMENTO DE QUATRO OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS DE BAIXO VALOR. VERIFICAÇÃO DO DOLO DE APROPRIAÇÃO.

SÚMULA N. 7 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. O STJ entende ser típica a conduta de deixar de repassar ao fisco o ICMS indevidamente apropriado. A ausência de fraude na apuração do tributo não é pressuposto desse delito, visto que ele não é praticado na clandestinidade. A conduta dolosa consiste na consciência de não recolher o valor do tributo devido. Precedentes.

2. Na hipótese, em princípio, a contumácia delitiva e o dolo de apropriação não foram estabelecidos, porquanto o não recolhimento de apenas quatro obrigações de baixo valor não foi suficiente para tanto.

3. O exame mais aprofundado da questão - dolo de apropriação - implicaria a necessidade de revolvimento fático probatório dos autos, o que é vedado, em recurso especial, pelo disposto na Súmula n. 7 do STJ.

4. Agravo regimental não provido.

( AgRg no REsp n. 1.859.166/GO, Rel. Ministro Rogerio Schietti, 6ª T.

, DJe 18/8/2022.)

II. Dispositivo À vista do exposto, dou provimento ao recurso especial, para absolver Valdir Padoin das condutas imputadas na denúncia (Processo n. 0900104-44.2017.8.24.0028).

Publique-se e intimem-se.

Brasília (DF), 03 de outubro de 2022.

Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ Relator

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(STJ - REsp: 1953696, Relator: ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Publicação: 05/10/2022)

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