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16 de Maio de 2024

STJ Teses - Medida Cautelar deve ter Relação com o caso em concreto, sob pena de ser inidônea

há 7 meses

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DE PRISÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ILEGALIDADE RECONHECIDA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO. 1. O entendimento majoritário da Sexta Turma deste Tribunal é no sentido de que a ausência de audiência de custódia não enseja nulidade da prisão preventiva em que posteriormente decretada por fundamento idôneo, quando são observadas as outras garantias processuais e constitucionais. 2. Para a aplicação das medidas cautelares diversas da prisão, exige-se fundamentação específica que demonstre a necessidade e adequação de cada medida imposta no caso concreto. 3. Tendo sido tão somente listadas as cautelares fixadas, sem justificativa de sua pertinência aos riscos que se pretendia evitar, tem-se a falta de suficiente fundamento e decorrente ilegalidade. 4. Habeas corpus concedido para cassar as medidas cautelares impostas ao paciente JAIME LUCAS DOS SANTOS RODRIGUES, o que não impede a fixação de novas medidas pelo Juízo de piso, por decisão fundamentada.

(STJ - HC: 480001 SC 2018/0309945-2, Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 12/02/2019, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/03/2019)

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E também, no mesmo sentido:


Inteiro Teor

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 174490 - RJ (2022/0394424-0)

RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA

RECORRENTE : D V C B

DECISÃO

Trata-se de recurso em habeas corpus , com pedido liminar, interposto por D V C B contra acórdão do Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro (0056108- 78.2022.8.19.0000).

Segundo consta dos autos, o recorrente, vereador eleito pelo município de Paracambi/RJ, foi denunciado pela suposta prática do crime de homicídio triplamente qualificado, na forma tentada, tendo sido indeferido o pedido de decretação da prisão preventiva, por duas vezes, mas foram aplicadas medidas cautelares, entre as quais o seu afastamento da atividade de parlamentar.

Na ação originária, a defesa postulou a revogação das medidas cautelares impostas, notadamente a de afastamento das atividades de vereador do município. O Tribunal estadual, por maioria de votos , denegou a ordem, recebendo o acórdão a seguinte ementa (e-STJ fls. 101/103):

HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSO PENAL. CONSTITUCIONAL. PACIENTE A QUEM É IMPUTADA, EM TESE, A AUTORIA MEDIATA (MANDANTE) DE UM CRIME DE HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO, TENTADO, PERPETRADO EM 11/11/2020. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À PRISÃO DECRETADAS POR OCASIÃO DO JUÍZO DE PRELIBAÇÃO . IRRESIGNAÇÃO DO IMPETRANTE ESPECIFICAMENTE QUANTO ÀQUELA PREVISTA NO INCISO VI, DO ART. 319, DO CPP, QUE AFASTOU O PACIENTE DAS FUNÇÕES PÚBLICAS POR ELE EXERCIDAS NA CASA LEGISLATIVA MUNICIPAL, ONDE, NO CERTAME DE 2020, FOI REELEITO PARA O CARGO DE VEREADOR. ALEGA AUSÊNCIA DE CONTEMPORANEIDADE, DESNECESSIDADE E INADEQUAÇÃO DA MEDIDA ESGRIMADA. ESPECA QUE OS FATOS IMPUTADOS AO PACIENTE NÃO SE ENQUADRARIAM COMO CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E NÃO ESTARIAM RELACIONADOS AO EXERCÍCIO DE SUA ATIVIDADE PARLAMENTAR. EVOCA, OUTROSSIM, A IMPORTÂNCIA DO MANDATO PARLAMENTAR EM UM ESTADO DEMOCRÁTICO PARA, AO FINAL, REQUERER QUE SEJA AUTORIZADO

O RETORNO DO PACIENTE AO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE PARLAMENTAR INERENTE AO MANDATO QUE LHE FOI OUTORGADO. Ainda que o afastamento do cargo público, objeto do presente mandamus, não afete diretamente a liberdade de locomoção do paciente, certo é que pelo fato de ser imposta como medida alternativa à prisão preventiva, seu descumprimento pode ensejar a decretação de sua custódia cautelar, o que revela a possibilidade do exame de sua legalidade na via do habeas corpus. Contemporaneidade que se tem como evidenciada. Por força do princípio da não culpabilidade admite-se a imposição de medidas cautelares (sejam elas privativas ou não da liberdade) quando houver não apenas prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, mas também quando a imposição da medida seja contemporânea aos riscos que com ela se pretende evitar. Noutras palavras, a prefalada contemporaneidade diz respeito não aos fatos em apuração, mas sim aos fundamentos lançados na decisão, ou seja, aos riscos que com ela se ambiciona obstaculizar. Hipótese vislumbrada no caso em cotejo. Condições pessoais que já foram ponderadas. Propaladas condições pessoais favoráveis ostentadas pelo acusado que já foram devidamente sopesadas pela magistrada a quo quando, ao contrário do que estabeleceu para os demais envolvidos (apontados como executores do delito), preteriu a decretação da medida cautelar extrema, optando, motivadamente, pela imposição de medidas cautelares alternativas, dentre as quais aquela que é objeto do presente mandamus. Necessidade/adequação/proporcionalidade da medida que restam configuradas. Mesmo não descurando do fato de o acusado em questão ter sido democraticamente eleito pelo povo para representá-lo na Casa Legislativa, da indelével importância do mandato parlamentar em um Estado Democrático e do indefectível respeito que devemos ter à supremacia do voto popular-destacadamente em tempos tão sombrios como aqueles por quais estamos passando-não podemos deixar de reconhecer assistir razão à magistrada a quo quando sustenta que "os veementes indícios (colhidos contra o réu em questão) atentam não apenas contra a vida, mas também contra o regime democrático", razão pela qual soa "incompatível o exercício das suas funções". Fatos atribuídos ao paciente que, para além de serem extremamente graves, teriam sido motivados supostamente por questões políticas e em pleno período eleitoral. Razoável, proporcional e necessário o afastamento do acusado das funções públicas até então exercidas pelo ora paciente, não apenas porque sua conduta teria atentado contra o próprio regime democrático, como também porque sua mantença na função política por ele exercida, destacadamente por se tratar de um pequeno município de nosso Estado onde ele já ocupou importantes cargos dentro da Casa Legislativa, coloca em risco a apuração dos fatos e a própria ordem pública. É legítimo que o povo escolha o seu representante. Isso é fato, irretorquível. O que não é legítimo é que este representante venha a se valer da prática de atos espúrios/criminosos para chegar e/ou se manter no poder ao qual o voto popular o alçou. Circunstâncias que circundam a prática delitiva atribuída ao ora paciente que, indiscutivelmente desbordam para a conclusão de que a imposição da medida cautelar esgrimada é necessária e proporcional. Medida que guarda pertinência com os fins colimados, quais sejam, assegurar que o paciente não possa se valer do poder que detém quando está no exercício de suas funções para vir a turbar a apuração dos fatos delituosos que lhe são imputados, sendo insuficientes, para tanto, a imposição das demais cautelares que lhe restaram aplicadas. Ante a ambiência em que supostamente praticado o delito, não há como apartar a necessidade de salvaguarda da ordem pública e da instrução criminal, do afastamento do acusado das funções públicas por ele exercidas. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VISLUMBRADO. ORDEM QUE SE DENEGA.

Nas razões do presente recurso, a defesa resume, inicialmente, as alegações apresentadas (e-STJ fl. 168):

i. Afastamento de parlamentar do exercício do mandato havido nas urnas, sob o fundamento de que "figurar como réu em processo criminal, é incompatível com o exercício das suas funções", sem nada dizer acerca de elementos concretos que apontem para a necessidade e adequação da medida.

ii. Ausência de nexo causal entre os fatos objeto de imputação e o exercício do mandato eletivo e da demonstração de que a continuidade do paciente no exercício da atividade parlamentar poderia afetar a atividade instrutória.

iii. Entendimento da própria Corte a quo de que "nada consta no expediente no sentido de que o representado tenha inviabilizado ou prejudicado as investigações ou ameaçado a vítima do fato ou testemunhas, nem para aplicação da lei penal, já que nada consta nos autos".

iv. Intervenção na soberania popular à falta de justa causa. Medida manifestamente ilegal e desproporcional, sem amparo na jurisprudência desta egrégia Corte.

v. Constrangimento ilegal manifesto, a ser coactado na presente via recursal heroica.

Sustenta que a medida é ilegal pela ausência de contemporaneidade e pela falta de uma justificativa idônea para o afastamento de uma pessoa eleita pelo voto popular. Argumenta, também, que se não há motivos para a prisão preventiva não há razão legal para o afastamento do recorrente das funções de parlamentar. Ressalta, ademais, que o paciente ostenta condições pessoais favoráveis, pois é casado, com família, filhos menores, e trabalha.

Diante disso, pede, em liminar e no mérito, a revogação da medida cautelar de afastamento do recorrente do cargo de parlamentar do município de Paracambi/RJ.

A liminar foi indeferida (e-STJ fls. 350/353).

As informações foram prestadas (e-STJ fls. 257/264) e o Ministério Público Federal, previamente ouvido, manifestou-se pelo não conhecimento do habeas corpus, em parecer assim resumido (e-STJ fl. 366):

Direito Penal e Processual Penal. Recurso Ordinário em Habeas Corpus. Medidas cautelares. Afastamento do cargo de vereador. Fundamentação idônea. Delito cometido em razão da função pública. Precedentes.- Requer-se o não provimento do recurso ordinário em habeas corpus.

É o relatório, decido.

Busca-se, em síntese, a revogação da medida cautelar de afastamento do recorrente do cargo público de Vereador do Município de Paracambi/RJ.

A Lei n. 12.403/2011 estabeleceu a possibilidade de imposição de medidas alternativas à prisão cautelar, no intuito de permitir ao magistrado, diante das peculiaridades de cada caso concreto e dentro dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, resguardar a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal.

Desse modo, caso se vislumbre a possibilidade de alcançar os resultados acautelatórios almejados por vias menos gravosas ao acusado, elas devem ser adotadas como alternativa à prisão.

Além disso, "[p]ara a aplicação das medidas cautelares diversas da prisão, exige-se fundamentação específica que demonstre a necessidade e adequação de cada medida imposta no caso concreto" ( HC 480.001/SC, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, julgado em 12/2/2019, DJe 7/3/2019).

Colhe-se do acórdão (e-STJ fls. 105 e 110/111):

Traz à lume matérias meritórias e destaca o fato de a prisão preventiva ter sido rechaçada pelo juízo a quo em duas oportunidades - 27/6/2022 e 6/7/2022 - porém, a par disso, ter deferido sido o pleito ministerial de afastamento do ora paciente do exercício da atividade parlamentar, nos seguintes termos:

"No caso concreto, o denunciado, Vereador reeleito do Município de Paracambi, diante de veementes indícios que atentam não apenas contra a vida, mas também contra o regime democrático, figura como réu em processo criminal, sendo incompatível o exercício das suas funções normalmente, assim deverá ser seja afastado cautelarmente do seu cargo. Pelo exposto, determino a SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO PÚBLICA, com base no art. 319, VI do Código de Processo Penal. Fixo ainda as seguintes medidas cautelares diversas da prisão previstas nos incisos I, II, III e IV, todos do art. 319 do CPP, pelo que o denunciado deverá se abster de manter contato, por qualquer meio, por si só, ou por pessoa interposta com qualquer uma das testemunhas arroladas na presente denúncia, bem como de frequentar local de trabalho de qualquer uma das testemunhas arroladas. Por fim, o denunciado deverá também comparecer mensalmente em juízo para informar e justificar atividades, e não poderá se ausentar da Comarca, por mais de 10 (dez) dias consecutivos, sem a prévia autorização do juízo. Estado do Rio de Janeiro Poder Judiciário." (cf. doc. 4).

(...)

Vejamos, por oportuno, as razões invocadas pelo parquet para requerer a imposição da cautelar ora esgrimada.

Não sendo o entendimento de Vossa Excelência pela decretação de prisão preventiva do acusado, requer o Ministério Público, subsidiariamente, seja determinada a SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO PÚBLICA, com fulcro no art. 319, VI do Código de Processo Penal. Não é razoável que o denunciado, Vereador reeleito do Município de Paracambi, ao cometer grave delito que atenta não apenas contra a vida, mas também contra o regime democrático, figure como réu em processo criminal e permaneça exercendo suas funções normalmente. Certamente ofende o princípio da razoabilidade a permanência do denunciado no exercício de suas funções enquanto tramita o processo-crime. Urge que seja afastado cautelarmente do seu cargo. Ao compulsar os autos, verifica-se que os elementos informativos, com destaque para o conteúdo das medidas de afastamento dos sigilos telefônico e telemático, não deixam dúvidas acerca da efetiva conduta criminosa e ímproba do denunciado. Tal conduta não é apenas vexatória para a Câmara de Vereadores de Paracambi, mas também para qualquer cidadão de bem. Ora, se o denunciado responde ao grave crime descrito na denúncia não há como permitir que continue exercendo sua função legislativa, eis que não haverá como conferir credibilidade aos atos que tenham o denunciado como agente. Reside aí uma incompatibilidade objetiva . O que será que o denunciado poderá continuar fazendo no desempenho de suas atividades? O Judiciário não pode "fechar os olhos" para esse fato. Não se pode perder de vista que o Estado (Câmara de Vereadores) acaba por ser um dos lesados, pois tem mais uma vez sua imagem e honra objetiva abaladas pela postura imoral, ímproba e criminosa do denunciado. Dessa forma, manter o denunciado na função pública enquanto se busca a verdade real é mais um escárnio para com o Poder Público, com a Câmara de Vereadores e com os demais agentes públicos que honram sua função. Daí a necessidade da presente medida cautelar. Enquanto se apura a verdade real, deve o denunciado ficar afastado do seu cargo, do contrário se acarretará uma situação incompatível e incoerente a ensejar perplexidade e repulsa. Na esteira deste raciocínio, presentes o "fumus boni juris" e o "periculum in mora", sendo certo que o presente afastamento do cargo tem natureza cautelar e como toda e qualquer medida cautelar caracteriza-se por ser medida acessória, provisória, preventiva e, segundo o mestre Piero Calamandrei, pela instrumentalidade hipotética, em que se deve analisar a necessidade dentro de um juízo de probabilidade e não de certeza, o Ministério Público requer a SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO PÚBLICA do denunciado até o trânsito em julgado da decisão final da demanda criminal que ora se ajuíza , expedindo-se ofício à Câmara de Vereadores de Paracambi para a materialização da presente medida cautelar.

Em 20/06/2022, os autos (nº 0000682-61.2022.8.19.0039) foram conclusos à magistrada de piso que, em 27/06/2022, proferiu decisão recebendo a denúncia ofertada em desfavor do ora paciente, indeferiu a decretação de sua prisão, decidindo-se, em seu lugar, pela aplicação das medidas cautelares alternativas previstas nos incisos I, II, III e IV, do art. 319, do CPP, bem como pela imposição da medida cautelar de suspensão do exercício de função pública requerida pelo parquet (art. 319, VI, do CPP). Ao fazê-lo, valeu-se dos seguintes fundamentos:

No caso concreto, o denunciado, Vereador reeleito do Município de Paracambi, diante de veementes indícios que atentam não apenas contra a vida, mas também contra o regime democrático, figure como réu em processo criminal, sendo incompatível o exercício das suas funções normalmente, assim deverá ser seja afastado cautelarmente do seu cargo. Em 28/06/2022, a defesa requereu acesso aos autos (sigilosos).

Segundo o Ministério Público, o recorrente, vereador eleito do Município de Paracambi/RJ, é suspeito de ser o autor intelectual e mandante do crime de homicídio qualificado ocorrido no dia 11/11/2020, na forma tentada, praticado com emprego de arma de fogo e que causou lesões corporais na vítima que, após se desentender com o paciente, teria passado a apoiar um opositor político do recorrente.

No caso, entendo que a medida cautelar deve ser revogada.

Primeiro - O afastamento do recorrente do cargo foi determinado na decisão que recebeu a denúncia, proferida em 27/6/2022, mediante a justificativa de que a acusação imputada ao denunciado é incompatível com o exercício das suas funções de membro do parlamento municipal.

Tratando-se de uma medida voltada para a efetividade do processo penal, entendo que a medida questionada não guarda a indispensável necessidade e adequação.

Em verdade, toda e qualquer conduta criminosa prevista no Código Penal é incompatível com o comportamento de qualquer cidadão, independente da atividade que exerça, pública ou privada, e merece ser investigada e punida.

Além disso, o fato teria ocorrido em 11/11/2020, durante a campanha eleitoral para o cargo para o qual o paciente foi reeleito e não há registros de que, na condição de vereador, tenha interferido na investigação.

Como dito, antes do trânsito em julgado, todo réu é considerado inocente, razão pela qual restrições cautelares exigem necessariamente fundamentação específica , observando os critérios de necessidade e adequação.

Portanto, no caso em exame, como pontuado no voto minoritário, "[...] diante de tais fatos trazidos aos autos, (...) a conduta imputada ao paciente não guarda nexo funcional ou relação direta com o mandato eletivo por ele exercido" (e-STJ fl. 137).

Segundo - A Magistrada singular, por duas vezes, reconheceu não haver contemporaneidade para a decretação da prisão preventiva. Confira-se (e-STJ fl. 135):

Ademais, na própria decisão que suspendeu o exercício da função pública (pasta 74 do anexo 01), a magistrada de piso negou a prisão preventiva do paciente, in verbis:

"Por outro lado, a prisão, neste momento, mostra-se medida excessiva, diante do lapso temporal decorrido entre o fato e apresente data, sem que tenha sido constatado qualquer outro ato que demonstre a necessidade do cárcere , mesmo tendo sido mantida a interceptação das linhas telefônicas durante considerável período."

Dias depois, diante de novo pedido do Ministério Público pela prisão preventiva (pasta 78 do anexo 01), negou novamente:

"Quanto ao requerimento para decretação da prisão preventiva, entendo que os argumentos indicados pelo Ministério Público na petição de fls. 538, já foram objetos de enfrentamento quando do recebimento da denúncia, e não houve qualquer alteração fática de relevância que justifique o deferimento da medida postulada pelo Ministério Público, pelo que mantenho a decisão anterior pelos próprios fundamentos."

Acertadamente, a prisão preventiva não foi decretada por não haver contemporaneidade, visto que o suposto fato ocorreu há dois anos.

Ora, se não havia razões contemporâneas para a decretação da prisão por fato que ocorreu no período eleitoral, mostra-se congruente a determinação do afastamento do recorrente do cargo para o qual foi reeleito. Como concluiu o Relator do processo, vencido no julgamento: "Não nos parece trivial um fato que supostamente ocorreu em 2020 repercutir em pleno período eleitoral. A imposição de medida cautelar atípica que restringe o exercício da atividade profissional mostra-se demasiada ." (e-STJ fl. 136).

Terceiro e último. O paciente se encontra afastado das funções parlamentares desde 27/6/2022, há mais de um ano, além de cumprir outras cautelares restritivas, sem registros de violação. Além disso, observa-se que não foi fixado um prazo para a medida de afastamento das funções e, pelas informações prestadas pelo Juízo de primeiro grau, a ação penal está paralisada, o que demonstra uma falta de perspectiva quanto ao futuro - seja quanto ao retorno do recorrente ao cargo para o qual foi eleito, seja em relação à conclusão da ação penal. Ainda, vale destacar que o mandato eletivo se encerra no final do próximo ano, e o prolongamento dessa indefinição pode configurar uma cassação por via transversa.

Nessa linha de raciocínio, certo é que o papel do Poder Judiciário é fazer observar e cumprir as disposições constantes do ordenamento jurídico, não sendo legitimado a atrair, para si, responsabilidades de decisões políticas inerentes ao exercício do sufrágio.

Nesse sentido:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E PECULATO. VEREADOR E PRESIDENTE DE CÂMARA MUNICIPAL. PRISÃO PREVENTIVA SUBSTITUÍDA POR MEDIDAS CAUTELARES. AFASTAMENTO DO CARGO POR CERCA DE 1 ANO E 8 MESES. AÇÃO PENAL NA FASE DE RESPOSTA A ACUSAÇÃO. EXCESSO DE PRAZO. OCORRÊNCIA. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional, com a exceção de quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se concede a ordem de ofício.

2. Caso em que o paciente, na condição de Vereador e de Presidente da Câmara Municipal de Correntina/BA, teve a prisão preventiva decretada em 23/10/2017 no bojo da operação denominada "Último Tango", a qual tinha por objetivo apurar a suposta prática de crimes contra a Administração Pública no âmbito da Câmara de Vereadores do Município de Correntina/BA, tendo sido denunciado pela suposta prática dos crimes de peculato (art. 312 do Código Penal) e associação criminosa (art. da Lei nº 12.850/2013).

3. Em julgamento realizado no dia 4/9/2018, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu a ordem para substituir a prisão preventiva por medidas cautelares, entres elas a proibição de acessos aos prédios público e

afastamento do cargo de gestor da Câmara e de Vereador do município, com revisão no máximo em 180 dias. Em 4/10/2019, o juízo de primeiro grau indeferiu o pedido de retorno do paciente ao cargo de vereador, decisão mantida pelo Tribunal estadual.

4. No caso, as informações prestadas pelo Juízo de primeiro grau não mencionam intercorrências, descumprimentos ou qualquer excepcionalidade que indique um eventual risco ao regular desenvolvimento do processo, que ainda se encontra na fase de resposta a acusação. Por outro lado, o paciente se encontra afastado há mais de 1 ano e 8 meses, tempo que representa quase 1⁄2 (metade) do mandato eletivo, configurando, assim, uma interferência indevida do Poder Judiciário. Nesse contexto, as medidas cautelares de i) proibição de acesso aos prédios público do Poder Legislativo e do Poder Executivo e de frequentar locais relacionados aos fatos e ii) de afastamento imediato da função de Presidente da Câmara e do cargo de Vereador do Município, devem ser relaxadas, com os cuidados devidos, a saber, ficando o paciente impedido de assumir qualquer outra função diversa (como as de natureza administrativa) da atividade típica da atuação parlamentar. Precedentes.

5. Nessa linha de raciocínio, certo é que o papel do Poder Judiciário é fazer observar e cumprir as disposições constantes do ordenamento jurídico, não sendo legitimado a atrair, para si, responsabilidades de decisões políticas inerentes ao exercício do sufrágio. Precedentes do STJ.

6. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, sendo vedado ao paciente assumir qualquer outra função diversa da atividade típica da atuação parlamentar, inclusive cargos de direção na Câmara Municipal. ( HC n. 561.252/BA, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 26/5/2020, DJe de 2/6/2020)

AGRAVO REGIMENTAL. PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR. AFASTAMENTO CAUTELAR DE AGENTE POLÍTICO. DECISÃO QUE IDENTIFICOU RISCO À INSTRUÇÃO PROCESSUAL. INEXISTÊNCIA DE GRAVE LESÃO À ORDEM PÚBLICA.

I - A decisão que prorrogou o afastamento cautelar do agente político está fundamentada no risco da instrução processual. Inexistência de grave lesão à ordem pública.

II - A prorrogação não pode representar uma interferência indevida no mandato eletivo. Limitação dos efeitos da decisão pelo prazo de 180 dias contados da data em que prolatada (1º de outubro de 2014) ou até o término da instrução processual - o que ocorrer antes.

Agravo regimental desprovido.

(AgRg na SLS n. 1.957/PB, relator Ministro Francisco Falcão, Corte Especial, julgado em 17/12/2014, DJe de 9/3/2015)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. ART. , I, DL 201/1967. MEDIDA DE AFASTAMENTO CAUTELAR DO CARGO COM IMPOSIÇÃO DE RESTRIÇÕES FUNDADAS NO ART. 319 DO CPP SOB PENA DE PRISÃO. ADMISSIBILIDADE DO MANDAMUS, NA HIPÓTESE. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. WRIT IMPETRADO CONTRA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. NÃO ESGOTAMENTO DA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. ILICITUDE DA PROVA ADVINDA DE QUEBRA DE SIGILO DETERMINADA POR JUIZ DE DIREITO EM AUTOS DE INQUÉRITO CIVIL. QUESTÃO NÃO APRECIADA NO DECISUM. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO VÁLIDA DA DECISÃO NO TOCANTE AO AFASTAMENTO DA PREFEITA DO CARGO. FALTA DE CONTEMPORANEIDADE ENTRE OS FATOS INVESTIGADOS E A DECISÃO DE AFASTAMENTO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE HC DE OFÍCIO. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO, TÃO SOMENTE PARA CASSAR O DECISUM NA PARTE EM QUE DETERMINOU O AFASTAMENTO DA PREFEITA DO CARGO E SUAS CONSEQÜÊNCIAS.

1. A jurisprudência mais atual da Terceira Seção desta Corte Superior de Justiça entende que a admissibilidade de habeas corpus para discutir afastamento de prefeito do cargo está condicionada à imposição conjunta de medidas que possam implicar restrição à liberdade de locomoção do paciente, como a prisão preventiva ou medidas cautelares diversas da prisão, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal.

2. Na hipótese, o mandamus volta-se contra decisão de relator de medida cautelar requerida pelo Ministério Público do Estado da Paraíba que, além de determinar o afastamento da paciente do cargo de Prefeita, impôs restrições fundadas no art. 319 do CPP, sob pena de prisão preventiva, como esclareceu a própria autoridade coatora em suas informações. Nesse contexto, é, em princípio, admissível a impetração.

3. Compete ao Superior Tribunal de Justiça apreciar habeas corpus impetrado nas hipóteses em que a autoridade coatora ou o paciente estejam indicados no art. 105, inciso I, alíneas a e c, da Constituição Federal.

4. No caso, o writ foi impetrado contra decisão monocrática proferida por relator no Tribunal de origem, a qual não foi impugnada por recurso cabível, objetivando submeter a decisão à apreciação do órgão colegiado. Uma vez não esgotada a instância ordinária, é manifesta, portanto, a supressão de instância.

5. Quanto à nulidade da prova produzida em inquérito civil, além da supressão de instância, registre-se que a jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que "a ação de improbidade administrativa deve ser processada e julgada nas instâncias ordinárias, ainda que proposta contra agente político que tenha foro privilegiado no âmbito penal e nos crimes de responsabilidade" ( AgRg na Rcl 12.514/MT, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJe 26/9/2013).

6. É possível a concessão de ordem de habeas corpus, de ofício, quando verificada flagrante ilegalidade.

7. Segundo jurisprudência desta Corte, o afastamento de prefeito do cargo, com fundamento no art. , II, do DL 201/1967 deve respeitar o princípio da contemporaneidade, exigindo, para o seu deferimento, fundamentação lastreada em dados objetivos e concretos que demonstrem o perigo atual que a permanência no cargo pode acarretar para o município, o que não ocorreu no caso concreto.

8. Habeas Corpus não conhecido. Ordem parcialmente concedida, de ofício, para suspender os efeitos da decisão proferida nos autos da Medida Cautelar 0003009-54.2015.815.0000, apenas em relação aos aspectos do afastamento da paciente do cargo de Prefeita do Município de Monte Horebe/PB. ( HC n. 331.986/PB, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta

Turma, julgado em 16/6/2016, DJe de 23/6/2016)

Ante o exposto, com fundamento no art. 34, XVIII, b, dou provimento ao recurso em habeas corpus para revogar a medida cautelar de afastamento do recorrente do cargo de Vereador do Município , devendo o Juízo de primeiro grau reavaliar as cautelares em vigor compatibilizando-as com o exercício da atividade parlamentar do recorrente.

Intimem-se.

Brasília, 01 de agosto de 2023.

Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA

Relator

(STJ - RHC: 174490, Relator: REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Publicação: 02/08/2023)


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