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2 de Maio de 2024

STJ Ago23 - Prisão Preventiva Revogada - Homicídio - Fundamentação Abstrata - Ser ex. Policial e Temor das Testemunhas

há 7 meses

Inteiro Teor

HABEAS CORPUS Nº 825724 - SP (2023/0175102-7)

RELATOR : MINISTRO JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR

CONVOCADO DO TJDFT)

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus , com pedido liminar, impetrado contra acórdão assim ementado:

Habeas corpus. Crimes de homicídio qualificado tentado, em concurso material com furto qualificado. Pedido de revogação das prisões cautelares. Impossibilidade. Gravidade em concreto da conduta dos pacientes. Necessidade de resguardo à integridade física e psíquica das testemunhas. Decisão que decretou a prisão preventiva bem fundamentada. Insuficiência e inaplicáveis as medidas cautelares diversas da prisão. Constrangimento ilegal não configurado. Ordem denegada.

Consta nos autos que os pacientes foram condenados em sessão do Tribunal do Júri como incursos nos arts. 121, § 2º, IV, c/c 14, II, e 155, § 4º, IV, do Código Penal. Heverton e Alessando às penas de 12 anos e 6 meses de reclusão, em regime fechado, e 12 dias-multa. Altair à pena de 11 anos e 8 meses de reclusão, em regime fechado, e 11 dias-multa. Na ocasião, foi concedido aos réus o direito de recorrer em liberdade.

O impetrante sustenta a existência de constrangimento ilegal diante da decretação da prisão preventiva sem nenhuma fundamentação concreta que indique que os pacientes possam colocar em risco a vida ou integridade física e psicológica da testemunha Juliana.

Também defende ser genérica a fundamentação posta quanto aos munícipes, sustentando que os pacientes já não exercem a profissão de policiais há quase 10 anos, que já foram condenados pelo Plenário do Júri e que não foi apontado qualquer fato novo que justificasse a prisão.

Aduz que "As argumentações genéricas e sem fundamentação no caso em concreto não podem servir como fundamentos suficientes para manter a segregação cautelar se nenhum fato em concreto demonstrar a necessidade para tal medida e, principalmente, a prisão preventiva não deve ser utilizada com objetivos secundários de antecipação da pena" (fl. 10).

Requer, liminarmente, a suspensão dos efeitos da decisão que decretou a prisão preventiva. No mérito, possam recorrer da sentença de primeiro grau em liberdade.

Deferida a liminar e prestadas informações, o Ministério Público Federal manifestou-se pela concessão da ordem.

Não obstante a excepcionalidade que é a privação cautelar da liberdade antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, reveste-se de legalidade a medida extrema quando baseada em elementos concretos, nos termos do art. 312 do CPP.

Extrai-se da decisão que decretou a prisão preventiva (fls. 30-31):

Entendo que assiste razão ao Ministério Público.

Os réus foram condenados por órgão colegiado previsto constitucionalmente, embora recorrível, entendo pela imprescindibilidade da prisão cautelar dos acusados para fins de garantia da ordem pública e aplicação da lei penal.

Os réus Heverton e Alessandro foram policiais militares e expulsos da corporação após regular processo administrativo, exercendo influência nos munícipes desta cidade, enquanto que o réu Altair foi reconhecido como o mandante dos crimes em tela, com influência negativa sobre as pessoas que lhe desagradam. No plenário, sua ex- esposa narrou seu forte temor sobre os atos dos acusados sobre sua pessoa, medo de represálias em consequência do resultado de seu depoimento no julgamento em questão, de modo que a custódia dos réus deve realmente ser decretada para se garantir a integridade física e psíquica das pessoas diretamente envolvidas nos crimes apurados, evitando-se sensação de impunidade ou ato atentatório à segurança das testemunhas e daqueles que tomaram parte no julgamento em plenário.

Os fatos em apuração são graves, assim como a atuação dos réus nesta cidade, apesar do tempo do apurado, ainda irradia temor nos munícipes, ante a influência que exerciam como detentores de cargos de segurança pública e Altair era pessoa próxima dos militares e influente nesse cenário.

[...]

Destarte, tenho que a prisão preventiva se mostra mesmo necessária, por todos os motivos acima expostos e nos termos do requerimento do Ministério Público.

Assente neste Tribunal que "A prisão preventiva é uma medida excepcional, de natureza cautelar, que autoriza o Estado, observadas as balizas legais e demonstrada a absoluta necessidade, restringir a liberdade do cidadão antes de eventual condenação com trânsito em julgado (art. , LXI, LXV, LXVI e art. 93, IX, da CF). Exige-se, ainda, na linha inicialmente perfilhada pela jurisprudência dominante deste Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal e agora normatizada a partir da edição da Lei n. 13.964/2019, que a decisão esteja pautada em motivação concreta de fatos novos ou contemporâneos, bem como demonstrado o lastro probatório que se ajuste às hipóteses excepcionais da norma em abstrato e revelem a imprescindibilidade da medida, vedadas considerações genéricas e vazias sobre a gravidade do crime"( AgRg no HC n. 695.954/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 5/10/2021, DJe de 13/10/2021).

No caso dos autos, mencionou o impetrante que o fato delituoso ocorreu em 11/10/2013. Houve a decretação de prisão temporária em 4/6/2014, convertida em preventiva em 1/7/2014. Posteriormente, em 2/12/2014, foi concedida liberdade provisória combinada com medidas cautelares diversas da prisão, o que levou os paciente a responderem ao processo em liberdade.

Quando da condenação pelo Tribunal do Júri, em 3/3/2023, concedeu-se aos pacientes o direito de recorrer em liberdade (fl. 1.465). Posteriormente, após pedido do Ministério Público, em 6/3/2023, o juiz de 1º grau decretou a prisão preventiva.

A respeito, verifica-se que a decisão proferida não descreve elementos concretos que indiquem a presença de fatos novos ou contemporâneos que justificassem a decretação da prisão preventiva.

Da leitura, apenas extrai-se a menção à gravidade do delito como forma de justificar a presença dos requisitos do art. 312 do CPP, bem como de alegado forte temor da ex-exposa do paciente Altair. Também ressaltou-se alegada influência que os outros dois pacientes, ex-policiais, pudessem exercer sobre os munícipes.

Ocorre pois hipótese de fundamentação genérica e abstrata sobre referidos requisitos, não tendo sido apresentados quaisquer elementos concretos que evidenciassem motivos para o temor da ex-esposa do paciente Altair ou de efetiva influência dos pacientes sobre os munícipes, até porque já foram condenados pelo Tribunal do Júri. Assim, as razões postas não se mostram suficientes para justificar a segregação cautelar.

A respeito:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. PROCESSUAL PENAL. DUPLO HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. MANUTENÇÃO DA SEGREGAÇÃO NA SENTENÇA DE PRONÚNCIA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS QUE DEMONSTREM A NECESSIDADE DA CUSTÓDIA CAUTELAR. ACRÉSCIMO DE FUNDAMENTAÇÃO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE POR MEIO DA VIA DO WRIT. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. A prisão preventiva, para ser legítima à luz da sistemática constitucional, exige que o Magistrado, sempre mediante fundamentos concretos extraídos de elementos constantes dos autos (arts. 5.º, incisos LXI, LXV e LXVI, e 93, inciso IX, da Constituição da Republica),

demonstre a existência de prova da materialidade do crime e de indícios suficientes de autoria delitiva (fumus comissi delicti), bem como o preenchimento de ao menos um dos requisitos autorizativos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal, no sentido de que o réu, solto, irá perturbar ou colocar em perigo (periculum libertatis) a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal.

2. No decreto prisional e nas decisões que indeferiram os pleitos de revogação da custódia cautelar do Agravado foram apresentados argumentos abstratos acerca da gravidade do crime, bem como foi afirmado, de maneira hipotética, que o Acusado poderia constranger as vítimas e as testemunhas, para impedir o seu reconhecimento, e frustrar os chamamentos judiciais, ensejando a aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal. Tais invocações, afastadas do substrato fático, revelam-se insuficientes para justificar a constrição cautelar.

3. Constata-se que o Magistrado singular decretou a prisão preventiva com lastro em fundamentação inidônea e genérica, pois não logrou demonstrar, com elementos concretos dos autos, o periculum libertatis, limitando-se a tecer argumentos acerca da gravidade abstrata do crime de homicídio qualificado tentado, sobre a possível intimidação das testemunhas e o receio de futura fuga, sem amparo em dados concretos extraídos do autos. Já na decisão de pronúncia, o Juiz singular restringiu-se a consignar que "[n]ão poderá o réu recorrer em liberdade desta sentença", sem fazer qualquer referência sobre a necessidade concreta de manutenção da medida extrema e nem mesmo sobre o decreto prisional outrora proferido.

4. Nesse contexto, pontua-se que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de que fundamentos vagos, aproveitáveis em qualquer outro processo, não são legítimos para justificar a prisão preventiva, porque nada dizem sobre a real periculosidade do Agente, que só pode ser decifrada à luz de elementos concretos constantes do feito.

5. Ressalta-se que, embora a Corte local, ao corroborar o decreto prisional, tenha destacado a gravidade concreta da conduta e a periculosidade do Agravado, não é permitido ao Tribunal, no âmbito do habeas corpus, agregar fundamentos não presentes na decisão do Juízo singular, por ser indevida a inovação em remédio constitucional exclusivo da Defesa.

6. Agravo regimental desprovido. ( AgRg no RHC n. 133.484/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 15/3/2022, DJe de 22/3/2022.)

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO E HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PRISÃO. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA. TRIBUNAL ACRESCE FUNDAMENTAÇÃO. ILEGALIDADE. LIBERDADE CONCEDIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. O decisum combatido não apresentou nenhum elemento concreto dos autos que pudesse justificar a custódia do réu. O periculum libertatis foi embasado em motivação genérica, sem nem sequer mencionar a gravidade abstrata dos delitos, nem a mínima individualização da conduta do ora recorrente - que, a propósito, segundo a denúncia, não foi executor do delito, mas permaneceu no interior do veículo, "assegurando a execução e fuga".

2. O Tribunal a quo, ao mencionar a quantidade de entorpecente apreendida com o réu, bem como suas passagens anteriores pela suposta prática de delitos da mesma natureza, trouxe novos elementos para justificar a manutenção da prisão cautelar do paciente - modus operandi empregado no delito, além do fato de ele haver permanecido em lugar incerto e não sabido. Porém, a jurisprudência desta Corte Superior é firme em assinalar que o acréscimo de fundamentos, pelo Tribunal local, não se presta a suprir a ausente motivação do Juízo natural, sob pena de, em ação concebida para a tutela da liberdade humana, legitimar-se o vício do ato constritivo ao direito de locomoção do paciente. Ilustrativamente: HC n. 377.398/PE (Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, 6a T., DJe 21/3/2017).

3. Ademais, a jurisprudência desta Corte Superior é firme ao assinalar que a simples não

localização do réu para responder ao chamamento judicial ou o fato de encontrar-se em local incerto e não sabido não constitui motivação suficiente para o encarceramento provisório, quando dissociado de qualquer outro elemento real que indique a sua condição de foragido. Não cabe deduzir que, frustrada a notificação ou a citação editalícia no processo penal, o acusado estaria evadido.

4. Agravo não provido. ( AgRg no RHC n. 144.936/AM, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 14/9/2021, DJe de 21/9/2021.)

Ademais, pontua a jurisprudência do STJ que a "contemporaneidade não está restrita à época da prática do delito, e sim da verificação da necessidade no momento de sua decretação, ainda que o fato criminoso tenha ocorrido em um período passado." ( AgRg no HC 707.562/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 08/03/2022, DJe 11/03/2022).

No caso dos autos, verifica-se que o fato delituoso ocorreu em 11/10/2013. Por sua vez, a prisão preventiva somente foi decretada em 6/3/2023, não tendo sido demonstrada qualquer circunstância concreta que indique a presença de fatos novos ou contemporâneos que justificassem a medida.

Ante o exposto, concedo o habeas corpus para revogar a prisão preventiva dos pacientes, se por outro motivo não estiverem presos.

Comunique-se.

Publique-se.

Intimem-se.

Brasília, 01 de agosto de 2023.

Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT)

Relator

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(STJ - HC: 825724, Relator: JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), Data de Publicação: 02/08/2023)

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