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30 de Abril de 2024

STJ Ago23 - Decote de Qualificadora - Homicídio - Ausência de Motivo não é Motivo Fútil

há 6 meses

Inteiro Teor

HABEAS CORPUS Nº 756852 - SP (2022/0220563-0)

RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ


EMENTA

HABEAS CORPUS . HOMICÍDIO QUALIFICADO. INSURGÊNCIA CONTRA ACÓRDÃO TRANSITADO EM JULGADO. MANEJO DO WRIT COMO REVISÃO CRIMINAL. DESCABIMENTO. ILEGALIDADE FLAGRANTE, TODAVIA, EVIDENCIADA. DOSIMETRIA. QUALIFICADORA DA UTILIZAÇÃO DE EMPREGO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. EXCLUSÃO INCABÍVEL. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. PROVIDÊNCIA INCABÍVEL NA VIA ELEITA. MOTIVO FÚTIL. DECOTE DE RIGOR. AUSÊNCIA DE MOTIVO QUE NÃO CONFIGURA A QUALIFICADORA EM COMENTO. CONFISSÃO QUALIFICADA. ALEGAÇÃO DE LEGÍTIMA DEFESA. IRRELEVÂNCIA, NO CASO. PENA REDIMENSIONADA. PEDIDO NÃO CONHECIDO. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA DE OFÍCIO.

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus , sem pedido liminar, impetrado em favor de ANXXXXXXXXXXXXXXXOS contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo proferido no julgamento da Revisão Criminal n. 0024378-88.2021.8.26.0000.

Consta nos autos que, em primeiro grau, o Paciente foi condenado "como incurso nas sanções do artigo 121 § 2º, incisos II e IV c/c artigo 14, inciso II (vítima Danilo) e artigo 121 § 2º, inciso II c/c artigo 14, inciso II (vítima Wender) do Código Penal, ambos na forma do artigo 69 do mesmo diploma legal, a cumprir pena privativa de liberdade total de 14 anos e 4 meses de reclusão em regime inicial fechado" (fl. 102).

Inconformado, o Sentenciado apelou ao Tribunal de origem, que deu "parcial ao provimento ao recurso, para reduzir a pena a 13 (treze) anos, 2 (dois) meses, 22 (vinte e dois) dias de reclusão, mantida, no mais, a sentença" (fl. 148).

Após o trânsito em julgado, a Defesa ajuizou revisão criminal na Corte local, que julgou improcedente o pedido (fls. 22-29).

Neste writ, a Defensoria Impetrante postula, de início, a exclusão da qualificadora do art. 121, § 2.º, inciso II, do Código Penal. Alega que o quesito foi apresentado aos jurados nos seguintes termos: "o crime foi praticado por motivo fútil, ante à ausência de motivo?" (fl. 6). Argumenta, porém, que a "ausência de motivo, contudo, não pode ser considerada sinônimo de motivo fútil, segundo entendimento jurisprudencial dominante" (fl. 6).

Com relação à qualificadora do art. 121, § 2.º, inciso IV, do Código Penal, afirma que "os jurados decidiram de forma diversa para cada uma das vítimas" (fl. 10). Aduz que "o crime foi praticado no mesmo contexto fático, estando os dois no mesmo churrasco" (ibidem) e que isso indica haver "contrariedade na decisão dos jurados, já que a conclusão foi diferente para cada vítima, apesar de estarem no mesmo contexto" (ibidem).

No mais, alega que "o paciente confessou parcialmente os fatos, já que confirmou ter agredido com uma faca as duas vítimas durante um churrasco" (fl. 10), razão pela qual faz jus à atenuante do art. 65, inciso III, alínea d, do Código Penal.

Ao final, requer "seja concedida a ordem de Habeas Corpus , para (i) afastar as qualificadoras de motivo fútil e recurso que dificultou a defesa da vítima e (ii) aplicar a atenuante da confissão no caso, compensando-a com a agravante" (fl. 12).

As informações foram prestadas (fls. 161-182).

O Ministério Público Federal opinou pelo não conhecimento do pedido (fl. 186).

É o relato do necessário. Decido.

A pretensão defensiva comporta parcial acolhimento.

Vale destacar que, em homenagem ao princípio da soberania dos veredictos do Tribunal do Júri (art. 5.º, inciso XXXVIII, alínea c , da Constituição Federal), o afastamento da conclusão adotada pelo Conselho de Sentença somente pode ocorrer em circunstâncias excepcionais (art. 593, inciso III, alínea d, do Código de Processo Penal).

No caso em tela, ao julgar o apelo defensivo, a Corte local manteve ambas as qualificadoras (art. 121, § 2.º, incisos II e IV, do Código Penal), consignando o que se segue (fls. 144-146; sem grifos no original):

"Interrogado, admitiu parcialmente os fatos. Nas duas fases (judicium accusationis e causae) disse que os ofendidos frequentemente lhe pediam dinheiro, sob ameaça de agressão. Certo dia, eles participavam de um churrasco próximo à sua residência, quando, novamente, lhe pediram dinheiro, negando-se a atendê-los. Wender partiu para cima e, para se defender, pegou uma faca e desferiu-lhe um golpe, não sabendo dizer se chegou efetivamente a atingi-lo. Logo após, Danilo também 'veio para cima', quando atirou a faca em sua direção e correu. Admitiu já ter adquirido drogas dos ofendidos, mas não possuía qualquer divida.

Danilo realizava um churrasco na rua, do qual o Apelante também participava, mas não viu Wender sendo agredido. Contou que depois foi apunhalado pelas costas, negando qualquer problema com o Apelante a quem nada havia cobrado.

Wender também estava na reunião e tudo corria bem, sem qualquer desentendimento, até que ANTÔNIO veio em sua direção e lhe desferiu um golpe com faca no pescoço, fazendo com que caísse ao solo, informando não ter presenciado a agressão a Danilo, o que soube posteriormente, por terceiros. Refutou ser usuário ou qualquer envolvimento com tráfico de drogas e que não tinha qualquer problema com ele.

Clemilda, genitora de Danilo, confirmou que ele ofereceu um churrasco aos amigos após receber seu primeiro salário. ANTÔNIO participava da festa e presenciou quando pediu R$ 10 a uma pessoa, para comprar entorpecentes, o que foi recusado, retirando- se da confraternização. Retornou, aproximadamente meia hora depois, munido de uma faca e desferiu um golpe em Wender. Não viu quando Danilo foi ferido.

Portanto, como se vê, a prova concatenada é plenamente desfavorável ao Apelante, ressaltando-se que, no recurso de apelação contra sentença proferida pelo Tribunal do Júri, sob o fundamento de manifesta prova contrária a dos autos, somente se admite a cassação do Veredicto se desprovido de elementos mínimos de prova capazes de sustentá-lo, hipótese não constatada.

[...]

O Apelante tentou ceifar a vida dos ofendidos sem qualquer motivação conhecida. Respeitado vozes dissonantes, a aparente ausência de motivos deve ser equiparada a fútil . Com efeito, se aquele de somenos importância justifica maior recrudescimento da pena, com maior razão deve ser punida, mais gravemente, a infração penal desarrazoada. O recurso que dificultou a defesa da vítima somente foi reconhecido no tocante a Danilo, golpeado com faca em momento de descontração, enquanto participava de uma festa, o mesmo não acontecendo com relação a Wender, o que não pode ser modicado em respeito ao princípio da soberania do júri."

No julgamento da revisão criminal, as qualificadoras igualmente foram mantidas, desta feita com base na seguinte fundamentação (fl. 26; sem grifos no original):

"No que diz respeito ao mérito, vale consignar que durante uma confraternização, o peticionário apoderou-se de uma faca e desferiu golpes contra as vítimas, atingindo-as em regiões vitais abdômen e pescoço -, e tais agressões foram confirmadas por testemunhas.

Quanto às circunstâncias qualificadoras do motivo fútil e do recurso que dificultou a defesa da vítima, ambas foram reconhecidas pelo Conselho de Sentença, e seu afastamento, neste momento processual, ofenderia a soberania dos vereditos, ressalvadas situações excepcionalíssimas.

Observo que há lastro probatório mínimo a suportar o reconhecimento das qualificadoras, visto que o réu surpreendeu as vítimas, atacando-as de inopino , e que agiu por motivo de somenos importância, ao que parece, dívidas relacionadas ao consumo de drogas."

Com relação à qualificadora do art. 121, § 2.º, inciso IV, do Código Penal, a Corte local entendeu que havia lastro probatório suficiente para a conclusão de que o Réu valeu-se de meio que dificultou a defesa da vítima Danilo. Nesse sentido, para inverter a conclusão adotada na origem, seria imprescindível incursionar, verticalmente, no acervo probatório, providência de todo incompatível com a estreita via do writ.

Com efeito, confiram-se os seguintes julgados com idêntica conclusão:

"[...]

5. O Júri é soberano e considerou a existência da qualificadora e essa conclusão não pode ser alterada na via eleita, pois, só seria possível se entendêssemos que a conclusão dos jurados fosse manifestamente contraria a prova dos autos, o que demandaria exame aprofundado de provas, providência vedada na via eleita.

[...]

7. Agravo regimental desprovido." ( AgRg no HC n. 687.044/SC, relator Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 19/12/2022, DJe de 22/12/2022; sem grifos no original.)

"AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS . DOSIMETRIA. QUANTUM DE AUMENTO DA PENA-BASE E DE DIMINUIÇÃO POR OCASIÃO DO AFASTAMENTO DE VETORES PELO TRIBUNAL A QUO . INOVAÇÃO RECURSAL. REPRIMENDA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

[...]

2 . No caso, uma vez que o acórdão apontou elementos dos autos a embasar a decisão dos jurados, concluir de forma diversa e retirar da condenação qualificadora prevista no art. 121, § 2º, IV, do CP, como quer a defesa, demandaria o reexame vertical do conteúdo probatório desenvolvido na ação penal, providência incabível em habeas corpus. [...]

5. Agravo regimental não provido." ( AgRg no HC n. 603.561/MG, relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 15/3/2022, DJe de 22/3/2022; sem grifos no original.)

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DE RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. IMPOSSIBILIDADE. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. DOSIMETRIA DA PENA. ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM . NÃO OCORRÊNCIA.

1. A pretensão da defesa de afastar a qualificadora acolhida pelos jurados exigiria o amplo revolvimento do material fático-probatório, o que é defeso no âmbito estreito do remédio constitucional.

[...]

3. Agravo regimental desprovido." ( AgRg no HC n. 720.109/SP, relator Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Sexta Turma, julgado em 2/8/2022, DJe de 8/8/2022; sem grifos no original.)

"[...]

1. Reconhecidas pelos jurados as qualificadoras do motivo fútil e da dissimulação, não é cabível seu afastamento porque a defesa a considera a incidência injusta. As qualificadoras somente poderiam ser excluída se manifestamente contrárias às provas dos autos, nos termos do art. 593, III, 'd' , do CPP; nesse caso o Tribunal teria de submeter o réu a novo júri - e não simplesmente decotar a qualificadora, como pretende a defesa.

2. No caso, conforme o reconhecido pela Corte de origem, 'avaliando o r. decisum em todos os seus aspectos, verifica-se que não houve decisão contrária às provas dos autos, porque os Jurados simplesmente optaram por algumas das teses sustentadas em Plenário, como lhes era lícito fazer, o que, aliás, fizeram em conformidade com o arcabouço probatório'. Nesse passo, máxime na via eleita, descabe falar em afastamento das qualificadoras .

[...]

6. Agravo desprovido." (AgRg no HC n. 748.954/SP, relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 28/11/2022, DJe de 2/12/2022; sem grifos no original.)

Ressalte-se que o simples fato de o Conselho de Sentença ter acolhido a referida qualificadora apenas com relação ao homicídio tentado contra a vítima Danilo não implica, por si só, qualquer contradição. Com efeito, embora ambas as vítimas estivessem em momento de descontração da vítima, isso não quer dizer que a ação do Réu, contra cada uma delas, tenha sido, necessariamente, idêntica. Aliás, nos autos há a informação de que Danilo foi apunhalado pelas costas , diferentemente do que ocorreu com a vítima Wender, o que justificaria a conclusão diferenciada dos Jurados ao reconhecer a qualificadora somente em relação ao homicídio tentado contra aquele.

No entanto, tem razão a Defensoria Impetrante ao postular o decote da qualificadora do motivo fútil. No julgamento da apelação interposta pelo Sentenciado, a Corte local consignou que aquele "tentou ceifar a vida dos ofendidos sem qualquer motivação conhecida" e que "a aparente ausência de motivos deve ser equiparada a fútil" . Tal conclusão, porém, encontra-se em nítida desconformidade com a remansosa jurisprudência deste Sodalício, firme no sentido de que a ausência de motivação não justifica a incidência da qualificadora do art. 121, § 2.º, inciso II, do Código Penal . De fato, o atentado contra vida alheia sem qualquer motivo parece tão ou mais reprovável do que a ação movida por motivo fútil. No entanto, o legislador apenas previu este último como circunstância qualificadora, não sendo possível, ao julgador, aplicar, analogicamente a norma incriminadora em prejuízo do Réu, sob pena de afronta ao princípio da legalidade, pedra angular do Direito Penal.

São valiosas, no ponto, as ponderações de Cezar Roberto Bitencourt sobre a matéria, in verbis:

"Aliás, motivo fútil não se confunde com ausência de motivo. Essa é uma grande aberração jurídico-penal. Fazemos aqui, apenas para reflexão, uma conclusão provocativa sobre a ilogicidade do sistema penal: a presença de um motivo, fútil ou banal, qualifica o homicídio. No entanto, a completa ausência de motivo, que, teoricamente, deve tornar mais censurável a conduta, pela gratuidade e maior reprovabilidade, não o qualifica. Absurdo lógico: homicídio motivado é qualificado; homicídio sem motivo é simples. Mas o princípio da reserva legal não deixa alternativa, não havendo como considerá-lo qualificado , embora seja permitido ao julgador ao efetuar a dosimetria penal, sopesar a gratuidade da violência que levou à morte de alguém, valorando negativamente a ausência de motivo. Não há dúvida alguma de que a 'ausência de motivo' revela uma perigosa anormalidade moral que atinge as raias da demência'" (BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal : Parte especial - crimes contra a pessoa - arts. 121 a 154-B. 22. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p. 44).

Com idêntica conclusão, confiram-se os seguintes acórdãos de ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte:

"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRIBUNAL DO JURI. PRONÚNCIA. ADMISSÃO DE QUALIFICADORA. MOTIVO FÚTIL. CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO SE EQUIPARA À AUSÊNCIA DE MOTIVO. RESTABELECIMENTO DA QUALIFICADORA. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ.

1. A ausência de motivo não caracteriza a qualificadora do inciso II do parágrafo 2º do artigo 121 do Código Penal (por motivo fútil), sob pena de violação ao princípio da reserva legal.

[...]

3. Agravo regimental improvido." (AgRg no REsp n. 1.718.055/GO, relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em

21/8/2018, DJe de 30/8/2018; sem grifos no original.)

"HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. PRONÚNCIA. QUALIFICADORA. MOTIVO FÚTIL. AFASTAMENTO. INADMISSIBILIDADE. IN DUBIO PRO SOCIETATE. A DÚVIDA ACERCA DA EXISTÊNCIA DA QUALIFICADORA DEVE SER DIRIMIDA PELO TRIBUNAL DO JURI. AUSÊNCIA DE MANIFESTA ILEGALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

[...]

2. A jurisprudência desta Corte Superior não admite que a ausência de motivo seja considerada motivo fútil, sob pena de se realizar indevida analogia em prejuízo do acusado. Precedente.

[...]

Habeas corpus não conhecido." ( HC n. 369.163/SC, relator Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 21/2/2017, DJe de 6/3/2017; sem grifos no original.)

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL. HOMICÍDIO. PRONÚNCIA. MOTIVO FÚTIL. QUALIFICADORA MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. AUSÊNCIA DE MOTIVO NÃO SE EQUIPARA À EXISTÊNCIA DE FUTILIDADE. PRECEDENTES. EXCLUSÃO. REGIMENTAL DESPIDO DE ARGUMENTOS NOVOS E IDÔNEOS PARA REBATER AS RAZÕES EM QUE SE FUNDOU A DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. As razões declinadas na petição do regimental se ressentem de argumentos novos e robustos o bastante para infirmar os fundamentos da decisão agravada, proferida em conformidade com a jurisprudência sedimentada nesta Corte, no sentido de que a ausência de motivo não se equipara à existência de futilidade, devendo, portanto, ser mantida em seus próprios termos.

2. Agravo regimental desprovido." ( AgRg no REsp n. 1.289.181/SP, relatora Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, julgado em 17/10/2013, DJe de 29/10/2013; sem grifos no original.)

"HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA. MOTIVO FÚTIL. PRONÚNCIA. EXCLUSÃO. QUALIFICADORA MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. AUSÊNCIA DE MOTIVOS NÃO SE EQUIPARA À FUTILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.

[...]

2. Na hipótese em apreço, a incidência da qualificadora prevista no art. 121, § 2º, inciso II, do Código Penal, é manifestamente descabida, porquanto motivo fútil não se confunde com ausência de motivos, de tal sorte que se o crime for praticado sem nenhuma razão, o agente somente poderá ser denunciado por homicídio simples (Precedentes STJ).

3. Ordem concedida para excluir da sentença de pronúncia a qualificadora prevista no inciso II do § 2º do art. 121 do Código Penal."( HC n. 152.548/MG, relator Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 22/2/2011, DJe de 25/4/2011; sem grifos no original.)

"RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. HOMICÍDIO. PRONÚNCIA. QUALIFICADORA. MOTIVO FÚTIL. EXCLUSÃO. AUSÊNCIA DE MOTIVO NÃO SE EQUIPARA, À LUZ DO PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL, A FUTILIDADE.

1. Observa-se, na hipótese, que o juízo processante, ao afastar a qualificadora do motivo fútil, fê-lo mediante o cotejo do conjunto-probatório, ressaltando, expressamente, que 'as provas produzidas não identificaram o motivo que ensejou o crime em questão.'

2. Como é sabido, fútil é o motivo insignificante, apresentando

desproporção entre o crime e sua causa moral. Não se pode confundir, como se pretende, ausência de motivo com futilidade. Assim, se o sujeito pratica o fato sem razão alguma, não incide essa qualificadora, à luz do princípio da reserva legal.

3. Recurso desprovido." ( REsp n. 769.651/SP, relatora Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, julgado em 4/4/2006, DJ de 15/5/2006, p. 281; sem grifos no original.)

Não ignoro que, ao julgar o pedido revisional, a Corte local ressaltou que o Paciente "agiu por motivo de somenos importância, ao que parece, dívidas relacionadas ao consumo de drogas" . No entanto, é insofismável que essa circunstância não foi submetida ao crivo dos Jurados. Ao contrário, o quesito relativo à qualificadora do art. 121, § 2.º, inciso II, do Código Penal foi assim redigido: "5) O crime foi praticado por motivo fútil, ante à ausência de motivo ?" (fl. 97).

Forçoso concluir, portanto, que o Conselho de Sentença deliberou afirmativamente pela referida qualificadora em razão da pura ausência de motivos para a prática do crime doloso contra a vida, pois foi essa a circunstância submetida à deliberação dos Jurados e não a suposta relação do homicídio com dívidas relacionadas ao consumo de drogas. De rigor, portanto, a exclusão da qualificadora em exame, em respeito ao princípio da legalidade estrita .

De outro vértice, com relação à confissão, a Corte estadual consignou que "não era mesmo o caso de ser reconhecida a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea 'd', do Código Penal, visto qu e houve a denominada confissão qualificada, pois o réu, ao admitir as agressões, alegou ter agido sob o manto de excludente de ilicitude" (fl. 27).

Como se vê, no caso, se está diante de confissão qualificada , pois, a partir da premissa fática delineada no acórdão de origem, observa-se que o Réu admitiu que golpeou a vítima, porém arguiu uma excludente de ilicitude (legítima defesa) ao afirmar que agiu para se defender.

Vale ressaltar, porém, que tal característica da confissão não impede a incidência da atenuante do art. 65, inciso III, alínea d , do Código Penal. Conforme remansosa jurisprudência desta Corte, "[ a] atenuante da confissão espontânea deve ser aplicada mesmo nas hipóteses em que qualificada pela excludente de ilicitude da legítima defesa. Precedentes" (AgRg no AREsp

n. 1.637.220/SP, relator Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma, julgado em 28/04/2020, DJe 30/04/2020; sem grifos no original). Assim, de rigor a incidência da

atenuante do art. 65, inciso III, alínea d, do Código Penal.

Ressalto, porém, que ante o decote da qualificadora do motivo fútil, o reconhecimento da atenuante da confissão não terá efeito prático , tendo em vista que a pena- base foi fixada no mínimo legal pela Corte estadual e não mais remanesce qualificadora sobressalente para ser utilizada como circunstância agravante na segunda fase da dosimetria. Permanecendo, porém, a qualificadora do art. 121, § 2.º, inciso IV, do Código Penal a pena-base partirá do mínimo de doze anos de reclusão.

Fixadas essas premissas, passo ao redimensionamento das penas.

Homicídio Qualificado Tentado contra a vítima Danilo

Na primeira fase, mantenho a pena-base aplicada na origem, que corresponde ao mínimo legal, a saber: 12 (doze) anos de reclusão.

Na segunda fase, embora incida a atenuante da confissão, a pena permanece inalterada em atenção à Súmula n. 231 desta Corte.

Na terceira fase, em razão da minorante da tentativa, preservo a fração redutora estabelecida pela Jurisdição Ordinária (1/3), ponto sobre o qual, inclusive, não se controverte neste writ. Assim, fixo a pena definitivamente em 8 (oito) anos de reclusão.

Homicídio Qualificado Tentado contra a vítima Wender

Considerando que, em relação ao homicídio tentado contra Wender, a pena-base foi fixada no mínimo, não incidiram agravantes na segunda fase e que, na terceira etapa, foi aplicada a fração redutora máxima para a tentativa, vai mantida a pena estabelecida pela Jurisdição Ordinária, a saber: 4 (quatro) anos de reclusão.

Considerando o concurso material de infrações penais, procedo à soma das penas, que ficam totalizadas em 12 (doze) anos de reclusão.

Fica mantido o regime inicial fechado, único cabível para o quantum da pena aplicada, consoante prescreve o art. 33, § 2.º, alínea a, do Código Penal.

Ante o exposto, NÃO CONHEÇO do pedido, porém CONCEDO a ordem de habeas corpus , de ofício, para decotar a qualificadora do motivo fútil, reconhecer a incidência da atenuante da confissão espontânea e redimensionar a pena aplicada ao Paciente na ação penal n. 0001308-41.2016.8.26.0542, que fica estabelecida em 12 (doze) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, mantidos os demais termos da condenação.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 01 de agosto de 2023.

Ministra LAURITA VAZ

Relatora

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(STJ - HC: 756852, Relator: LAURITA VAZ, Data de Publicação: 02/08/2023)

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