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23 de Maio de 2024
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    Do abandono afetivo de idosos: O Princípio da Afetividade e a Reparação Civil

    Publicado por Thaislane Coelho
    há 4 anos

    Resumo: O abandono afetivo de idosos sempre esteve presente na sociedade, contudo, tal problemática ainda está distante de ser solucionada. Nesse cenário, a necessidade gritante de modificações contou com a ajuda do Princípio da Afetividade para a praticabilidade da Reparação Civil. É digno de nota que a natureza reparatória não visa a pecúnia em si, pois a reparação em tela tem o intuito de dissipar a conscientização de que a proteção dos idosos é um dever dos seus entes familiares e não uma faculdade.

    Palavras-chave: Idosos; Abandono afetivo; Princípio da Afetividade; Reparação Civil.

    INTRODUÇÃO

    Existem dois tipos de envelhecimento: o biológico, que é inevitável, pois segue a ordem cronológica do ser humano, e o psicológico, que é desenvolvido a partir das emoções vivenciadas ao longo da vida, ou em alguma fase específica dela.

    De acordo com a Política Nacional do Idoso, Lei nº 8.842, de janeiro de 1994 no seu art. : “Considera-se idoso, para os efeitos desta Lei, as pessoas maiores de sessenta anos de idade”. Sendo desse modo uma prerrogativa brasileira, a questão cronológica.

    Por questões físicas e psicológicas os idosos necessitam de atenção redobrada apesar da vasta experiência acoplada ao longo da vida, pois ao envelhecer o ser humano dispõe de uma perca significativa de hormônios, neurônios, elasticidade, resistência e dos cinco sentidos.

    É importante ressaltar que o metabolismo de cada pessoa reage de uma forma diferente, uma vez que a sua predisposição é uma soma de questões genéticas e psicológicas.

    Como definido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), a saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades.

    Como é sabido, o século XXI é conhecido como o século da “depressão”. Das doenças da alma, de uma forma ampla. Dentre a enorme variedade de doenças da nossa psique, fora denominada de depressão a junção de sentimentos como a presença de tristeza, solidão, pessimismo e baixa autoestima. Tais doenças são provocadas por diversos fatores, como o abandono afetivo.

    Diante das modificações impostas pelo corpo humano ao decorrer das décadas, os idosos sofrem também as modificações impostas pelas famílias e pela sociedade.

    Em uma era tecnológica onde tudo se troca, é inegável que não só aparelhos são descartáveis. Os idosos por sofrerem tamanhos desrespeitos são descartados a margem de uma sociedade individualista.

    Embora ninguém possa obrigar o outro a ter amor pelo seu próximo, o poder judiciário de forma sutil desenvolveu uma medida extra de defesa aos idosos. Punindo e conscientizando a ausência de proteção, cuidado e carinho para com estes.

    Assim, tendo em vista a possibilidade de requerer danos morais dos filhos contra os pais, nada mais correto do que propiciar o direito inverso.

    A reparação civil então aliada ao princípio da afetividade se tornou uma medida viável para a conscientização dos traumas acarretados pelo abandono afetivo do idoso. Salienta-se que, tal reparação tem cunho de compensação, pois não se pode calcular os danos sofridos pelo abandono afetivo na terceira idade e nem retornar ao status quo antes da realização desses traumas.

    DA MUTABILIDADE DAS FAMÍLIAS PARA O ACOLHIMENTO DO PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE A LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.

    Como aduz Lôbo, o núcleo familiar sofreu profundas mudanças, sejam elas de composição, natureza ou concepção com a integração do Estado social nos últimos dois séculos. Uma vez que o Estado deixou de ser ausente e se tornou atuante nas relações familiares.

    Afirmando assim que, a família atual vivencia um paradigma onde há a afetividade e que por conta disso, existe a presença do afeto, dos laços de liberdade, responsabilidade, comunhão de vida e colaboração compõe o que denominamos de núcleo familiar.

    Explana o autor que sob o ponto de vista do direito existe duas estruturas que integram a família, que são os vínculos e os grupos. Dentre os vínculos estão presentes os de sangue, de direito e de afetividade.

    Posto isso, decorre destes, a criação dos grupos conjugais, parentais e secundários. Essas somas de fatores têm base no princípio da solidariedade previsto no art. da CF/88. (págs. 17 e 18, 2011).

    O doutrinador acima citado, alude que a afetividade é um elemento nuclear que define a união familiar, pois aproxima a instituição jurídica da social. Sendo desse modo, um triunfo da intimidade como valor na modernidade. (Pág. 20, 2011)

    Abarcando essas modificações na sociedade, o direito contou com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que previsto na lei suprema do Brasil, no seu art. 1º, onde faz menção à família, o princípio da dignidade humana é inerente a todo e qualquer cidadão.

    Portanto o seu descumprimento é uma violação gravíssima, posto que inibe ou reduz um direito fundamental.

    O filósofo Kant, menciona tal princípio como o núcleo existencial que é essencialmente comum a todas as pessoas, pois essas são vistas como membros iguais do gênero humano. Ocorrendo assim, uma imposição geral de respeito, intocabilidade e proteção. (pág. 77, 1986.)

    Ante o exposto, o princípio da dignidade da pessoa humana faz com que o dever de amparo, cuidado, proteção e apoio físico e moral sejam recíprocos entre pais e filhos.

    Da igualdade entre os membros da família a partir da Constituição de 1988.

    A Constituição Federal de 1988 trouxe no art. 299 que: "Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade".

    Posto isso, o verbo “dever” acima citado remete-se a uma obrigação mútua entre os entes de um núcleo familiar.

    Ademais, o art. 230 da CRFB/88, abrange que o amparo ao idoso deve ser propiciado não só pela família, mas também pela sociedade e pelo Estado.

    “Art. 230: A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”.

    Nesse contexto, diante das necessidades gritantes, fora desenvolvido o princípio da afetividade com base em princípios expressos na CRFB. Dentre eles, o princípio da dignidade da pessoa humana, da convivência familiar e da solidariedade.

    Cabe transcrever o pensamento do doutrinador Lôbo:

    O princípio da afetividade especializa, no âmbito familiar, os princípios constitucionais fundamentais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da solidariedade (art. 3º, I), e entrelaça-se com os princípios da convivência familiar e da igualdade entre cônjuges, companheiros e filhos, que ressaltam a natureza cultural e não exclusivamente biológica da família. A evolução da família “expressa a passagem do fato natural da consanguinidade para o fato cultural da afinidade” (este no sentido de afetividade). (2011, P. 72)

    Na atualidade, a entidade familiar é entendida como um grupo social que se funda em laços de afetividade, não necessitando de parentesco para se configurar o núcleo familiar. Abordando sobre isso, dispõe Lôbo:

    O art. 1.593 do Código Civil enuncia regra geral que contempla o princípio da afetividade, ao estabelecer que “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”. Essa regra impede que o Poder Judiciário apenas considere como verdade real a biológica. Assim, os laços de parentesco na família (incluindo a filiação), sejam eles consanguíneos ou de outra origem, têm a mesma dignidade e são regidos pelo princípio da afetividade. (2011, P. 73)

    Apesar da nomenclatura ser parecida, o afeto é diferente de afetividade. Visto que, a afetividade tem caráter de contraprestação obrigatória.

    Aduz Lôbo que, “o princípio jurídico da afetividade não se confunde com o afeto, pois a afetividade é um dever imposto aos pais em relação aos filhos e a estes em relação àqueles, mesmo que haja desafeição entre eles. (LÔBO P. 72)”.

    Portanto, cabe a todo o núcleo familiar a obrigação de proporcionar uma velhice digna dentro das suas limitações.

    A importância reservada ao idoso na CF 88

    No sistema jurídico brasileiro os princípios previstos na CF/88 são basilares, uma vez que servem de alicerces para a construção do ordenamento jurídico.

    Ora, a constituição brasileira fora elaborada após uma ditadura, pregando a solidariedade entre os povos. Diante disso, visando relações pacíficas entre a população foi estabelecido como direito fundamental a dignidade humana no art. da constituição.

    Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

    (...)

    III - a dignidade da pessoa humana;

    O princípio da dignidade da pessoa humana deixa claro que todos têm os direitos de serem respeitados e protegidos, por isso é um princípio que orienta todos os demais no ordenamento jurídico.

    Sendo um instrumento da segurança jurídica, bem como da aplicação jurídica adequada, o princípio em tela norteia o comportamento dos indivíduos e do Estado, garantindo a todos condições mínimas para uma vida digna em todas as fases que o ser humano passa.

    Sublinha-se o posicionamento de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho acerca da importância de tal princípio:

    Princípio solar em nosso ordenamento, a sua definição é missão das mais árduas, muito embora arrisquemo-nos a dizer que a noção jurídica de dignidade traduz um valor fundamental de respeito à existência humana, segundo as suas possibilidades e expectativas, patrimoniais e afetivas, indispensáveis à sua realização pessoal e à busca da felicidade.

    Além do princípio da dignidade da pessoa humana que é um instrumento garantidor de integridade física, psíquica, moral e intelectual, o tema supracitado abarca também o princípio da igualdade, que constitucionalmente, vem dar ao idoso a proteção contra qualquer forma de discriminação ou preconceito.

    Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

    (...)

    Atrelado a proteção afetiva do idoso, o princípio da solidariedade familiar disposto no art. da CF/88 implica em respeito e cuidado mútuo.

    Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

    I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

    II - garantir o desenvolvimento nacional;

    III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

    O doutrinador Flávio Tartuce afirma que o princípio da solidariedade familiar estabelece uma condição de respeito e consideração mútuos em relação aos membros da família. Sendo assim, esse princípio prega o sentimento recíproco onde se cria um vínculo moral entre as pessoas e à vida, fazendo nascer laços de fraternidade.

    Em verdade, os princípios constitucionais regulam as relações jurídicas e coordenam todo o sistema jurídico, atuando para a melhor desenvoltura humanitária.

    Ressalta-se que, a função principal desse sistema é a segurança, o respeito e o bem-estar da sociedade.

    O abandono afetivo de idosos

    O processo de envelhecimento humano é transação complexa no qual todo ser humano passará. Entretanto, criou-se um valor de juízo negativo sobre esse ciclo.

    Amparados pelo art. 8º da Lei nº 10.741 de 1º de outubro de 2013, os idosos contam com um direito social a sua proteção.

    Art. 8º O envelhecimento é um direito personalíssimo e a sua proteção um direito social, nos termos desta Lei e da legislação vigente.

    No ponto, cabe a sociedade e ao Estado assegurar a esses idosos a liberdade, o respeito e a dignidade de pessoa humana. Sendo que esse respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral.

    Como previsto no § 3º do art. 10 desse estatuto, é dever de todos zelar pela dignidade do idoso, colocando-o a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.

    Ainda nessa esteira de ideias, como dito pela professora de Psicologia Jurídica da Faculdade Ruy Barbosa, Vanessa Vasquez: “Abandono afetivo é uma violência que se expressa na omissão e na negligência”. Assim, o abandono afetivo de idosos é caracterizado pela falta de prestação de afeto e cuidados.

    É de salutar importância esclarecer que abandono afetivo não está expresso de forma clara no Estatuto do Idoso, nem em qualquer outra legislação brasileira. O ordenamento jurídico não traz uma disciplina especifica para tutelar o abandono afetivo. Trazendo somente sobre do abandono material e intelectual.

    Contundo, como o Direito é um conjunto de mutações e adequações, ele conta com o auxílio de outros de artigos como o 229 da CRFB/88 que diz: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”

    Além da Constituição Federal, a Carta Magna trouxe no bojo do seu artigo 230 que o dever que a família, a sociedade e o estado devem ter com relação às pessoas idosas, assegurando-lhes condições dignas de bem-estar, e garantia do direito à vida, enfim, à salvaguarda do direito a uma vida em toda a sua plenitude.

    Ademais, o Estatuto do Idoso visou no artigo que: “É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, á dignidade, ao respeito e a convivência familiar e comunitária. ”

    Reprisa-se que, afeto é diferente do direito de cuidado. Não se impõe o direito de afeto, mas sim o direito de cuidado. Amar é faculdade, cuidar é dever.

    Lôbo o conceitua que o princípio jurídico da afetividade como aquele que fundamenta o direito de família na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida, com primazia sobre as considerações de caráter patrimonial ou biológico. (2010, p.70)

    Em harmonia com o pensamento de Lôbo, a autora Berenice Dias na sua obra traz o seguinte trecho:

    A afetividade é o princípio que fundamenta o Direito de Família na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida, com primazia em face de considerações de caráter patrimonial ou biológico. (Manual de Direito da Família, p. 52, 2015.)

    Por fim, como o afeto foi considerado um valor jurídico, o abandono afetivo gera indenização, pois é causado pela falta de proteção e cuidado. Diante disso, volta-se a afirmar que o cuidado e a proteção para com os pais idosos são deveres e não uma faculdade. E se este dever não é observado, se está diante não só de um ato desumano, mas também ilícito.

    O DANO TRAUMÁTICO POTENCIALIZANDO A REPARAÇÃO CIVIL

    Um dos significados da palavra dano pelo dicionário é: Mal ou prejuízo causado a alguém; Prejuízo efetivo, real, provado.

    Os danos causados aos idosos que sofrem o abandono afetivo são inúmeros e incalculáveis. Não existem remédios que curem a saudade, a solidão e o sentimento de ingratidão.

    A reparação civil atua na conscientização dessa problemática, diminuindo a sua incidência e punindo as pessoas que confrontaram as disposições ora vigentes que são claras e precisas ao abordar a fragilidade do idoso e a sua importância na sociedade.

    Porém, muitos entendem ou querem perpetuar a ideia que essa medida é apenas lucrativo/indenizatório. Para deflagrar essa errônea informação, faz-se necessário a explanação da doutrinadora Maria Celina Bodin de Moraes:

    No entanto, chega-se a compreensão de que aquele que sofre um dano moral deve ter direito a uma satisfação de cunho compensatório. Diz-se compensação, pois o dano moral não é propriamente indenizável, indenizar significa devolver (o patrimônio) ao estado anterior, ou seja, eliminar o prejuízo e suas consequências – o que, evidentemente, não é possível no caso de uma lesão de ordem extrapatrimonial (MORAES, 2003)

    Como explanado pelo o doutrinador Pablo Stolze, existem três funções que visualizam o instituto da reparação civil, que são a compensatória do dano à vítima; a punitiva do ofensor; e a desmotivação social da conduta lesiva.

    Na primeira função, está presente o objetivo básico e a finalidade da reparação civil, que é a retomada das coisas ao status quo ante, se possível, é claro. Quando não há essa possibilidade impõe-se o pagamento de um quantum indenizatório, em que há um parâmetro sobre o valor do bem material ou compensatório do direito não redutível pecuniariamente.

    Como uma função secundária, existe a reposição das coisas ao estado em que se encontravam, onde se frisa a punição do ofensor pela ausência de cautela na prática de seus atos, persuadindo-o a não mais lesionar.

    A terceira função tem cunho socioeducativo, na qual visa tornar público que condutas semelhantes não serão toleradas. Procurando-se restabelecer o equilíbrio e a segurança desejados pelo Direito. (pág. 68, 2012.)

    Ora, o prover material não quer dizer que não há abandono afetivo. O abandono não é subjetivo. Ele é a ausência de cuidado, de presença, de atenção. A ausência desses requisitos faz o dano está subentendido.

    No ensejo, cabe transcrever que o direito a reparação ao dano está previsto na Constituição Federal no seu art. , incisos V e X:

    Art. 5º – Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

    V –É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização

    por dano material, moral ou à imagem;

    X –São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,

    assegurando a indenização por dano material ou moral decorrente de sua violação

    Além do mais, dispõe o Código Civil que no artigo 186 que: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."

    Compactuando com esse entendimento, Tartuce explana na sua obra que o principal argumento jurídico a favor da admissibilidade da reparação dos danos morais nos casos de abandono afetivo seria o enquadramento da hipótese ao art. 186 do Código Civil o qual estabelece que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

    Diante dos fatos, a responsabilidade civil é um fenômeno social. Uma vez que, para o Direito, um dos principais pressupostos da responsabilidade civil é a existência de nexo causal entre o ato e o dano por ele produzido.

    DAS DIVERSIDADE DE FORMAS DE PROTEÇÃO AO IDOSO

    Como já contextualizado acima, o papel do idoso na sociedade é tão relevante que se tornou preciso tomar variadas medidas cabíveis para se garantir que as suas fragilidades perante determinadas situações não fossem utilizadas ao seu desfavor.

    Diante disso, além dos dispositivos que já foram aludidos, cabe mencionar que com o objetivo de uma proteção mais ampla aos idosos o Código Penal dispôs de especial zelo referente as fragilidades inerentes à terceira idade.

    No ensejo, vale transcrever:

    a) Art. 61, II, h, que trata das circunstâncias agravantes genéricas, a expressão velho foi substituída pela expressão maior de 60 (sessenta) anos;

    b) Art. 121, § 4º, tornou-se causa de aumento de pena no crime de homicídio doloso, ser ele praticado contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos;

    c) art. 133, § 3º, III No crime de abandono de incapaz, foi incluída causa de aumento de pena de um terço se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos;

    d) Art. 140, no crime de injúria a utilização de elementos referentes à condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência,

    trouxe nova redação ao parágrafo terceiro (injúria por preconceito);

    e) Art. 141, IV Nos crimes contra a honra de calúnia e difamação, foi introduzida causa de aumento quando forem praticados contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou portadora de deficiência;

    f) Art. 148, § 1º, I Nos crimes de sequestro ou cárcere privado, foi incluída qualificadora consistente em ser a vítima maior de 60 (sessenta) anos;

    g) Art. 159, § 1º, também no crime de extorsão mediante sequestro, foi incluída qualificadora consistente em ser a vítima maior de 60 (sessenta) anos

    h) Art. 183, III, foi vedado expressamente o reconhecimento das imunidades penais (absolutas e relativas) nos crimes contra o patrimônio, se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos;

    i) Art. 244, “caput”, por fim, no crime de abandono material, a expressão valetudinário (pessoa de compleição física muito fraca, pessoa enfermiça, achacadiça) foi substituída pela expressão maior de 60 (sessenta) anos.

    Na legislação especial:

    a) Foi introduzida causa de aumento de pena, de um terço até a metade, na contravenção de vias de fato, se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos (art. 21, parágrafo único, do Decreto-lei nº 3.688/41 –LCP);

    b) No crime de tortura, foi acrescentada causa de aumento de pena, se o crime é cometido contra maior de 60 (sessenta) anos (art. , § 4º, II, da Lei nº 9.455/97);

    c) Nos crimes da Lei de Entorpecentes, foi incluída causa de aumento de pena quando qualquer deles visar a pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos (art. 18, III, da Lei nº 6.368/76)

    Reafirmando dessa forma, que cabe ao Estado proporcionar através da sua legislação que sejam cumpridos os direitos à vida, a segurança, ao respeito, aos atendimentos de suas necessidades básicas, a saúde, a educação, a moradia, ao transporte, ao lazer, e a justiça.

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Segundo Álvaro Villaça Azevedo, “O descaso entre pais e filhos é algo que merece punição, é abandono moral grave, que precisa merecer severa atuação do Poder Judiciário, para que se preserve não o amor ou a obrigação de amar, o que seria impossível, mas a responsabilidade ante o descumprimento do dever de cuidar, que causa o trauma moral da rejeição e da indiferença. ”

    No ensejo, Ramos (2002, p. 79), afirma que: “Os velhos são sujeitos de direitos, o que comprova que o fato de as pessoas irem envelhecendo não lhes retira a sua dignidade. Continuam sendo seres humanos portadores dos mesmos direitos dos quais são sujeitos todas as criaturas de semblante humano”

    Além da problemática explanada ao decorrer do texto, é de suma importância afirmar que que o prover financeiro/material não retira o condão do abandono afetivo.

    O que se busca pelo idoso é o respeito. É a contraprestação da sociedade, do judiciário e de seus familiares pelos anos de dedicação e pela sua condição humana, representante de direitos.

    Ser portador de direitos humanos e fundamentais é ser portador de direitos atemporais. Onde as normas foram elaboradas para protegerem a qualquer tempo cada cidadão. Assim, não se pode ignorá-los, sem que o Estado intervenha e propicie uma consequência jurídica para revertê-la ou amenizá-la.

    Dispondo sobre o tema, cabe transladar o seguinte posicionamento:

    “O abandono afetivo dos filhos gera o dever de indenizar e essa indenização tem um caráter punitivo, compensatório e pedagógico. É uma punição ao filho que deixar de cumprir dever legal e contribui para o surgimento de dano moral. É compensatória da privação do convívio familiar e do próprio dano moral levado a efeito. É pedagógico porque tem por escopo desestimular a reiteração no descumprimento da obrigação pelos filhos.“ (Adriane Leitão Karam, 2011. p. 55)

    Pois bem, a Lei suprema do Brasil, que é a Constituição Federal de 1988 e seus derivados, impõem em seus artigos e princípios, que a proteção a terceira idade, não é uma opção e sim um obrigação.

    Dever o qual, quando descumprido deve ter a intervenção judicial, uma vez que o compete ao Estado gerir o equilíbrio entre as suas normas e a sua aplicação.

    Diante do aludido, não há dúvidas sobre a eficácia da aplicabilidade da reparação civil, a luz do princípio da afetividade. O abando afetivo é um câncer na sociedade, que se alastra de forma silenciosa, pois a sua prática reiterada sem punição transparece uma falsa permissão/aceitação da população e do judiciário.

    O direito inverso de responsabilização na velhice deve ser cada vez mais estimulado, conscientizando a população que além de ilegal, o abandono é desumano.

    O Estado não pode permitir que vidas humanas sejam jogadas a margem do abandono, da solidão e do esquecimento, pelo simples fato de não poderem mais exercer com a mesma capacidade laborativa, o seu papel na sociedade.

    Ao contrário, cabe o Estado através de medidas como a implementação da reparação civil, demonstrar que essas pessoas mais do que nunca, precisam de atenção e cuidado. Ressaltando-se que, não só financeiramente, mas também psicologicamente.

    Portanto, aos desacreditados o lembrete de que: “A mudança já começou!”

    REFERENCIAL

    LÔBO, Paulo. Direito civil: famílias, 4ª edição, São Paulo: Saraiva, 2011.

    DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito da Família, 10ª edição revista, atualizada e

    Ampliada, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

    GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: direito de família. p. 74

    TARTUCE, Flávio. Novos princípios do direito de família brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 10 ago. 2007.

    Gagliano, Pablo Stolze, Novo curso de direito civil, volume 3: responsabilidade civil / Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho. 10.ª edição revista atualizada e ampliada, São Paulo: Saraiva, 2012."(Abrangendo os Códigos Civis de 1916 e 2002)

    KANT, Immanoel. Fundamentação da metafisica dos costumes. Trad. Paulo Quintela. Lisboa: Ed. 70, 1986.

    MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

    RAMOS, Paulo Roberto Barbosa. Fundamentos constitucionais do direito à velhice. Florianópolis: Livraria e Editora Obra Jurídica Ltda., 2002. 157 p

    AZEVEDO, Álvaro Villaça. Jornal do Advogado - OAB/SP - n 1º 289, dez/2004, p.14.

    KARAM, Adriane Leitão. Responsabilidade civil: o abandono afetivo e material dos filhos em relação aos pais idosos. 2011.71p.Trabalho de conclusão de curso (Especialização em Direito de Família, Registros Públicos e Sucessões) - Universidade Estadual do Ceará, Centro de Estudos Sociais Aplicados, Escola Superior do Ministério Público do Ceará. 2011. p. 55

    Constituição da Republica Federativa do Brasil, 1988.

    Carta Magna, 1215.

    Estatuto do Idoso, 2003.

    http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=e783341675cac120

    http://www.univali.br/ensino/graduacao/cejurps/cursos/direito/direitoitajai/publicacoes/revista-de-iniciacao-cientifica-ricc/edicoes/Lists/Artigos/Attachments/996/Arquivo%2018.pdf

    http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/3597/Os-Principios-Constitucionais

    http://www.observatorionacionaldoidoso.fiocruz.br/biblioteca/_artigos/197.pdf

    http://cherranea.jusbrasil.com.br/artigos/317315568/o-abandono-afetivo-de-pais-idososea-possibilidade-de-reparacaoaluz-do-ordenamento-jurídico-brasileiro

    http://elizabethalais.jusbrasil.com.br/artigos/220020071/abandono-afetivo-inverso-quando-os-filhos-abandonam-os-pais-idosos

    http://www.faculdadescearenses.edu.br/revista2/edicoes/vol7-1-2014/artigo1.pdf

    http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,danos-morais-por-abandono-afetivo-de-idosos-por-familiares...

    https://www.youtube.com/watch?v=cBrvEUI9uGc

    https://www.youtube.com/watch?v=96HyG6h9HWg

    https://www.dicio.com.br/dano/

    http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7830

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