Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
17 de Junho de 2024

Reserva Legal Sob a Ótica da Lei 12.651, de 25 de MAIO de 2012

há 6 anos

RESUMO: Esta pesquisa tem como finalidade demonstrar as diretrizes da Reserva Legal, a preservação do Meio Ambiente, é imprescindível para a vivência em sociedade de uma maneira prospera, assim, existem variados métodos para preservá-lo, veremos isso sob a ótica do Código Florestal e o conflito jurisdicional desse instituto. É pretendido demonstrar a importância social, jurídica e técnica referente ao Meio Ambiente, evitando um possível retrocesso e solução para tais conflitos com ênfase no assunto principal Reserva Legal. Inicia-se com uma breve explicação do que chamamos de Reserva Legal e suas finalidades e possíveis causas de retrocesso que é abrangido pela Lei 12.651 de 2012, os objetivos deste trabalho foram: Estudos da Reserva legal a responsabilidade civil e o dever do Estado em fiscalizar.

Palavras-chave: Reserva Legal; Meio Ambiente; Retrocesso Ambiental

1 INTRODUÇÃO

Até recentemente a humanidade viveu como se fosse à última geração, despreocupada com as consequências futuras, provocadas pela destruição e poluição, porém a preocupação com o patrimônio florestal tem se aflorado cada vez mais no decorrer do tempo, principalmente no que diz respeito à vegetação existente no país e justamente essa cobrança tem submetido o Brasil a norma cada vez mais severa.

Vale lembrar que a espécie humana, em sua origem, era constituída por poucos indivíduos, que viviam de forma nômade e selvagem, alimentavam-se de frutos nativos, bulbos, caças e raízes, entre outros, encontrados na natureza; agiam instintivamente e, quando os alimentos começavam a escassear, procuravam novos lugares que garantissem a sobrevivência. Essa mudança permitia aos locais explorados se restabelecerem naturalmente, visto que a forma de exploração causava pequenos impactos, pois o homem retirava somente o necessário para seu sustento. Notadamente, a falta de conhecimento e recursos permitia verdadeira inteiração homem-natureza, observavam-se somente pequenos vestígios deixados pela presença humana como sinais de fogueiras, escritas em cavernas, entre outros. Entretanto, é de conhecimento, conforme mostra a história, que a presença, as atividades do homem, bem como a ocupação do espaço, firmam as alterações por ele impostas ao ecossistema terrestre, marcadas não somente pelas causas físicas naturais, mas também pelas mudanças intencionais resultantes da intervenção humana, que vem acelerando o processo de desenvolvimento.

Observa-se, pelo contexto histórico, que a sociedade moderna tem passado por grandes transformações, em que se pode destacar o modo de produção social, o desenvolvimento das atividades rurais, a modernização nos moldes industrial urbano, criada pela sociedade capitalista, que tende ao progresso tanto social, cultural e econômico; tais interesses tornamse mais importantes que os fatores ecológicos, protegidos pelas normas.E, com o aumento da população e a capacidade inventiva do homem, ocorreu necessidade de se utilizar cada vez mais os recursos da natureza, visando principalmente melhoria nas condições de vida, gerando um crescimento desordenado e, com este, também o início dos problemas ambientais. Logo, percebe-se o crescente progresso social, econômico e cultural, desprezando os fatores ecológicos, base necessária à produção da vida social. A partir desse momento, o homem percebe o começo dos desastres ecológicos.

Com isso, as agressões de grande porte começaram na Idade Média e Moderna, especialmente na fase da Revolução Industrial.

E, de acordo com Carvalho:

O dinamismo da civilização industrial introduziu radicais mudanças no Meio Ambiente físico. Essas transformações implicaram a formação de novos conceitos sobre o ambiente e o seu uso. A Revolução Industrial, que teve início no século XVIII, alicerçou-se, até as primeiras décadas do último século, nos três fatores básicos da produção: a natureza, o capital e o trabalho. Porém, desde meados do século XX, um novo, dinâmico e revolucionário fator foi acrescentado: a tecnologia. Esse elemento novo provocou um salto, qualitativo e quantitativo, nos fatores resultantes do processo industrial. Passou-se a gerar bens industriais numa quantidade e numa brevidade de tempo antes impensáveis. Tal circunstância, naturalmente, não se deu sem graves prejuízos à sanidade ambiental (CARVALHO 2005, p, 67).

Recentemente, com a edição da Lei 12.651/12 passou a vigorar o Novo Código Florestal, o qual foi discutido em um cenário de conflito de interesses dos produtores rurais que pregavam a necessidade do aumento de terra produtiva e a preservação do meio do ambiente defendida por grupos científicos e movimento ambientalista de forma geral (METZGER, 2010; SILVA, 2011).

Dentre as alterações imputadas ao Novo Código Florestal, destacamos neste estudo a inserção da área de preservação permanente APP na porcentagem da Reserva Legal RL prevista no artigo 15 da referida lei. Desta forma, este trabalho busca analisar por meio de revisão bibliográfica os aspectos que foram alterados na legislação, apontar os impactos que tais mudanças podem causar sobre a biodiversidade brasileira e sua (in) compatibilidade com o princípio ambiental de proibição do retrocesso. Foram explorados e revisados legislações, jurisprudências, artigos e trabalhos científicos com o foco principal das alterações trazidas pelo Novo Código Florestal.

2 PRESERVAÇÃO LEGAL NO BRASIL

No Brasil, sabe-se que a primeira norma a fazer referência à questão preservação é datada do período colonial, porém, é de conhecimento que não se tratava de preocupação com a proteção às florestas, isso porque a exploração da madeira significava a principal atividade econômica, contribuindo inclusive para o nome do País.Pelo exposto, Trennepohl e Trennepohl (2011, p.10) relata que: “Foi o regimento do Pau Brasil, de 12/12/1605, considerada como a primeira Lei Florestal do Brasil, que trata a referida arvore como insumo, bem de produção, não como um elemento natural”.

Importante salientar que a lei citada teve papel importante no Brasil no que tange à política florestal brasileira, entretanto a visão inicial da Lei foi econômica.

E, para enfatizar, Silva relata que, no Estado Acre, o então Presidente Hermes da Fonseca, criou quatro reservas florestais, totalizando uma área de 5 milhões de hectares, conforme decreto datado de 26 de julho de 1911, nos termos abaixo:

O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, atendendo que a devastação desordenada das matas esta produzindo em todo o país efeitos sensíveis e desastrosos, salientando-se entre eles alterações na constituição climatérica de várias zonas e no regime das águas pluviais e das corrente que delas dependem; e reconhecendo que é da mais urgente necessidade impedir que tal estado de cousas estenda-se ao território do Acre, mesmo por tratar-se da região onde, como igualmente em toda a Amazônia, há necessidade de proteger e assegurara navegação fluvial, e, consequentemente, de obstar que sofra modificação ao regime hidrográfico respectivo (SILVA 2010, p. 166).

No entanto, entende-se que a política de proteção eficaz com relação à floresta e demais formas vegetativas, outrora não foi próspera, pois predominava o direito da propriedade adotada pela Constituição de 1891, ou seja, o direito de gozar e dispor de sua propriedade da forma que melhor lhe conviesse, em detrimento do bem comum, idéia que hoje predomina, lembrando que a Constituição de 1934, no art. 50, inciso XIX, dispositivo reiterado pela Carta Constitucional de 1937, e também aceito na Constituição de 1946.

A Lei Federal 4.771/1965 foi inteiramente recepcionada como norma geral pela Constituição Federal de 1988, prevista nos arts. 23, VII e 24, VI. Entretanto, foi a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em junho de 1992, conhecida como Eco 92, que o Brasil passou a ser a preocupação mundial, com destaque para o desmatamento na Amazônia, o que provocou o início da pressão internacional.

Quando o presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1996, alterou o Código Florestal - Lei 4.741/1965, a partir da edição da medida provisória 1.511/1996, foi aumentada o percentual de conversão de floresta em áreas agrícolas na região Norte e na parte Norte da Região Centro-Oeste. Por essa norma, foi mantido o percentual de 50% a título de reserva legal, nas áreas ocupadas por floresta, em especial na região amazônica e de 20% para asáreas ocupadas por cerrado, reduzindo, entretanto, o percentual possível de conversão, ou seja, o desmatamento autorizado passa a ser de 20% e 80% respectivamente.

A Medida Provisória 1.511/1996, no art. § 3º, assim define:

Entende-se por região Norte e parte Norte da região Centro-Oeste os Estados do Acre, Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá e Mato Grosso, além das regiões situadas ao norte do paralelo 13º S, nos Estados de Tocantins e Goiás, e a oeste do meridiano de 44º W, no Estado do Maranhão.

Aspecto relevante a ser considerado refere-se à limitação do uso da propriedade imposta pelo Código florestal, através das áreas de preservação permanente, vale frisar que essas áreas de reserva legal no bioma Amazônia tiveram seus percentuais elevados posteriormente através de edição e publicação da Medida Provisória 2.166/2001, que elevou para 80% de Reserva legal as áreas ocupadas por florestas e 35% para áreas ocupadas por cerrado, esta sendo reeditada 67 vezes, porém esse assunto será tratado posteriormente, e, atualmente, está sendo aguardada a aprovação do novo Código Florestal, que recentemente foi aprovado pelo Senado e aguarda que os deputados analisem as modificações feitas pelos senadores. O texto que deverá alterar o Código Florestal está dividido em duas partes: as disposições permanentes, sobre as normas gerais, e as disposições transitórias, sobre a adaptação das regras vigentes à nova lei.

3 CONSIDERAÇÕES SOBRE A RESERVA LEGAL

A reserva legal é uma exigência para qualquer propriedade rural, independentemente do estado em que se encontrem as áreas, e da forma que o proprietário as utiliza ou pretende utilizá-las. Sendo, a reserva legal é uma exigência normativa, está o proprietário sujeito a cumpri-lá, pois trata-se do reconhecimento da função social da propriedade, ou seja, do próprio direito de propriedade, conforme prevê o art. 16, caput e § 2º, do Código Florestal, recepcionado pela Constituição Federal de 1988, que trouxe evidente avanço à tutela ambiental.

Em 1920, foi tomada a iniciativa de criar uma legislação apropriada, o então presidente da República - Epitácio Pessoa compôs uma comissão para a elaboração de um anteprojeto que daria origem ao Código Florestal. De modo sucinto pode-se dizer que o projeto transformou-se no Decreto 23.793, conhecido naquela época como o Código Florestal de 1934, sendo atualizado pela Lei 4.771/1965.

Entretanto, somente após edição da Lei nº. 6.938/1981, as florestas naturais passaram a ser considerado bem jurídico ambiental, independente da utilização, passando a ter valor existencial. Sendo assim, a Constituição Federal/1988 considera as áreas de floresta como um bem jurídico, conforme cita o art. 170, que estabelece a exploração econômica ao uso racional dos recursos; também o art. 186, que leciona a respeito da função social da propriedade rural;incluindo também o art. 225, que protege o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, saudável, que deve ser defendido pelo Poder Público e pela sociedade.

Também o Código Civil/2002, em seu art. 1.228, § 1º, prevê a função social da propriedade, ao preceituar que o direito de propriedade deve estar em conformidade com as finalidades econômicas e sociais, mantendo-se a preocupação de preservação:

§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

4 USO DAS ÁREAS DE RESERVA LEGAL

A Reserva Legal possui delimitações estabelecidas por lei, diferenciando o tanto da Reserva a ser protegida, variando por área, ou seja, o tanto da Reserva estabelecida para uma zona do Cerrado se diferencia do tanto da Amazônia, enfatizando o tanto de precisão da área, para ser coesa com a necessidade de cada área.

Assim, temos a seguinte porcentagem a ser protegida de cada Área: 80% na Área de Floresta, situada na Amazônia Legal, 35% em área de Cerrado, 20% em Imóveis em área de Campos Gerais e por fim em Imóveis localizados nas demais regiões 20% do imóvel.

Há critérios a serem observados para a localização da área de Reserva Legal no imóvel rural, como o plano de bacia hidrográfica; o Zoneamento Ecológico-Econômico; a formação de corredores ecológicos com outra Reserva Legal, com Área de Preservação Permanente, com Unidade de Conservação ou com outra área legalmente protegida; as áreas de maior importância para a conservação da biodiversidade; e as áreas de maior fragilidade ambiental.

Além dos critérios acima citados, existe a questão do Módulo Fiscal, que ver a ser uma unidade de medida, em hectares, cujo seu valor é fixado pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), que tem medidas diferentes por cada município, seja eles:

1 - O tipo de exploração predominante no município (hortifrutigranjeira cultura permanente, cultura temporária, pecuária ou florestal);

2 - A renda obtida no tipo de exploração predominante;

3 - Outras explorações existentes no município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada;

4 - O conceito de "propriedade familiar". A dimensão de um módulo fiscal varia de acordo com o município onde está localizada a propriedade.

O valor do módulo fiscal no Brasil varia de 5 a 110 hectares, o que vem a ser observado na questão do modulo, seria que o Novo Código Florestal, exige que a pequena propriedade, faça sua Reserva Legal com a vegetação nativa que ainda existir no imóvel. Como se pode observar no artigo 67 do Código Florestal (Lei nº 12.651/12):

Art. 67. Nos imóveis rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro) módulos fiscais e que possuam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto no art. 12, a Reserva Legal será constituída com a área ocupada com a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso alternativo do solo.

5 MUDANÇAS DA RESERVA LEGAL PELO NOVO CÓDIGO FLORESTAL

O que realmente nota-se no Novo Código Florestal, são as profundas alterações a Reserva Legal, o que gera alvo de controvérsias entre ruralista, doutrina, pessoas em geral, pois os mesmos afirmam, que essas modificações não respeitam o artigo 225 da CF/88:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

O que vem a ser alvo de criticas, é a questão do Meio Ambiente ecologicamente equilibrado, gerando opiniões de que a Reserva Legal passou a ter como função apenas auxiliar ou assegurar na conservação dos processos ecológicos levando em conta a redução da Reserva Legal .

Diante de tantas criticas, com a afirmação de descumprimento a preceitos constitucionais, a Procuradoria Geral da República, por meio do controle abstrato de constitucionalidade, ajuizou três Ações Diretas de Inconstitucionalidade.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade sob o nº 4901 questiona os dispositivos que tratam da redução da reserva legal (em virtude da existência de terras indígenas e unidades de conservação no território municipal), da dispensa de constituição de reserva legal por empreendimentos de abastecimento público de água, tratamento de esgoto, exploração de energia elétrica e implantação ou ampliação de ferrovias e rodovias, da possibilidade de compensação da reserva legal.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade sob o nº 4902 questiona os artigos relacionados à permissão de novos desmatamentos sem a recuperação das áreas já realizadas irregularmente, a anistia de multas e outras medidas que desestimulariam a recomposição da vegetação original.

E, por último, a Ação Direta de Inconstitucionalidade sob o nº 4903 onde se questiona a redução da área de reserva legal.

Espera-se o julgamento destas dessas Ações Direta de Inconstitucionalidade, para que estejamos em consonância com a Lei, e que que o Meio Ambiente não seja mais lesado, degradado, pelos Seres Humanos , pois a Reserva Legal de fato é um instituto demasiada importância para a proteção do Meio Ambiente, protegendo áreas florestais que devem permanecer.

6 DA AVERBAÇÃO DA RESERVA LEGAL

Para a regularização da Reserva Legal, é necessária sua averbação, como se pode observar nos artigos a seguir no art. 14 parágrafo 1 da Lei 12.651e registrada (art. 18, caput, e § 4º, da Lei 12.651/2012).

Art. 14. A localização da área de Reserva Legal no imóvel rural deverá levar em consideração os seguintes estudos e critérios:

§ 1o O órgão estadual integrante do Sisnama ou instituição por ele habilitada deverá aprovar a localização da Reserva Legal após a inclusão do imóvel no CAR, conforme o art. 29 desta Lei.

Art. 18. A área de Reserva Legal deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio de inscrição no CAR de que trata o art. 29, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento, com as exceções previstas nesta Lei.

[...]

§ 4o O registro da Reserva Legal no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis, sendo que, no período entre a data da publicação desta Lei e o registro no CAR, o proprietário ou possuidor rural que desejar fazer a averbação terá direito à gratuidade deste ato.

Assim, diante os artigos acima, observa a consagração do caráter real das obrigações nela relacionadas, ao dispor que são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural (artigo , parágrafo 2º, e artigo 66, parágrafo 1, da Lei 12.651/2012).

O caráter real da obrigação de averbar no Registro de Imóveis já foi identificado pelo Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do RESP 1179316/SP, que embora proferido sob a égide da lei anterior, aplica-se, mutatis mutandis, à lei nova:

ADMINISTRATIVO. MEIO AMBIENTE. ÁREA DE RESERVA LEGAL EM PROPRIEDADES RURAIS: DEMARCAÇÃO, AVERBAÇÃO E RESTAURAÇÃO. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. OBRIGAÇÃO EX LEGE E PROPTER REM, IMEDIATAMENTE EXIGÍVEL DO PROPRIETÁRIO ATUAL. 1. Em nosso sistema normativo (Código Florestal - Lei 4.771/65, art. 16 e parágrafos; Lei 8.171/91, art. 99), a obrigação de demarcar, averbar e restaurar a área de reserva legal nas propriedades rurais constitui (a) limitação administrativa ao uso da propriedade privada destinada a tutelar o meio ambiente, que deve ser defendido e preservado "para as presentes e futuras gerações" (CF, art. 225). Por ter como fonte a própria lei e por incidir sobre as propriedades em si, (b) configura dever jurídico (obrigação ex lege) que se transfere automaticamente com a transferência do domínio (obrigação propterrem), podendo, em conseqüência, ser imediatamente exigível do proprietário atual, independentemente de qualquer indagação a respeito de boa-fé do adquirente ou de outro nexo causal que não o que se estabelece pela titularidade do domínio. 2. O percentual de reserva legal de que trata o art. 16 da Lei 4.771/65 (Código Florestal)é calculado levando em consideração a totalidade da área rural. 3. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.” (STJ, REsp 1179316 / SP, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, Julg. 15/06/2010, Pub. DJe 29/06/2010).

Um dos requisitos necessários à inscrição do imóvel rural no Cadastro Ambiental Rural – CAR e somente será dispensada caso o proprietário demonstre a sua averbação na matrícula do imóvel ou o registro do termo de compromisso, em caso de posse:

Art. 29. É criado o Cadastro Ambiental Rural - CAR, no âmbito do Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente - SINIMA, registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.

§ 1o A inscrição do imóvel rural no CAR deverá ser feita, preferencialmente, no órgão ambiental municipal ou estadual, que, nos termos do regulamento, exigirá do proprietário ou possuidor rural:

I - identificação do proprietário ou possuidor rural;

II - comprovação da propriedade ou posse;

III - identificação do imóvel por meio de planta e memorial descritivo, contendo a indicação das coordenadas geográficas com pelo menos um ponto de amarração do perímetro do imóvel, informando a localização dos remanescentes de vegetação nativa, das Áreas de Preservação Permanente, das Áreas de Uso Restrito, das áreas consolidadas e, caso existente, também da localização da Reserva Legal.

[...]

§ 3o A inscrição no CAR será obrigatória para todas as propriedades e posses rurais, devendo ser requerida no prazo de 1 (um) ano contado da sua implantação, prorrogável, uma única vez, por igual período por ato do Chefe do Poder Executivo.

Art. 30. Nos casos em que a Reserva Legal já tenha sido averbada na matrícula do imóvel e em que essa averbação identifique o perímetro e a localização da reserva, o proprietário não será obrigado a fornecer ao órgão ambiental as informações relativas à Reserva Legal previstas no inciso IIIdo § 1o do art. 29.

Parágrafo único. Para que o proprietário se desobrigue nos termos do caput, deverá apresentar ao órgão ambiental competente a certidão de registro de imóveis onde conste a averbação da Reserva Legal ou termo de compromisso já firmado nos casos de posse.

Após o advento do Novo Código Florestal Lei 12.651 de 2012, pode ser efetuada mediante averbação na matrícula do imóvel no Cartório de Registro de Imóveis e/ou inscrição no Cadastro Ambiental Rural.

7 LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS

De acordo com Hely Lopes Meirelles (2007, p. 600), a limitação administrativa é, conjuntamente com a desapropriação, servidão administrativa, requisição e ocupação temporária, uma das formas de intervenção na propriedade particular, a qual, por sua vez, pode acontecer em razão de necessidade, utilidade pública ou interesse social.

Assim é que a limitação administrativa que não se confunde com a civil, por figurar como restrição de ordem pública, de modo que protege genericamente a coletividade, sendo, portanto, regida pelo Direito Administrativo e não pelo Privado, que protege especificamente os vizinhos (artigo 1.277 e ss. do Código Civil)- pode ser definida, segundo Meirelles (2007, p. 632), como: “toda a imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar social.”

Dessa forma, as limitações administrativas, de acordo com o autor supracitado, são imposições gerais, isto é, “dirigidas a propriedades indeterminadas, mas determináveis no momento de sua aplicação” (MEIRELLES, 2007, p. 633); são gratuitas, pois não implicam em indenização, diferentemente da servidão e da desapropriação, as quais ocorrem em situações determinadas e não gerais, quando houver conflito com interesse público; são unilaterais, uma vez que são impostas por lei, independentemente do consentimento do proprietário; e são de ordem pública, donde decorre sua imperatividade, no sentido de que deverão ser cumpridas. Ainda, as tais imposições poderão importar em obrigações de fazer, de não fazer ou de permitir que se faça.

Salienta-se que as limitações administrativas visam o bem estar social, isto é, o bem comum, caracterizando-se como o objetivo da “justiça social” a que se refere o artigo 170, da Constituição Federal, de modo que encontram-se justificadas em seu inciso III, ou seja, na função social da propriedade, também estabelecida no artigo , inciso XXIII da Carta Magna.

8 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DO RETROCESSO

No Direito Ambiental, dentre os diversos princípios estudados, destaca-se o princípio da proibição do retrocesso, atualmente presente nas recentes discussões acerca da aplicabilidade e a efetividades das mudanças normativas trazidas pela Lei 12.651/2012, com preocupação que se estende na comunidade internacional. A colocação desse princípio em evidência vai muito além de uma proteção meramente temporal de aplicação de normas jurídicas, uma vez que ele procura resguardar que um direito fundamental, já acobertado por um determinado grau de proteção, seja afrontado por uma mudança normativa retrógada (MILARÉ, 2014; AGOSTINHO, 2013).

A proteção do retrocesso em matéria ambiental exige uma tutela progressiva para maximizar a qualidade de vida existente e corresponder efetivamente aos padrões de amparo da dignidade humana, não possibilitando o retrocesso jurídico ou fático, a um nível de proteção menor do que o existente hoje (SARLET; FENSTERSEIFER, 2014).

Por isso, a doutrina especializada já discorre sobre a utilização desse princípio como instrumento peculiar para contestar as alterações legais que estabeleçam um padrão de proteção ambiental inferior ao existente. Aliás, a Procuradoria-Geral da República, por meio de três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIn’sns. 4.901, 4.902 e 4.903) questionam vários dispositivos do novo Diploma Florestal que recuaram valores ambientais que já contavam com apropriado amparo da legislação florestal então vigente (MILARÉ, 2014).

Dentre elas destaca-se a de nº 4901, segundo a qual pretende a declaração da inconstitucionalidade do art. 15 da Lei 12.651/2012, porque tal enunciado descaracteriza o regime de proteção ambiental das reservas legais, ao permitir a sua redução de área, ao admitir o computo em sua delimitação da área da APP. Ademais, esse dispositivo legal encontra-se frontalmente e diretamente contrário aos seguintes dispositivos constitucionais: garantia da função socioambiental da propriedade (art. 186); vedação da utilização de espaços especialmente protegidos com o comprometimento de atributos que justificam a sua proteção (art. 225, § 1º, III); imposição de reparação dos danos ambientais causados (art. 225, § 3º) e restauração dos processos ecológicos essenciais (art. 225, § 1º, I) (LEHFELD;CARVALHO; BALBIM, 2015).

Nesse caso, houve a vulneração do núcleo essencial do direito fundamental ao meio ambiente, com a evidente redução da área de proteção da reserva legal na propriedade, haja vista que isso caracterizou um anacronismo normativo de desrespeito ao piso de garantias constitucionais que deveriam ser mantidas ou postas em avance na proteção do meio ambiente (MILARE, 2014).

Aliás, não foi outro o entendimento recente lançado pela 1ª Turma do Conselho Superior do Ministério Público (2015), já que esse órgão, ao analisar o art. 15 do novo Código Florestal brasileiro e negar a sua aplicação, defende a “afronta ao princípio da vedação do retrocesso em matéria socioambiental”.

Além disso, a Turma Julgadora afirmou que o disposto no art. 15 descaracteriza o regime de proteção das reservas legais, ao admitir a possibilidade de cômputos das APP em reservas legais em imóveis de qualquer tamanho, pois isso significa uma notória diminuição da área de proteção, que exercem funções ecossistêmicas distintas, mas complementares, e que unidas compõe o mosaico de áreas protegidas mínimas para conferir sustentabilidade às propriedades rurais (CSMP, 2015).

9 O RETROCESSO NO NOVO CÓDIGO FLORESTAL; LESÃO AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.

Dizer que a abordagem dos Direitos Fundamentais é antropocêntrica, pode soar como um pleonasmo. No entanto, esse antropocentrismo pode ser suavizado, quando é atravessado pelo tema da proteção ao meio ambiente: o meio ambiente não deve se deteriorar a tal ponto que o direito à vida, à saúde e ao bem-estar, o direito à família e à vida privada, o direito à propriedade e outros direitos fundamentais sejam comprometidos (JONAS, 2010).

As condições ambientais sadias fazem parte do direito à vida. Há um vínculo óbvio entre a saúde ambiental e a saúde humana.

As perspectivas centradas nos Direitos Humanos, mais precisamente em interesses humanos específicos para não dizer em interesses econômicos específicos, como se pode verificar nos dispositivos do novo Código Florestal acima referidos - por outro lado, tendem a manter diferenças inconciliáveis entre direito ambiental e o direito à vida. Daí a importância, no presente contexto, da afirmação de François OST (2005), referida na introdução do presente estudo, acerca da crise de vínculo e de limite que atravessa a humanidade na atualidade.

A referida crise do vínculo e do limite pode ser visualizada da perspectiva jurídica quando se tem que a normativa jurídica se contradiz, ao estabelecer normas infraconstitucionais que vão de encontro à normativa constitucional: as leis promotoras de retrocesso ecológico - como em vários dispositivos do novo Código Florestal acima citados - vão de encontro a dispositivos normativos constitucionais, que visam a promoção e portanto a irretroatividade da proteção a o bem ambiental.

Assim sendo, temos que o critério jurídico dominante no cotidiano jurídico ainda é aquele do direito individual à vida ou à propriedade, em detrimento do direito difuso a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. É necessário pois, uma releitura ou uma leitura atualizada dos Direitos Fundamentais, em que se incluam os direitos difusos, a proteção ao meio ambiente. A História dos Direitos Humanos nasce com o liberalismo político que favorece a proteção da liberdade individual. Em um segundo momento constitucional, esses direitos são mitigados em face da proteção de grupos ou populações inteiras, ou seja, em face da proteção aos direitos sociais. Os direitos difusos surgem como mais uma dimensão protetora dos Direitos Humanos, ou seja, como uma terceira dimensão, que vai além da proteção individual e social dos direitos, em sentido estrito, compondo uma nova forma de proteção aos Direitos Humanos, exigida pelos problemas ambientais que assolam a contemporaneidade.

No entanto, ainda hoje, os interesses individuais se sobrepõem, mesmo àqueles sociais, assim como aos interesses difusos. Nos capítulos um e dois acima desenvolvidos exemplos de lesão aos direitos difusos se impõem, tanto na esfera legislativa quanto na esfera judiciária. Ocorre a predominância de direitos individuais à propriedade sobre responsabilidades ecológicas, quando das disposições do novo Código Florestal, que reduzem a proteção aos rios, aos morros, às APPs e às Reservas legais. Também ocorre a predominância dos direitos individuais no conflito entre direito à moradia e direito à proteção de APPs.

No entanto, ao nosso ver, o Código Florestal brasileiro atua justamente em sentido oposto à proteção constitucional dos Direitos Fundamentais, ao legalizar a impunidade do desmatador. Além do eventual estímulo a que o proprietário rural venha a fragmentar as suas propriedades rurais de modo a não ultrapassar os 4 módulos rurais e isentar-se, assim, da manutenção da Reserva Legal. A legislação infraconstitucional do novo Código Florestal abre, portanto, um espaço normativo para legitimar futuros desmatamentos, além de desobrigar aqueles que já o fizeram de reparar o dano ambiental causado.

CONCLUSÃO

A proibição de retrocesso ecológico é um princípio constitucional implícito. Decorre não somente da letra do art. 225 da Constituição Federal, ou seja, da norma constitucional especificamente atinente à proteção do meio ambiente. Decorre igualmente dos Direitos Fundamentais e dos princípios da proteção à vida e à dignidade da pessoa humana, fundamentos da Constituição de 1988.

O chamado “novo” Código Florestal estabelece normas que afrontam diretamente a proibição de retrocesso ecológico, assim como os princípios constitucionalmente estabelecidos, tendentes à promoção de uma vida digna para as presentes e futuras gerações. Ofende, enfim, as dimensões de Direitos Individuais, Sociais e, mais especificamente, a dimensão dos Direitos Difusos.

É necessário, pois, uma postura das Funções Estatais: Legislativa, Executiva e Judiciária que atue no sentido de uma efetiva proteção ao meio ambiente. Se a legislação infraconstitucional atenta contra a proibição do retrocesso ecológico, como ocorre em alguns dispositivos do Código Florestal, as demais Funções estatais devem atuar no sentido de resgatar a proteção constitucionalmente estabelecida.

Com base nos estudos científicos, é evidente que as alterações feitas no Novo Código Florestal foram realizadas sem o embasamento cientifico necessário, podendo causar danos irreversíveis para a biodiversidade uma vez que os atuais valores das áreas protegidas não são o suficiente para garantir a preservação dos organismos.

Em uma análise mais simplista não seria possível identificar significativas alterações, pois em termos numéricos as alterações foram pequenas. No entanto, a análise sistemática trazida pelo presente trabalho demonstra que as alterações legislativas causam grandes impactos à biodiversidade.

Portanto, a sistemática trazida pelo Novo Código Florestal afronta a própria essência da legislação, que é a de preservação do meio ambiente, ao passo que ofende as garantias ambientais existentes anteriormente, configurando abrandamento da legislação e consequente prejuízo à biodiversidade, o que evidencia violação ao princípio proibição do retrocesso ambiental.

Desta forma, se faz necessários debates nas esferas populares e científicas para elaboração de uma Lei que atenda as necessidades sociais e ambientais, sobretudo, que o Poder Legislativo leve em consideração os conhecimento e discussões geradas pela sociedade e meio acadêmico ao aprovar uma alteração legislativa.

REFERÊNCIAS

ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 12.ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris. 2010.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal.

BRASIL. Código Florestal (2012). Código Florestal Lei 12.651 de 2012. Brasília, DF: Senado Federal.

JONAS, Hans. Das Prinzip Verantwortung. Eine Kritische Analyse. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 2010.

LEHFELD, L. S; CARVALHO, N, C, B; BALBIM, L, I, N. Código Florestal comentado e anotado (artigo por artigo). 3.ed. rev. atual e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

MILARÉ, É. Direito do Ambiente: a gestão ambiental em foco. 9.ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

OST, François. A Natureza à Margem da Lei. São Paulo: Instituto Piaget, 2005.

SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

TRENNEPOHL, CURT; TRENNEPOHL, Terence. Licenciamento ambiental. 4.ed. Rio de Janeiro. Impetus,2011.

STJ, REsp 1179316 / SP, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, Julg. 15/06/2010, Pub. DJe 29/06/2010

  • Sobre o autorAdvogada. Ética, empatia e seriedade.
  • Publicações2
  • Seguidores5
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoArtigo
  • Visualizações244
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reserva-legal-sob-a-otica-da-lei-12651-de-25-de-maio-de-2012/645523108

Informações relacionadas

Gabriela Bertolini, Advogado
Artigoshá 4 anos

Todo imóvel rural precisa de Área de Reserva Legal?

Leticia Matias, Advogado
Artigoshá 2 anos

Do avanço tecnológico à responsabilidade civil no campo

Hébia Machado, Bacharel em Direito
Artigoshá 10 anos

Reserva legal: regularização após a implementação do CAR

Diego Luiz Godoy Assis Pereira, Advogado
Artigoshá 4 anos

Responsabilidade penal da pessoa jurídica por crime ambiental

Leandro Praxedes Ribeiro, Advogado
Artigoshá 2 anos

AS Leis 13.097/15 e 14.382/22 – E as Certidões para a Venda e Compra de Imóveis.

0 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)