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28 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

THAIS DE LAURENTIIS GALKOWICZ

Documentos anexos

Inteiro TeorCARF__16561720233201682_c5a4c.PDF
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Inteiro Teor

Processo nº 16561.720233/2016-82

Recurso De Ofício

Acórdão nº 1201-005.828 - 1a Seção de Julgamento / 2a Câmara / 1a Turma Ordinária Sessão de 11 de abril de 2023

Recorrente FAZENDA NACIONAL

Interessado AMBEV S.A.

ASSUNTO: PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL

Ano-calendário: 2011, 2012, 2013

LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO. ATO ADMINISTRATIVO. FALTA DE JUSTIFICAÇÃO RACIONAL. VÍCIO RELACIONADO À MOTIVAÇÃO. NULIDADE.

No âmbito do direito administrativo, motivo significa as circunstâncias de fato e os elementos de direito que provocam e precedem a edição do ato administrativo. No que tange à motivação, trata-se da explicação ou expressão dos motivos do ato administrativo, ou seja, é a exposição do raciocínio que conduz ao ato, fundando-se sobre elementos de fato e de direito, gerando as consequências ali expostas. Os vício relacionados à motivação do ato administrativo dizem respeito não só a sua ausência, mas também na sua insuficiência, ininteligibilidade ou incongruência, quando tais defeitos impeçam que haja uma verdadeira e efetiva justificação do ato.

Havendo os citados vícios, de natureza material, no lançamento tributário, ato administrativo vinculado aos motivos e à motivação que lhe ensejaram, necessário reconhecer sua nulidade.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de ofício.

(documento assinado digitalmente)

Neudson Cavalcante Albuquerque - Presidente

(documento assinado digitalmente)

Thais De Laurentiis Galkowicz - Relatora

Participaram do presente julgamento os Conselheiros: Efigênio de Freitas Junior, Jeferson Teodorovicz, Wilson Kazumi Nakayama, Fredy José Gomes de Albuquerque, Fabio de Tarsis Gama Cordeiro, Viviani Aparecida Bacchmi, Thais de Laurentiis Galkowicz, Neudson Cavalcante Albuquerque (Presidente).

Relatório

Original

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 2 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Trata-se de recurso de ofício apresentado em face da decisão proferida pela Delegacia da Receita Federal de Julgamento ("DRJ") de Belo Horizonte/BHE, que julgou procedente a impugnação oferecida pelo Sujeito Passivo sobre a cobrança de IRPJ e CSLL.

Por bem consolidar os fatos ocorridos até a decisão da DRJ, colaciono o relatório acórdão recorrido in verbis:

Em 13/12/2016, autos de infração de Imposto de Renda Pessoa Juridica - IRPJ (fls. 885/897) no valor total de R$ 2.747.166.930,50, e Contribuição Social sobre o Lucro Liquido - CSLL no valor total de R$ 988.980.094,96 (fls. 24/41), foram lavrados contra o sujeito passivo, AMBEV S.A., em função de Despesas não comprovadas e seus reflexos em CSLL. Houve exigência de Multa de Ofício no percentual de 75%.

Termo de verificação fiscal, fls. 856/884.

A fiscalização, em cumprimento ao Mandado de Procedimento Fiscal XXXXX-2015- 00054-0 na AMBEV S/A., CNPJ 07.XXXXX/0001-00 (sucessora por incorporação de COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMERICAS - AMBEV -, CNPJ 02.808.708/0001- 07), apurou que a Incorporada registrou despesas financeiras que não foram comprovadas mediante apresentação de documentação hábil e idônea.

A seguir, relação das contas contábeis relativas às despesas glosadas.

Original

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Fl. 3 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária Processo nº 16561.720233/2016-82

Original

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 4 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

A fiscalizada foi intimada a:

- apresentar planilhas indicando todos os lançamentos contábeis registrados nessas contas.

- apresentar todos os documentos e demonstrativos necessários para o entendimento e para a comprovação da realização das operações citadas por meio dos cinco maiores lançamentos a débito (exceto lançamentos de estornos e de lançamentos que posteriormente foram estornados) efetuados em cada uma das contas.

- informar quais das contas relacionadas tiveram seus saldos, no todo ou em parte, adicionados ao lucro líquido do correspondente período de apuração, para efeito de apuração do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido. - demonstrar, por meio da apresentação de memórias de cálculo conciliadas com os registros efetuados nos livros de apuração do lucro real, em DIPJ e em DCTF, quais saldos das contas listadas foram, no todo ou em parte, adicionados ao lucro líquido do correspondente período de apuração, para efeito de apuração do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido.

- apresentar os demonstrativos de ganhos e perdas auferidos nos resgates de cotas dos fundos Júpiter e Plutão, ao longo dos anos 2011, 2012 e 2013.

- demonstrar que, nas operações de cobertura (hedge) que tenham sido realizadas através das operações contabilizadas nas contas relacionadas, foram cumpridas as disposições da Instrução CVM nº 475/2008.

Em resposta, a intimada informou, em síntese,:

Original

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Fl. 5 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

- que as contas registraram operações via fundo de investimento e que em sua ECD escriturada o resultado do fundo estava contabilizado nas contas XXXXX e XXXXX.

- que os lançamentos contábeis das contas que registraram operações via fundo de investimentos em 2011 eram realizados de acordo com o seu sistema de riscos, que por sua vez é um espelho da carteira do administrador do fundo, devidamente categorizado por carteira. Este sistema diariamente fazia a marcação a mercado (MTM) dos instrumentos financeiros contratados, trazendo-os a valor presente, e gerando o valor a ser contabilizado relativo às perdas/ganhos com as operações realizadas pelos fundos de investimento dos quais era quotista.

- que qualquer seleção de documentação deve ser realizada através da carteira do fundo, para que a Intimada possa disponibilizar os documentos e informações com qualidade em conformidade com seus controles. A intimada envia para análise a composição detalhada da carteira. (Outros_01).

- esclarece ainda, que a exclusão de 102.301.359,80 da Ficha 09 é referente ao descasamento entre os requerimentos contábeis e fiscais causados pele aplicação de hedge accounting. Esta exclusão se faz necessária uma vez que na contabilidade os valores de hedge ficam temporariamente alocados no resultado abrangente (conta do patrimônio liquido), mas a Intimada oferece estes resultados à tributação pela variação da quota do fundo, e que este efeito só ocorre devido ao fato de que os derivativos

Original

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 6 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

contratados pelos Fundos tiveram como objetivo proteger ativos e passivos da Intimada, sendo tal tratamento contábil aceito pela auditoria independente da Intimada por conta da natureza de hedge das operações que os Fundos praticam.

- que o Fisco está baseando suas análises na ECD original, que não reflete sua contabilidade, uma vez que em sua ECD escriturada, que é a ECD substituída, o resultado do fundo está contabilizado nas contas XXXXX e XXXXX, prática contábil que representa a realidade dos fatos corretamente.

Apresentou a conciliação com a DIPJ relativas ao anos 2011 e 2012 da seguinte forma: - segue abaixo demonstrada a conciliação entre a conta de resultado referente às aplicações nos fundos de investimento com os saldos informados na DIPJ 2012 (ano- calendário 2011) e na DIPJ 2013 (ano-calendário 2012) respectivamente:

Informou que a Ficha 09 - Linha 02 da DIPJ 2012 (ano-calendário 2011) apresenta um valor total de R$786.617.299,37, o qual inclui o valor de R$102.301.360,00 referente às operações praticadas pelos Fundos. Essa exclusão foi feita com a finalidade de tributar exatamente o valor da variação positiva das quotas dos Fundos conforme previsto pela legislação fiscal aplicável às aplicações de renda fixa em fundos de investimento multimercado.

Acrescentou que no ano-calendário de 2011 as aplicações feitas por ela nos Fundos apresentaram resultado positivo de R$ 4.375.784,49 que foi oferecido à tributação.

A fiscalização também intimou a fiscalizada a:

- informar se, após as retificações de suas contabilidades relativas aos anos 2011, 2012 e 2013, as correspondentes DCTFs foram retificadas para incluir valores devidos de IRPJ e CSLL. Caso a resposta fosse afirmativa, deveriam ser apresentados os respectivos documentos comprobatórios.

- apresentar os demonstrativos de ganhos e perdas auferidos nos resgates de cotas dos fundos Júpiter e Plutão, ao longo dos anos 2011, 2012 e 2013.

- demonstrar que, nas operações de cobertura (hedge) que tenham sido realizadas através das operações contabilizadas nas contas acima relacionadas, foram cumpridas as disposições da Instrução CVM nº 475/2008.

Em resposta, a fiscalizada alegou, em síntese,:

Original

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Fl. 7 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

- que as operações do fundo foram contabilizadas inicialmente "abertas entre linhas", de forma analítica, na escrituração contábil digital (ECD) da intimada, ao passo que o tratamento contábil correto seria contabilizar o fundo em uma única linha, como investimento (no caso investimento financeiro), rigorosamente da mesma forma como é feito para os demais investimentos da intimada.

- que fez a correção de sua escrituração. Insta salientar que a escrituração corrigida é a que deve ser considerada válida para todos os efeitos conforme a legislação vigente, e não a escrituração anterior à retificação a que a fiscalização faz referência para as solicitações ora em comento. Além disto, a versão corrigida é a escrituração que corretamente demonstra o patrimônio do fundo refletido na contabilidade da intimada como investimento financeiro.

- que a fiscalização ao selecionar lançamentos de forma isolada não possibilita a comprovação de tais lançamentos mediante a apresentação de um único documento para cada lançamento selecionado. Conforme explanado acima as contratações dos instrumentos são feitas pelos fundos (e não pela intimada) junto à BM&F Bovespa e outras bolsas de maneira agrupada e, na interface com a intimada pelo sistema risk, são organizadas por estratégia de proteção. Além disso, cada instrumento financeiro usualmente é contabilizado com diversas contrapartidas (valor justo, hedge reserves, resultado financeiro, etc.) e a amostragem selecionada pela Fiscalização não leva em consideração tal fator.

- que na análise apresentada no anexo Outros_01 resta claro que, considerando o nível de complexidade das operações e a granulação das contabilizações por uma série de critérios de cada contrato, o pedido de reconciliação dos lançamentos citados com a documentação correspondente implica praticamente o refazimento por completo da contabilidade da intimada no que diz respeito aos instrumentos financeiros, esforço extenso e inviável nos períodos restritos de tempo oferecidos no termo em questão e também desnecessário como será explicado a seguir.

- que a documentação suporte para sua contabilidade são as carteiras disponibilizadas pelo Administrador dos fundos, as quais já foram disponibilizadas e reconciliadas com os saldos das contas indicadas pela fiscalização nos questionamentos acima.

- que após a retificação da contabilidade (ECD) nos referidos anos, não houve mudança nos valores devidos de IRPJ e CSSL.

A fiscalização informou no TVF que realizou diligências nas instituições administradoras dos fundos Júpiter e Plutão intimado-as a responder se tais fundos de investimento foram utilizados para realizar operações de cobertura (hedge) e de swaps para proteger ativos e passivos da Companhia de Bebidas das Américas e que BTG Pactual, BNY Mellon e UBS Corretora responderam que não possuíam elementos necessários para responder se os Fundos Júpiter e Plutão eram utilizados para realizar operações de cobertura (hedge) e de swaps para proteger ativos e passivos da Ambev porque, como administradora e controladora dos respectivos Fundos, tinham como responsabilidade assegurar que as operações estivessem em conformidade com as políticas de investimento constantes nos regulamentos vigentes e com as normas regulatórias, bem como acompanhar as implicações das operações para os Fundos, não tendo competência sobre motivações externas.

Com base nessas respostas, a fiscalização concluiu que os esclarecimentos prestados pelas administradoras BTG Pactual, BNY Mellon e UBS Corretora contradiziam, a argumentação da Fiscalizada de que os fundos realizavam operações de cobertura (hedge) das posições da Ambev.

Diante do relatado, a fiscalização concluiu, em resumo, que:

- diligenciados, os administradores BTG Pactual e BNY Mellon e a gestora UBS Corretora não atestaram a afirmação da fiscalizada de que o Fundo Júpiter praticou operações para proteger ativos e passivos da fiscalizada.

Original

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Fl. 8 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

- a fiscalizada, após retificar sua contabilidade, não adicionou ao lucro real e à base de cálculo da CSLL os valores relativos a suas despesas financeiras não suportadas por documentos hábeis e idôneos e que a retificação de sua contabilidade foi inócua.

- a fiscalizada alega que fundos de investimento realizaram operações de cobertura (hedge) e de swaps para proteger os ativos e passivos da Incorporada, porém não cumpriu as disposições da Instrução CVM nº 475/2008 editada especificamente para disciplinar tais tipos de operação, conforme se observa de sua leitura:

Art. 1º As companhias abertas devem divulgar, em nota explicativa específica, informações qualitativas e quantitativas sobre todos os seus instrumentos financeiros, reconhecidos ou não como ativo ou passivo em seu balanço patrimonial.

Art. 4º Para as operações com instrumentos financeiros derivativos realizadas com finalidade de hedge, a companhia deve divulgar o objeto (o elemento sendo protegido) e o instrumento financeiro derivativo de proteção em linhas separadas do quadro demonstrativo de análise de sensibilidade, de modo a informar sobre a exposição líquida da companhia, em cada um dos três cenários mencionados no art. 3º, § 2º. Parágrafo único. A companhia deve indicar como procedeu à contabilização dos derivativos designados com a finalidade de hedge, em conformidade com o disposto no Pronunciamento CPC 14 - Instrumentos Financeiros:

Reconhecimento, Mensuração e Evidenciação.

- o Regulamento do Fundo Júpiter prevê, em seu art. 5º, que ele "tem como objetivo propiciar a valorização de suas quotas mediante a aplicação dos recursos dos quotistas, feita pela ADMINISTRADORA, de forma alavancada ou não, em diversos mercados, tais como ouro, câmbio, títulos e valores mobiliários, juros, quotas de fundos de investimento, títulos públicos e derivativos" e que esse objetivo conflita com a alegada estratégia de cobertura (hedge) da empresa, já que não há como propiciar a valorização das respectivas quotas e, simultaneamente, proteger posições decorrentes das atividades operacionais da quotista.

A fiscalização listou inúmeras contradições detectadas nas informações da fiscalizada:

1) Relata que sua Incorporada controlou fundos de investimento que, em vez de seguir seus regulamentos e buscar a valorização de suas cotas, protege ativos e passivos dela, informação não confirmada pelas administradoras e pela gestora dos fundos;

2) Não consegue comprovar, através de documentação hábil e idônea, nem sequer um lançamento contábil registrado em contas de despesas financeiras que alega que registraram operações praticadas pelos fundos

3) Alega que os fundos de investimento realizaram operações com derivativos para proteger ativos e passivos de sua Incorporada, porém a Incorporada não cumpriu o disposto na Instrução CVM nº 475/2008, a qual regulamenta o assunto.

4) Entende que planilhas indicando carteiras dos fundos de investimento de sua Incorporada são documentos suficientes para comprovar a efetividade das despesas financeiras que registrou em sua contabilidade. Porém, não há como vincular as despesas escrituradas com as carteiras dos fundos de investimento apresentadas. Fosse isso possível, a Contribuinte teria conseguido fazer essa ligação no curso da fiscalização.

A fiscalização citou os art. 251 e 264 do Regulamento do Imposto de Renda, que determinam que a pessoa jurídica sujeita à tributação com base no lucro real deve manter escrituração com observância das leis comerciais e fiscais e conservar em ordem, enquanto não prescritas eventuais ações que lhes sejam pertinentes, os livros, os documentos e os papéis relativos a sua atividade, ou que se refiram a atos ou operações que modifiquem ou passam vir a modificar sua situação patrimonial.

Original

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 9 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Acrescentou que, quanto à força probante dos livros e documentos que dão base à escrituração, o art. 226 da Lei nº 10.406/2002 ( Código Civil) prescreve que os livros e as fichas dos empresários e sociedades provam contra as pessoas a que pertencem, e, em seu favor, quando, escriturados sem vício extrínseco ou intrínseco, forem confirmados por outros subsídios.

Com base nessas normas concluiu que a Contribuinte, quando intimada a comprovar despesas financeiras, deve demonstrar não apenas que escriturou essas operações, mas apresentar a respectiva documentação comprobatória e que a glosa dessas despesas não requer qualquer outra prova por parte da autoridade administrativa, senão a demonstração de que o Contribuinte deduziu esses valores na apuração do IRPJ e da CSLL e que, intimado a comprová-los, não logrou apresentar documentação hábil e idônea para tanto.

Ao final, concluiu que a fiscalizada não conseguiu comprovar, através de documentação hábil e idônea, a efetiva realização de despesas financeiras registradas em sua contabilidade, infringindo os seguintes artigos do Regulamento do Imposto de Renda (RIR/1999):

"Art. 247. Lucro real é o lucro líquido do período de apuração ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas por este Decreto (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. ).

§ 1º A determinação do lucro real será precedida da apuração do lucro líquido de cada período de apuração com observância das disposições das leis comerciais (Lei nº 8.981, de 1995, art. 37, § 1º).

§ 2º Os valores que, por competirem a outro período de apuração, forem, para efeito de determinação do lucro real, adicionados ao lucro líquido do período de apuração, ou dele excluídos, serão, na determinação do lucro real do período de apuração competente, excluídos do lucro líquido ou a ele adicionados, respectivamente, observado o disposto no parágrafo seguinte (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. , § 4º).

§ 3º Os valores controlados na parte B do Livro de Apuração do Lucro Real - LALUR, existentes em 31 de dezembro de 1995, somente serão atualizados monetariamente até essa data, observada a legislação então vigente, ainda que venham a ser adicionados, excluídos ou compensados em períodos de apuração posteriores (Lei nº 9.249, de 1995, art. ).

Art. 248. O lucro líquido do período de apuração é a soma algébrica do lucro operacional (Capítulo V), dos resultados não operacionais (Capítulo VII), e das participações, e deverá ser determinado com observância dos preceitos da lei comercial (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. , § 1º, Lei nº 7.450, de 1985, art. 18, e Lei nº 9.249, de 1995, art. ).

Art. 249. Na determinação do lucro real, serão adicionados ao lucro líquido do período de apuração (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. , § 2º):

I - os custos, despesas, encargos, perdas, provisões, participações e quaisquer outros valores deduzidos na apuração do lucro líquido que, de acordo com este Decreto, não sejam dedutíveis na determinação do lucro real;

Art. 251. A pessoa jurídica sujeita à tributação com base no lucro real deve manter escrituração com observância das leis comerciais e fiscais (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. ).

Parágrafo único. A escrituração deverá abranger todas as operações do contribuinte, os resultados apurados em suas atividades no território nacional, bem como os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior (Lei nº 2.354, de 29 de novembro de 1954, art. 2º, e Lei nº 9.249, de 1995, art. 25).

(...)

Original

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Fl. 10 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Art. 277. Será classificado como lucro operacional o resultado das atividades, principais ou acessórias, que constituam objeto da pessoa jurídica (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 11).

Parágrafo único. A escrituração do contribuinte, cujas atividades compreendam a venda de bens ou serviços, deve discriminar o lucro bruto, as despesas operacionais e os demais resultados operacionais (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 11, § 1º).

Art. 278. Será classificado como lucro bruto o resultado da atividade de venda de bens ou serviços que constitua objeto da pessoa jurídica (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 11, § 2º).

Parágrafo único. O lucro bruto corresponde à diferença entre a receita líquida das vendas e serviços (art. 280) e o custo dos bens e serviços vendidos - Subseção III (Lei nº 6.404, de 1976, art. 187, inciso II).

(...)

Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47).

§ 1º São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 1º). § 2º As despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de transações, operações ou atividades da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 2º). § 3º O disposto neste artigo aplica-se também às gratificações pagas aos empregados, seja qual for a designação que tiverem.

Art. 300. Aplicam-se aos custos e despesas operacionais as disposições sobre dedutibilidade de rendimentos pagos a terceiros (Lei nº 4.506, de 1964, art. 45, § 2º)." Diante disso, glosou as despesas financeiras por falta de apresentação de documentação hábil e idônea que as comprovassem.

Impugnação, fls. 918/999.

A fiscalizada tomou ciência dos autos de infração por meio de sua Caixa Postal na data de 15/12/2016 (fl. 914).

Em 16/01/2017, tempestivamente, apresentou impugnação (fl. 917), alegando, em síntese, o que se segue:

- a Fiscalização entendeu indedutíveis os saldos devedores registrados pela Impugnante nas contas contábeis relacionadas nos quadros de fls. 878/880 dos autos, por considera- los não comprovados mediante apresentação de "documentação hábil e idônea".

- que demonstrou durante a fiscalização, que sua Escrituração Contábil Digital foi substituída para corretamente refletir os resultados das operações financeiras sujeitas à fiscalização e, portanto, grande parte das contas cujos saldos foram glosados não mais existe.

- que essa supressão se deu porque referidas contas serviram para registrar na contabilidade da Impugnante perdas na marcação a valor de mercado de instrumentos financeiros detidos pelo Fundo de Investimento Multimercado Júpiter (CNPJ 01.XXXXX/0001-06, "Fundo Júpiter") e pelo Fundo de Investimento Multimercado Iguana (CNPJ 14.061.256/0001- "Fundo Iguana", em conjunto denominados "Fundos"), dos quais a Impugnante é quotista exclusiva, apenas por conta de regras de divulgação de demonstrações financeiras.

- que diferentemente do que supôs a Fiscalização, as referidas contas suprimidas não têm qualquer relevância para a apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL porque, independentemente da forma como tais valores foram contabilizados, a Impugnante ofereceu à tributação exatamente os valores correspondentes à variação do valor das quotas dos Fundos de Investimento nos períodos autuados, porque estes (e apenas estes) impactaram seu patrimônio.

Original

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Fl. 11 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

- que a variação do valor de mercado dos instrumentos financeiros acima referidos afeta diretamente o valor do patrimônio líquido dos Fundos e, por consequência, o valor de suas respectivas quotas. É exatamente essa, e somente essa variação, que importa para fins de tributação dos resultados apurados pelos Fundos ao nível da Impugnante. Foi por este motivo então que a Impugnante modificou sua ECD para que a sua contabilidade refletisse diretamente o impacto da variação do valor das quotas dos Fundos, e não mais a variação segregada do valor de mercado de cada um dos ativos financeiros por eles detidos.

- que explicou durante a fiscalização que utiliza tais Fundos (e outros instrumentos financeiros detidos diretamente) para fins de cobertura (hedge), isto é para se proteger contra variações de câmbio ou taxa de juros de títulos de dívida (bonds) emitidos no Brasil ou em mercados estrangeiros e de variações de preço de insumos necessários para seu processo produtivo.

- que sob o argumento de que a Impugnante não teria apresentando documentos que suportassem, lançamento a lançamento, os saldos finais devedores (despesas com perdas) registrados nas contas contábeis relacionadas nos quadros de fls. 878/880, a Fiscalização as considerou indedutíveis e lançou o IRPJ e a CSLL sobre os seus valores integrais, ignorando os ganhos oriundos das mesmas operações em relação as quais foram registradas as perdas.

- que para demonstrar de uma vez por todas a boa-fé da Impugnante e veracidade de suas afirmações, a empresa especializada (KPMG) foi contratada para verificar por meio de Laudo Técnico de Natureza Contábil e Fiscal ("Laudo", fls. 1039/1412): (i) a existência e correção do tratamento contábil dado pela Impugnante aos resultados produzidos pelas operações financeiras em análise; (ii) a importância e necessidade de contratação de um sistema de risco para controle dessas operações, bem como (iii) para demonstrar como é possível se fazer a comprovação documental de operações dessa natureza.

A impugnante apresentou Laudo Técnico de Natureza Contábil e Fiscal elaborado por KPGM Assessores Ltda, fls. 1039/1412, mais seus anexos (fls. 1413/21035), com o objetivo de verificação da documentação suporte para os ativos da Carteira dos Fundos de Investimentos Júpiter e Iguana, de comprovação dos procedimentos de tributação pela Ambev da variação das quotas detidas nos Fundos de Investimento, de verificação dos procedimentos de contabilização pela Ambev dos resultados auferidos nas operações realizadas pelos Fundos de Investimento por meio do Sistema denominado Risk Control e de comprovação da documentação suporte para o maior lançamento contábil a débito e a crédito das maiores despesas financeiras glosadas pelas Autoridades Fiscais.

A impugnante pede a insubsistência dos autos de infração em razão da desconsideração das receitas que têm a mesma origem que as despesas, pelo que alega a seguir:

- ou se entende que há suporte documental para as receitas e despesas - o que no mínimo limitaria a autuação às despesas que excedessem às receitas (nos termos do art. 76, § 4º, da Lei 8.981/1995), ou se entende que não há suporte documental para quaisquer dos lançamentos contábeis concernentes aos instrumentos finance iros, desconsiderando-os integralmente - i.e. expurgando todos esses lançamentos (e não apenas as despesas) da apuração do IRPJ e CSLL da Impugnante.

- tivesse a Impugnante a intenção de "fabricar" despesas, não teria, ao mesmo tempo e com base na utilização dos mesmos sistemas de controle e contabilização, "criado" em todos os anos-calendário autuados valores de receitas superiores ao valor das despesas glosadas nas mesmas operações, consoante demonstram os Quadros 14a, 14b e 14c do Laudo, fls. 929/931.

- que no ano-calendário de 2011 o valor das receitas é superior ao das despesas no montante de R$106.677.143, no ano-calendário de 2012 no montante de R$705.687.004 e no ano-calendário de 2013 no montante de R$251.973.480 (conforme circunscrito em vermelho nas tabelas- esses valores representam o valor líquido entre as despesas

Original

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Fl. 12 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

indicadas nas tabelas com a letra D e as receitas indicadas com a letra C (note-se que os valores entre parênteses representam receitas).

A impugnante pede a insubsistência do IRPJ e da CSLL lançados em razão da correta tributação das operações que geraram as despesas glosadas pela fiscalização, pelo que alega a seguir:

De acordo com o laudo apresentado, a Ambev adotou procedimentos para que o movimento anual do período obtido pela fórmula matemática: Patrimônio Líquido (PL) do ano base menos PL do ano anterior menos Aportes mais Resgates correspondesse ao valor do resultado auferido pelos Fundos nas operações que compõem as suas carteiras (variação no valor das quotas ajustada pelo expurgo dos aportes e resgates efetuados no período), o qual foi registrado contabilmente pela Ambev em contas do resultado do período (resultado financeiro) e resultados abrangentes (Hedge Accounting), fosse computado na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL.

Para demonstrar que o valor da variação das quotas detidas nos Fundos corresponde ao montante computado na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, o laudo apresentou o somatório das rubricas contábeis de resultado do exercício que registraram valores de operações de hedge contratadas pelos Fundos de Investimento e pela própria Ambev, quadro 14.a. - Receitas e despesas financeiras associadas as operações financeiras, fl. 1087.

Em 2011, as receitas e despesas financeiras nas operações dos Fundos registradas no período, se somadas, montam a quantia de R$ 106.677.144 (ganho líquido).

Nesse ponto, a impugnante ressalva que a Autoridade Fiscal ao proceder à glosa das despesas financeiras, sob o fundamento de que não tinham documentação suporte, desconsideraram as contas de receitas que também registraram operações da mesma natureza.

Dessa forma, tendo em vista as constatações até então verificadas quanto à existência e comprovação das operações financeiras contratadas pelos Fundos de Investimento, qualquer questionamento da Autoridade Fiscal quanto aos resultados produzidos por tais operações deveriam considerar a variação líquida das contas, dado que ambas tem a mesma origem, forma de contabilização e prova documental.

Em seguida, explica que, apesar de o valor total que figura na contabilidade da Ambev de 2011 a título de resultado nas operações dos Fundos ser um ganho líquido de R$ 106.677.144, a Ambev ofereceu a tributação o montante de R$ 4.375.784 que corresponde ao valor da variação das quotas detidas nos Fundos de Investimento no período expurgados os valores de aportes e resgates efetuados pela Ambev, conforme cálculo demonstrado no quadro 15.a - Valor da variação das quotas detidas nos Fundos de Investimento, fl. 1088.

Laudo: a diferença entre o valor de receitas e despesas financeiras registrados pela Ambev (R$ 106.677.144) e o valor oferecido a tributação correspondente a variação do valor da quota (R$ 4.375.784) no montante de R$ 102.301.360 refere-se à contabilização da alocação de parcela dessas receitas e despesas de ou para grupo de Resultados Abrangentes no Patrimônio Líquido da Sociedade a título de Hedge Accounting.

O laudo defende que a Ambev efetua um ajuste fiscal em sua apuração do IRPJ e da CSLL para garantir que os montantes oferecidos a tributação sejam exatamente conforme a variação das quotas detidas nos Fundos para neutralizar, fiscalmente, os lançamentos contábeis de Hedge Accounting que afetaram as contas de resultado do período.

Acrescenta que as Demonstrações Financeiras Auditadas da Companhia do ano- calendário de 2011 (Anexo Geral XXI contém a descrição das operações de instrumentos derivativos contabilizadas pelo Grupo - nota explicativa 27 - Instrumentos Financeiros e Riscos, fls. 7165/ss.), em conformidade com os requerimentos de divulgação da instrução CVM nº 475/2008.

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Fl. 13 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Ressalta que o registro de Hedge Accounting em conta de patrimônio líquido deve ser feito em observância aos conceitos e regras da regulamentação contábil (IAS 39 e dos Pronunciamentos CPCs nos 14 e 38 - Instrumentos Financeiros).

Para fins fiscais, o efeito fiscal de tributação de R$ 4.375.784 foi obtido mediante exclusão fiscal do valor de R$ 102.301.360 declarado na DIPJ do ano-base de 2011 (Anexo 1.4), mais especificamente na linha 02 das Fichas 09A e 17 - Ajustes do Regime Tributário de Transição - RTT. A composição dos ajustes de RTT pode ser visualizada no Anexo 1.4.1. do Laudo (fls. 8890/ss.).

Ressalta que, também neste caso, a exclusão observa o comando legal da Lei 11.941 de 2009 que instituiu o RTT e determinou que os efeitos decorrentes das normas contábeis internacionais não deveriam gerar efeito fiscal. Portanto, como o montante de despesa de R$ 102.301.360 foi contabilizado em conta de PL por força da nova norma contábil, a Ambev procedeu à exclusão deste nos termos do RTT (art. 16 da Lei 11.941).

Defende que a mecânica de cálculo efetuada pela Companhia visa oferecer à tributação do IRPJ e da CSLL o valor corresponde a variação das quotas detidas nos Fundos de Investimento no ano-calendário de 2011.

Idêntica demonstração foi feita para os demais anos fiscalizados.

A impugnante defende que a tributação da variação da quota dos Fundos, alcançada por meio de exclusões no Lalur, decorreu de valores obtidos por meio de documentos fornecidos pelos próprios administradores dos Fundos e que confirma que o fato de ter registrado os lançamentos contábeis relativos aos instrumentos contratados pelos Fundos diretamente e de forma analítica em sua contabilidade em nada influenciaram o valor passível de tributação.

Reforça que, embora em momento nenhum a Fiscalização tenha questionado esse ponto, a tributação de investimentos em fundos de investimento multimercado se faz com base na variação positiva ou negativa de suas quotas. Não fosse assim, todo contribuinte (pessoa física ou jurídica) deveria solicitar aos administradores dos fundos em que investem toda a documentação comprobatória dos investimentos por eles feitos (i.e., cada contrato de investimento individualmente), algo que seria totalmente incoerente com a natureza dos fundos de investimento e com a função que os administradores desempenham.

Isto porque, são os administradores dos fundos os responsáveis pela contabilização e comprovação documental das operações individuais realizadas pelos fundos que administram, conforme previsão da Instrução CVM 409/2004, que transcreve:

"Das Obrigações do Administrador do Fundo

Art. 65. Incluem-se entre as obrigações do administrador, além das demais previstas nesta Instrução:

I - diligenciar para que sejam mantidos, às suas expensas, atualizados e em perfeita ordem:

(...)

e) os registros contábeis referentes às operações e ao patrimônio do fundo; e

f) a documentação relativa às operações do fundo, pelo prazo de cinco anos."

Acrescenta que a Medida Provisória XXXXX-49/2001, ao tratar da tributação pelo imposto de renda na fonte sobre rendimentos auferidos por contribuintes que investem em fundos de investimento, deixa cristalino que a base de cálculo passível de tributação pelo imposto de renda sobre resultados obtidos por meio de investimento em fundos de investimento se obtém por meio da apuração da valorização das quotas do referido fundo.

"Art. 6º A partir de 1o de janeiro de 1999, a incidência do imposto de renda na fonte sobre os rendimentos auferidos por qualquer beneficiário, inclusive pessoa jurídica

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Fl. 14 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

isenta e as imunes de que trata o art. 12 da Lei no 9.532, de 1997, nas aplicações em fundos de investimento , ocorrerá: (Vide Lei nº 10.892, de 2004)

I - na data em que se completar cada período de carência para resgate de quotas com rendimento, no caso de fundos sujeitos a essa condição, ressalvado o disposto no inciso II;

II - no último dia útil de cada trimestre-calendário, no caso de fundos com períodos de carência superior a noventa dias;

III - no último dia útil de cada mês, ou no resgate, se ocorrido em outra data, no caso de fundos sem prazo de carência.

§ 1º. A base de cálculo do imposto será a diferença positiva entre o valor da quota apurado na data de resgate ou no final de cada período de incidência referido neste artigo e na data da aplicação ou no final do período de incidência anterior [variação da quota], conforme o caso."

A impugnante reafirma que não há que se falar em ausência de comprovação de quaisquer das operações ora objeto de discussão, uma vez que as operações (instrumentos financeiros) de que decorrem as despesas glosadas estão devidamente documentadas: os instrumentos financeiros detidos pelos Fundos estão registrados nas respectivas carteiras e podem ser confirmados pelos respectivos contratos, por relatórios da CETIP, por notas de corretagem de negociação junto à BMF&Bovespa e por outros documentos; já os instrumentos financeiros detidos diretamente pela Impugnante decorrem de contratos por ela firmados e por documentos que já foram entregues durante a fase de fiscalização.

Em seguida, demonstra o que chama de prova das operações realizadas pelos Fundos em grande parte por referência ao Laudo Técnico da KPMG utilizando a seguinte metodologia:

1) demonstrar que os Fundos efetivamente contrataram os instrumentos financeiros relacionados nas respectivas carteiras.

2) demonstrar que o sistema Risk Control contratado para calcular a variação do valor de mercado de referidos instrumentos financeiros é confiável e adequado para dar suporte aos lançamentos contábeis efetuados nas contas glosadas.

3) demonstrar que, em decorrência da correta contabilização da variação do valor de mercado dos instrumentos financeiros detidos pelos Fundos, o resultado obtido em sua contabilidade e oferecido à tributação corresponde à variação do valor das quotas, não havendo IRPJ e CSLL a cobrar.

Ao final, pede o que se segue:

- sejam declarados nulos os Autos de Infração impugnados, por omissão de requisito de validade essencial (descrição dos fatos que dão origem ao lançamento tributário), já que a fiscalização faz referência a lançamentos em contas contábeis que não mais existem na contabilidade da Impugnante após a substituição das ECDs dos anos-calendário autuados, conclusão que é ainda mais patente para o ano-calendário de 2013, cuja substituição da ECD ocorreu antes mesmo do início do procedimento de fiscalização.

- caso assim não se entenda, pede sejam julgados totalmente improcedentes os Autos de Infração impugnados e cancelados os débitos neles exigidos e todos os seus consectários, tendo em vista que, adotando-se como correta a premissa de que as operações de que decorreram as despesas glosadas não têm amparo em documentação hábil e idônea, também devem ser excluídas da base de cálculo do IRPJ e da CSLL as receitas decorrentes de tais operações tidas por não comprovadas, o que, conforme demonstrado, implicaria base de cálculo de referidos tributos menor do que a já declarada pela Impugnante nas DIPJs do período autuado.

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Fl. 15 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

- pede também que os Autos de Infração sejam julgados totalmente improcedentes porque, conforme a Impugnante demonstrou, não há que se falar que as despesas glosadas não têm amparo em documentação hábil e idônea, tendo sido demonstrado, especificamente em relação às despesas inerentes aos instrumentos financeiros detidos pelos Fundos, que (i) tais instrumentos financeiros existem e foram devidamente contratados; (ii) o sistema adotado pela Impugnante para dar base à contabilização de referidos instrumentos é confiável e adequado para esta tarefa; e (iii) independentemente da forma de contabilização, ofereceu à tributação o resultado correspondente à variação das quotas dos Fundos em cada ano-calendário autuado. - pede que sejam julgados totalmente improcedentes os Autos de Infração impugnados em virtude de as despesas ora glosadas dizerem respeito a instrumentos financeiros contratados pelos Fundos ou diretamente pela Impugnante com a finalidade de cobertura de riscos (hedge), cuja dedutibilidade é admitida pela legislação aplicável. - pede ao menos que seja cancelado o Auto de Infração de CSLL em virtude da inaplicabilidade das normas que impõem limites a dedutibilidade de perdas no mercado de renda variável.

- caso a multa seja mantida, ainda que em parte, pede a Impugnante que seja determinada a insubsistência da cobrança de juros de mora sobre os valores de multas de ofício mantidos.

Protesta a Impugnante pela produção de todos os tipos de prova admitidos no processo administrativo fiscal federal, especialmente pela determinação de diligências e verificações que relevantes à adequada verificação dos argumentos de fato desta Impugnação, colocando-se a Impugnante desde já à disposição para o fornecimento das informações que lhe forem solicitadas nesse âmbito.

Proposta de conversão do julgamento em diligência.

O julgador, em decorrência do princípio da oficialidade, tem o poder de comando do processo, podendo determinar de ofício a realização de diligências ou perícias, quando as entender necessárias (art. 18 cc art. 29 do Decreto nº 70.235/1972).

O fundamento da autuação foi a não apresentação de documentação hábil e idônea que comprovassem as despesas financeiras relacionadas nos quadros 1, 2 e 3 deste relatório. Quando intimada, a impugnante reiteradamente afirmou que a maior parte dessas despesas eram relativas a operações realizadas pelos fundos de investimento Júpiter e Iguana.

Afirmou também que era obrigação do Administrador do Fundo a manutenção e apresentação dos registros contábeis e da documentação referentes às operações e ao patrimônio do fundo.

A fiscalização, inclusive, intimou os administradores BTG Pactual e BNY Mellon e a gestora UBS Corretora.

No caso do BTG Pactual e do BNY Mellon, a intimação era para: 1- informar se o único cotista do Fundo Júpiter, CNPJ 01.XXXXX/0001-06, e do Fundo Plutão, CNPJ 01.XXXXX/0001-56, ao longo dos anos-calendários citados, foi a Ambev; 2- apresentar demonstrativos indicando a composição das carteiras dos citados fundos ao longo dos anos-calendários citados; 3- apresentar os extratos de evolução diária das cotas dos referidos fundos ao longo dos anos-calendários citados; 4- apresentar extratos indicando todos os aportes e resgates realizados nos mencionados fundos, desde sua criação até a presente data, pela Ambev; 5- apresentar extratos indicando todas as receitas e despesas auferidas, nos anos-calendários citados, pela Ambev, em seus investimentos praticados através do mencionado fundo; 6- informar se os citados fundos foram utilizados para realizar operações de cobertura (hedge) e de swaps para proteger ativos e passivos da AMBEV.

O BTG Pactual apresentou em resposta, os arquivos a seguir listados, anexados ao processo como arquivos não pagináveis:

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Fl. 16 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

O BNY Mellon apresentou em resposta, os arquivos a seguir listados, anexados ao processo como arquivos não pagináveis:

Apesar da extensa documentação apresentada, no TVF, a fiscalização ateve-se à resposta ao item 6, afirmando que os esclarecimentos prestados pelas administradoras BTG Pactual, BNY Mellon e UBS Corretora não atestaram a afirmação da Fiscalizada de que o Fundo Júpiter praticou operações para proteger ativos e passivos da Incorporada.

A impugnante afirma que grande parte das contas contábeis glosadas pela Fiscalização foi utilizada pela Impugnante (na escrituração original, substituída) para registrar perdas vinculadas a instrumentos financeiros detidos pelos Fundos (itens XXXXX/ss. Da impugnação).

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Fl. 17 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

A documentação apresentada pelos administradores BTG Pactual e BNY Mellon confirma a existência dos Fundos.

O Laudo Técnico apresentado pela impugnante, no item 4.1 - Verificação da documentação suporte dos ativos da Carteira de Ativos Financeiros do Fundo Júpiter e Iguana, constata a existência das operações financeiras que compuseram as carteiras dos Fundos de Investimento Júpiter e Iguana nos anos-calendários de 2011, 2012 e 2013 com base na verificação da documentação hábil e idônea que suporta essas transações (exemplos de documentação utilizada: relatórios do Bacen (fl. 1083); composições dos Ativos do Fundo Júpiter (Anexos 1.1.2, 2.1.2 e 3.1.2) e Fundo Iguana (Anexos 1.2.2, 2.2.2, 3.2.2) enviadas pelas administradoras dos Fundos (Banco BTG e BNY Mellon) em 31 de dezembro de cada ano analisado (2011, 2012 e 2013); extratos das administradoras (ii) e a composição extraída do sítio eletrônico da Comissão de Valores Mobiliários - CVM (Anexos 1.1, 1.2, 2.1, 2.2, 3.1 e 3.2); extrato do sitio eletrônico da CVM (Anexo 1.1, Anexo 1.2, Anexo 2.1, Anexo 2.2, Anexo 3.1 e Anexo 3.2); relatórios emitidos pela Cetip em dezembro de 2016 (Anexos 1.1.2.1.1, 1.2.2.1.1, 2.1.2.1.1, 2.2.2.1.1, 3.1.2.1.1 e 3.2.2.1.1); Notas de Negociação - Swap entre o Fundo Júpiter e as instituições financeiras (contraparte) (anexos 1.1.2.3, 1.1.2.4 e 1.1.2.5); Notas de Corretagem emitidas pela Bradesco Corretora S.A.; composições mensais das carteiras, as quais compreendem as operações na BM&F (Anexo 1.1.2.8); relatório extraído do sítio eletrônico Bacen que relaciona as "Negociações de Títulos Federais no Mercado Secundário" onde foi possível verificar que o título NTN-B de código ISIN - BRSTNCNTB3X2 faz parte dessa lista (Anexo 1.3)).

Diante do exposto, propus a conversão do julgamento em diligência e formulei 8 quesitos para serem respondidos pela fiscalização. A proposta foi aceita pela 2a Turma de julgamento da DRJ Belo Horizonte e formalizada por meio da Resolução 2.108, de 26 de abril de 2017.

Em 29 de abril de 2019, o processo retornou para prosseguimento do julgamento. Novas intimações foram feitas pela fiscalização e os quesitos formulados foram respondidos assim pela fiscalização.

1- Informar se a documentação apresentada pelos administradores dos fundos foi analisada e se elas são suficientes ou não para comprovar a existência dos instrumentos financeiros que compõem a carteira dos fundos.

RESPOSTA: Os documentos apresentados pelos administradores dos fundos foram analisados e são suficientes para comprovar a existência das carteiras dos fundos e a existência dos instrumentos financeiros que compõem a carteira dos fundos. Porém, não há como vincular as carteiras dos fundos e os instrumentos financeiros que compõem suas carteiras aos lançamentos contábeis escriturados pela AMBEV.

Analisar se a metodologia utilizada no Laudo Técnico é suficiente ou não para comprovar a existência dos instrumentos financeiros que compõem a carteira dos fundos.

RESPOSTA: Como já dito na resposta ao quesito anterior, os documentos apresentados pelos administradores dos fundos são suficientes para comprovar a existência dos instrumentos financeiros que compõem as carteiras dos fundos. O Laudo Técnico comprado pela Diligenciada tenta demonstrar - sem sucesso - que o sistema Risk Control foi corretamente alimentado por funcionários da AMBEV, para que depois fossem gerados lançamentos em sua contabilidade, através do sistema SAP. O documento não consegue vincular as operações praticadas pelos fundos aos lançamentos contábeis da Fiscalizada nem a documentos que seriam seus suportes, os quais nunca foram apresentados.

3- Informar se as contas de despesas glosadas correspondem aos mesmos instrumentos financeiros utilizados pelos fundos conforme defende a impugnante em todas as suas respostas e na impugnação.

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Fl. 18 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

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RESPOSTA: A Diligenciada e a prestadora de serviços contratada não conseguiram demonstrar os vínculos que alegam existir entre contas da contabilidade da AMBEV e os instrumentos financeiros utilizados pelos fundos.

4- Analisar se a "variação das quotas detidas nos fundos" corresponde ao somatório das "receitas e despesas financeiras associadas às operações financeiras relativas às contas de despesa glosadas que a impugnante afirma estarem contidas nos fundos" mais o resultado das "receitas e despesas financeiras associadas às operações financeiras relativas às contas de despesa glosadas de operações Ambev". Essa igualdade é demonstrada no Laudo Técnico no item "4.2 - Comprovação dos procedimentos de tributação da variação das quotas detidas no fundos de investimento".

RESPOSTA: A Diligenciada foi intimada a comprovar, através de documentação hábil e idônea, todos os aportes em valor superior a R$ 50 milhões que teria feito nos fundos. Os documentos nunca foram apresentados. Portanto, não há como validar os cálculos descritos nos laudos técnicos elaborados pela prestadora de serviços contratada pela Diligenciada.

5- Analisar e informar se a tributação efetuada pela impugnante com base na variação das quotas dos fundos está em consonância com a legislação tributária, inclusive quanto à contabilização da alocação de parcela dessas receitas e despesas de ou para grupo de Resultados Abrangentes no Patrimônio Líquido da Sociedade a título de Hedge Accounting.

RESPOSTA: A correta tributação de aplicações em fundos de investimento dos tipos em que a Diligenciada alega que sua incorporada investiu deve ser feita nos resgates de cotas dos fundos, nos quais forem auferidos lucros. Os administradores dos fundos não efetuaram nenhuma retenção na fonte de imposto de renda nos resgates de cotas. Intimada, a Diligenciada não apresentou o fundamento legal da sistemática de tributação que alega ter adotado, dizendo que é uma forma "até intuitiva" de tributação.

6- Analisar e informar se as receitas correspondentes aos instrumentos financeiros referentes às contas de despesas glosadas são suficientes para suportar a dedução das despesas.

RESPOSTA: As receitas que a Contribuinte alega que correspondem aos instrumentos financeiros referentes às contas de despesas glosadas não são suficientes para suportar a dedução das despesas (Anexo 5). E, da mesma forma que as despesas escrituradas não foram comprovadas através da apresentação de documentação hábil e idônea nos procedimentos de fiscalização e diligência, as receitas escrituradas também não foram comprovadas no procedimento de diligência.

7- No caso de as receitas correspondentes não serem suficientes e caso seja neceária a confirmação da natureza dos instrumentos financeiros ser ou não de hedge para fins de afastar-se a aplicação do art. 77, V, § 1º, a e b, da Lei 8.981, de 1995, analisar a documentação apresentada pela impugnante na resposta à intimação de 30 de novembro de 2016, fls. 768/ssss., especificamente, em relação ao item "7 - Demonstrar que, nas operações de cobertura (hedge) que tenham sido realizadas através das operações contabilizadas nas contas acima relacionadas, foram cumpridas as disposições da Instrução CVM nº 475/2008", e informar se restou comprovada ou não a natureza de hedge das operações.

RESPOSTA: A Diligenciada alega que as demonstrações financeiras de sua incorporada foram aprovadas pela CVM. Porém, não apresentou nenhum laudo que ateste tal informação. Os Balanços da AMBEV sequer citam os fundos em que a empresa alega ter investido.

8- Informar a fundamentação legal que sustenta a análise dos dados escriturados nas escriturações originais, em especial, a do ano calendário 2013 que, segundo alegação da impugnante, foi substituída em 30 e 31/12/2015, fls. 21062/ss., antes do início da fiscalização referente a 2013, comunicada à impugnante em 19/05/2016. Nesse item,

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Fl. 19 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

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informar também quando se deu o início da fiscalização dos anos 2011 e 2012, pois não localizei o Termo de Início da Fiscalização nos autos.

RESPOSTA: Após início do procedimento de fiscalização, a Diligenciada retificou a contabilidade de sua incorporada, mas não retificou suas DIPJs e suas DCTFs.

Portanto, do ponto de vista fiscal, a retificação da contabilidade foi inócua. Ademais, a retificação da contabilidade consistiu apenas na reunião das muitas contas que existiam na contabilidade original em uma única conta "11200999 FUNDOS DE INVESTIMENTOS".

Sobreveio então o Acórdão XXXXX-95.985, da 2a Turma da DRJ/BHE, dando provimento à impugnação do Sujeito Passivo, exonerando completamente o crédito tributário controlado no presente processo.

LANÇAMENTO. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE.

O lançamento, sendo ato administrativo que afeta direitos ou interesses por excelência, não prescinde de motivo nem, por expressa previsão legal (art. da Lei 9.784/99), de motivação. Se o auto de infração não indica circunstâncias de fato que justificam a glosa da despesa, não pode o lançamento ser completado posteriormente, eis que teria nascido sem um dos seus elementos essenciais.

Não foram apresentadas razões adicionais pela Procuradoria da Fazenda Nacional. É o relatório.

Voto

Conselheira Thais De Laurentiis Galkowicz, Relatora.

Encontra-se sob julgamento recurso de ofício, o qual continua sendo passível de conhecimento, mesmo depois do advento da Portaria ME nº 2, de 18 de janeiro de 2023 majorou o limite de alçada para interposição de recurso de ofício, que deixou de ser o valor estabelecido na Portaria MF nº 63, de 2017 (R$ 2.5000.000,00 - dois e meio milhões de reais), para R$ 15.000.000,00 (quinze milhões mil reais). Nos termos da Súmula CARF nº 103, para fins de conhecimento de recurso de ofício, aplica-se o limite de alçada vigente na data de sua apreciação em segunda instância

Pois bem. Conforme se depreende do relato acima, a questão fulcral é saber sobre a procedência do auto de infração lavrado com base na acusação de a Contribuinte não ter comprovado, por meio de documentação hábil e idônea (registro contábil de instrumentos financeiros), a efetiva realização de despesas (com fundos de investimento que realizaram operações de cobertura hedge e de swaps para proteger os ativos e passivos), para fins de apuração do IRPJ e da CSLL.

A decisão ora objeto de recurso de ofício foi bastante cuidadosa a respeito dos fatos que permearam a fiscalização, durante a qual dois laudos foram produzidos pela Contribuinte, no sentido de demonstrar a procedência da contabilização de suas despesas. Também detalhista o julgamento a quo , precedido por pedido de diligência, com o fito de avaliar as razões apresentadas pela defesa, em contraposição aos motivos do auto de infração. E foi além: a decisão da DRJ, para fins de análise do presente caso, trouxe para conhecimento dos julgadores notícia de outros dois autos de infração lavrados contra a mesma contribuinte, a respeito de matéria de fato e de direito semelhante. A avaliação do quanto ocorrido nesses processos paralelos ratificou a conclusão sobre a falta de convicção da autoridade fiscal a

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Fl. 20 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

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respeito dos fatos analisados - semelhantes, porém referentes a períodos de apuração diversos -, além da displicência sobre a avaliação substancial da documentação contábil que os respaldam. Tudo isso no sentido de demonstrar os problemas congênitos do lançamento tributário ora sob análise, onde, alfim, não foi evidenciado pela fiscalização o porquê de não ter sido considerada hábil e idônea a documentação que respalda as despesas da recorrente com instrumentos financeiros para fins de apuração do Lucro Real e da base de cálculo da CSLL.

Nesse sentido, cumpre trazer a baila os fundamentos da decisão recorrida sobre a análise das provas e descrição dos fatos, in verbis:

A impugnante faz críticas ao trabalho da fiscalização alegando que se esforçou para a solucionar suas dúvidas tendo inclusive contratado um empresa especializada, a KPMG para elaborar um laudo com objetivo de "verificar por meio de Laudo Técnico de Natureza Contábil e Fiscal: (i) a existência e correção do tratamento contábil dado pela Impugnante aos resultados produzidos pelas operações financeiras em análise; (ii) a importância e necessidade de contratação de um sistema de risco para controle dessas operações, bem como (iii) para demonstrar como é possível se fazer a comprovação documental de operações dessa natureza".

Ao tempo da diligência, a KPMG foi novamente chamada "para explicar, demonstrar e comprovar, mediante o anexo Laudo Técnico de Natureza Contábil e Fiscal Complementar ao Laudo Técnico emitido em 15 de janeiro de 2017, os lançamentos contábeis solicitados".

A impugnante defende a contratação como um esforço no atendimento às intimações diante da complexidade do tema e reclama que a fiscalização desconsiderou esse trabalho desqualificando sem indicar quais seriam os defeitos do Laudo, dos documentos apresentados ou mesmo quaisquer outros motivos para tal desconsideração.

A seguir, transcrição das conclusões da fiscalização utilizada pela impugnante para ressaltar seu descontentamento com o trabalho da fiscalização:

"Contudo, a Intimada informa que para"atender a este ponto de forma organizada e satisfatória, a Impugnante contratou empresa especializada (KPMG) para explicar, demonstrar e comprovar, mediante o anexo Laudo Técnico de Natureza Contábil e Fiscal Complementar ao Laudo Técnico emitido, em 15 de janeiro de 2017, os lançamentos contábeis solicitados ("Laudo", Doc_comprobatorios0001.pdf e anexos Doc_comprobatorios0002.pdf a Doc_comprobatorios0042.pdf)".

O fato de a Contribuinte ter precisado contratar uma empresa prestadora de serviços, para explicar o que ela própria teria feito, demonstra que ela sozinha não consegue comprovar a efetiva realização das operações que alega ter efetuado.

O laudo de milhares de páginas e as dezenas de milhares de páginas de anexos elaboradas pela empresa contratada também são uma evidência de que é impossível comprovar a argumentação da Diligenciada.

O laudo contratado tentou demonstrar - sem sucesso - que os maiores lançamentos efetuados em cada uma das contas discriminadas nas intimações

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Fl. 21 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

que lhe foram formuladas decorrem de informações que foram registradas no sistema Risk Control. O documento também não consegue vincular lançamentos contábeis a documentos que seriam seus suportes.

A Diligenciada alega que investiu em três fundos de investimento. Porém, em vez de apenas contabilizar os aportes e resgates realizados nos fundos e a evolução de suas cotas, alega que contabilizou as operações que teriam sido feitas pelos administradores e gestores desses fundos, sem apresentar os documentos que teriam servido de suporte para tal forma equivocada e estranha de contabilização.(*** há nos autos documentos que trazem a evolução das cotas dos fundos e aportes e resgates, mas não há nenhuma informação por parte da fiscalização sobre a análise desta documentação. Relatório de Aportes e Resgates (Anexo 1.1.2.9) )

A tese de que o sistema Risk Control é capaz de produzir lançamentos contábeis - o que a Diligenciada e o laudo contratado não conseguem comprovar que ocorreu neste caso concreto -, não torna os lançamentos contábeis produzidos automaticamente válidos. Para serem válidos, os lançamentos contábeis devem estar lastreados em documentos hábeis e idôneos, documentos que, quando requisitados, devem ser apresentados à autoridade fiscal.

Nem a Diligenciada, tampouco a prestadora de serviços contratada conseguiram atender o pedido simples da intimação: apresentar os documentos que embasam os maiores lançamentos a crédito e os maiores lançamentos a débito contabilizados nas contas analisadas. É evidente que, se a própria Contribuinte não conseguiu atender aos pedidos que lhe foram feitos em fiscalização e diligência, uma empresa contratada por ela também não conseguiria.

(...)

Não há como vincular as operações praticadas pelos três fundos nos quais a Diligenciada alega que sua incorporada investiu aos lançamentos contábeis da empresa e a documentos. Todas as inúmeras requisições de documentos, demonstrativos, esclarecimentos e informações realizadas com esse intuito foram infrutíferas. Face à impossibilidade de realizar tal vinculação, a Diligenciada contratou uma prestadora de serviços, para tentar, também sem sucesso, fazer o trabalho que a Fiscalizada nunca conseguiu fazer.

O segundo laudo contratado também tenta demonstrar que o sistema Risk Control foi alimentado para que a incorporada da Diligenciada conseguisse reproduzir, em sua contabilidade as operações que teriam sido feitas pelos administradores e gestores dos três fundos em que teria investido. O documento não consegue comprovar sua tese e também não consegue vincular os lançamentos que a Auditada registrou em sua contabilidade a documentos relativos a operações que teriam sido praticadas pelos administradores e pelos gestores dos três fundos de investimento. (...)".(observações em negrito acrescentadas)

A impugnante rebate tais conclusões afirmando que "os lançamentos dizem respeito a componentes de marcação a valor de mercado de operações no mercado de renda variável, e a D. Fiscalização aparentemente esperava receber documentos tais quais notas fiscais de aquisição que amparam despesas com compras, o que mostra o completo desconhecimento da D. Fiscalização sobre o registro contábil

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Fl. 22 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

de instrumentos financeiros cujo valor de mercado varia dia a dia para mais e para menos".

A impugnante prossegue em sua reclamação ressaltando que a fiscalização não citou os pontos de discordância em relação à defesa e aos documentos comprobatórios apresentados.

Como se depreende da transcrição acima, apesar de afirmar que nem a Impugnante e nem a KPMG conseguem demonstrar os fundamentos dos lançamentos contábeis, fato é que a única característica dos Laudos que a Fiscalização consegue citar são as milhares de páginas de explicação e as dezenas de milhares de páginas de documentos em anexo.

OU SEJA, A FISCALIZAÇÃO NÃO FOI CAPAZ DE MENCIONAR NEM UM PONTO SEQUER DE CONTEÚDO DO LAUDO OU DOS DOCUMENTOS ANEXOS COM O QUAL NÃO CONCORDA. NEM MESMO FOI CAPAZ DE APONTAR QUAL O PROBLEMA DA METODOLOGIA UTILIZADA OU ENTÃO PORQUE ELA NÃO TERIA SIDO CAPAZ DE DEMONSTRAR A CORRELAÇÃO DOS DOCUMENTOS COM OS REGISTROS CONTÁBEIS. Enfim, apesar do trabalho empreendido pela Impugnante e pela KPMG, a Fiscalização não empregou esforço algum para compreender o conteúdo do laudo, a metodologia empregada e os resultados obtidos e nele constatados. Simplesmente os desconsiderou, sem indicar quais seriam os defeitos do Laudo, dos documentos apresentados ou mesmo quaisquer outros motivos para tal desconsideração .

Nesse contexto, I. Julgadores, os AIs já deveriam ser julgados cancelados pelos simples fatos de que (i) a acusação nos AIs se limita a suposta falta de comprovação das despesas glosadas e (ii) a Fiscalização não é capaz de indicar qualquer defeito, vício ou outro motivo para desconsiderar a demonstração de tais despesas entregue pela Impugnante e corroborada pela KPMG. Não há, portanto, qualquer fundamento pelo qual a acusação fiscal possa subsistir.

Ainda que somente por este motivo os AIs já devessem ser cancelados, a Impugnante passa a demonstrar, com o objetivo de responder os quesitos feitos por essa DRJ e que estes sim pertinentes para o deslinde da questão colocada nos Ais, como os documentos solicitados e efetivamente apresentados solucionam as questões formuladas na Resolução XXXXX-2 de fls. 21.120 a 21.143.

O objetivo dos três primeiros quesitos da diligência era esclarecer pontos relativos à análise da Autoridade Fiscal na questão de alta indagação deste processo. Afinal, as despesas glosadas fazem ou não parte da carteira dos fundos? Confira-se os quesitos e as respostas da Autoridade Fiscal a seguir:

1- Informar se a documentação apresentada pelos administradores dos fundos foi analisada e se elas são suficientes ou não para comprovar a existência dos instrumentos financeiros que compõem a carteira dos fundos.

Resposta: Os documentos apresentados pelos administradores dos fundos foram analisados e são suficientes para comprovar a existência das carteiras dos fundos e a existência dos instrumentos financeiros que compõem a carteira dos fundos. Porém, não há como vincular as carteiras dos fundos e os

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Fl. 23 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

instrumentos financeiros que compõem suas carteiras aos lançamentos contábeis escriturados pela AMBEV.

2- Analisar se a metodologia utilizada no Laudo Técnico é suficiente ou não para comprovar a existência dos instrumentos financeiros que compõem a carteira dos fundos.

Resposta: Como já dito na resposta ao quesito anterior, os documentos apresentados pelos administradores dos fundos são suficientes para comprovar a existência dos instrumentos financeiros que compõem as carteiras dos fundos. O Laudo Técnico comprado pela Diligenciada tenta demonstrar - sem sucesso - que o sistema Risk Control foi corretamente alimentado por funcionários da AMBEV, para que depois fossem gerados lançamentos em sua contabilidade, através do sistema SAP. O documento não consegue vincular as operações praticadas pelos fundos aos lançamentos contábeis da Fiscalizada nem a documentos que seriam seus suportes, os quais nunca foram apresentados.

3- Informar se as contas de despesas glosadas correspondem aos mesmos instrumentos financeiros utilizados pelos fundos conforme defende a impugnante em todas as suas respostas e na impugnação.

Resposta: A Diligenciada e a prestadora de serviços contratada não conseguiram demonstrar os vínculos que alegam existir entre contas da contabilidade da AMBEV e os instrumentos financeiros utilizados pelos fundos. Quando perguntei se a documentação apresentada pelos administradores dos fundos foi analisada e se elas seriam suficientes ou não para comprovar a existência dos instrumentos financeiros que compunham a carteira dos fundos (quesito 1), foi porque estranhei que o TVF apenas citava a resposta sobre hedge e não dispensava nem uma linha para os demais itens.

No processo, o arquivo não paginável relativo à diligência junto ao BTG contém 1.376 arquivos em 16 pastas com 112 mb de dados. Há pastas contendo memórias de cálculos de resgates, demonstrações financeiras dos fundos, planilhas com a composição da carteira dos fundos, livro razão e planilha com a valorização das quotas e do patrimônio dos fundos.

Não há uma linha objetiva no processo relativa às características intrínsecas desta vasta documentação.

O que há são juízos de valor subjetivo. Um laudo é ruim porque é grande ou porque foi elaborado por uma terceira pessoa quando deveria ser considerado ruim porque, por exemplo, cita fontes equivocadas.

1.2. Documentação hábil e idônea.

O fundamento do lançamento é a não comprovação por meio de documentação hábil e idônea de despesas financeiras registradas na contabilidade, mas em que consiste a documentação hábil e idônea?

A fiscalização não nos ajuda a compreender os termos.

Por idôneo, temos o que é honesto, íntegro, confiável. Se fosse um fundamento jurídico, seria aquele que se sustenta na lei e na

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Fl. 24 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

jurisprudência. Sendo um documento, seria aquele que se reveste das características formais legais ou costumeiras.

Nesse processo, foram apresentados contratos, notas de corretagem, extratos, razões, etc, documentos que, em princípio, podem ser considerados idôneos, pois foram emitidos em conformidade com as normas e os costumes.

Como exemplo, cito a Nota de Negociação - Swap, nº boleto XXXXX, nº operação XXXXX41000500016, referente ao contrato para realização de operações Swap entre o Citibank, o Jupiter Fundo de Investimento Financeiro e a Ambev, fls. 27542/27545. Essa nota está assinada, tem o período de vigência, está registrada na Cetip, tem o valor da operação, a periodicidade das parcelas de juros, dentre outras cláusulas.

Esse parece ser um documento idôneo, mas será hábil para fazer prova em favor da impugnante?

O que é um documento hábil?

O Conselho Federal de Contabilidade, no exercício de suas atribuições legais e regimentais e com fundamento no disposto na alínea f do art. do Decreto-Lei n.º 9.295/46, alterado pela Lei n.º 12.249/10, aprovou a Norma Brasileira de Contabilidade (NBC), ITG 2000 (R1), de 5 de dezembro de 2014, que traz a seguinte definição para documentação contábil hábil:

Documentação contábil é hábil quando revestida das características intrínsecas ou extrínsecas essenciais, definidas na legislação, na técnica- contábil ou aceitas pelos "usos e costumes".

Quando a fiscalização acusa a impugnante de não apresentar documentação hábil e idônea para comprovar as suas despesas diante de milhares de páginas de documentação, o que se espera é que a fiscalização aponte as falhas, os vícios, os defeitos da documentação apresentada.

No caso da Conta contábil #34055018# - "HD BOND 13 - JUROS" - 2011, fls. XXXXX/134072, a impugnante selecionou lançamentos e informou que se tratavam de contratos de Swap.

Listou dados dos contratos:

Relacionou-os com a carteira do Fundo Júpiter:

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Fl. 25 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Apresentou as notas de negociação.

O anexo 1.5018.5, fls. 27652/27660, contém uma Nota de Negociação entre o Banco Santander Banespa S.A. e o Fundo de Investimento Multimercado Jupiter, figurando a Companhia de Bebidas das Americas - Ambev como interveniente garantidor. Os valores, datas e taxas correspondem à operação referenciada no laudo. A seguir, recortes da nota. Observem que a impugnante realçou a data da contratação, início e vencimento da operação, além do valor base. Esses cuidados para facilitar a compreensão dos documentos apresentados foram bastante utilizados pelo contribuinte e permitem a rastreabilidade dos dados neles contidos. No quadro acima, percebe- se em vermelho um indicador do ponto de referência ao documento no laudo.

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Fl. 26 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária Processo nº 16561.720233/2016-82

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Fl. 27 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

1.3. 1º lançamento, ano-calendário 2009.

Para falar sobre a primeira autuação, anexo a seguir parte do relatório do acórdão DRJ XXXXX-61.787 - 1a Turma da DRJ/RPO, de 30 de junho de 2016.

Em ação fiscal levada a efeito no contribuinte COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV (doravante apenas AMBEV), sucedido por AMBEV S/A, foram glosadas despesas operacionais informadas na DIPJ/2010, relativa ao ano-calendário de 2009, mais precisamente na Ficha 06A, linhas 39 (Variações Cambiais Passivas), 40 (Perdas Incorridas em Mercados de Renda Variável, exceto Day-Trade) e 43 (Outras Despesas Financeiras). Em consequencia, foram lavrados os autos de infração de IRPJ (fls. 1458-1459) e de CSLL (fls. 1466- 1467).

Conforme descrito no "Termo de Verificação Fiscal" de fls. 1422-1455, no curso da ação fiscal foram auditadas as contas que correspondem aos valores informados na DIPJ/2010, relativa ao ano-calendário de 2009, mais precisamente na Ficha 06A, linhas 39 (Variações Cambiais Passivas), 40 (Perdas Incorridas em Mercados de Renda Variável, exceto Day-Trade) e 43 (Outras Despesas Financeiras). Como resultado da auditoria, concluiu a autoridade autuante que: a) os valores lançados nas contas relacionadas no Anexo 1 (fl. 1457); b) os valores contabilizados nas contas relacionadas no Anexo 2 (fls. 1456), além de não terem sido comprovados em documentação

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Fl. 28 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

hábil e idônea, referem-se a perdas incorridas em operações praticadas em mercados de renda variável e de swaps.

Relata a autoridade autuante que foram expedidas diversas intimações instando o contribuinte a prestar esclarecimentos, apresentar livros auxiliares, demonstrativos, memórias de cálculo e amostras de documentos necessários ao entendimento e á comprovação dos valores contabilizados nas contas de que tratam os Anexos 1 e 2. Nas respostas apresentadas, porém, não foram apresentados documentos hábeis e idôneos para comprovar a realização e a necessidade das despesas escrituradas nas referidas contas.

Especificamente quanto às perdas em operações de swap e em mercados de renda variável escrituradas nas contas do Anexo 2, o contribuinte, intimado a prestar esclarecimento acerca desses lançamentos contábeis, afirmou ser quotista do Fundo Multimercado Júpiter (doravante apenas Júpiter), fundo de investimento privado constituído na forma de condomínio aberto, constituído segundo as regras da Instrução Normativa CVM nº 409/2004. Segundo alega, o Júpiter tem como principais ativos investimentos em dólar futuro, non- deliverable forwards (NDFs), swaps , títulos públicos e CDBs, sendo esses derivativos contratados em observância à Política de Administração de Risco da empresa, razão pela qual possuem natureza de hedge , com finalidade de proteção das atividades da empresa em relação à variação de diversos fatores financeiros, entre os quais variações no câmbio e na taxa de juros.

Observa a autoridade autuante que, contrariamente ao alegado pelo contribuinte, o Regulamento do Júpiter prevê, em seu art. 5º, que ele "tem como objetivo propiciar a valorização de suas quotas mediante a aplicação dos recursos dos quotistas, feita pela ADMINISTRADORA, de forma alavancada ou não, em diversos mercados, tais como ouro, câmbio, títulos e valores mobiliários, juros, quotas de fundos de investimento, títulos públicos e derivativos". O objetivo previsto em regulamento do Júpiter conflita com a alegada estratégia de cobertura (hedge) da empresa, já que não há como propiciar a valorização das respectivas quotas e, simultaneamente, proteger posições decorrentes das atividades operacionais da quotista.

O contribuinte esclareceu, ademais, que, no ano de 2009, era quotista do Fundo de Investimento em Quotas de Fundos de Investimento Plutão Crédito Privado (doravante apenas Plutão), tendo este como único ativo quotas do Júpiter, de modo que a variação da quota daquele correspondia à variação da quota deste.

Os fundos Júpiter e Plutão foram constituídos, sob a administração do Banco BTG PACTUAL, exclusivamente para o contribuinte realizar operações de swap e em mercados de renda fixa e de renda variável, com o objetivo de, segundo alega, melhor organizar suas atividades financeiras.

Intimado a explicar a razão pela qual as operações financeiras não foram realizados diretamente por ele, o contribuinte afirmou que não possui conhecimento técnico e estrutura física (pessoas e sistemas) adequados para a administração direta de instrumentos financeiros, de modo que optou por valer-se de um fundo de investimento administrado por instituição financeira renomada e com expertise no ramo .

Quanto ao controle contábil dessas operações financeiras, afirmou o contribuinte que:

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Fl. 29 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Em relação às informações dos Fundos acima citados, a Intimada informa que recebia, por e-mail, diariamente do BANCO BTG Pactual a variação dos instrumentos financeiros que compuseram o patrimônio do Fundo .

Nessas informações havia a abertura analítica da carteira do Fundo, com a marcação a mercado de cada um dos instrumentos financeiros (swap, futuros, títulos públicos, etc.) de modo que o somatório da variação individual de cada um desses instrumentos financeiros compusesse a variação da cota do Fundo naquele dia .

As operações contratadas pelos Fundos também eram mensuradas diariamente pela Intimada, de acordo com os fechamentos das taxas de câmbio, juros, entre outros índices/fatores financeiras que impactam suas atividades.

Tal mensuração era feita por sistemas informatizados da Intimada, conectados aos principais órgãos divulgadores das taxas acima citadas (ex: SELIC - Sistema Especial de Liquidação e de Custódia; CETIP - Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos, sistema Bloomberg entre outros).

Tais sistemas são conectados ao sistema contábil da Intimada, sendo assim a contabilização das operações era feita de maneira automática (por interface). Nesse contexto, a Intimada utilizava as informações enviadas pelo BANCO BTG Pactual para confronto com os valores por ela calculados.

A autoridade autuante intimou o contribuinte a demonstrar como foram feitas as operações de hedge ou de swap , por meio do Júpiter, a fim de proteger ativos e passivos. Para tanto, o contribuinte foi instado a apresentar a documentação referente ao planejamento e aos testes de efetividade relativos às proteções feitas, a comprovar que os riscos foram avaliados e documentados (incluindo instrumento de proteção, transação protegida, natureza do risco protegido etc.) e a demonstrar a correta proporcionalidade dos valores dos ativos e passivos protegidos, bem como as quantidades de contratos de derivativos comprados ou vendidos.

Concluiu a autoridade autuante que o contribuinte, na resposta apresentada, não conseguiu demonstrar que as operações praticadas mediante o Júpiter caracterizam-se como hedge.

Intimado a esclarecer se o Júpiter e o Plutão foram utilizados pela AMBEV para realizar operações de hedge e de swap , com a finalidade de proteção de seus ativos e passivos, o Banco BTG PACTUAL informou que não possuía elementos para responder a essa indagação, pois, na condição de administrador e controlador dos referidos fundos, tinha como responsabilidade assegurar que as operações estivessem em conformidade com as políticas de investimento constantes dos regulamentos vigentes e com as normas regulatórias, bem como acompanhar as implicações das operações para os fundos, não tendo competência sobre motivações externas.

A resposta apresentada pelo Banco BTG PACTUAL infirma a alegação da AMBEV de que o Júpiter teria sido utilizado para realização de operações de hedge. A instituição financeira apresentou, ainda, os contratos que deram causa aos lançamentos de todas as despesas/prejuízos incorridos pelos fundos no ano de 2009 . Trata-se de contratos de swap nos quais, com exceção de um, a AMBEV figura como coobrigada. Esse fato levou a autoridade autuante a inferir que o fundo não atua de maneira autônoma, sendo uma simples extensão de sua investidora exclusiva.

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Fl. 30 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Também a gestora do Júpiter, UBS CORRETORA, foi intimada a esclarecer se ele foi utilizado para realizar operações de hedge a fim de proteger ativos e passivos da AMBEV. Em resposta, a gestora asseverou que não tinha condição de tecer considerações acerca do propósito das operações realizadas pelo fundo, pois atuou apenas como corretora e mera executora das ordens por ele dadas, não tendo qualquer ingerência sobre as decisões de investimento do Júpiter. Essa resposta, observa a autoridade autuante, também contradiz a afirmação da AMBEV sobre as operações realizadas pelo Júpiter.

Diante dos fatos apurados, concluiu a autoridade autuante que o contribuinte não comprovou, por meio de documentação hábil e idônea, a efetiva realização das despesas escrituradas nas contas dos Anexos 1 e 2, razão pela qual devem elas ser glosadas. As mesmas infrações que deram ensejo à lavratura do auto de infração de IRPJ ensejam a lavratura do auto de infração reflexo de CSLL.

Especificamente no tocante às perdas incorridas em operações de swap e em mercados de renda variável, a autoridade autuante afirma, ainda, que, consoante as regras previstas na "Seção III - Das Disposições Comuns à Tributação das Operações Financeiras" da Lei nº 8.981/1995, essas perdas somente são dedutíveis, na apuração do lucro real, até o limite dos ganhos auferidos em operações da mesma natureza realizadas no mesmo período ou, se houver excesso em relação a este, até o limite de ganhos auferidos em períodos de apuração futuro s.

Por essa razão, deveria o contribuinte ter adicionado, na apuração do lucro real, as perdas que excederam os ganhos auferidos nas operações de renda variável realizadas por meio dos fundos Plutão e Júpiter. Acrescenta que a realização dessas operações pela AMBEV por meio de fundos de investimento exclusivamente seus em nada muda o respectivo tratamento tributário, de modo que as perdas incorridas em 2009, em montante superior aos ganhos em operações da mesma natureza, devem ser glosadas .

Sobre os créditos tributários de IRPJ e de CSLL apurados e lançados com base nesta infração específica, foi aplicada multa qualificada (150%), por envolver um intrincado mecanismo desenvolvido pelo contribuinte, em conluio com o Banco BTG PACTUAL, para tentar disfarçar perdas indedutíveis em dedutíveis , de modo a reduzir indevidamente o lucro real e a base de cálculo da CSLL, caracterizando sonegação e conluio, tal como definidos nos arts. 71 e 73 da Lei nº 4.502/64.(negritos acrescentados) Como se pode observar, a discussão sobre as operações financeiras e os fundos teve início no processo 16561.720159/2014-32, em 27/03/2014, (termo de início juntado aos autos mediante o "Termo de Anexação de Arquivo Não- Paginável", fl. 1155 do citado processo).

Sobre essas operações, assim se manifestou a fiscalização no TVF:

As perdas incorridas em operações praticadas em mercados de renda variável e de swaps, que excederam os ganhos no mesmo tipo de operação no período, conforme discriminado no Anexo 2, foram glosadas e penalisadas com multa de 150%.

...

Em resposta expedida em 11 de novembro de 2014, o Banco apresentou os contratos que embasam os lançamentos de todas as despesas/prejuízos auferidos pelos Fundos no ano 2009 , em valor igual ou superior a R$ 100

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Fl. 31 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

milhões (Doc. nº 04). Todos os documentos apresentados são contratos de swaps . A AMBEV assina todos eles, com exceção de um, como coobrigada nas obrigações neles dispostas . Isso demonstra que o fundo não é autônomo. Ou seja, ele é uma simples extensão de sua investidora exclusiva - a AMBEV .

A acima reproduzida "SEÇÃO III - Das Disposições Comuns à Tributação das Operações Financeiras" da Lei nº 8.981/95 é bastante clara ao estabelecer que perdas em operações realizadas em mercados de renda variável e swaps só são dedutíveis, na apuração do lucro real, até o limite dos ganhos auferidos em operações da mesma espécie realizadas no mesmo período ou, se houver excesso em relação a estes, até o limite de ganhos auferidos em períodos de apuração futuros .

Já as glosas relativas aos saldos líquidos de perdas mostrados no Anexo 2 foram punidas com a multa qualificada de 150% , por, além de tudo o que ¡á foi exposto neste TVF, envolver um intrincado mecanismo desenvolvido pela Contribuinte, em conluio com o Banco BTG PACTUAL, para tentar disfarçar perdas indedutíveis em dedutíveis e, assim, reduzir indevidamente seu lucro real e sua base de cálculo da CSLL. Essa conduta configura Sonegação e Conluio.(negritos acrescentados)

Da manifestação, pode-se concluir que a fiscalização considerou as operações reais, pois a glosa foi realizada com base no excesso das perdas sobre os ganhos, e identificou-as como operações realizadas por meio do Fundo Júpiter em um planejamento tributário ilícito, razão pela qual a multa foi qualificada.

A seguir, relação de contas glosadas nesse processo (ano-calendário 2009) que também foram glosadas no processo atual (anos-calendário 2011 a 2013).

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Fl. 32 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Entretanto, no processo atual, a fiscalização afirma que analisou a documentação apresentada pelos administradores dos fundos e que não é possível vincular os lançamentos contábeis glosados com a carteira do fundo, sem contudo dizer porque não é possível estabelecer esse vínculo.

O processo que deu início a esta sequência de autos de infração foi julgado no Carf. Confira-se o resultado e a ementa a seguir:

Acórdão nº 1401002.027 - 4a Câmara / 1a Turma Ordinária, Sessão de 15 de agosto de 2017

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA IRPJ

Ano-calendário: 2009

LANÇAMENTO. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. O lançamento, sendo ato administrativo que afeta direitos ou interesses por excelência, não prescinde de motivo nem, por expressa previsão legal (art. 50 da Lei 9.784/99), de motivação. Se o auto de infração não indica circunstâncias de fato que justificam a glosa da despesa, não pode o lançamento ser completado posteriormente, eis que teria nascido sem um dos seus elementos essenciais.

PERDAS EM OPERAÇÕES DE RENDA VARIÁVEL. GLOSA DE DESPESAS. DESCONSIDERAÇÃO DE OPERAÇÕES EFETUADAS POR FUNDO DE INVESTIMENTO EXCLUSIVO.

Autuação baseada em dispositivo legal que determina a indedutibilidade do excesso de perdas em relação aos ganhos nas operações de renda variável, sob a premissa de que as aplicações financeiras teriam sido realizadas diretamente pela empresa e não pelo fundo: constatado que o fundo não pode ser desconsiderado e que as operações foram realizadas por este, o auto de infração carece de fundamento tanto fático quanto legal.

Recurso Voluntário Provido

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

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Fl. 33 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso voluntário.

Como se pode observar, o Carf anulou o processo em relação às contas fora do fundo por ausência de motivação e não aceitou a desconsideração do fundo o que levou a não aceitar o lançamento com bases calculadas como se as operações fossem realizadas diretamente pela autuada.

No voto, a relatora justifica a anulação explicando que não houve por parte da fiscalização a demonstração dos defeitos da documentação, logo não houve a motivação necessária para fundamentar o lançamento e permitir a defesa do contribuinte. Confira-se a seguir:

a fiscalização não intimou a contribuinte a apresentar esclarecimentos nem fez qualquer questionamento específico relacionado a tais despesas em nenhum dos 13 termos de intimação enviados ao longo de mais de um ano . Pelo contrário, comportou-se como se estivesse satisfeita com as informações e documentos enviados pela contribuinte, ate esta ser surpreendida com a lavratura do auto de infração.

Também no TVF a autoridade autuante não dispensa uma linha para indicar, ao menos exemplificativamente, por que os documentos apresentados no curso da fiscalização não foram considerados hábeis e idôneos para comprovar as despesas contabilizadas pela Recorrente .

Seriam tais documentos relativos a outras despesas que não as que se pretendiam comprovar? Seriam os valores divergentes? Seriam tais documentos insuficientes, dependentes de documentos adicionais? Não sabemos o motivo, mas apenas a conclusão, isto é, que tais documentos não foram considerados hábeis e idôneos.

Ora, o lançamento fiscal não deixa de ser um ato administrativo, o qual tem como um de seus elementos o motivo. Assim dispõe o artigo 50 da Lei 9.784/1999

(grifamos):

[...]

Do caput desse dispositivo legal depreende-se que o motivo compreende as situações de direito e de fato que levam à prática do ato administrativo no caso, a situação de direito seria a norma que embasa o ato administrativo, enquanto o pressuposto de fato representa as circunstâncias, situações ou acontecimentos que levam a Administração a praticar o ato.

O parágrafo primeiro esclarece a exigência de que o motivo seja explicitado na chamada motivação e, com base nisso, a doutrina chega a falar em um princípiomotivação ou da fundamentação. Neste sentido: "o princípio da motivação exige que aAdministração Pública indique os fundamentos de fato e de direito de suas decisões. Ele está consagrado pela doutrina e pela jurisprudência, não havendo mais espaço para as velhas doutrinas que discutiam se a sua obrigatoriedade alcançava só os atos vinculados ou só os atos discricionários, ou se estava presente em ambas categorias. A sua obrigatoriedade se justifica em qualquer tipo de ato, porque trata de formalidade necessária para permitir o controle de legalidade dos atos administrativos."(Di Pietro, Maria Sylvia Zanella."Direito Administrativo", 19 ed., Atlas: 2005, p. 97).

Original

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 34 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Em resumo, o lançamento, sendo ato administrativo que afeta direitos ou interesses por excelência, não prescinde de motivo nem, por expressa previsão legal, de motivação. Se o auto de infração não indica circunstâncias de fato que justificam a glosa da despesa, não pode o lançamento ser completado posteriormente, eis que teria nascido sem um dos seus elementos essenciais . (negritos acrescentados)

Sobre o fundo, a relatora não aceita a sua desconsideração, logo não aceita a tributação sobre a operação como se realizada diretamente pela autuada:

O auto de infração não se baseou no dispositivo legal que determina a indedutibilidade das perdas em operações de swap sem comprovação de hedge, mas no dispositivo legal que determina a indedutibilidade do excesso de perdas em relação aos ganhos nas operações de renda variável, sob a premissa de que as aplicações financeiras teriam sido realizadas diretamente pela empresa e não pelo fundo Jupiter.

A situação que levou à declaração de nulidade do lançamento no Carf, repete-se neste processo.

A falta de detalhamento do lançamento prejudica tanto a defesa quanto o julgamento.

A despeito de os lançamentos terem decorridos de uma única ação de fiscalização contemplando períodos subsequentes e da coincidência de operações glosadas, a conclusão divergente indica uma falta de convicção da autoridade autuante.

Como no presente processo não houve a desconsideração do fundo, o que foi desconsiderado foi toda a documentação relativa aos fundos. Apesar da afirmação da autoridade autuante de que analisou a documentação, não há nos autos nenhuma menção objetiva que possa confirmar tal afirmação.

A conclusão que chego é que não houve a afirmada análise da documentação dos fundos. Tampouco as contas de receita foram analisadas. Daí, talvez, a mudança de posicionamento e a opção pela glosa geral de todas as contas de despesa ao contrário do primeiro lançamento no qual foram glosados apenas o excesso das perdas sobre os ganhos.

Passo agora a fazer algumas considerações sobre o processo 16561.720180/2015-19, ano-calendário 2010 , o segundo desta sequência. Este processo encontra-se nesta data em diligência. É a segunda diligência, pois a primeira mostrou-se insuficiente para elucidar as dúvidas da relatora.

Na primeira diligência foram estabelecidos os seguintes quesitos:

Feitas essas considerações, fica patente a necessidade de diligências, para que o Fisco, nessa parte da autuação, reveja o seu trabalho como um todo, notadamente para :

1) No TVF, a Fiscalização, ao mencionar que foram auditadas as contas que contém os valores lançados na Ficha 06A, salienta que os valores

Original

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 35 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

contabilizados nas contas contábeis que integram o Anexo 1, não estariam lastreados em documentos hábeis (cita a nota 6).

Contudo, a glosa não se deu pela totalidade dos valores indicados no aludido Anexo 1, mas pelo saldo demonstrado neste Anexo, separado em "perda líquida das operações de swap", de R$239.459.893,68, e "perda líquida das operações com derivativos de moeda", de R$87.490.864,09, ao argumento de que tais valores referem-se a perdas incorridas em operações praticadas em mercado de renda variável, que só são dedutíveis até o limite dos ganhos auferidos em operações de mesma espécie.

Portanto, o Fisco necessita justificar o por quê se valeu do fundamento de que tais operações não estariam lastreadas em documentos hábeis, tendo em vista que a simples menção à "nota 6" não é suficiente para explicar tal fundamento.

2) No que toca às operações destacadas no Anexo 1, que seriam operações no mercado de renda variável, operacionalizadas por meio do Fundo JUPÍTER, é preciso que se esclareça se elas realmente compõe e em qual medida o montante informado pelo contribuinte na DIPJ entregue em 12.01.2015 (objeto da presente autuação), Ficha 06A, Linhas "20" e "42".

Após executados os procedimentos e as auditorias que se fizerem necessários, o Fisco deve elaborar demonstrativos de todas as operações no mercado de renda variável operacionalizadas pelo contribuinte, no ano de 2010, com base nas informações prestadas na referida Ficha 06A, esclarecendo, com os devidos fundamentos e justificativas, se aquelas indicadas no aludido Anexo 1, fazem ou não parte do todo que compõe as informações da Ficha 06A, Linhas "20" e "42".

3) De outro lado, em sendo afirmativa, ainda que em parte, a resposta a tal indagação, no sentido que as operações segregadas no referido Anexo 1 compõe o montante total informado na DIPJ, Ficha 06A, é necessário que se verifique se há ganhos em operações da mesma espécie, "operações swap" e "derivativos de moeda" (como discriminado em tal Anexo), que justificariam e em qual medida a compensação das correspondente perdas glosadas na presente autuação.

4) Por fim, diante da acusação fiscal de que as operações do Anexo 1 não seriam de cobertura (hedge), dos argumentos trazidos pela defesa e das respostas dadas no curso do procedimento fiscal, em sentido contrário de que as operações discriminadas no Anexo 1, seriam de cobertura (hedge), faz-se necessário que a Fiscalização aprofunde a investigação, analisando os correspondentes contratos, no intuito de confirmar ou não a sua conclusão de que não se tratam de operações de cobertura (hedge).

No primeiro quesito, o relator perguntou porque não se glosou a totalidade dos valores indicados.

Quis aqui o julgador esclarecer uma incoerência do lançamento. Se as contas contábeis não estavam lastreadas em documentos hábeis e idôneos, a glosa deveria ser total e não parcial.

Não há como afirmar, mas também é possível que tal questionamento tenha contribuído para a fiscalização alterar seus procedimentos e optar pela glosa total das contas no presente processo, não apurando excesso de perdas sobre ganhos. Isso porque no processo atual a fiscalização

Original

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 36 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

também considerou que as contas não estavam lastreadas em documentação hábil e idônea.

O que é possível afirmar é que não há convicção da autoridade lançadora quanto aos fundamentos da autuação.

Também nessa diligência, o relator solicitou que a fiscalização elaborasse demonstrativos de todas as operações no mercado de renda variável operacionalizadas pelo contribuinte, no ano de 2010, com base nas informações prestadas na referida Ficha 06A, esclarecendo, com os devidos fundamentos e justificativas, se aquelas indicadas no aludido Anexo 1 (operacionalizadas por meio do Fundo JUPÍTER), faziam ou não parte do todo que compunha as informações da Ficha 06A, Linhas "20" e "42".

Isso porque, mais uma vez, a fiscalização não conseguiu comprovar objetivamente por meio de demonstrativos a coincidência ou não dos valores contabilizados nas contas e nas operações do fundo.

Esse processo retornou de diligência, mas a relatora determinou nova diligência nos seguintes termos:

Tendo em vista as inconsistências entre os documentos apresentados pelo sujeito passivo, mencionadas nos itens anteriores, e também as possíveis inconsistências na apuração do resultado pela Autoridade Fiscal, bem como a necessidade de análise da consistência dos documentos apresentados pelo sujeito passivo, após os esclarecimentos às questões apresentadas nos itens anteriores, deve ser respondido os seguintes quesitos:

i) identificar todas as contas patrimoniais relacionadas ao investimento no fundo Júpiter (número, descrição, saldo inicial, total de lançamentos a débito e a crédito e saldo final). Fazer a consolidação anual;

ii) identificar todas as contas de resultado relacionadas ao investimento no fundo Júpiter (número, descrição, saldo inicial, total de lançamentos a débito e a crédito e saldo final) Fazer a consolidação anual;

iii) identificar a (s) conta (s) de patrimônio líquido que registraram lançamento relacionadas ao investimento no fundo Júpiter (número, descrição, saldo inicial, total de lançamentos a débito e a crédito e saldo final). Fazer a consolidação anual;

iv) identificar as contas que alimentaram as linhas 20 e 42 da ficha 6A da DIPJ, bem como aquelas que registraram resultado do fundo pelo hedge accounting (número, descrição, saldo inicial, total de lançamentos a débito e a crédito e saldo final).

Fazer a consolidação anual;

v) entre as contas identificadas nos itens anteriores, apartar as contas relacionadas a operações de day-trade, de operações realizadas em mercado distinto do de renda variável e as operações de hedge;

vi) consolidar os resultados diários dos ganhos e perdas no mercado de renda variável, aportes e resgates das operações financeiras a partir dos extratos apresentados pelo administrador do fundo ou extrair os referidos dados do Informe de Rendimento Financeiro;

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DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 37 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

vii) identificar os lançamentos contábeis realizados nas referidas contas e validar a consistência dos resultados;

viii) analisar os lançamentos contábeis relacionados ao hedge accouting e validar a consistência do resultado.

Ou seja, a diligência não foi suficiente para resolver as muitas pontas soltas do lançamento. Por isso a opção por nova diligência. No caso presente, tampouco a diligência foi suficiente para sanar as dúvidas existentes. Todos os quesitos foram respondidos de maneira econômica e sem o acompanhamento de relatórios ou demonstrativos.

Entretanto, entendo que não é o caso de nova diligência para que, nos termos da 1a diligência do 2º lançamento, a fiscalização "reveja como um todo o seu trabalho".

A diligência presta-se ao esclarecimento de dúvidas e omissões. Não se presta à revisão do trabalho de fiscalização.

Da leitura, fica claro que a Autoridade Fiscal se amesquinhou na sua função de motivar a desconsideração da documentação apresentada pela contribuinte para respaldar suas despesas com perdas advindas da utilização de instrumentos financeiros. Afinal, diante de todo o contexto descrito acima, de fato a conclusão que se chega é que apesar da afirmação da autoridade autuante no sentido de ter analisado a documentação, não há nos autos nenhum dado objetivo que possa confirmar tal afirmação. Assim, fazendo coro com a decisão recorrida, a conclusão que chego é que não houve a afirmada análise da documentação dos fundos. Tampouco as contas de receita foram analisadas. Afinal, a pergunta segue aberta: por que não são hábeis e idôneos os registros contábeis da Recorrente, feito com base nos contratos, notas de negociação, descrição dos fundos, dos sistemas utilizados (Risk Control)? Não se sabe.

Pois bem. Vejamos as consequências dessa situação, para fins de validade do ato administrativo de lançamento tributário.

Como ensina Odete Medauar, 1 "no âmbito do direito administrativo, motivo significa as circunstâncias de fato e os elementos de direito que provocam e precedem a edição do ato administrativo. Por exemplo: o ato administrativo punitivo tem como motivo uma conduta do servidor (circunstância de fato) que a lei qualificou como infração funcional (elemento de direito)."

No que tange à motivação, a doutrina costuma conceituá-la como a explicação ou expressão dos motivos do ato administrativo.

Nesse sentido, a ideia de motivação relaciona-se a um discurso, um conjunto de signos linguísticos com a finalidade de justificar racionalmente o ato motivado. É assim que Araújo Cintra define a utilização o instituto: "através da motivação o agente público procura argumentar no sentido de convencer seja o particular interessado, seja a coletividade, de que aquele determinado ato administrativo tem sua razão de ser, tanto no plano da legalidade como no da oportunidade e conveniência." 2 Ou seja, é a exposição do raciocínio que conduz ao ato, fundando-se sobre elementos de fato e de direito, gerando as consequências ali expostas.

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 38 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

Munido desses conceitos, o renomado jurista bem coloca que são três as modalidades de vício relacionados ao motivo que podem acometer ato administrativo: i) a inexistência de norma jurídica que lastreie a sua prática; ii) a inexistência de fato que ensejaria a sua emanação; e iii) inadequação entre motivos de fato e de direito, "o que ocorre quando os fatos verificados não se subsumem na hipótese normativa." Paralelamente, haverá vício quanto à motivação do ato administrativo são não só na ausência de motivação, mas também na sua insuficiência, ininteligibilidade ou incongruência, "quando tais defeitos venham a impedir que a motivação represente uma verdadeira e efetiva justificação do ato". 3

No presente caso, portanto, é evidente o vício na motivação do lançamento, já que a autoridade lançadora não foi capaz justificar racionalmente o discurso adotado para a sua atuação administrativa. Com efeito, é clara a insuficiência das razões adotadas pela autoridade fiscal para justificar a glosa das despesas da Contribuinte e, por conseguinte, para efetuar a cobrança tributária de IRPJ e CSLL.

Havendo o citado vício material no lançamento tributário, ato administrativo plenamente vinculado, este Colegiado deve reconhecer sua invalidade. 4

Isto porque a legislação brasileira relacionou o lançamento tributário entre aqueles atos administrativos que obrigatoriamente devem ser motivados (artigo 142 do CTN; artigo 10, inciso III e IV do Decreto 70.235/72 e artigos 2º, caput, incisos VII e VIII e 50, inciso I da Lei n. 9.784/99). Por conseguinte, à sanção jurídica para o vício relacionado ao motivo e/ou a motivação é a sua nulidade, como já determinou este Conselho em outras oportunidades (Acórdão XXXXX-005.541), 5 inclusive em caso análogo ao presente, da mesma contribuinte (1401- 002.027). 6

Afinal, tal vício fere a essência do ato administrativo, culminando na impossibilidade de seu efetivo controle, seja interno (pelo órgão expedidor, vale dizer, a Receita Federal), seja externo (por outro órgão com competência para análise de seus requisitos legais, como o Poder Judiciário). Isto porque, sendo impossível compreender as reais razões que motivaram a exação do ato administrativo, fica o administrado cerceado do seu direito à ampla defesa e ao contraditório. Em outras palavras: como guerrear algo infundado?

Por isso que o Decreto 70.235/72, em seu art. 59, inciso II, tratou de expressamente de determinar a sanção de nulidade aos atos exarados com preterição do direito de defesa.

Ademais, o art. 142 do Código Tributário Nacional é categórico quando impõe à autoridade lançadora a obrigação de verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação

3 Motivo e motivação do ato administrativo, São Paulo: RT - Revista dos Tribunais, 1979, pp. 150 e 151.

4 LAURENTIIS, Thais De. Mudança de critério jurídico pela Administração Tributária: regime de controle e

garantia do contribuinte. São Paulo: IBDT, 2022.

5 NULIDADE. LANÇAMENTO DE OFÍCIO. DESQUALIFICAÇÃO DE CERTIFICADOS DE ORIGEM DA

MERCADORIA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO.

A utilização, como fundamento do auto de infração, de ato declaratório executivo expedido ao cabo do processo de investigação de origem no qual a Administração Tributária não especifica os fatos e as razões que conduziram à desqualificação dos certificados de origem eiva o auto de infração de nulidade insanável, rendendo ensejo à decretação de sua nulidade por cerceamento do direito de defesa.

6 Ementa. "LANÇAMENTO. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE.

O lançamento, sendo ato administrativo que afeta direitos ou interesses por excelência, não prescinde de motivo nem, por expressa previsão legal (art. 50 da Lei 9.784/99), de motivação. Se o auto de infração não indica circunstâncias de fato que justificam a glosa da despesa, não pode o lançamento ser completado posteriormente, eis que teria nascido sem um dos seus elementos essenciais. (...)"

Original

DF CARF MF Fl. XXXXX

Fl. 39 do Acórdão n.º 1201-005.828 - 1a Sejul/2a Câmara/1a Turma Ordinária

Processo nº 16561.720233/2016-82

correspondente, determinar a matéria tributável. No presente caso, a determinação da matéria tributável, desconsiderando as provas apresentadas pelo contribuinte, não aconteceu efetivamente.

Diante dessas considerações, entendo que dever ser mantida a decisão a quo, que bem concluiu sobre a nulidade do lançamento tributário em julgamento, por vício material.

Dispositivo

Dessa forma, voto por negar provimento ao recurso de ofício.

(documento assinado digitalmente)

Thais De Laurentiis Galkowicz

Original

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/carf/1829894793/inteiro-teor-1829894794

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