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1 de Junho de 2024

A demissão arbitrária ou abusiva e o risco da indenização

O poder de demitir do empregador em face de sua responsabilidade social

Publicado por André Carpe Neves
há 9 anos

É importante destacar, de início, que há previsão constitucional para as hipóteses de despedida arbitrária. A CF/88 coloca no mesmo patamar a despedida “arbitrária ou sem justa causa”. Não é o nosso ponto de vista, nem o objeto do presente artigo. A despedida sem justa causa, a nosso ver, não é arbitrária. Os nossos melhores dicionários traduzem “arbitrariedade” como o ato por mero capricho, uma ação em que há abuso de autoridade, violência.

A nosso ver, a demissão sem justa causa é aquela, simplesmente, que é levada a termo sem se utilizar de nenhuma das hipóteses de justa causa elencadas no artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho, as quais constituem situações gravíssimas, que, regra geral, tornam impossível a boa continuidade das relações humanas no trabalho, ocasionando uma inafastável necessidade da rescisão do contrato laboral.

Entendemos, portanto, que a demissão pode ser simplesmente injustificada ou, em hipótese diversa, ser injustificada E arbitrária. O inciso I do art. da Constituição Federal de 1988 estabelece que a relação de emprego é protegida contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, proteção esta a ser regulamentada por lei complementar, com previsão de indenização compensatória dentre outros direitos:

CF/88 - Art. 7.º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;

Segundo o dispositivo constitucional, a dispensa arbitrária é também denominada imotivada ou sem justa causa. Como destacamos acima, em nosso entendimento o termo “arbitrária” traduz uma despedida mais grave, que extrapola o livre agir do administrador/empregador e avança pelo campo da ilegalidade, tanto que, em diversas situações, pode ser anulada pelo Judiciário e/ou ser compensada mediante grave indenização.

A despedida sem justa causa se trata, por um lado, de prerrogativa do empregador, desde que pague a indenização decorrente de seu ato. A “indenização compensatória” de que trata a CF/88 é, simplesmente, na maioria dos entendimentos, aquela multa complementar do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço equivalente a 40% do saldo existente na conta vinculada do empregado.

Portanto, uma vez que não há, ainda, Lei Complementar que regule o supracitado art. , I, da CF/88, é aplicável, no que concerne à indenização compensatória, o artigo 18, parágrafo 1º, da Lei 8.036/90:

"Art. 18. (...)

§ 1º. Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, depositará este, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, importância igual a quarenta por cento do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros.”

No entanto, a despedida individual sem justa causa poderá também ser revestida de outra faceta, aquela por abuso de direito, tal qual prevista pelo artigo 187 do Código Civil, isto é, quando a despedida violar a boa-fé objetiva. Os artigos 422 e 472 do Código Civil determinam que compete à parte (na esfera trabalhista, o empregador) guardar a boa-fé objetiva, tanto na conclusão, na execução e na sua extinção (“rescisão”, na esfera trabalhista).

Então, ocorrendo a despedida abusiva, além da indenização compensatória prevista pela despedida sem justa causa, o empregador poderá ser condenado a arcar com outra indenização a ser arbitrada em função do abuso de direito cometido. Esta indenização é o objeto deste artigo: a indenização pela despedida abusiva e, portanto, ilegal.

Recentemente, houve decisao do TRT do Paraná que determinou ao Banco Santander a reintegração de um ex-empregado, além do pagamento de indenização de 500 mil reais por danos morais, em razão de demissão considerada abusiva, por ter sido discriminatória. (http://www.trt9.jus.br/internet_base/noticia_crudman.do?evento=Editar&chPlc=4521731)

Neste caso específico, a condenação se deu por conta de uma demissão individual. Há situações, porém, em que há demissões de um grupo de trabalhadores, portanto, consideradas demissões coletivas, em que a cautela do empregador deve ser ainda maior. A assistência jurídica, nestes casos, é indispensável, para evitar ou ao menos minimizar as consequências futuras (leia-se o ajuizamento de ações trabalhistas com pedido de indenização).

Esses deveres de cautela do empregador, na despedida coletiva, compreendem o dever de informação ao conjunto dos trabalhadores e seus representantes (eleitos na empresa ou, na sua falta, sindicais) da causa objetiva da empresa, de ordem econômico-conjuntural ou técnico-estrutural, a justificar a despedida coletiva, bem como o dever da tentativa da negociação coletiva para tentar a substituição da extinção dos múltiplos contratos por outras soluções, como a suspensão dos contratos de trabalho, com a participação dos trabalhadores em programa ou curso de qualificação ou re-qualificação profissional.

Nestes casos, a cautela do empresário pode ser recompensada com recebimento de uma ajuda compensatória mensal de recursos do FAT, nos termos dos arts. 476-A e seguintes da CLT. Há, também, as possibilidades das férias coletivas, do trabalho a tempo parcial, da redução da jornada e do salário, sendo esta a última hipótese possível (art. , inciso VI, CF/88).

Portanto, as despedidas coletivas e individuais só serão admitidas se justificadas. Neste sentido, surge a questão: o direito fundamental social da proteção da relação de emprego contra a despedida arbitrária ou sem justa causa extinguiu o direito potestativo do empregador de despedir?

Entendemos que sim, infelizmente, até. O infortúnio surge ao contrapor ao princípio do livre mercado e da livre iniciativa econômica. São princípios fundamentais que devem ser balanceados caso a caso e que sofrerão tendência patronal ou laboral, conforme as circunstâncias do caso concreto em estudo.

Em uma sociedade ainda carente de solidez nas garantias sociais, o princípio constitucional da proteção da relação de emprego contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, como direito fundamental dos trabalhadores, tem força normativa irradiante. Sua dimensão objetiva vem impregnada do Direito Civil e dos valores constitucionais, que, por meio das cláusulas gerais da boa-fé objetiva e da função social do contrato, respectivamente, acaba por cobrir de abusividade tanto as despedidas coletivas quanto as individuais que, em situações especiais como acima ressalvadas, quando não precedidas dos deveres anexos da boa-fé objetiva, representarão ofensa aos direitos básicos dos trabalhadores da manutenção de seu emprego.

A despedida arbitrária, no sentido de abusiva, pode ocorrer:

- Nos casos de manifestação de doença grave, sobremaneira quando impede a continuidade do trabalho na forma como originariamente contratado, obrigando a empresa a readequar a função e as atividades do empregado;

- Nos casos de gravidez sequencial (a cada dois anos);

- Nos casos de idade avançada e/ou alto salário;

- Nos casos de empregado com atuação ativa na defesa dos direitos individuais ou coletivos (associação a partidos políticos, ONG’s, ou apenas formação de opinião dentro da empresa);

- Nos casos de faltas frequentes com atestado médico, para tratamento de saúde.

Nosso entendimento é que deve o empregador, nestes casos, entre outros aplicáveis à espécie, manter o contrato de trabalho e adequá-lo, o quanto possível, de modo a não promover a rescisão para não correr o risco de sofrer uma condenação a indenizar o ex-empregado. Todo o esforço nesta manutenção será menos custoso do que uma eventual ação judicial e a possível condenação.

  • Sobre o autorPós-graduado em Civil (Família, Sucessões, Contratos), Imobiliário e Ambiental.
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Uma empresa determinou a um Operador de Retroescavadeira que ficasse vigiando um canteiro de obras. Além de ferir o contrato póis não era função do empregado, este não se achava preparado técnica nem emocionalmente para desempenhar o trabalho.
Ponderou suas razões com a empresa mas foi demitido por justa causa
Por sorte da empresa ele ia embora de São Paulo e aceitou, no processo judicial que ajuizou contra a empresa para "derrubar" a justa causa, o pagamento das verbas rescisórias mais a liberação do FGTS e do Seguro-Desembprego. Se ação continuasse o valor seria bem maior. continuar lendo