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30 de Abril de 2024

Análise da jurisprudência acerca do fato gerador de ITBI.

Considerar que este fato apenas ocorre mediante o registro no cartório competente é uma ofensa aos princípios da legalidade e isonomia.

ano passado

Introdução

O presente artigo trata sobre o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI). Será falado sobre os principais destaques históricos de sua aplicação no Brasil desde a sua criação devido às necessidades da vinda da família real, no ano de 1809, tempo em que era chamado “imposto de Sisa”, bem como a sua evolução ao longo das Constituições Brasileiras.

Importante notarmos também a forma como a legislação pátria, atualmente, trata sobre o tema e como as últimas decisões dos Tribunais Superiores têm afrontado o princípio da legalidade, bem como o da isonomia, de forma a prejudicar, inclusive, a arrecadação financeira por parte dos Municípios.

Por fim, será relatado um caso hipotético, a partir do qual será possível enxergar, de forma concreta, como o Judiciário tem aberto as “brechas” que o Poder Constituinte Originário, na criação da lei, fechou.

Histórico do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) no Brasil

Conforme estudo histórico feito por José Maurício Conti (1999), a fim de suprir as necessidades da vinda da família real ao Brasil, houve a imposição da criação de diversos tributos imobiliários. Entre eles, se insere o ITBI, conhecido naquela época e, atualmente, bastante utilizado, como “Imposto de Sisa (Serviço de Imóveis de sua Alteza)”, que seria aplicado sobre a transferência imobiliária.

O "Imposto de Sisa”, então, surgiu no direito brasileiro no ano de 1809, por meio do Alvará 3. Sua primeira previsão constitucional ocorreu em 1891, na primeira Constituição do sistema republicano de governo. Estava previsto no artigo 9º, inciso III: “é de competência exclusiva dos Estados decretar impostos: sobre a transmissão da propriedade”.

Com a constituição de 1934, diferente da de 1809, separou-se a transmissão de propriedade em: imposto de transmissão de propriedade imobiliária inter vivos e imposto de transmissão de propriedade causa mortis. Ambos de competência dos Estados. As constituições de 1937 e 1946 mantiveram o entendimento da Constituição de 1934.

Outras importantes alterações a respeito do tema se deram nos anos de 1961 e 1965, ambos com Emendas Constitucionais. A primeira, Emenda Constitucional nº 5 de 1961, mudou a competência sobre o imposto de transmissão de propriedade imobiliária inter vivos, de Estadual para Municipal, enquanto continuou com o entendimento que o imposto de transmissão de propriedade causa mortis era de competência dos Estados. A Emenda Constitucional de 1965, que foi a nº 18, volta a reestabelecer a união entre os impostos de transmissão de propriedade, bem como voltar sua competência para os Estados, como era antes da Constituição de 1934. Pouco foi mudado na Constituição de 1967.

A última mudança se deu com a Constituição de 1988, a qual voltou a separar a transmissão de propriedade, e mudou a competência, a qual ficou: Estados e Distrito Federal são competentes sobre o Imposto de Transmissão Causa Mortis; enquanto os Municípios são competentes sobre o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis inter vivos.

O Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e sua previsão na Constituição Federal de 1988 e na Lei Complementar 5.172/1996

O Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) trata-se, atualmente, de um tributo municipal que é pago sempre que ocorre uma transação imobiliária onerosa entre pessoas vivas. Quando se trata de doação ou sucessão devido falecimento, não incidirá ITBI, mas sim ITCMD (Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação), cuja alíquota é de 4%. Assim sendo, a propriedade do imóvel só poderá ser transferida a partir do momento em que é realizado o seu pagamento.

Na Constituição Federal está previsto no artigo 156, caput e inciso II: “compete aos Municípios instituir impostos sobre: II - transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição.” Portanto, não é possível precisar um valor exato quanto ao valor cobrado pelo ITBI, visto que varia de Município para Município. Porém, não obstante a autonomia dos Municípios, considero-a relativa, visto a súmula nº 656 do STF, a qual proíbe a aplicação de ITBI progressivo, vejamos:

Imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis - Alíquotas progressivas - Inconstitucionalidade - Verbete 656 da Súmula do Supremo. É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis - ITBI com base no valor venal do imóvel. [ RE 346.829 AgR, rel. min. Marco Aurélio, 1ª T, j. 8-2-2011, DJE 42 de 3-3-2011].

É assegurado ainda pela Constituição Federal, em seu art. 156, § 2º, I, imunidade tributária para transmissões decorrentes de conferência de capital, de fusão, de incorporação, de cisão ou de extinção de pessoas jurídicas, salvo se a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, a locação de imóveis ou o arrendamento mercantil.

Na Lei do Sistema Tributário Nacional (Lei nº. 5172/1966), o ITBI está regulado entre os artigos 35 a 42. Conforme já dito no corpo do texto, em especial na parte do histórico, devido à Emenda Constitucional nº 18 de 1965, a qual houve a junção dos impostos de transmissão de propriedade e a mudança de tornar ambos de competência do Estado, pelo fato desta lei ter sido editado em vigência da Constituição de 1946, ela trata dos dois tributos de maneira uniforme, além de constar, em seu artigo 35, que é de competência dos Estados. Todavia, basta o aplicador do direito interpretar da maneira que convém com os institutos. Ressalta-se que esta lei foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 e isso pode se verificar a partir do inciso III do art. 156: “compete aos Municípios instituir impostos sobre: III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em Lei complementar.

A base de cálculo do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI)

Para incidência do ITBI, considera-se o valor venal dos bens ou direitos transmitidos, diferente da incidência do IPTU, que considera o valor venal do imóvel. Portanto, para fins de ITBI, o que vale é o preço descrito pelas partes no momento da lavratura da escritura; enquanto que, para o IPTU, o que vale é a publicação feita, pelo Poder Público, de uma planta genérica de valores. Está previsto, inclusive, no art. 38 da Lei do Sistema Tributário Nacional: “A base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos”.

Valor venal este, pacificado na doutrina e na jurisprudência, que deverá ser considerado o preço de mercado a ser pago, visto que o seu próprio significado é “relativo à venda”, logo, é o valor que mais se aproxima do valor venal. Sendo assim, prevalece o valor real da operação em relação à planta genérica de valores, mesmo que este seja maior que o valor venal adotado para lançamento do IPTU. Inclusive, é entendimento firmado na jurisprudência que o valor venal de referência estabelecido pelo ente público é inconstitucional, visto que a majoração do tributo é privativa de lei.

ITBI. BASE DE CÁLCULO. VALOR DE MERCADO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 535, II, E 458, II, DO CPC. INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO DO ART. 146 DO CTN. INOCORRÊNCIA. REEXAME DE PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. (…) III – É cediço na doutrina majoritária e na jurisprudência dessa Corte que a base de cálculo do ITBI é o valor real da venda do imóvel ou de mercado, sendo que até nos casos em que não houve recolhimento, pode-se arbitrar o valor do imposto, por meio de procedimento administrativo fiscal, com posterior lançamento de ofício. Segundo HUGO DE BRITO MACHADO: em se tratando de imposto que incide sobre a transmissão por ato oneroso, tem-se como ponto de partida para a determinação de sua base de cálculo na hipótese mais geral, que é a compra e venda, o preço. Este funciona no caso, como uma declaração de valor feita pelo contribuinte, que pode ser aceita, ou não, pelo fisco, aplicando-se, na hipótese de divergência, a disposição do art. 148 do CTN. ( “CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO”, Machado, Hugo de Brito, Ed. Malheiros, 29ª Edição, p. 398) IV – Conforme consignado no v. acórdão, houve a devida intimação da complementação do lançamento, fato que a agravante alega não ter ocorrido. Entretanto, a análise da alegada irregularidade do procedimento administrativo fiscal demanda reexame de provas, o que é inadmissível pela via eleita do especial, a teor da Súmula 07/STJ. V – Agravo regimental improvido. ( AgRg no REsp 1057493/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/08/2008, DJe 04/09/2008).

Fator gerador de ITBI – uma análise acerca da (in) constitucionalidade dos precedentes dados pelos tribunais superiores

Existe previsão para incidência do ITBI tanto na Constituição Federal, em seu artigo 156, § 2º, bem como na Lei 5172/1986, que é a lei do Sistema Tributário Nacional, em seu artigo 35. Naquele, é previsto:

“Artigo 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: II - transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição.” (1988, CONSTITUIÇÃO FEDERAL). Grifos meus.

Enquanto na Lei do Sistema Tributário Nacional, está previsto:

“Art. 35. O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador: I - a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil; II - a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia; III - a cessão de direitos relativos às transmissões referidas nos incisos I e II.” (LEI 5172/1986 - LEI DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL. Grifos meus.

Para entendermos melhor, é preciso esmiuçar os presentes dispositivos. Fragmentando-os, percebemos então que o legislador elegeu três hipóteses para a incidência do ITBI, são elas: I - transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física; II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia; III - cessão de direitos à sua aquisição.

Faz-se necessário o entendimento dos Tribunais Superiores a respeito do fato gerador de ITBI, vejamos:

“EMENTA Agravo regimental no agravo de instrumento. Imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis. ITBI. Momento da ocorrência do fato gerador. Compromisso de compra e venda. Registro do imóvel. 1. Está assente na Corte o entendimento de que o fato gerador do ITBI somente ocorre com a transferência efetiva da propriedade imobiliária, ou seja, mediante o registro no cartório competente. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido”. (AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – AI 764432 / MG - Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI - Julgamento: 08/10/2013 - Órgão Julgador: Primeira Turma – Publicação - ACÓRDÃO ELETRÔNICO - DJe-231 DIVULG 22-11-2013 PUBLIC 25-11-2013).

E ainda:

A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que apenas a transcrição do título de transferência no registro de imóveis dá ensejo à incidência do ITBI, não podendo ser tributada a promessa de compra e venda ou de cessão de direitos ( RO em MS 10.650-DF, AgReg no REsp 982.625/RJ).

Pois bem, a partir da comparação entre o que a legislação prevê como fato gerador de ITBI e o que a Jurisprudência tem entendido, vamos à análise da previsão legal e de como os Tribunais Superiores têm ignorado isso.

A primeira hipótese em análise, é referente à previsão legal de que é fato gerador de ITBI a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia. O problema surge quando pensamos na hipótese da “promessa de compra e venda”, visto que o Código Civil lista, no artigo 1225, inciso VII, como direito real, o direito do promitente comprador do imóvel. O artigo 1.417 do Código Civil, ainda reforça prevendo que: “mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel”. Portanto, a legislação é bastante clara no sentido de que, sendo direito real, deva incidir a cobrança do ITBI. Também deve incidir o referido tributo quando a promessa de compra e venda não for registrada no Cartório de Registro de Imóveis, visto que constitui direito pessoal, e, portanto, uma cessão de direitos que, nesse caso ,é relativo a um direito real. Isso está previsto tanto na Constituição Federal, art. 156, II, bem como na Lei do Sistema Tributário Nacional, art. 35, III.

Defensores do entendimento dos Tribunais Superiores, utilizam do argumento de que só é dono quem registra. Isso é inegável, mas não é o fato em questão, o ponto é quando deve haver incidência de ITBI. Quando os Tribunais Superiores entendem que apenas a efetiva transmissão da propriedade imobiliária é fato gerador de ITBI, eles restringem, e muito, o desejo do legislador. E essa conclusão é clara e pode ser percebível apenas fazendo uma análise superficial dos fatos geradores de ITBI constituídos tanto na Constituição, bem como na LSTN. É evidente que a intenção dos legisladores era dar uma amplitude maior para incidência desse imposto tributário, abrangendo não apenas para transmissão da propriedade, mas indo além, contemplando, inclusive como previsto, as transmissões sobre os direitos reais, bem como as transmissões sobre as cessões de direitos.

Outro argumento contrário é o de que, no caso da incidência de ITBI na promessa de compra e venda, quando houvesse a consolidação desta, haveria um “bis in idem tributário”, ou seja, incidir a mesma tributação duas vezes sobre a mesma pessoa. A solução para isso seria bastante fácil, bastava que, caso fosse consolidado pela parte que realizou o contrato de promessa de compra e venda, não seria necessário, no momento do registro no cartório de Registro de Imóveis, nova incidência de ITBI.

JULYANA DORIA, em publicação no site Âmbito Jurídico, afirma que: “no caso do ITBI, a norma que está sendo esvaziada trata-se de norma constitucional, válida, originária, incapaz, sequer, de ser submetida ao controle de constitucionalidade, bem como não se encontra em dissonância com as demais normas constitucionais para que tenha sua eficácia limitada pelo Judiciário”. E esse é o primeiro ponto de crítica ao entendimento do Judiciário acerca da incidência de ITBI: considerá-lo somente quando da transmissão da propriedade com o registro do título no cartório de imóveis, é uma ofensa ao princípio da legalidade.

Parte da doutrina que impugna as decisões dos Tribunais Superiores sobre o fato gerador de ITBI, evidencia a circunstância de que, ao longo dos tempos, os Tribunais Superiores estão apenas repetindo precedentes anteriores, sem a devida fundamentação como exige o artigo 489 do Código de Processo Civil. Repetindo o entendimento da Representação de Inconstitucionalidade nº 1.121-6/GO, no sentido de que não cabe incidência de ITBI em promessa de compra e venda, visto que é necessário a efetiva transferência da propriedade mediante o registro do respectivo título no cartório imobiliário. Acontece que a publicação da ementa desse acórdão aconteceu no dia 13 de abril de 1984, ou seja, antes do Código Civil de 2002, que instituiu a promessa de compra e venda como direito real.

Todavia, parece existir um movimento no sentido de entender a promessa de compra e venda como fato gerador de ITBI. Vejamos:

"PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA, IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E INCOMPETÊNCIA DA CORTE ESPECIAL DO TJPE PARA DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE DA NORMA MUNICIPAL ATACADA. REJEIÇÃO Á UNANIMIDADE. DISPOSITIVO DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO DO MUNICÍPIO DE OLINDA. INCIDÊNCIA DE ITBI SOBRE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL SEM CLÁUSULA DE ARREPENDIMENTO E DEVIDAMENTE REGISTRADA NO CARTÓRIO IMOBILIÁRIO COMPETENTE. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À CONSTITUIÇÃO ESTADUAL E FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. DECISÃO POR MAIORIA.

  1. As preliminares de ilegitimidade ativa, de impossibilidade jurídica do pedido e de incompetência desta Corte Especial para declarar a eventual inconstitucionalidade da norma municipal questionada foram rejeitadas ante a ausência de amparo legal.
  2. O Código Civil de 2002, adotando nova sistemática, estabelece em seus artigos 1.225 e 1.417 que a promessa de compra e venda de bem imóvel se caracteriza como direito real, de forma que incidirá o tributo correspondente (ITBI) quando da constituição desse direito. Para além disso, o Código Tributário Nacional, em seu artigo 35, II, é claro ao reconhecer que a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis também é fato gerador do ITBI.
  3. Considerando que o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis e de Direitos a eles relativos (ITBI) tem como fato gerador a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis e, sendo a promessa de compra e venda irretratável e irrevogável devidamente registrada no Cartório imobiliário um direito real – segundo a nova sistemática da Lei Adjetiva Civil Pátria – resta incontroversa ser devida/exigível a exação fiscal (cobrança do ITBI) a partir do momento em que se registra o aludido contrato (promessa de compra e venda) perante o Cartório de Imóveis, ficando o promissário comprador, consequentemente, desincumbido do ônus de pagar o imposto quando do registro da escritura definitiva.
  1. Verifica-se, assim, que tanto a transmissão definitiva da propriedade imóvel, quanto a promessa de compra e venda com cláusula de irretratabilidade, são fatos geradores da exação fiscal (ITBI), posto se tratarem de cessões irretratáveis de direitos reais sobre a propriedade imobiliária, sendo exatamente esta a hipótese fático-jurídica descrita na norma impugnada.
  2. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente para, em consequência, reconhecer a constitucionalidade do artigo 100, inciso V, da Lei Complementar nº 003/1997 do Município de Olinda (Código Tributário Municipal) – com a redação que lhe deu o artigo da Lei Complementar nº 016/2003 do mesmo Município. Decisão por maioria de votos (AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 241892-8, Relator Desembargador Fausto de Castro Campos, Corte Especial, Data do julgamento 01/02/2016)". (Grifo nosso).

Embora o julgado se refira apenas à promessa de compra e venda, a partir do momento que pararem e analisarem a cessão de direitos, provavelmente irão definir acerca do cabimento.

Um outro ponto que merece atenção, é o fato de como as pessoas se utilizam dessas “brechas” da lei para escapar dessa tributação. Penso, principalmente, de forma quantitativa. Quantos milhões, bilhões ou trilhões de reais os Municípios deixam de arrecadar pelo fato de que o ITBI, conforme o STF, só tem como fato gerador a transferência efetiva da propriedade mediante o registro do respectivo título no cartório imobiliário. Patrimônio esse que seria direcionado para à saúde, à educação, à segurança pública, etc...

Para melhor exposição a respeito das brechas dadas pelos Tribunais Superiores, criarei, no próximo tópico, um caso hipotético para tratarmos do assunto, inclusive caso este criado na própria aula de Direito Imobiliário.

Caso hipotético das “brechas” dadas pelo entendimento dos Tribunais Superiores a respeito do fato gerador de ITBI: tão somente a transferência efetiva da propriedade mediante o registro do respectivo título no cartório imobiliário

Suponhamos que o cliente João vai procurar uma advocacia penal para saber a respeito dos seus direitos. Por não ter recursos necessários para realizar o pagamento dos honorários, avisa ao escritório que fez uma promessa de compra e venda do imóvel de um amigo. Logo, por ter feito a promessa de compra e venda e ter registrado no cartório de Registro de Imóveis, ele tem o direito real de aquisição.

O escritório, ao analisar a proposta, de início não tem interesse, mas fica sabendo que um sócio gostaria de aceitar o imóvel como pagamento. O motivo deste em ficar com o imóvel é o fato de que comprou um apartamento de um investidor imobiliário e que este aceita imóvel como parte do pagamento. O investidor, por sua vez, tem o interesse de pegar o imóvel porque pagará nele um valor atrativo e, futuramente, venderá por um valor mais caro.

Temos, portanto, alguns caminhos possíveis para realizar essa transação: o primeiro, por meio do caminho tradicional, que seria: a consolidação da promessa de compra e venda por parte do cliente João (incidindo os custos de escritura, de registro e de ITBI), que faria uma escritura de dação em pagamento para o escritório de advocacia (incidindo, pela segunda vez, os custos de escritura, de registro e de ITBI) e este, por sua vez, faria uma nova escritura de dação em pagamento para o investidor imobiliário (incidindo, pela terceira vez, os custos de escritura, de registro e de ITBI).

Uma outra forma seria por meio da procuração em causa própria. Trata-se, basicamente, de poderes irrestritos para que o outorgado transfira aquele imóvel para quem ele quiser, da forma que quiser, e como quiser, sem prestação de contas. No caso em exemplo, a construtora daria uma procuração em causa própria ao cliente da advocacia, que a substabeleceria para o sócio do escritório de advocacia e, este, por fim, substabeleceria ao investidor. Caso o investidor ficasse com o imóvel, pagaria os emolumentos. Então, percebemos que diante toda essa transação, incidiria apenas um ITBI.

E tem um terceiro caminho, que é através da cessão de direitos. Este, mais seguro, por evitar ilegalidade e sonegação de imposto. Portanto, para fazer uma cessão de direitos, no caso concreto, bastaria ter anuência da construtora. Com a anuência da construtora, então, o cliente faria um contrato de cessão de direitos aquisitivos (do imóvel, o qual ele tinha o direito real de aquisição constituído), e assim seriam feitos contratos de cessão de direitos até chegar em mãos do investidor, sem gerar ITBI algum, visto que, conforme, mais uma vez, o entendimento do STF, ó fato gerador de ITBI é a transferência efetiva da propriedade mediante o registro do respectivo título no cartório imobiliário, não a transferência por meio de cessão de direitos. Só incidirá ITBI, neste caso, no momento que o investidor resolvesse ficar com o imóvel.

A partir desse caso hipotético é possível perceber a gravidade do entendimento dos Tribunais Superiores sobre o tema. E isso gera uma grande ofensa ao princípio da isonomia, um grande dano e desrespeito com àqueles que se servem do caminho tradicional para a transferência do imóvel, além de afetar, significamente, à arrecadação por parte dos Municípios, recursos estes que, sem dúvidas, fariam total diferença no desenvolvimento humano, social e cultural do mesmo. Além disso, volto aqui a salientar, trata-se de uma ofensa ao princípio da legalidade. Está previsto tanto na Constituição Federal, em seu artigo 156, II, bem como na LSTN, no art. 35, como fato gerador do ITBI: I - transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física; II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia; III - cessão de direitos à sua aquisição. Quando o legislador assim constituiu essas hipóteses, acredito que foi justamente para impedir essas “brechas” que foram abertas pelos Tribunais Superiores em suas decisões.

Conclusão

O Poder Constituinte Originário, ao criar a Constituição Federal de 1988, previu, em seu art. 156, II, três hipóteses para incidência do ITBI, são elas: I - transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física; II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia; III - cessão de direitos à sua aquisição. Tais incidências, quando pensadas, evidenciam que se pensava a incidência do ITBI para além simplesmente da transmissão de propriedade, alcançando também quando da transmissão de direitos reais sobre imóveis, bem como a cessão de direitos. Entendimento diferente tem tido os Tribunais Superiores, considerando que é fato gerador de ITBI tão somente a transferência efetiva da propriedade mediante o registro do respectivo título no cartório imobiliário. Ao decidir dessa forma, primeiramente ofende o princípio da legalidade, uma vez que restringe a forma como havia pensado os legisladores. Depois, a partir do momento que abre “brechas” para que sejam realizadas transmissões e transmissões, seja por meio da procuração em causa própria, seja por meio da cessão de direitos, sem pagar ITBI, fere o princípio da isonomia, visto que várias pessoas ainda seguem pelo caminho tradicional realizando todos os registros no cartório de Registro de Imóveis e pagando emolumentos significativos.

Tal (in) constitucionalidade de entendimento provavelmente se baseia na repetição de precedentes sem a devida fundamentação, visto que foi no ano de 1984 que ocorreu a primeira decisão de que não incidiria ITBI sobre a promessa de compra e venda. Porém, houve uma mudança no Código Civil de 2002, em especial na parte referente aos direitos reais, no artigo 1225, o qual prevê, em seu inciso VII, o direito do promitente comprador do imóvel; mudança esta não acompanhada pela Jurisprudência.

Ultimamente, parece que a Jurisprudência tem avançado em uma mudança de entendimento. Como vimos, conforme a ADI 241292-8, existe um movimento de considerar constitucional a incidência de ITBI na promessa de compra e venda. E, aposto, em um futuro bem próximo, em um mesmo entendimento quanto da incidência de ITBI na cessão de direitos.

Referências Bibliográficas

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CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Disponível em: . Acesso em 25 de novembro de 2020, às 19:21.

CONSTITUIÇÃO DE 1981. Disponível em: . Acesso em 25 de novembro de 2020, às 19:30.

CONTI, José Maurício. O Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI): principais questões. Disponível em: . Acesso em 25 de novembro de 2020, às 19:15.

DORIA, Julyana Perrelli de Ayalla. Incidência do ITBI sobre os contratos de promessa de compra e venda. Uma análise crítica da Jurisprudência. Disponível em:

- Âmbito Jurídico (ambitojuridico.com.br)>. Acesso em 25 de novembro de 2020, às 19:17.

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LEI 5.172, DE 25 DE OUTUBRO DE 1966. Disponível em:

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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Disponível em: . Acesso em 25 de novembro de 2020, às 19:19.

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Disponível em: . Acesso em 25 de novembro de 2020, às 19:19.

Nome do autor: CARLOS HENRIQUE DA SILVA FIGUEREDO

Estudante da Universidade de Brasília

E-mail: 170049914@aluno.unb.br

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