Página 124 da Judicial I - Interior SP e MS do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) de 12 de Maio de 2017

0003650-11.2XXX.403.6XX1 - MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (Proc. 2816 - DIEGO FAJARDO MARANHA LEAO DE SOUZA) X VALDENCIR DA SILVA MARTINS (SP288688 - CARLOS EDUARDO DE CAMARGO ROSSETTI)

Vistos.Trata-se de ação penal que o Ministério Público Federal move emface de Valdencir da Silva Martins, dado como incurso nas penas do artigo 18 da Lei n.º 10.826/2003. Narra a denúncia que no dia 25 de agosto de 2012, no KM 340 da Rodovia SP-333, foi o denunciado surpreendido, emoperação de vigilância empreendida pela Receita Federal, na posse de mercadorias, entre as quais se encontravam, como depois se verificou, 400 (quatrocentas) munições de uso permitido, mas importadas semautorização da autoridade competente.Recebida a denúncia, determinou-se a citação do denunciado para responder à acusação, assimcomo a requisição de seus antecedentes criminais.O acusado respondeu à acusação, rebatendo a e clamando por absolvição; arrolou testemunhas.Inocorrendo hipótese de absolvição sumária, designou-se audiência de instrução e julgamento, instando-se a defesa a justificar o conteúdo visado da prova oral pretendida; deprecou-se a inquirição de testemunha arrolada pela acusação.Não atendendo o réu à instigação judicial, declarou-se preclusa a produção da sua prova testemunhal.Tornou ao feito, cumprida, a precatória expedida para oitiva de testemunha.Na audiência que neste juízo se travou, colheu-se do réu que suas testemunhas eramabonatórias ou de caráter, razão pela qual a ele se deferiu trazer aos autos termos escritos contendo as declarações de suas testemunhas, mantendo-se o decidido à fl. 262 (segundo parágrafo). Procedeu-se, na sequência, à inquirição das demais testemunhas arroladas pela acusação e tomou-se o interrogatório do réu. Semrequerimentos na etapa do artigo 402 do CPP, declarou-se encerrada a instrução processual e deferiu-se prazo para apresentação de alegações finais escritas.Alegações finais aportaramnos autos. O MPF repisou o pedido de condenação, dando como provadas materialidade, autoria e dolo. Disse necessária a fixação da pena-base acima do mínimo legal, mencionou a necessidade de dar aplicação ao artigo 25 da Lei nº 10.826/03 e de declarar-se, como efeito da condenação, a inabilitação do autor para dirigir veículo.A defesa, a seu turno, bradou por absolvição, à falta de provas para decreto condenatório; quando não, fazia jus à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.É o relatório. DECIDO:O réu foi denunciado por tráfico internacional de munição, atraindo sobre si a incidência do artigo 18 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, verbis:Art. 18. Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente:Pena - reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.Prospera, tenho para mim, a pretensão punitiva deduzida na denúncia.A materialidade do delito ressai induvidosa. Entremostra-se pelo Termo de Guarda de fl. 04, pelo Auto de Apreensão de fl. 05 e pelo Laudo de Perícia Criminal nº 192/2013 - UTEC/DPF/MII/SP (fls. 11/16), a revelar que as 400 (quatrocentas) munições apreendidas do réu e sob sua órbita de poder são estrangeiras, estão emcondições de uso e aptas a produzir disparos.Acresce a solidez do caderno probatório o fato de o acusado trazer para o Brasil, emmeio a outras tantas mercadorias que adquiriu no Paraguai - e sobre isso não há controvérsia - munições de uso permitido, mas semautorização da autoridade competente.A internacionalidade da ação delituosa desponta, pois, cristalina.O autor não possuía (nemlegalmente poderia ter) autorização da autoridade competente para a internação promovida.Só os órgãos mencionados no artigo do Estatuto do Desarmamento podemconseguir autorizações de compra de munição, sempre comidentificação do lote e do adquirente no culote dos projéteis, na forma de Regulamento. Aliás, todas as munições comercializadas no País deverão estar acondicionadas emembalagens comsistema de código de barras, gravado na caixa, visando possibilitar a identificação do fabricante e do adquirente, entre outras informações definidas emRegulamento (1º e 2º, do art. 23, da Lei nº 10.826/2003).Ao que consta dos autos, em25 de agosto de 2012, no curso da Operação de Vigilância e Repressão Aduaneira - OTEFIS, deflagrada pela Receita Federal, o réu foi abordado na posse de mercadorias de origemestrangeira, desacompanhadas de documentação comprobatória de importação regular, as quais foramacondicionadas emseis volumes, que foramlacrados. A mercadoria apreendida foi entregue à guarda da empresa 4f09e5c4 de Bauru/SP, credenciada pela Receita Federal do Brasil (fls. 127/139).Lavrou-se termo de lacração, que recebeu o número 082503-12, apontando descrição sumária das mercadorias (perfumes, antenas, cosméticos, aparelho de som), a quantidade de volumes (seis) e o tipo de lacre (fita). O réu apôs firma no aludido termo, declarando haver presenciado a lacração dos volumes e estar ciente da designação de data para a abertura deles (fl. 167).Na data marcada para deslacração, na conferência das mercadorias na empresa Dínamo, foramencontradas 400 (quatrocentas) unidades de munição para arma de fogo, a saber: 100 munições calibre ponto38, 150 calibre ponto32 e 150 calibre ponto22. As munições foramretiradas por Fernando Montenegro Rossi, servidor da DRF/Marília (fl. 170), e encaminhadas à Delegacia de Polícia Federal de Marília (fl. 172).À fl. 174 está ofício da DRF/Marília para a Polícia Federal, no qual se consignou que as munições foramencontradas embrulhadas emjornais, ocultas dentro de bolsos de peças de vestuário (jaqueta ou sacola, segundo a testemunha Fernando Montenegro de Rossi). Tambémse informou que o réu não se fez presente no momento da deslacração.Os testemunhos ouvidos densificamo extrato probatório.Rudnei Aparecido da Silva, Auditor-Fiscal da Receita Federal arrolado pela acusação, disse que participou da Operação OTEFIS, mas não se lembrou especificamente do denunciado. Explicou que não chegou ao seu conhecimento qualquer reclamação relativa à lacração das mercadorias ou à confecção dos termos de lacração. Disse que o termo de lacração constante dos autos está regular. Quanto à numeração nele lançada, esclareceu que a rasura está no número de identificação do mês da lacração, que 8 corresponde ao mês de agosto, que 25 é o dia e o 12 é o ano de 2012. O 03 lançado corresponde ao terceiro termo lavrado naquele dia. Por isso, nenhumoutro termo leva aquela numeração. O mesmo número foi inserido nos lacres.A testemunha Fernando Montenegro de Rossi, servidor da Receita Federal, esteve presente no momento da deslacração realizada nas dependências da empresa Dínamo. Lembra-se que o conferente da empresa, emverificação das mercadorias constantes dos volumes identificados como sendo do denunciado, encontrou as munições nos bolsos de uma jaqueta, embrulhadas emjornal e o chamou. Disse que a sacola onde estavamas mercadorias (e tambémas munições) estavamlacradas comfita e que não havia sinal de adulteração.Já a testemunha Andréia Américo Andrade disse que era empregada da empresa Dínamo em2012 e que, na função de sub-fiel, acompanhava a chegada das mercadorias apreendidas, assimcomo os auditores da Receita Federal, no contato comessas mercadorias. Lembrou-se de umcaso de Marília, emque Fernando Montenegro de Rossi era o auditor. Disse que na ocasião os funcionários da empresa encontrarammunições entre as mercadorias e que elas foramacondicionadas emuma caixa da empresa e colocadas emuma sala mais fresca, para evitar acidentes. Lembra-se de ter assinado umtermo relativo às munições, o qual Fernando traria a Marília.Interrogado, o réu negou ter comprado munições no Paraguai e afirmou que o que levava consigo e foi apreendido encontrava-se emduas sacolas, apenas. Disse que não se lembra de constar no termo de lacração que assinou a quantidade de seis volumes. Mas reconheceu como sua a assinatura lançada no Termo de Lacração. Depois, acabou por declarar que, alémdas duas sacolas, foramlacradas também, emquatro ou cinco partes, bacias de antena parabólica.Embora o acusado tenha dito que entre as coisas compradas no Paraguai não havia jaqueta, a foto de fl. 158 retrata uma blusa feminina aparentando couro (item17 de fl. 149), a qual bemse aproxima da peça de vestuário citada.A bolsa para pesca (item21 - fl. 149 e foto de fl. 159) símile a uma sacola tambémpode ter guarnecido as munições, no narrar da testemunha Fernando Montenegro de Rossi.Por tudo o que se colheu, é autorizado concluir que as munições emquestão foramencontradas, ematividade fiscalizatória da Receita Federal do Brasil, entre outras mercadorias apreendidas empoder do denunciado, provindas todas elas do Paraguai.O crime de tráfico internacional de arma de fogo, acessório ou munição é de perigo abstrato; pune-se a conduta pelo risco que representa para a incolumidade pública.A conduta delitiva descrita no artigo 18 da Lei nº 10.826/03 é de ação múltipla ou de conteúdo variado; consuma-se coma realização de qualquer dos atos desenhados na norma, irrelevante a finalidade da munição introduzida ou exportada.A configuração do tráfico internacional de armas de fogo, acessórios ou munições exige só o dolo genérico, dispensada a existência de umespecial fimde agir.Dá-se, emsuma, por bemdemonstrada a responsabilidade do acusado pela infração penal descrita na denúncia, diante de materialidade (laudo pericial de fls. 11/16), autoria (munições achadas emmeio a outras mercadorias reconhecidas pelo acusado como suas trazidas do Paraguai) e dolo (munições ocultadas por jornal) inescondíveis. O réu será, pois, condenado.Passo à fixação das penas.Levando-se emconta as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, constata-se que o grau de reprovabilidade da conduta perpetrada pelo acusado é normal para a espécie; culpabilidade, portanto, não importará aumento na pena-base. De outro lado, emdesfavor do acusado não se registramantecedentes criminais. Nada se apurou sobre sua personalidade e conduta social. O motivo, mercantil, é próprio do tipo. Circunstâncias e consequências do delito não assoberbam. Deixo registrado, aqui, que a quantidade da munição importada (400) nemé tal que permita a desclassificação do crime para a conduta típica do artigo 334 do Código Penal (TRF4 - ACR 50030878520104047110-RS, Rel. Simone Barbisan Fortes, julgado no qual se raciocinou com75 cartuchos) nemque permita justificar a majoração da pena base (TRF3 - ACR 00008010320094036006-MS, Rel. CotrimGuimarães, a entender que 500 munições eramcapazes de exasperar a pena-base). Comportamento da vítima não acode considerar. Comessas considerações, fixo a pena-base no mínimo legal, isto é, em4 (quatro) anos de reclusão.Não há circunstâncias agravantes; tambémnão há atenuantes. Inexistem, por igual, causas de aumento ou diminuição da pena.Fixa-se a pena definitiva, assim, em4 (quatro) anos de reclusão. No que concerne à pena de multa, deve ser observado o critério bifásico. O número de dias-multa deve ser fixado de acordo como artigo 49 do Código Penal e o valor unitário, conforme a condição econômica do réu, na forma do artigo 60, caput, do mesmo estatuto. Destarte, invocando as considerações feitas a respeito das circunstâncias judiciais e legais do crime e no entendimento de que não avultou que o réu possua boa condição financeira, fixo a pena pecuniária em10 (dez) dias-multa, cada umna base de 1/30 (umtrigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo da prática do crime.O regime inicial de cumprimento da pena corporal, emrazão de sua quantidade, é o aberto, nos moldes do artigo 33, , c, do Código Penal.Tomadas essas considerações, é de ver que o quantumda pena privativa de liberdade aplicada permite sua substituição, ao teor do artigo 44, inciso I, do CP. A pena corporal aplicada não é superior a 4 (quatro) anos e o delito não foi praticado comviolência ou grave ameaça à pessoa. Assim, substituo a pena de reclusão imposta por duas restritivas de direitos, semprejuízo da pena de multa aplicada, nos termos do 2º do preceptivo logo acima mencionado, a saber:(i) prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período da pena privativa de liberdade, consistente na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado, emqualquer das entidades designadas emlei (art. 46, , do CP), da forma que houver por bemde determinar o digno juízo da execução;(ii) prestação pecuniária (art. 43, I, do CP), equivalente ao pagamento de cinco salários mínimos, à entidade pública ou privada comdestinação comdestinação social, na forma do artigo 45, , do Código Penal. Concedo ao réu o direito de recorrer emliberdade, pois respondeu solto ao processo e não estão presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva nesta fase.Ante o exposto e considerando tudo o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva deduzida na denúncia e CONDENO o réu Valdencir da Silva Martins nas iras do artigo 18 da Lei n.º 10.826/2003, impondo-lhe a pena de 4 (quatro) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente no regime aberto, alémdo pagamento de 10 (dez) dias-multa, fixados no valor mínimo legal. Concedo-lhe, outrossim, a substituição da pena de reclusão imposta, sem prejuízo da pena de multa, por duas restritivas de direito, na forma como antes descritas. Decreto a perda das munições apreendidas emfavor da União, nos termos do artigo 91, II, b, do CP, autorizando sua remessa a Comando do Exército, nas dobras do artigo 25 da Lei nº 10.826/03.Nos autos não há indicação de que o réu tenha feito uso de veículo automotor para a prática do crime apurado, diante do que não é de se lhe aplicar o efeito do inciso III, artigo 92, do Código Penal (inabilitação para dirigir veículo), como requerido pela acusação.Custas pelo condenado, ficando autorizadas as providências necessárias ao recebimento. Transitada esta em julgado, inscreva-se o nome do réu no rol dos culpados e faça-se a conclusão dos autos.P. R. I. C.

Expediente Nº 3999

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