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31 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Segunda Câmara de Direito Público

Julgamento

Relator

Carlos Adilson Silva
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Inteiro Teor











Apelação Nº XXXXX-64.2021.8.24.0020/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA


APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Trata-se de apelação cível interposta pelo Estado de Santa Catarina em face da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara da Infância e Juventude e Anexos da Comarca de Criciúma, Dr. Pablo Vinicius Araldi que, nos autos da ação civil pública movida pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, julgou procedentes os pedidos exordiais.
Em suas razões de insurgência, aduz o ente público estadual que: a) não há omissão do Estado de Santa Catarina com relação aos serviços prestados no Centro de Atendimento Socioeducativo (CASE), no Centro de Atendimento Socioeducativo Provisório (CASEP) e na Casa de Semiliberdade (CSL) de Criciúma/SC, eis contam com o quadro completo no que se refere à equipe mínima para atendimento da medida socioeducativa de internação, conforme preconiza o item 5.2.1.4, da Resolução CONANDA nº 119/2006; b) em referência aos Agentes de Segurança Socioeducativo, foram nomeados todos os aprovados no último concurso público do Edital 001/2016/SJC, inclusive os remanescentes, sendo que ainda o Estado deflagrou concurso de remoção interna, de modo que as unidades socioeducativas de Criciúma foram contempladas tanto pela remoção interna, quanto pelo advento de novos servidores; c) a decisão viola o que restou decidido no TEMA 2 do TJSC (IAC n. XXXXX- 37.2015.8.24.0000); d) a matéria delineada pelo Magistrado na origem é de competência do Poder Executivo, não sendo possível a atuação do Poder Judiciário, sob pena de violação ao princípio de separação dos poderes; e) é necessária a aplicação da reserva do possível, bem como que sejam reconhecidas as limitações orçamentárias e decorrentes do princípio da legalidade, de forma que não é possível a criação de despesa sem a respectiva fonte de custeio.
Subsidiariamente, pugnou pela majoração do prazo para cumprimento da sentença para dois anos, bem como pelo afastamento da multa cominatória fixada ou sua minoração para patamar proporcional com a fixação de teto máximo.
Foram apresentadas contrarrazões (evento 50, 1G).
Os autos ascenderam a esta Corte de Justiça e foram distribuídos a este Relator.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra do Exmo. Dr. Marcelo Truppel Coutinho, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 14, 2G).
É o relatório.

VOTO


O recurso voluntário deve ser conhecido porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.
Consta do caderno processual que o Ministério Público de Santa Catarina intentou ação civil pública em face do Estado de Santa Catarina objetivando a condenação do ente público estadual para que "no prazo de 60 (sessenta) dias, concluir estudos de impacto financeiro e orçamentário e, nos 30 (trinta) dias seguintes, encaminhar Projeto de Lei à Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina para criação dos cargos efetivos previstos na Resolução n. 119/06 do CONANDA (itens 5.2.1.3 e 5.2.1.4), a serem providos mediante concurso público, para completar a equipe técnica do CASE, CASEP e CSL de Criciúma, nos termos indicados na fundamentação supra, assim como a realização de concurso público para provimento dos cargos dos demais profissionais (agentes de segurança socioeducativos), cujo certame deverá ser deflagrado com urgência, conforme exposto, em prazo não inferior a 60 (sessenta) dias após sancionada a respectiva lei que criará os demais cargos técnicos, devendo ser ultimado o preenchimento dos cargos referidos no prazo máximo de 6 (seis) meses, sob pena de multa diária em valor a ser fixado por Vossa Excelência, a ser revertido em benefício do Fundo da Infância e Adolescência (FIA) do Município de Criciúma (arts. 88, IV, 214, 260, §§ 2º e , do ECA)" (evento 1, fl. 27, 1G).
1. Da alegada violação ao princípio da separação dos poderes
De plano, no que diz respeito à (im) possibilidade de o Poder Judiciário adentrar ao mérito do ato administrativo, cumpre salientar que a atuação do ente público está vinculada aos termos dos preceitos constitucionais.
Deste modo, a intervenção judicial é o meio de assegurar a adequação da prestação de serviço público, o que leva por consequência à observância das condições mínimas necessárias a uma existência digna, em atenção ao núcleo essencial dos direitos fundamentais (art. , III, da CRFB).
No que tange à tese de inadequada interferência do Poder Judiciário na atuação do Poder Executivo, há algum tempo este Órgão Fracionário vem revendo seu posicionando no tocante ao crescente ativismo do Poder Judiciário frente à consecução de políticas governamentais, ponderando a necessidade de se observar as limitações financeiras, o planejamento administrativo e orçamentário, a discricionariedade administrativa, a responsabilidade fiscal dos gestores públicos, buscando, com isso, uma harmonização entre as eventuais omissões de dever agir dos entes públicos e o princípio da Separação dos Poderes.
Assim, sem descurar da necessidade de se privilegiar a eficácia das normas constitucionais, especialmente a fundamentalidade dos direitos sociais, atendendo-se ao mínimo existencial, intimamente correlacionado ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. , III, da CF), busca-se preservar o pacto republicano e o poder discricionário da Administração Pública.
Nesse passo, "[...] não há como falar em violação ao Princípio da Separação dos Poderes, nem em indevida interferência de um Poder nas funções de outro, se o Judiciário intervém a requerimento do interessado titular do direito de ação, para obrigar o Poder Público a cumprir os seus deveres constitucionais de proporcionar saúde às pessoas, que não foram espontaneamente cumpridos ( AC n. 2014.021021-9, de Balneário Camboriú, rel. Des. Jaime Ramos, j. em 15.5.2014)" ( AI n. XXXXX-22.2015.8.24.0000, de São José, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. em 08.05.2018)."(TJSC, Agravo de Instrumento n. XXXXX-75.2018.8.24.0000, de Sombrio, rel. Sônia Maria Schmitz, Quarta Câmara de Direito Público, j. 20-08-2020).
A propósito, já decidiu a Corte Superior:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS. OMISSÃO ESTATAL. DIREITOS ESSENCIAIS INCLUSOS NO CONCEITO DE MÍNIMO EXISTENCIAL. 1. O STJ tem decidido que, ante a demora do Poder competente, o Poder Judiciário poderá determinar, em caráter excepcional, a implementação de políticas públicas de interesse social - principalmente nos casos em que visem resguardar a supremacia da dignidade humana sem que isso configure invasão da discricionariedade ou afronta à reserva do possível. 2. O controle jurisdicional de políticas públicas se legitima sempre que a "inescusável omissão estatal" na sua efetivação atinja direitos essenciais inclusos no conceito de mínimo existencial. 3. O Pretório Excelso consolidou o posicionamento de ser lícito ao Poder Judiciário "determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos Poderes" ( AI 739.151 AgR, Rel. Ministra Rosa Weber, DJe 11/6/2014, e AI 708.667 AgR, Rel. Ministro Dias Toffoli, DJe 10/4/2012). 4. Agravo interno a que se nega provimento. ( AgInt no REsp XXXXX/MG, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe 20/10/2017)"
Por outro lado, com relação à alegação da reserva do possível, o TJSP já decidiu:
"APELAÇÃO. Ação Civil Pública. Pretensão à adequada prestação do serviço de assistência social pela Municipalidade. Admissibilidade. O mero argumento de carência de recursos financeiros ou de obediência ao princípio da reserva do possível não pode ser usado pela Fazenda Pública Municipal para descumprimento de normas de ordem pública e cogentes. Poder discricionário da Administração Pública Municipal que não pode ser concedido para descumprimento de seus deveres fundamentais perante os administrados. Imperiosa a aplicação do princípio da razoabilidade. Comprovação dos fatos alegados pelo Ministério Público do Estado de São Paulo na petição inicial, conforme documentos juntados aos autos. Incidência do art. 373, I, do CPC. Manutenção dos capítulos da r. sentença. Incidência do art. 252 do RITJSP. Entendimento jurisprudencial deste E. TJSP. RECURSO DESPROVIDO."(TJSP; Apelação Cível XXXXX-59.2020.8.26.0646; Relator (a): Antonio Celso Faria; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro de Urânia - Vara Única; Data do Julgamento: 30/07/2021; Data de Registro: 30/07/2021)
Aliás, nos termos do parecer da Procuradoria-Geral de Justiça"embora não se desconheçam os obstáculos práticos que muitas vezes se impõem à consecução das políticas públicas, o gestor público não pode se esquivar de cumprir direitos básicos fundamentais e constitucionalmente assegurados, escudando-se no argumento, por demais banalizado, da falta de recursos para sua adequada disponibilização".
Assim, eventual manifestação do Judiciário com o objetivo de garantir a efetivação de direitos, especialmente como é o caso dos autos, não se demonstra indevida.
2. Das irregularidades nas unidades socioeducativas do Município de Criciúma
No que concerne à proteção à criança e ao adolescente, reza a Carta Magna:
"Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[...]
§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica;
V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade;
VII - programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins."
Veja-se que a CF/88 estabeleceu o dever do Poder Público na garantia dos direitos das crianças, adolescentes e jovens com absoluta prioridade. Nesse diapasão, o Estatuto da Criança e do Adolescente, no que concerne especialmente ao autor de ato infracional, afirma:
"Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes:
I - entrevistar-se pessoalmente com o representante do Ministério Público;
II - peticionar diretamente a qualquer autoridade;
III - avistar-se reservadamente com seu defensor;
IV - ser informado de sua situação processual, sempre que solicitada;
V - ser tratado com respeito e dignidade;
VI - permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável;
VII - receber visitas, ao menos, semanalmente;
VIII - corresponder-se com seus familiares e amigos;
IX - ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio pessoal;
X - habitar alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade;
XI - receber escolarização e profissionalização;
XII - realizar atividades culturais, esportivas e de lazer:
XIII - ter acesso aos meios de comunicação social;
XIV - receber assistência religiosa, segundo a sua crença, e desde que assim o deseje;
XV - manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventura depositados em poder da entidade;
XVI - receber, quando de sua desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade.
[...]
Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e segurança."
No caso dos autos o Ministério Público de Santa Catarina afirmou que teria encontrado uma série de irregularidades nas unidades de atendimento socioeducativo do Município de Criciúma, conforme infere-se dos Inquéritos Civis ns. 06.2018.00003145-2 e 06.2020.00001219-2.
2.1. Dos servidores temporários nas unidades socioeducativas
Dentre as infrações apontadas pelo MPSC, constatou-se que"o Estado de Santa Catarina realizou uma série de certames para contratar servidores para atuar nas entidades socioeducativas em meio fechado em caráter temporário (ACTs), em afronta direta à regra constitucional que determina o provimento de cargos na Administração Pública por meio de concurso público".
Com o objetivo de afastar a referida alegação, o ente público estadual limitou-se a afirmar que"foram nomeados todos os aprovados no último concurso público do Edital 001/2016/SJC, inclusive os remanescentes. Ainda, o Estado deflagrou concurso de remoção interna, sendo as unidades socioeducativas de Criciúma contempladas tanto pela remoção interna, quanto pelo advento de novos servidores"
Ademais, aduziu que já foi autorizada a realização de concurso público para o preenchimento de 43 vagas na área técnica e administrativa do sistema socioeducativo, bem como a admissão de 1.271 servidores em caráter temporário.
Pois bem.
Consta da ação civil pública intentada na origem que dos 155 funcionários das unidades socioeducativas do Município de Criciúma, apenas 2 ingressaram mediante concurso público!!
No que concerne ao provimento de vagas nas referidas unidades socioeducativas, a sentença proferida pelo Juízo na origem deve ser mantida por seus próprios e bem lançados fundamentos:
"Sabido que de acordo com o art. 37, II, da Constituição Federal, a investidura em cargos ou emprego público na administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios depende de prévia aprovação em concurso público.
Apesar da regra permiter exceções, estas são bastante restritas.
O inciso IX do citado artigo dispõe: a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, ficando, portanto, a cargo de lei infraconstitucional a sua regulamentação.
Nesse diapasão, a doutrina:
A razão do dispositivo constitucional em apreço, obviamente, é contemplar situações nas quais ou a própria atividade a ser desempenhada, requerida por razões muitíssimo importantes, é temporária, eventual (não se justificando a criação de cargo ou emprego, pelo quê não haveria cogitar de concurso público), ou a atividade não é temporária, mas o excepcional interesse público demanda que se faça imediato suprimento temporário de uma necessidade (neste sentido, "necessidade temporária"), por não haver tempo hábil para realizar concurso, sem que suas delongas deixem insuprido o interesse incomum que se tem de acobertar. (MELLO, 2004, p. 261).
Portanto, pelo que se infere, a contratação a que alude o IX do art. 37 da CF depende de lei específica delimitando os casos, bem assim sujeita-se que a contratação seja por tempo determinado e que exista excepcional interesse público.
Para tal desígnio, editada a Lei n. 8.745/93, que passou a delimitar os casos de contratação por tempo determinado nos termos do inciso IX do art. 37 do CF.
Assim, atualmente, em seu art. 2º, dispõe:
Art. 2º Considera-se necessidade temporária de excepcional interesse público:
I - assistência a situações de calamidade pública;
II - assistência a emergências em saúde pública;
III - realização de recenseamentos e outras pesquisas de natureza estatística efetuadas pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE;
IV - admissão de professor substituto e professor visitante;
V - admissão de professor e pesquisador visitante estrangeiro;
VI - atividades:
a) especiais nas organizações das Forças Armadas para atender à área industrial ou a encargos temporários de obras e serviços de engenharia;
b) de identificação e demarcação territorial;
c) (Revogada pela Lei nº 10.667, de 2003)
d) finalísticas do Hospital das Forças Armadas;
e) de pesquisa e desenvolvimento de produtos destinados à segurança de sistemas de informações, sob responsabilidade do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento para a Segurança das Comunicações - CEPESC;
f) de vigilância e inspeção, relacionadas à defesa agropecuária, no âmbito do Ministério da Agricultura e do Abastecimento, para atendimento de situações emergenciais ligadas ao comércio internacional de produtos de origem animal ou vegetal ou de iminente risco à saúde animal, vegetal ou humana;
g) desenvolvidas no âmbito dos projetos do Sistema de Vigilância da Amazônia - SIVAM e do Sistema de Proteção da Amazônia - SIPAM.
h) técnicas especializadas, no âmbito de projetos de cooperação com prazo determinado, implementados mediante acordos internacionais, desde que haja, em seu desempenho, subordinação do contratado ao órgão ou entidade pública.
i) técnicas especializadas necessárias à implantação de órgãos ou entidades ou de novas atribuições definidas para organizações existentes ou as decorrentes de aumento transitório no volume de trabalho que não possam ser atendidas mediante a aplicação do art. 74 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990;
j) técnicas especializadas de tecnologia da informação, de comunicação e de revisão de processos de trabalho, não alcançadas pela alínea i e que não se caracterizem como atividades permanentes do órgão ou entidade;
l) didático-pedagógicas em escolas de governo; e
m) de assistência à saúde para comunidades indígenas; e
n) com o objetivo de atender a encargos temporários de obras e serviços de engenharia destinados à construção, à reforma, à ampliação e ao aprimoramento de estabelecimentos penais;
VII - admissão de professor, pesquisador e tecnólogo substitutos para suprir a falta de professor, pesquisador ou tecnólogo ocupante de cargo efetivo, decorrente de licença para exercer atividade empresarial relativa à inovação.
VIII - admissão de pesquisador, de técnico com formação em área tecnológica de nível intermediário ou de tecnólogo, nacionais ou estrangeiros, para projeto de pesquisa com prazo determinado, em instituição destinada à pesquisa, ao desenvolvimento e à inovação;
IX - combate a emergências ambientais, na hipótese de declaração, pelo Ministro de Estado do Meio Ambiente, da existência de emergência ambiental na região específica.
X - admissão de professor para suprir demandas decorrentes da expansão das instituições federais de ensino, respeitados os limites e as condições fixados em ato conjunto dos Ministérios do Planejamento, Orçamento e Gestão e da Educação.
XI - admissão de professor para suprir demandas excepcionais decorrentes de programas e projetos de aperfeiçoamento de médicos na área de Atenção Básica em saúde em regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde (SUS), mediante integração ensino-serviço, respeitados os limites e as condições fixados em ato conjunto dos Ministros de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão, da Saúde e da Educação.
XII - admissão de profissional de nível superior especializado para atendimento a pessoas com deficiência, nos termos da legislação, matriculadas regularmente em cursos técnicos de nível médio e em cursos de nível superior nas instituições federais de ensino, em ato conjunto do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão e do Ministério da Educação.
Da observância da referida lei, vê-se que os casos contemplados são bem específicos e atendem à situações pontuais e emergenciais motivados.
Fora isso, a atividade temporária não deve estar atrelada à atividades essenciais do Estado e que necessitem de uma continuidade nos seus serviços.
Desta feita, tem-se que a contratação temporária somente se justifica quando a atividade a ser desempenhada é por um tempo determinado, eventual, ou em casos de atividade permanente desde que não haja tempo hábil para a realização de concurso público em virtude da necessidade imediata/urgente da contratação. Apenas para suprir uma necessidade temporária.
Aliás, acerca dessas contratações temporárias no serviço público, ensina a melhor doutrina:
[...] As contratações com prazo determinado, por representarem uma exceção à regra constitucional do concurso público, devem ser efetuadas com a estrita observância dos seguintes requisitos:a) existência de lei regulamentadora com a previsão dos casos de contratação temporária; b) prazo determinado da contratação (a legislação deve estipular os prazos); c) necessidade temporária (não é possível utilizar essa contratação para o exercício de funções burocráticas ordinárias e permanentes); e d) excepcional interesse público (a contratação deve ser precedida de motivação que demonstre de maneira irrefutável o excepcional interesse público)."(Oliveira, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo, 6º edição,Editora Método, 2018, p. 738).
Aliás, segundo a doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello:
Trata-se, aí, de ensejar suprimento de pessoal perante contingências que desgarrem da normalidade das situações e presumam admissões apenas provisórias, demandadas em circunstâncias incomuns, cujo atendimento reclama satisfação imediata e temporária (incompatível, portanto, com o regime normal de concursos). (MELLO, 2006, p. 270).
Nesse sentido, é o entendimento do Supremo Tribunal Federal:
CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO: CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. C.F., art. 37, IX. Lei 4.957, de 1994, art. 4º, do Estado do Espírito Santo. Resolução nº 1.652, de 1993, arts. 2º e 3º, do Estado do Espírito Santo. SERVIDOR PÚBLICO: VENCIMENTOS: FIXAÇÃO. Resolução nº 08/95 do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo. I. - A regra é a admissão de servidor público mediante concurso público. C.F., art. 37, II. As duas exceções à regra são para os cargos em comissão referidos no inc. II do art. 37, e a contratação de pessoal por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. C.F., art. 37, IX. Nesta hipótese, deverão ser atendidas as seguintes condições: a) previsão em lei dos casos; b) tempo determinado; c) necessidade temporária de interesse público; d) interesse público excepcional (STF, ADI n. 1500/ES, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 19/06/2002) [...]
E, ainda:
A respeito, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, fixou, emrepercussão geral, a seguinte tese: Nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal, para que se considere válida a contratação temporária de servidores públicos, é preciso que: a) os casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a contratação seja indispensável, sendo vedada para os serviços ordinários permanentes do Estado que estejam sob o espectrodas contingências normais da Administração. ( RE XXXXX/MG Rel. Min. Dias Toffoli, j. 09/04/2014).
Analisando-se o caso concreto, sem dúvidas, tem-se que a contratação de pessoal temporário para o CASE e a CSL de Criciúma não se enquadra em nenhuma das hipóteses colocadas pela Lei n.º 8.745/93.
Ao lado disso, e mais propriamente ligado ao caso em comento, o art. da Lei 12.594/12 (Lei que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo - Sinase), dispõe:
Art. 4º Compete aos Estados:
[...]
III - criar, desenvolver e manter programas para a execução das medidas socioeducativas de semiliberdade e internação;
Art. 12. A composição da equipe técnica do programa de atendimento deverá ser interdisciplinar, compreendendo, no mínimo, profissionais das áreas de saúde, educação e assistência social, de acordo com as normas de referência.
[...]
§ 3º O não cumprimento do previsto neste artigo sujeita as entidades de atendimento, seus dirigentes ou prepostos à aplicação das medidas previstas no art. 97 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 ( Estatuto da Criança e do Adolescente).
[...]
Art. 17. Para o exercício da função de dirigente de programa de atendimento em regime de semiliberdade ou de internação, além dos requisitos específicos previstos no respectivo programa de atendimento, é necessário:
I - formação de nível superior compatível com a natureza da função;
II - comprovada experiência no trabalho com adolescentes de, no mínimo, 2 (dois) anos; e
III - reputação ilibada.
Nesse passo, observa-se ainda do Estatuto da Criança e Adolescente, em seu art. 94 e 94-A:
Art. 94. As entidades que desenvolvem programas de internação têm as seguintes obrigações, entre outras:
[...]
III - oferecer atendimento personalizado, em pequenas unidades e grupos reduzidos;
[...]
IX - oferecer cuidados médicos, psicológicos, odontológicos e farmacêuticos;
X - propiciar escolarização e profissionalização;
XI - propiciar atividades culturais, esportivas e de lazer;
XII - propiciar assistência religiosa àqueles que desejarem, de acordo com suas crenças;
XIII - proceder a estudo social e pessoal de cada caso;
[...]
Art. 94-A. As entidades, públicas ou privadas, que abriguem ou recepcionem crianças e adolescentes, ainda que em caráter temporário, devem ter, em seus quadros, profissionais capacitados a reconhecer e reportar ao Conselho Tutelar suspeitas ou ocorrências de maus-tratos.
A par destas considerações, notório que as atividades desenvolvidas junto às unidades que desenvolvem os programas de atendimento de internação e semiliberdade são de caráter duradouro e permanente, sem características de excepcionalidade e temporariedade, não se enquadrando na concepção de excepcionais e temporárias a rigor da Lei 8.745/93, situação que permitiria o ingresso sem concurso.
Não obstante as unidades CASE e CSL de Criciúma ofereçam serviço a adolescentes infratores em caráter permanente e duradouro, tais serviços vem sendo desempenhados por profissionais contratados em regime temporário.
Ou seja, apesar do importante papel dos cargos que devem compor a equipe técnica dentro das unidades socioeducativas para o acompanhamento dos socioeducandos, em especial com um acompanhamento continuado e capacitado, estes cargos estão sendo providos por pessoal que tem transitoriedade, o que acaba trazendo prejuízos aos internos e à sociedade, Estado como um todo, que deve prezar pela qualidade do atendimento, até para o alcance dos objetivos desses programas de atendimento.
Em Criciúma, essa situação excepcional de contratações temporárias nas unidades socioeducativas de meio fechado tem perdurado desde 2018 sem que haja alguma providência efetiva no tocante à realização de concurso público, em clara afronta à Constituição Federal e à legislação pátria.
E o embróglio não parece se resolver na medida em que o Estado apresenta as mais variadas argumentações para não ter implementado o Concurso Público para a região de Criciúma.
Não obstante, o certo é que os casos de contratação temporária em comento não podem perdurar a longos períodos, a fim de não ensejar a ilegalidade de contratações em ferimento ao art. 37, II, da CF.
Nessa senda, imprescindível a contratação de pessoal mediante concurso.
Aliás, no que diz respeito a quantidade de servidores atuando no CASE e CSL de Criciúma, segundo apontado pelo Parquet, atualmente, a equipe técnica efetiva das referidas unidades é formada por apenas 2 (dois) agentes de segurança socioeducativo (ambos lotados no CASE), sendo um deles supervisor da unidade. Todo o restante da equipe técnica, considerando-se ambas as unidades, é formada por servidores temporários (ACTs).
Dos 155 (cento e cinquenta e cinco) profissionais, apenas 2 (dois), lotados no CASE, ingressaram nos quadros da Administração Pública mediante aprovação em concurso público. Os demais ocupam os cargos de natureza permanente com vínculo de contratação temporária.
Tal situação era a verificada ao tempo da propositura da ação. É de conhecimento deste juízo que o quadro sofreu alterações desde então, com o provimento de diversas vagas por servidores efetivos. Contudo, a irregularidade do quadro geral, se amenizada, não foi sanada."
Veja-se que o ente público estadual não tem justificado de maneira plausível as razões pelas quais o preenchimento das vagas nas unidades socioeducativas de Criciúma não tem ocorrido por concurso público, mas tão-somente por contratação em caráter temporário, o que deve ser a exceção e não a regra.
Demais disso, no caso dos autos, a tese do MPSC mostra-se ainda mais relevante, eis que se tratam de unidades socioeducativas em que a legislação pátria determina que a equipe seja multidisciplinar, cujo acompanhamento deve ser contínuo e permanente, com vistas ao melhor atendimento às crianças e adolescentes que lá se encontram, o que não se coaduna com a investidura em caráter temporário dos servidores.
Por esta razão, mostra-se correta a sentença proferida pelo Juízo na origem que reconheceu a ilegalidade das contratações temporárias pelo Estado de Santa Catarina nas unidades socioeducativas do Município de Criciúma com consequente determinação da realização de concurso público para o preenchimento das referidas vagas.
Ademais, convém ressaltar que diferentemente do alegado pelo ente público, a determinação de realização de concurso público não fere o que restou decidido por este Tribunal no julgamento do Incidente de Assunção de Competência n. XXXXX- 37.2015.8.24.0000, de relatoria do eminente Des. Luiz Fernando Boller.
Isso porque, naqueles autos, a tese fixada determinou que não poderia o Poder Judiciário substituir o Poder Executivo na determinação de onde devem ser providos cargos na área de segurança pública, situação diferente dos presentes autos, no qual se está reconhecendo a ilegalidade do provimento das vagas em caráter excepcional, com a consequente determinação da realização de concurso público.
Mutatis mutandis:
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE SERVIDORES - OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA ADMINISTRAÇÃO - BURLA AO PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DO CONCURSO PÚBLICO. 1. A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração (art. 37, II, CF). A lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX, CF). 2. Contratação temporária de servidores para exerceram cargos de monitores, sem concurso público, mediante processo seletivo baseado em entrevistas e análise de currículos. Inexistência de situação emergencial aliada a interesse público extraordinário. Ofensa ao art. 37, II e IX, da CF. Violação aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput, CF). Fato que configura infração ao art. 11, I, da Lei nº 8.429/92. Nulidade das contratações. Ressarcimento ao erário. Inadmissibilidade. A despeito da ilegalidade na contratação inexiste prova de dano patrimonial ao erário. Penalidade afastada. Pedido procedente. Recurso provido, em parte. (TJSP; Apelação Cível XXXXX-82.2016.8.26.0058; Relator (a): Décio Notarangeli; Órgão Julgador: 9ª Câmara de Direito Público; Foro de Agudos - 2ª Vara Judicial; Data do Julgamento: 04/05/2020; Data de Registro: 04/05/2020)
Por outro lado, em que pese o ente público tenha alegado em seu recurso de apelação que houve autorização para realização de concurso público com o preenchimento de 43 vagas, não foi esclarecido se o provimento dos cargos seria para as unidades socioeducativas de Criciúma. Ademais, eventual provimento de cargos de caráter temporário não resolveria o problema tal qual delineado no caso dos autos, razão pela qual os fundamentos que embasaram a decisão do Juízo na origem mostram-se irretocáveis.
2.2. Do descumprimento da Resolução n. 119/2006 do CONANDA
Aduz ainda o Parquet que o Estado de Santa Catarina não tem cumprido a Resolução n. 119/2006 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, que estabelece equipe técnica para atuação nas unidades de cumprimento de medida socioeducativa.
Acerca das deficiências no quadro técnico, o MPSC aduziu a ausência de cargos de coordenador técnico, advogado, assistente social, entre outros.
Com relação à necessidade de adequação à Resolução n. 119/2006, a 5ª Câmara de Direito Público deste Tribunal pronunciou-se em caso semelhante ao dos autos:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CRIAÇÃO E PROVIMENTO DE CARGOS PÚBLICOS. CASE/CASEP DE TUBARÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. CRIAÇÃO E PROVIMENTO DOS CARGOS NECESSÁRIOS AO FUNCIONAMENTO DAS ENTIDADES DE ATENDIMENTO. IMPOSIÇÃO DE LEGISLAÇÃO NACIONAL (LEI 12.594/2012 E RESOLUÇÃO 119 DO CONANDA). QUADRO DE PESSOAL DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO ESTADUAL (LC 472/2009). PREVISÃO SOMENTE DE CARGOS DE AGENTE DE SEGURANÇA. INÉRCIA ESTATAL VERIFICADA EM RELAÇÃO AOS DEMAIS CARGOS. IMPOSSIBILIDADE DE PERPETUAÇÃO DAS CONTRATAÇÕES TEMPORÁRIAS RENOVADAS ANO APÓS ANO. SERVIÇOS PERMANENTES. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL (ART. 37, IX, DA CF). INEXISTÊNCIA DE DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA NO CASO. ABSOLUTA PRIORIDADE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS ÀS CRIANÇAS E AOS ADOLESCENTES. INTERVENÇÃO JUDICIAL NECESSÁRIA QUE NÃO AFRONTA A SEPARAÇÃO DOS PODERES. OBRIGAÇÃO (PREENCHIMENTO DOS CARGOS) QUE DEVE SER CUMPRIDA EM 180 DIAS. IMPOSSIBILIDADE DE MANUTENÇÃO DESSE PRAZO. NOMEAÇÃO QUE DEVE SE DAR DENTRO DO PERÍODO DE VALIDADE DO CERTAME A SER ABERTO. COMANDO IMPUGNADO QUE PROIBIU A CONTRATAÇÃO DE PESSOAL TEMPORÁRIO PARA OCUPAR CARGOS DESTINADOS À FORMAÇÃO DA EQUIPE DO CASEP QUE NÃO PODE SER MANTIDA. POSSIBILIDADE ENQUANTO PERDURAR O CUMPRIMENTO DO COMANDO JUDICIAL IMPUGNADO E DESDE QUE DEMONSTRADA A EXCPECIONALIDADE E URGÊNCIA DA SITUAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. XXXXX-92.2020.8.24.0075, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Vilson Fontana, Quinta Câmara de Direito Público, j. 17-05-2022). [Grifou-se]
Do referido julgado, extrai-se do voto do eminente Relator Des. Vilson Fontana, cujos fundamentos ora se utilizam como razões de decidir:
"No presente caso, restou evidenciado que as contratações com prazo determinado, reiteradas ano após ano, têm sido utilizadas como subterfúgio para evitar a criação dos cargos efetivos necessários ao funcionamento do CASE de Tubarão. As funções atualmente exercidas por servidores temporários são permanentes, até porque impostas por lei federal.
É certo que a Lei do SINASE (Lei 12.594/12) permite que a entidade de atendimento socioeducativo seja pessoa jurídica de direito privado, atuando em parceria com o poder público. No entanto, no caso em análise, o Estado de Santa Catarina optou por prestar tal serviço diretamente. Assim, a contratação de servidores para exercer as funções necessárias ao desenvolvimento dos programas de atendimento (art. 1º, § 5º) deve se dar por meio de concurso público. É a própria Constituição Federal que impõe, pois não admite outra forma de contratação para funções contínuas do Estado.
A Lei do SINASE atribuiu aos Estados a competência para"criar, desenvolver e manter programas para a execução das medidas socioeducativas de semiliberdade e internação"(art. 4º, III).
O programa de atendimento, segundo o art. 12, caput, da mesma lei, deve contar com equipe técnica interdisciplinar,"compreendendo, no mínimo, profissionais das áreas de saúde, educação e assistência social". Tal diretriz não configura mera recomendação, mas norma coercitiva cujo descumprimento sujeita as entidades de atendimento e seus dirigentes à aplicação de sanções previstas no art. 97 do ECA.
Nesse contexto, a Lei Complementar Estadual 472/2009, que prevê, no quadro de pessoal do sistema socioeducativo, unicamente cargos de Agente de Segurança Socioeducativo, é insuficiente e inadequada para os fins a que se destina o Sistema de Atendimento: a responsabilização, reprovação e integração social do adolescente que pratique ato infracional (art. , § 2º, da Lei 12.594/2012).
Também revela a demora e a resistência do Estado em criar a estrutura necessária para atender à obrigação constitucional de assegurar, com absoluta prioridade, os direitos do adolescente sujeito a medida privativa de liberdade e o respeito à sua condição especial de pessoa em desenvolvimento, conforme determina a Constituição Federal:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[...]
§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
[...]
V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade;
A respeito, destaca-se relevante lição doutrinária:
Todos temos direito à vida, à integridade física, à saúde, à segurança etc., mas os infantes e jovens precisam ser tratados em primeiríssimo lugar (seria em primeiro lugar, fosse apenas prioridade; porém, a absoluta prioridade é uma ênfase), em todos os aspectos. Precisam ser o foco principal do Poder Executivo na destinação de verbas para o amparo à família e ao menor em situação vulnerável; precisam das leis votadas com prioridade total, em seu benefício; precisam de processos céleres e juízes comprometidos. Se conjugarmos este princípio com a proteção integral, verificar-se-á o universo de equívocos lamentáveis cometidos pelos Poderes do Estado. O poder público sempre alega falta de recursos para prover unidades de acolhimento e de internação de maneira satisfatória, mas nunca falta verba para alargar uma avenida, construir uma ponte, comprar viaturas, dar festas, entre outros gastos. (NUCCI, Guilherme. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: em busca da Constituição Federal das Crianças e dos Adolescentes. 3a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 06)
Outrossim, no que se refere ao poder discricionário da administração pública, consigna-se que"Se é certo que ao Judiciário recusa-se a possibilidade de substituir-se à Administração Pública, o que contaminaria ou derrubaria a separação mínima das funções do Estado moderno, também não é menos correto que, na nossa ordem jurídica, compete ao juiz interpretar e aplicar a delimitação constitucional e legal dos poderes e deveres do Administrador, exigindo, de um lado, cumprimento integral e tempestivo dos deveres vinculados e, quanto à esfera da chamada competência discricionária, respeito ao due process e às garantias formais dos atos e procedimentos que pratica"( REsp XXXXX/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/05/2016, DJe 01/06/2016)."(TJSC, Apelação n. XXXXX-58.2019.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Júlio César Knoll, Terceira Câmara de Direito Público, j. 13-07-2021).
Logo, ainda que a situação evidenciada nos autos arraste-se desde o ano 2018, quando, inclusive, os Centros de Apoio Operacional da Infância e Juventude e o da Moralidade Administrativa do Ministério Público manifestaram-se no sentido de excepcionar a realização de concurso público imediatamente, a fim de iniciar, desde logo, as atividades nas entidades socioeducativas, penso que a ordem exarada no decisum não importa em qualquer violação.
Não se nega que o ideal seria o atendimento das prioridades constitucionais diretamente pelos poderes Executivo e Legislativo, sem necessidade de intervenção do Judiciário, especialmente em questões complexas que envolvem planejamento e alocação de recursos.
No entanto, impedido de intervir diretamente nas políticas públicas do setor, o Poder Judiciário, no caso dos autos, ver-se-ia num impasse: de um lado, as contratações temporárias estão sendo realizadas pelo Estado de maneira ilegal; de outro, simplesmente proibi-las resultaria em maior ofensa aos direitos dos adolescentes em restrição de liberdade, que deixariam de ter acesso aos serviços mínimos assegurados em lei.
Portanto, a solução adotada na sentença, determinando que seja encaminhado projeto de lei para a criação de cargos efetivos, é uma resposta adequada para equacionar o respeito à Constituição Federal, sob os três vértices aqui entrelaçados: a exigência de concurso público para o exercício de funções permanentes da Administração; a prioridade absoluta das garantias à criança e ao adolescente; e o princípio da independência e harmonia entre os Poderes."
Veja-se que ao estabelecer a absoluta prioridade das crianças e adolescentes, a CF/88 determina que esse atendimento seja especializado, com vistas a permitir um tratamento digno àqueles que se encontram no cumprimento de medidas socioeducativas.
Nesse sentido, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, utilizando-se de sua competência para a definição das políticas para infância e adolescência, estabeleceu a composição da equipe multidisciplinar junto às unidades socioeducativas, de modo que o Estado não pode se eximir da referida determinação.
Por esta razão, mostra-se igualmente adequada a determinação do Magistrado na origem para que o Estado de Santa Catarina realize o provimento de vagas nos termos da Resolução n. 119 do CONANDA.
3. Do prazo para cumprimento da decisão e a multa em caso de descumprimento
O Magistrado na origem determinou que o ente público, no prazo de 60 dias, finalizasse os estudos de impacto financeiro e orçamentário para implementação das medidas determinadas na sentença, bem como para que no prazo de 30 dias encaminhasse projeto de lei para ALESC propondo a criação dos cargos previstos na Resolução n. 119 do CONANDA.
Com relação às vagas atualmente ocupadas por servidores temporários, o Juízo a quo fixou o prazo de 60 dias para que o Estado de Santa Catarina, após a sanção da lei que criará os novos cargos, publique o edital do concurso público, devendo o preenchimento dos cargos ocorrer no prazo máximo de 180 dias.
Em caso de descumprimento, foi fixada multa diária de R$ 15.000,00.
Insurge-se o ente público estadual com relação ao prazo para cumprimento, bem como à multa fixada.
3.1 Do prazo para cumprimento da decisão
Pugna o ente público para"flexibilização do prazo para cumprimento da ordem judicial, sugerindo-se no caso concreto, sopesados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o prazo de dois anos, a contar do trânsito em julgado da decisão".
Pois bem.
A situação delineada nos autos vem se arrastando há muitos anos, eis que ao menos desde 2018 o Estado de Santa Catarina não realiza concurso público para o provimento de vagas para servidores nas unidades socioeducativas.
Ademais, a Resolução n. 119 do CONANDA é de 2006, sendo que até o momento não ocorreu sua total implementação, em claro descumprimento ao princípio da razoabilidade.
Assim, o prazo de 60 dias para que o Estado de Santa Catarina realize os estudos técnicos do impacto financeiro da medida mostra-se adequado para o cumprimento da medida.
Por outro lado, com relação ao encaminhamento do projeto de lei à ALESC, entendo que igualmente deva ser mantido aquele fixado na sentença (60 dias).
Por fim, com relação à publicação do edital para o provimento das vagas após a aprovação da lei, entendo que deva ser dilatado o prazo para 180 dias, com o preenchimento dos cargos de maneira definitiva em novos 180 dias, conforme fixado pela sentença, com vistas a permitir os trâmites administrativos necessários.
3.2 Da multa em caso de descumprimento
Em que pese o ente público requeira o afastamento da multa cominatória, razão não lhe assiste, eis que necessária para assegurar o cumprimento das medidas determinadas nestes autos.
Todavia, reputo necessária fixação de teto máximo, eis que não foi estabelecido pelo Magistrado na origem.
Assim, mantenho a fixação da multa em R$ 15.000,00, todavia, com o estabelecimento do teto máximo de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).
4. Honorários recursais
Quanto aos honorários recursais, inviável a majoração na forma do art. 85, § 11, do CPC, pois não atendidos os critérios cumulativos (STJ, EDcl no AgInt no REsp XXXXX/RJ).
5. Dispositivo
À vista do exposto, voto no sentido de conhecer do reclamo e dar-lhe parcial provimento tão-somente para postergar o prazo de publicação do edital para 180 dias após a aprovação da lei; e estabelecer o teto máximo da multa cominatória em R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).

Documento eletrônico assinado por CARLOS ADILSON SILVA, Desembargador, na forma do artigo , inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador XXXXXv33 e do código CRC XXXXXf.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ADILSON SILVAData e Hora: 6/12/2022, às 17:28:56
















Apelação Nº XXXXX-64.2021.8.24.0020/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA


APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


EMENTA


APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA INTENTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. IRREGULARIDADES NAS UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS DO MUNICÍPIO DE CRICIÚMA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO ENTE PÚBLICO ESTADUAL.
ALEGADA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. INEXISTÊNCIA. INTERVENÇÃO JUDICIAL NECESSÁRIA COM O OBJETIVO DE ASSEGURAR A ADEQUADA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO. ADEMAIS, CASO DOS AUTOS QUE SE MOSTRA DE ESPECIAL RELEVÂNCIA, PORQUANTO CONCERNENTE ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA. INTERVENÇÃO JUDICIAL NECESSÁRIA. PRECEDENTES.
ABSOLUTA PRIORIDADE À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. DIGRESSÃO INSCULPIDA NA CARTA MAGNA E NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. IRREGULARIDADES NAS UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS DE CRICIÚMA. CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES EM CARÁTER TEMPORÁRIO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA URGÊNCIA E EXCEPCIONALIDADE. ILEGALIDADE EVIDENCIADA. DETERMINAÇÃO DE REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO QUE SE MOSTRA CORRETA.
DESCUMPRIMENTO DA RESOLUÇÃO 119/2006 DO CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (CONANDA). EQUIPE TÉCNICA DE ATUAÇÃO NAS UNIDADES DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO INCOMPLETA. NECESSIDADE DE CRIAÇÃO DOS REFERIDOS CARGOS, COM VISTAS AO ATENDIMENTO ADEQUADO ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA. RECURSO DESPROVIDO NO PONTO.
PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA MEDIDA. DILAÇÃO EM 180 DIAS PARA A PUBLICAÇÃO DO EDITAL, COM A MANUTENÇÃO DOS DEMAIS PRAZOS ESTABELECIDOS NA SENTENÇA. MULTA COMINATÓRIA ARBITRADA SEM TETO MÁXIMO. NECESSIDADE DE FIXAÇÃO.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS NA HIPÓTESE.

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer do reclamo e dar-lhe parcial provimento para tão-somente para postergar o prazo de publicação do edital para 180 dias após a aprovação da lei; e estabelecer o teto máximo da multa cominatória em R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 06 de dezembro de 2022.

Documento eletrônico assinado por CARLOS ADILSON SILVA, Desembargador, na forma do artigo , inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador XXXXXv10 e do código CRC 2f76c415.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ADILSON SILVAData e Hora: 6/12/2022, às 17:28:56














EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA POR VIDEOCONFERÊNCIA DE 06/12/2022

Apelação Nº XXXXX-64.2021.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

PRESIDENTE: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

PROCURADOR (A): MONIKA PABST
APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária por Videoconferência do dia 06/12/2022, na sequência 102, disponibilizada no DJe de 18/11/2022.
Certifico que a 2ª Câmara de Direito Público, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECLAMO E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO PARA TÃO-SOMENTE PARA POSTERGAR O PRAZO DE PUBLICAÇÃO DO EDITAL PARA 180 DIAS APÓS A APROVAÇÃO DA LEI; E ESTABELECER O TETO MÁXIMO DA MULTA COMINATÓRIA EM R$ 500.000,00 (QUINHENTOS MIL REAIS).

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA
Votante: Desembargador CARLOS ADILSON SILVAVotante: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETOVotante: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZ
NATIELE HEIL BARNISecretário
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-sc/1718830401/inteiro-teor-1718830412

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