Banco do Brasil é condenado a reintegrar empregada discriminada por ter depressão
Uma funcionária do Banco do Brasil, demitida em virtude de debilitado estado de saúde, obtém na Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho a manutenção da decisão que manda reintegrá-la ao emprego, porque sua dispensa foi julgada ato discriminatório. Após trabalhar por 14 anos para a empresa, recebendo as melhores avaliações, a bancária começou a sofrer de depressão no ano anterior a sua demissão, período em que se submeteu a tratamento e esteve algum tempo afastada do trabalho por recomendação médica.
O preposto do banco afirmou que a trabalhadora foi dispensada porque o seu desempenho funcional era inferior ao estabelecido pelos padrões da administração, mas, na avaliação do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC), que determinou a reintegração, a redução da produtividade ocorreu devido à doença. Pelo que registrou o Regional, a funcionária passou a sofrer de depressão, caracterizada por distúrbios psicológicos sérios, a partir de julho de 2000. Desde então, seus superiores hierárquicos começaram a persegui-la, desqualificando-a, com o intento de demiti-la. Isso caracterizou o ato discriminatório, nos termos do artigo 4º , inciso I , da Lei nº 9.029 /1995 , que proíbe práticas discriminatórias no trabalho.
A 2ª Vara do Trabalho de Blumenau, onde foi ajuizada a ação, havia indeferido o pedido de reintegração, mas o TRT reformou a sentença, por dois motivos: ato discriminatório e ausência de motivo para o ato da despedida, condição necessária por se tratar de sociedade de economia mista. O Banco recorreu da decisão ao TST, que rejeitou o recurso e manteve a reintegração.
Para o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, relator, a argumentação do banco de que não há provas de que a trabalhadora foi demitida em razão da doença não procede, pois, de acordo com o acórdão regional, os documentos juntados pela autora - exames, atestados e receitas médicas - revelam que suas condições de saúde não eram boas. As provas apresentadas foram contrárias ao que mostrava o atestado de saúde ocupacional de abril de 2001, emitido para a dispensa, o qual assegurava que a bancária estava em perfeitas condições para o trabalho.
(RR - 1570/2001-018-12-00.9)
Leia, abaixo, a íntegra da decisão:
"NÚMERO ÚNICO PROC : RR - 1570/ 2001-018-12-00
PUBLICAÇÃO: DJ - 26/09/2008
A C Ó R D Ã O
6ª Turma
RECURSO DE REVISTA. DISPENSA IMOTIV A DA. ATO DISCRIMINATÓRIO.
SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. Diante do teor do decisum regional, que
manteve a decisão que determinou a reintegração da e m pregada no emprego,
não só pela n e cessidade de motivação do ato de di s pensa, como também
em face da prova de que a demissão se deu por ato di s criminatório, não
há como viabilizar o conhecimento do recurso de revista por contrariedade
com a Orientação Jurisprudencial 247 da C. SDI , dest a cando-se que a
reintegração se deu também pela nulidade de dispensa da autora, em face do
estado debilitado de saúde, aplicando por analogia o art. 4º, inciso I, da
Lei 9029 /95 , remetendo a v. decisão que a autora trabalhava desde 1986 e
que anterio r mente aos problemas de saúde não co n ta que tivesse
qualquer tipo de pr o blema que justificasse sua despedida. Decisão em
sentido contrário implica reexame do conjunto fático-probatório,
impossível nesta instâ n cia recursal, a teor da Súmula nº 126 do C. TST .
Recurso de revista não c o nhecido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de R e curso de Revista nº
TST-RR-1570/2001-018-12-00.9 , em que é Recorre n te BANCO DO BRASIL
S.A. e Recorrida MARLI PEREIRA .
O Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região deu provimento ao
recurso ordinário interposto pelo reclamante para anular o ato demissional
e determinar a sua reintegração no emprego com o pagamento dos salários
vencidos e vincendos, conceder os ben e fícios da assistência judiciária e
honorários advocatícios no pe r centual de 15% sobre o valor líquido
encontrado em execução e, ai n da, excluir da condenação a penalidade por
litígio de má-fé.
O reclamado interpôs embargos de declaração, que foram acolhidos para
explicitar que não se trata de investidura em cargo ou emprego e que a
reintegração da reclamante foi deferida com fundamento na Lei nº 9.029 /95 ,
que é compatível com a do parágrafo 1º do artigo 173 da Constituição Federal (fls. 779/781).
Inconformado, o reclamado interpõe recurso de r e vista às fls. 783/799.
Suscita negativa de prestação jurisdicional, sob o argumento de que não
obstante a oposição de embargos de decl a ração, o Eg. Tribunal Regional
não se pronunciou quanto à aplicação do artigo 173, § 1º, inciso II, e 37,
inciso II, da Constituição Federal , por tratar-se de sociedade de
economia mista sujeita ao mesmo regime jurídico das empresas privadas.
Aponta violação dos artigos 5º, inciso LV, e 93, inciso IX, da Constituição Federal , 458 do CPC e 832 da CLT . No mérito, insurge-se
quanto à estabilidade concedida à sociedade de economia mista, a
determinação de reintegração do r e clamante.
O recurso de revista foi admitido às fls. 805/807, por contrariedade com
a Orientação Jurisprudencial nº 247 da SBDI-1 do C. TST quanto a nulidade
da dispensa e reintegração do reclama n te.
Contra-razões foram apresentadas às fls. 809/820.
Os autos não foram enviados ao Ministério Público do Trabalho diante da
inexistência de interesse público.
É o relatório. V O T O I - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
RAZÕES DE NÃO-CONHECIMENTO
Suscita o reclamado negativa de prestação jurisd i cional, sob o
argumento de que não obstante a oposição de embargos de declaração, o Eg.
Tribunal Regional não se pronunciou quanto à aplicação do art. 173, § 1º,
inciso II, e 37, inciso II, da Constituição Federal , por tratar-se de
sociedade de economia mista sujeita ao mesmo regime jurídico das empresas
privadas. Aponta violação dos artigos 5º, inciso LV, e 93, inciso IX, da Constituição Federal , 458 do CPC e 832 da CLT .
Cumpre esclarecer, de início, que a Orientação Jurisprudencial nº 115
pacificou o entendimento de que somente se a d mite o conhecimento do
recurso quanto à preliminar de nulidade por negativa de prestação
jurisdicional, quando indicada a violação do artigo 832 da CLT ; do artigo 458 do CPC ou do artigo 93 , inciso IX , da Constituição Federal , razão por
que não será analisada a indicada violação do inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal .
Não se verifica negativa de prestação jurisdici o nal. O Eg. Tribunal
Regional, em resposta aos embargos e declaração opostos pelo reclamado,
prestou esclarecimentos no sentido de que a reintegração foi deferida com
fundamento na Lei nº 9.029 /95 , e que não há incompatibilidade entre essa
norma legal e a insculpida no parágrafo 1º do artigo 173 da Constituição Federal (fl. 781).
Assim, a decisão, mesmo que contrária ao interesse da recorrente,
apresentou solução judicial para o conflito, config u rando-se efetiva
prestação jurisdicional, não havendo se falar em ofensa ao dispositivo
constitucional indicado.
Não conheço.
II - REINTEGRAÇÃO. DESPEDIDA IMOTIVADA. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA.
RAZÕES DE NÃO-CONHECIMENTO
O Eg. Tribunal Regional da 12ª Região determinou a reintegração do
reclamante ao quadro de empregados do reclamado, sob o seguinte
fundamento:
(...)
Informa a autora, na inicial que, a partir de julho de 2000, passou a
sofrer de depressão, caracterizada por distúrbios psicológicos sérios. A
pa r tir de então, os seus superiores hierárquicos começaram a
persegui-la, de s qualificando-a, com o intento de demiti-la injustamente.
(...)
Todos os documentos juntados pelo demandado com a defesa, visa n do a
justificar a demissão da reclamante, forram impugnados (fls. 551/563).
Os documentos juntados pela autora às fls. 30/128, principalmente os
exames, atestados e receitas médicas, ignorados pelo reclamado, são rev e
ladores de que as condições de saúde da demitida não eram tão boas quanto
o recorrido sustenta.
(...).
Efetivamente, os autos permitem reconhecer que a reclamante foi demitida
em virtude de seu debilitado estado de saúde (documentos de fls. 30/128),
caracterizando ato discriminatório que enseja a aplicação analóg i ca da
Lei nº 9.029 /95 . Tal assertiva resulta da análise da vida funcional da
reclamante e do depoimento do preposto quando afirma que a autora foi
dispensada porque seu desempenho funcional era inferior ao estabelecido
pelos padrões de administração .
Ora, a reclamante, desde a sua admissão até ser acometida da doença
noticiada, segundo demonstram os autos, não praticou qualquer ato caract e
rizador de deficiência no desempenho funcional.
Admitindo-se como verdadeira a alegação contida no depoimento do
preposto, a redução da produtividade ocorreu em virtude da doença sob e
jamente demonstrada nos autos.
(...). A reclamante foi vítima de ato discriminatório, sendo nula, por
isso, a demissão, nos termos do art. 4º , inc. I , da Lei nº 9029 /95 .
Por outro lado, ainda que não estivesse caracterizado o ato discriminatório, o reclamado, empresa de economia mista, não motivou o ato da
despedida, o que compromete a sua validade, porquanto se trata de empr e
gada contratada após prévia aprovação em concurso público.
O Banco, na qualidade de empresa de economia mista, deve pautar seus atos
dentro dos princípios constitucionais que norteiam a administr a ção
pública, ainda que o regime jurídico adotado seja o celetista.
Nesse passo, assim como a investidura dos seus servidores somente pode
ocorrer mediante a prévia aprovação em certame público, a demissão somente
pode ser efetivada após a regular apuração de eventuais falhas, insuficiências ou crimes praticados no desempenho das atividades profissi o
nais, sempre observado o direito de ampla defesa, ainda que se trate de servidor não estável.
Deriva a declaração de nulidade da despedida por ato discriminatório e
imotivado o reconhecimento do direito da reclamante à reintegração, como
uma conseqüência lógica. Defiro, também, o pagamento dos salários vencidos
e vincendos, a contar da data da despedida. (fls. 762-763)
Nas razões de recurso de revista, o reclamado insurge-se contra a v.
decisão recorrida que declarou nula a dispensa do autor, nos termos da Lei
nº 9.029/95 , e condenou-o a reintegrá-lo no emprego. Aduz que se trata de
sociedade de economia mista e que, nos termos do artigo 173, § 1º, inciso II, da Carta Magna , sujeita-se ao regime jurídico das empresas privadas,
não havendo de se falar em estabilidade do reclamante no emprego. Invoca a
aplicação indevida do artigo 4º , inciso I , da Lei nº 9.029 /95 . Aponta
violação dos artigos 333 , inciso I , do CPC , 818 , 2º e 477 da CLT e 5º ,
inciso II, 7º, 37, inciso II, e 173, § 1º e II, da Constituição da
República e contrariedade com a Orientação Jurisprudencial nº 247 da
SBDI-1 do C. TST. Transcreve divergência jurisprudencial.
Sem razão o reclamado.
Conforme se extrai do v. acórdão recorrido, A reclamante foi vítima
de ato discriminatório, sendo nula, por isso, a demissão, e o
reclamado, empresa de economia mista, não motivou o ato da despedida, o
que compromete sua validade .
Observa-se que a nulidade da demissão da autora se deu por dois
motivos: ato discriminatório e ausência de motivo para o ato da despedida.
Esta C. Corte vem entendendo, por meio da Orientação Jurisprudencial nº
247 da SBDI-1 , que a despedida de empregados de empresa pública e de
sociedade de economia mista independe de ato motivado:
"SERVIDOR PÚBLICO. CELETISTA CONCURSADO. DESP E DIDA IMOTIVADA.
EMPRESA PÚBLICA OU SOCIEDADE DE EC O NOMIA MISTA. POSSIBILIDADE. Inserida
em 20.06.2001 I A despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de
economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato
motivado para sua validade;
II - omissis".
Entretanto, inviável, no caso dos autos, a aplic a ção da supracitada
orientação jurisprudencial, pois a nulidade da despedida não se deu
somente em razão de ato imotivado, mas também pela constatação do Eg.
Tribunal Regional de que a reclamante foi vítima de ato discriminatório,
pelo seu debilitado estado de saúde quando da demissão.
Não há, assim, que se falar em aplicação indevida do inciso I do artigo 4º da Lei nº 9.029 /95 , uma vez que a conden a ção se deu em consonância
com referido dispositivo, que dispõe ace r ca da opção pela reintegração
ao emprego quando a demissão se dá por ato discriminatório, caso dos
autos.
O artigo 2º da CLT trata de conceituação de empr e gador, matéria alheia
à discussão dos autos.
Também não há como se analisar a ofensa aos artigos 477 da CLT e 7º da Constituição Federal , pois o reclamado não apontou nas razões do recurso
de revista qual dispositivo dos art i gos foi violado.
Não há que se falar que ausente prova de que a demissão se deu em
razão da doença, uma vez que, de acordo com o v. acórdão recorrido, os
documentos juntados pela autora exames, atestados e receitas médicas
revelam que as condições de saúde da empregada não eram boas. Intactos os
artigos 818 da CLT e 333 , inc i so I, do CPC .
E, com relação à argüição de violação dos artigos 37, inciso II, e 173, § 1º , da Constituição Federal , esta também não procede, pois não se está a
discutir investidura em cargo ou emprego público, ou quanto ao estatuto
das sociedades de economia mista a se sujeitarem ao regime jurídico
próprio das empresas privadas; a co n denação de reintegrar a reclamante
se deu em razão da constatação de ato discriminatório praticado pela
empresa quando da demissão.
Também não impulsiona a revisão pretendida a al e gação de ofensa ao
artigo 5º , inciso II , da Carta Magna , uma vez que o Supremo Tribunal
Federal reiteradamente tem afastado a possibil i dade de ofensa ao
dispositivo em tela, pois, além de genérico, e n cerra a necessidade de
análise das normas infraconstitucionais.
E os arestos trazidos a confronto de teses, às fls. 796/798, são
inespecíficos, pois trazem somente situações em que a demissão foi
considerada legal pela constatação de que ausente a estabilidade nas
sociedades de economia mista, a permitir a di s pensa sem justa causa;
enquanto no caso dos autos há delimitação de que a demissão se deu por ato
discriminatório da empresa. Incidência da Súmula nº 296 do C. TST .
Não conheço.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho,
por unanimidade, não conhecer do recurso de revi s ta.
Brasília, 17 de setembro de 2008.
ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA
Ministro Relator"
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