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25 de Maio de 2024

Casamento Igualitário

Publicado por Loreano Goulart
há 7 anos

O presente trabalho pauta-se por expor e debater uma questão que hoje se torna imprescindível à discussão em todas as esferas, dentre elas a jurídica, que é a união homoafetiva, especialmente sob a ótica da cidadania modelando o estado. A partir da decisão do Supremo Tribunal Federal (ADPF 132 e ADI 4277) e a Resolução 175/2013 do Conselho Nacional de Justiça, ocorreu a abertura no sistema jurídico que possibilitou a união estável e o casamento civil entre casais homoafetivos. No entanto, o preconceito sofrido pela minoria homoafetiva e as dificuldades na aprovação de leis em favor dessa parcela da população são presentes no sistema legislativo brasileiro, o qual permanece inerte frente à demanda que o assunto requer. Coube, então, ao Poder Judiciário reconhecer o direito constitucional de ser igual perante a lei para essa parcela da população, mas ainda é necessário a resposta do Poder Legislativo a seus representados, os quais têm como retorno a morosidade ao invés de proteção. Trata-se, pois, o tema como “tabu”, mesmo em uma sociedade que se denomina defensora de condições não normativas e que assume não ter medo das diferenças, essa parcela da população encontra um longo caminho para que possa ser considerado apenas igual em sua condição de cidadão e respeitada em suas diferenças.

Palavras-chave: união homoafetiva, casamento civil e princípios constitucionais.

Abstract: This paper is guided by exposing and debating an issue that nowadays is indispensable to the discussion in all spheres, among them the legal, which is homo-affective union, especially from the perspective of citizenship moulding the state. From the Supreme Court decision (ADPF 132 e ADI 4277) and Resolution 175/2013 of the National Council of Justice occurred the opening in the legal system allowing stable union and civil marriage between homo-affective couples. However, prejudice suffered by the homo-affective minority and difficulties in approving laws in favor of this part of population are present in Brazilian legal system that remains silent against the requests required by this matter. Then, it was up to judiciary to recognize the constitutional right to be equal under the law to this part of population, but it is still necessary an answer from Legislative to their constituents, who have slowness in return instead of protection. So the matter treated as a "taboo", even in a society that call itself like the protector of non-normative conditions and that assumes not being afraid of differences, this population finds a long way for it to be considered just equal in their condition of citizens and respected in their differences.

Key-words: homo-affective union, civil marriage and constitutional principles.

1. Introdução

Esse artigo traz como tema as mudanças sociais e jurídicas ocasionadas a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal nos processos de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, ADPF132 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade, ADI 4277, ambas as ações referentes ao tema da união estável homoafetiva. Ademais tratou da Resolução 175 do Conselho Nacional de Justiça, a qual versa sobre a regulamentação do casamento igualitário em todo o território brasileiro, e ainda foi feita uma breve análise do projeto de lei 5120/2013 atualmente em tramitação no Congresso Nacional.

As modificações no âmbito jurídico demonstram que os efeitos da concretização da evolução jurídica da realidade social trouxeram consigo mudanças bem aceitas pela sociedade. Apoiadas nas decisões do STF, na resolução do CNJ, nos artigos jurídicos, nas sustentações orais na ADPF 132 e a ADI 4277, na doutrina e nos livros citados na bibliografia, baseou-se o presente estudo para demostrar os significativos avanços ocorridos na sociedade como um todo. Para tal, mirou-se o escopo da cidadania modelando o estado visto a inclusão no sistema jurídico do casamento civil igualitário e da união estável homoafetiva, diretamente pelas decisões dos órgãos jurisdicionais, incluindo na sistemática jurídica uma realidade social de fato.

Outrossim, ensejou-se discutir a constitucionalidade da aprovação do casamento civil homoafetivo bem como a importância de sua legalização. Além disso, debateu-se os efeitos sociais positivos e ainda os reflexos dessa mudança de paradigma na luta cotidiana contra o preconceito em face dessa minoria.

Almeja-se demonstrar que a lacuna da lei não significa a ausência de direito e que o legislador deve estar atento às modificações sociais a fim de proteger tais mudanças.

A importância da proteção estatal na diminuição do preconceito contra as minorias, comprova que ao longo do tempo é de grande contribuição para a dissolução histórica do preconceito. Contudo, evidencia-se a morosidade do Poder Legislativo, em votar projetos, que beneficie e concretize as evoluções sociais, em relação à parcela homoafetiva da população.

Demonstra-se a constitucionalidade da decisão do Supremo Tribunal Federal ao permitir a união estável e do Conselho Nacional de Justiça ao permitir o casamento civil igualitário, uma vez que a função do judiciário é praticar a justiça exercendo diversas vezes função contramajoritária de proteger minorias e garantir direitos fundamentais das minorias contra o abuso da maioria.

2. Casamento Civil e União Estável por Casais Homoafetivos

Após intenso debruçar sobre a temática e tendo consultado várias fontes verificou-se que primeiro ocorre a mudança social, depois o direito busca disciplinar essa modificação, pois nasce um fato novo e dele nasce o direito[1]. Não existe o direito sem a ocorrência do fato[2], tal situação começa a existir de fato sem a proteção direta legal. E o fato continuará a existir mesmo que não seja disciplinado pelo legislador, existindo assim uma lacuna no ordenamento jurídico. O legislador não pode se antecipar às modificações sociais, porém, cabe a ele analisar, estudar e buscar proteger os avanços sociais solidificados na vida social.

Cabe ao legislador fazer a abertura no sistema jurídico para proteger as evoluções sociais, seja estas de uma maioria ou minoria, como no caso da união homoafetiva que existindo de fato modelou o estado, e com o impulso processual através das decisões jurisdicionais, modificou e modelou o Estado e o ordenamento jurídico direto de maneira solene e oficial. Modelar que veio primeiro pelo existir o fato, que modificou o “status” de um grupo de pessoas, que fermentou e interviu na sociedade, gerando consequências e discutindo o quebrar de paradigmas e gerando um movimentar de estruturas sociais.

Sempre existirá um eterno processo de adaptação dos sistemas legais, função essa que cabe ao Congresso operar. Não pode, entretanto o Congresso Nacional[3] argumentar que não teve a oportunidade de legislar a favor de tal tema, o que pode ser evidenciado claramente pela morosidade no debate e na votação dos projetos sobre a temática ao longo dos anos.

Há vinte anos projetos de lei e propostas de emenda a Constituição tramitam nas Casas Legislativas, desde 1995, quando a então deputada federal Marta Suplicy (PT-SP) apresentou o projeto de lei 1151/95, o qual regulamentava a união civil entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. Este projeto, consequentemente, traria o “status” de um país que respeitava os direitos das minorias homoafetivas e estaria na vanguarda mundial nesse tema - o que não ocorreu não obstante ainda não se tratasse de plena equiparação jurídica com a maioria heteroafetiva, o que só foi possível com a aprovação do casamento igualitário. A Holanda seis anos depois, em 2001, tornou-se o primeiro país a aprovar um projeto semelhante e, atualmente, as palavras homo e heterossexual não são utilizadas em suas leis, prova de que a evolução social protegida pela lei foi incorporada à cultura do país, contribuindo para dissolução do preconceito.

A não-diferenciação entre pessoas pelo fato de sua orientação sexual demonstra que o avanço, ainda que não seja aprovado por uma parcela da sociedade, não pode por essa mesma parcela ser ignorado. Ora, todo o preconceito, ainda que solidificado ao longo dos anos, com a criminalização de sua expressão e com a proteção do Estado, tende ao passar dos tempos a se dissolver como ocorreu na Holanda. No Brasil, - desde 1995, o projeto de lei 1151/95 está pronto para ser votado e até o presente momento encontra-se nas gavetas do Congresso Nacional. Consta que esse projeto atualmente está desatualizado, já que a união estável igualitária reconhecida pelo STF e o casamento civil pelo CNJ, torna este projeto anacrônico, incompatível com a igualdade jurídica, mas mesmo assim ele foi um paradigma da inércia do Legislativo na regulamentação do tema, sendo o atual projeto de lei 5120/2013 mais compatível com as modificações sociais e jurídicas ocorridas.

O também ex-deputado federal José Genoíno (PT-SP) já havia apresentado, em 1991, uma proposta de emenda à Constituição que, - em suma, reconheceria expressamente o direito à livre orientação sexual, e esta emenda foi rejeitada pelo Congresso Nacional. Atualmente o projeto de lei 5120/2013, de autoria dos deputados Jean Wyllys (PSOL- RJ) e Érica Kokay (PT – DF), está em tramitação no Congresso Nacional e este projeto tende disciplinar o casamento civil e a união estável no Código Civil, reconhecendo a isonomia jurídica desses institutos no tocante a essas duas formas de relacionamento.

Coube, então, ao Judiciário, na ADPF 132 e na ADI 4277, dar uma resposta à população LGBT, e qual deveria ser a resposta dos ministros a essas ações? Segundo a Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, no seu artigo 4o: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito[4]”. A omissão da lei é clara e ainda hoje latente. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal, que são os guardiões da Constituição segundo dispositivo constitucional expresso (art. 102 CF), deram uma resposta a essas ações, utilizando-se dos princípios constitucionais e também do citado artigo da LINDB para dar uma decisão à ADPF e a ADI.

Apresenta-se a seguir alguns dos argumentos que justificam a legalidade e constitucionalidade da decisão do STF, a qual permitiu a união estável, e a resolução do CNJ, a qual regularizou o casamento civil igualitário:

A função do Poder Judiciário de garantir os direitos fundamentais das minorias contra as arbitrariedades das maiorias, decidindo mesmo contra a vontade das maiorias, o atual Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso perguntado uma vez sobre decisões contramajoritárias assim disse:

“O papel contramajoritário de uma Corte Constitucional sempre pode ser exercido. Se numa sala houver oito cristãos e dois muçulmanos, os oito cristãos não podem deliberar jogar os dois muçulmanos pela janela. Por quê? Porque a vida democrática não é feita só das maiorias políticas. A vida democrática também é feita da preservação dos direitos fundamentais de todas as pessoas, inclusive das que integram as minorias”. Os Constitucionalista. Conversas Acadêmicas: Luís Roberto Barros[5].

O artigo , inciso II, da Constituição Federal diz que: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei[6]. Assim não podemos negar a possibilidade do entendimento ser reconhecido como uma cláusula de abertura. Cláusula utilizada na fundamentação das decisões, pois se ninguém está obrigado a fazer algo senão em virtude de lei, direitos podem ser reconhecidos a despeito da ausência de previsão legal que os reconheça. Com isso sempre é possível agregar direitos ao patrimônio subjetivo do cidadão, sempre acrescendo e nunca abatendo, Paulo Alexandrino assim destaca sobre a cláusula de abertura:

“Fica patente serem os direitos fundamentais uma categoria aberta, pois incessantemente completada por novos direitos; e mutável, pois os direitos que a constituem têm alcance e sentido distintos conforme a época que se leve em consideração. Com isso, a enumeração dos direitos fundamentais na Constituição da República de 1988 não é fechada, exaustiva, podendo ser estabelecidos outros direitos fundamentais no próprio texto constitucional ou em outras normas (PAULO; ALEXANDRINO, 2009, p. 104)

A inércia do Poder Legislativo: conforme já destacado, o legislador, por mais de uma vez, teve a oportunidade de pronunciar e legislar sobre o tema, mas preferiu se calar ao invés de dar uma resposta a essa modificação social. Como se trata de tema relativo a direitos fundamentais, coube ao Judiciário garantir o respeito dos direitos da minoria homoafetiva, a despeito da omissão legal;

Os princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana e da liberdade garantem proteção constitucional às minorias. Afinal, não faz sentido negar direitos a casais homoafetivos quando eles são concedidos a casais heteroafetivos, logo, essa negativa de direitos viola o princípio da isonomia. Ademais, negar aos homoafetivos o que se concede aos heteroafetivos implica classificá-los como inferiores a estes, o que viola o princípio da dignidade humana. Limitar a possibilidade de constituir família com pessoa do mesmo sexo viola o direito fundamental à liberdade.

Destaca-se ainda a importância da legalização[7] do casamento civil igualitário, pois esta ocorre não somente pela necessidade de uma resposta do legislador a sociedade brasileira, como também se faz necessária para que os avanços conquistados pela minoria homoafetiva possam ser positivados e consolidados dentro da sociedade. Outrossim a discussão de um projeto de lei, versando essa matéria supramencionada, no Congresso, traz para a sociedade um amplo debate, o qual demonstrará que os casais homoafetivos são “tão normais e iguais” como os demais casais, debate esse de grande contribuição para a dissolução histórica do preconceito.

Bruno Bimbi, em seu livro Casamento Igualitário[8], parafraseia a filósofa Hannah Arendt a qual dissertava sobre a importância do reconhecimento ao casamento civil inter-racial, visto que a alteração legislativa contribuiria para que o casamento inter-racial fosse encarado de uma forma “normal” e que houvesse uma plena aceitação e inclusão social. Essa aceitação ocorreu e atualmente o preconceito relativo a casais inter-raciais foi dissolvido e permanece apenas na história a lembrança do preconceito, o que se comprova historicamente em países como o Estados Unidos da Américas e na África do Sul, onde o processo legislativo e o sistema jurídico eram ferramentas discriminatórias. Com a modificação dessas normas do sistema jurídico, fez que avançasse o respeito as diferenças e fortemente contribuiu para dissolução do preconceito.

Observa-se também que nos países que tiveram a aprovação do casamento civil igualitário – entre eles a Argentina, Uruguai e a Inglaterra - a abertura para o casamento civil ocorreu através das ações do Poder Legislativo, exercendo o papel de representante da população como um todo.

No Brasil o casamento igualitário só foi possível graças à resposta dada à luta dos grupos LGBT pelo Poder Judiciário, pois talvez temeroso pelas críticas de grupo considerados fundamentalistas, o Legislativo preferiu calar-se a dar uma resposta efetiva e justa para a causa homoafetiva brasileira.

Outra observação que se faz sobre a decisão do STF na ADPF 132 e na ADI 4277[9] é que esta pontua que a união estável homoafetiva deverá seguir as mesmas regras e consequências da união estável heteroafetiva, não permitindo assim uma diferenciação entre a união heteroafetiva e homoafetiva. Reconhece-se, assim, que a união estável é um instituto uno, seja quando formado por homoafetivos ou heteroafetivos.

Ora, a união estável foi criada pela Constituição para a proteção da família, devendo ser facilitada a conversão da união estável em casamento. Seria uma continuidade do preconceito haver apenas uma “meia permissão”, traindo-se assim o objetivo da norma que nasceu para acolher as famílias em sua maioria formada em segunda união, retornando ao pensamento de que: “Todos são iguais, mas alguns são mais iguais do que outros[10]. Haveria, destarte, uma disparidade com a Declaração Universal dos Direitos Humanos no artigo 1º a qual aduz que: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”. Se todos são iguais, não deve, pois, haver diferenças para as mesmas coisas, portanto a resolução do CNJ, frisa-se que possibilitou o casamento civil, vem para complementar à decisão do STF.

Na Espanha, em Portugal e na Argentina grupos conservadores argumentavam que os LGBT’S tinham direito a uma união civil, mas não como o nome de “matrimônio” ou “casamento” e sim outro nome para diferenciar da união heterossexual. Nesses três países houve a proposta de não aprovar um casamento/matrimônio homoafetivo, mas uma “união civil”, contudo, se a luta é por direitos iguais, os militantes responderam dizendo que todos devem ter o mesmo direito como o mesmo nome. Esse lema foi incorporado também pelos deputados que apresentaram a proposta de lei do casamento civil igualitário, na campanha pela aprovação da PL 5120/2013.

A luta do casamento civil igualitário é a luta das inquietações, é a luta pela igualdade para que o amor possa ser vivido e não existe diferença no amor, seja ele entre pessoas de sexo oposto ou de sexo igual. O casamento se tornou antes de tudo uma união que tem como meta a felicidade[11] e não mais apenas como uma união com fins estritamente procriativo e financeiro – pensamento esse o qual traz ao casamento uma visão reducionista ao um mero contrato, voltando assim a ideia de família que se une com fins estritamente patrimoniais.

Algumas pessoas argumentam que o casamento civil homoafetivo iria exterminar com a “família tradicional”, baseada nos ensinamentos bíblicos[12], de bases hierárquico-patriarcais. Ora, isso é totalmente irracional, pois com amparo de mais famílias protegidas pelo casamento, a família que é a célula mater da sociedade, torna-se mais forte.

Atualmente está em tramitação na Câmara dos Deputados o projeto de lei 6583/2013 de autoria do Dep. Anderson Ferreira (PR/PE), no qual em seu artigo 2º denomina família como: “núcleo social formando por homem e mulher”. Trazendo assim uma interpretação restritiva do conceito de família[13]. O projeto traz ainda uma série de medidas para o fortalecimento da família descrita no projeto. A interpretação de família como homem e mulher, constituídos a partir do casamento ou da união estável, excluiria diversos grupos familiares, entre eles as famílias monoparental o que afronta o artigo 226, § 4 da Constituição Federal de 1988: “Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

Antes do advento da Constituição de 1988 e da lei do divórcio[14] de 1977, muitas famílias existiam de fato, mas não possuíam a proteção do legislador, e quando começaram os movimentos a favor da aprovação do divórcio no Brasil o mesmo argumento foi utilizado. O tempo demonstra que a ampliação da proteção às famílias fortalece a sociedade ao invés de exterminá-la.

Dizer que existe apenas um modelo de família “certa” e dizer que todas as outras estão “erradas”, ou ainda determinar uma hierarquia entre os modelos é afirmar que sempre haverá o preconceito. Lembremo-nos do estudioso Conde Arthur de Gobineau, em seu estudo Ensaio sobre a desigualdade das raças humanas[15], afirmava que existia uma supremacia entre as ”raças humanas” e que a miscigenação nem deveria ocupar espaço na hierarquia racial. Ademais o estudioso asseverava que mistura entre as “raças” era responsável pelo fim de vários impérios, entre eles o Império Romano, e essa mistura também acabaria com a população brasileira, sendo esta enfraquecida a cada geração, rumo à extinção da espécie humana no Brasil. Contudo, o que foi demonstrado pela história e pela ciência com o passar dos anos foi justamente o contrário: que a variação e a miscigenação fortaleceram o Brasil e o fez um país rico geneticamente.

Ora, o mesmo argumento é utilizado ainda hoje para criticar o casamento igualitário, o qual procura criar uma hierarquia entre o casamento civil heteroafetivo e homoafetivo. Quanto maior é a diversidade entre as famílias na sociedade, melhor ela será. Ainda mais irracional é dizer que o casamento civil homoafetivo irá acabar com a sociedade, pois quanto mais famílias o Estado proteger mais forte será a sociedade – e evidentemente heterossexuais e casais heteroafetivos não deixarão de existir com a regulamentação do casamento civil homoafetivo. Existindo assim uma irracionalidade matemática, pois o aumento da proteção e ampliação dos direitos a mais grupos nunca significará uma diminuição social, antes porém, resultará em uma sociedade mais forte.

Caso se conjecture o pensamento de que a base necessária é a “igualdade” com todos similares a bonecos pré-moldados, nos quais não cabe nenhuma diferença, seja esta de caraterísticas físicas, religiosas e mais especificamente afetivas, encontrar-se-á um mundo no qual não haverá a possibilidade de um mundo diverso, comprável ao um quadro, onde não há presença de cores múltiplas, mas apenas um tom. Tudo será monocromático e os que destoarem ou forem coloridos estarão errados, pois tudo o que estiver fora desse conceito pré-moldado, no qual todos devem ser de tal cor, seguir tal religião e amar o que for estabelecido. Em suma, voltando ao pensamento que o nazista Adolf Hitler tanto quis concretizar, de exterminar os diferentes e cultivar os “iguais”, enquanto aqueles que estiverem no “padrão” estabelecido por tal grupo social permanecerão e os que forem diferentes deverão simplesmente desaparecer sem nenhuma explicação lógica, apenas um fundamentalismo absurdo

O filosofo Kant em suas obras como a Metafisica dos Costumes[16] sempre defendeu que o ser humano deve ser tratado com um fim em si mesmo, e nunca como meio[17]. Cada individuo é único, impossível de ser copiado, e respeitar suas diferenças é respeitar a humanidade. Todos devem ser respeitados e possuir os mesmos direitos, nesse sentido a base da ética kantiana e cristã aduz que se deve tratar os outros da mesma forma que se almeja ser tratado, ou seja, igual enquanto ser humano, diferente enquanto individuo, como ser único, obra-prima de valor inestimável, digno.

Não é a diferença que caracteriza a raça humana? Não são as diferenças que distinguem os indivíduos nas multidões? “Se foi para diferenciar que Deus criou a diferença, que irá nos aproximar intuir o que Ele pensa? Se cada ser é só um, e cada um com sua crença, tudo é raro, nada é comum[18]. O aprendizado de convivência com o diferente é também a aceitação com as nossas próprias diferenças. Trilhar-se-á o caminho para a socialização pacífica quando se respeitar e se considerar que o direito começa onde termina o dos outros, não importando as diferenças. Será que se chegará então a uma sociedade fraterna e justa? Não existe uma igualdade de direitos e deveres para com todos? Infelizmente essas questões acabam sendo sempre respondidas concretamente inferiorizando os diferentes e marginalizando os que se expressam contra a desigualdade, o sociólogo Boaventura de Souza Santos lembra que:

"Temos o direito a ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito a ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades." Santos, Boaventura de Sousa. Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Introdução: para ampliar o cânone do reconhecimento, da diferença e da igualdade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, página 56.

3. Justificavas apresentadas no projeto de lei 5120/2013

Apresentar-se-á uma sucinta análise e resumo dos argumentos apresentados no texto justificador do projeto de lei 5120/2013, apresentado na Câmara dos Deputados.

O projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional, tendo como a Casa iniciadora à Câmara dos deputados, através da iniciativa dos deputados Jean Wyllys (PSOL/RJ) e da deputada Érica Kokay (PT/DF), busca a alteração dos artigos 551, 1.514, 1.517, 1.535, 1.541, 1.565, 1.567, 1.598, 1.642, 1.723 e 1.727 do Código Civil, visando inovar as regras referentes ao casamento civil. A principal mudança nos textos dos artigos ocorre com alteração das palavras homem e mulher para pessoas ou cônjuges.

O texto de justificativa para a alteração do Código Civil começa com os versos do poeta Carlos Drummond de Andrade de 1920, no qual o poeta começa a se questionar sobre o sufrágio feminino e a ocupação da presidência por uma mulher, o que naquela época era inconcebível, trazia consigo um estigma e preconceito tão natural e presente na sociedade como vemos atualmente com o casamento igualitário e as minorias homoafetivas. O voto feminino após grande luta foi promulgado no Código Eleitoral de 1932, eliminando parcialmente a diferenças; o voto não era obrigatório e a presidência só foi ocupada por uma mulher eleita em 2010.

O texto justificador apresenta ainda uma analogia entre as conquistas dos movimentos femininas, dos negros, dos que professam uma religião ou de etnia que são minoritárias, com o que os homossexuais e tantos outros grupos que são vitimas do preconceito sofrem com a crueldade da maioria ao longo da história humana.

Destaca-se o artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”, da qual o Brasil é signatário. Bastaria esse artigo para justificar a necessidade dessas alterações no texto normativo, mas as desigualdades aceitas pelas leis e pelo senso comum dominante são presentes em diversos momentos da história e ainda é aceita em nosso país.

O reconhecimento das situações discriminatórias é prejudicado por uma banalização do preconceito, fazendo que pessoas e situações acabem ficando invisíveis a sociedade e a lei. Com essa discriminação cria-se uma falsa certeza de que a forma correta de tratar as pessoas é utilizar de uma desigualdade sem motivos, em contrate com o princípio da igualdade entre todos. Talvez o inferno para aqueles que possuem preconceitos é saber que todos somos iguais.

A proibição do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo é uma evidente violação aos direitos humanos, especialmente ao direito a igualdade. A exclusão desse grupo ocorre da mesma forma que aconteceu em relação a vedação ao voto feminino, a proibição do casamento inter-racial, a segregação de brancos e negros, a perseguição aos judeus e tantas outras formas de discriminação e violência que apareceram de forma evidente ao longo do tempo.

Se hoje o voto feminino e todas as proibições citadas, foram extintas da sociedade, o mesmo vem ocorrendo em países que o casamento homoafetivo foi aprovado, ficando com o tempo apenas a lembrança de que um dia já fora proibido. O escritor argentino Osvaldo Bazán exemplifica uma caraterística que faz com que o preconceito aos homossexuais seja peculiar:

“A criança judia sofre a estupidez do mundo, volta para casa e lá seus pais judeus lhe dizem: ‘estúpido é o mundo, não você’. E lhe dizem por que essa noite não é como todas as noites, e contam para ele a história daquela vez em que tiveram que sair correndo e o pão não levou. Dão-lhe uma lista de valores e falam: ‘Você está parado aqui’. E saberá a criança judia que não está sozinha. A criança negra sofre a estupidez do mundo, volta para casa e lá seus pais negros lhe dizem: ‘estúpido é o mundo, não você’. E lhe falam do berço da humanidade, de um barco, de uma guerra. Dão-lhe uma lista de valores e falam: ‘Você está parado aqui’. E saberá a criança negra que não está sozinha. A criança homossexual sofre a estupidez do mundo e nem pensa em falar com os pais, porque supõe que eles vão ficar chateados. Não sabe por quê, mas eles vão se chatear. E para seus pais, o pior é crer que seu filho não é como eles (...). A criança homossexual, só por ter nascido homossexual, só por ter sido parida em território inimigo, está em guerra com a religião, com a ciência e com o Estado. Como poderá uma criança enfrentar uma luta tão desigual?”.[19]

Os grupos minoritários que sofrem com a discriminação vivem em constante luta pelo mundo inteiro, para ter garantido direitos básicos como: o direito à vida, à integridade física, à liberdade, à igualdade e a liberdade. O nosso país teve alguns avanços que foram conquistados na última década, mas ainda hoje vemos dados do Grupo Gay da Bahia que demonstram que um homossexual é morto a cada dois dias em razão de crime de ódio. Ora a luta pelo casamento civil igualitário não é restrita apenas à conquista desse direito, mas sim é também uma luta pelo reconhecimento social e politico da dignidade da pessoa humana das pessoas homossexuais. É uma luta cultural e simbólica com efeitos a serem vistos não somente em curto prazo, pois se o casamento civil é a realização formal de direitos, a curto e médio prazo o casamento igualitário não mais será visto com algo diferenciado, mas sim de forma incorporada à sociedade e às futuras gerações, combatendo o preconceito.

O juiz da Suprema Corte argentina Raùl Zaffarone acredita que o direito ao casamento entre homossexuais envolve outros tantos direitos e que a violência gerada pela discriminação põe em risco não somente as pessoas homossexuais, mas o conjunto das suas relações. Deve-se lembrar que da mesma forma que se hoje o preconceito é focado em um grupo pelo fato de duas pessoas do mesmo sexo se amarem e quererem respeito, amanhã poderá haver, sem nenhuma explicação, a direção do preconceito a outras minorias.

O desrespeito às legislações internacionais referentes aos Direitos Humanos justifica a imposição feita pelo Superior Tribunal Federal ao Congresso Nacional na necessidade de legislar sobre a união estável em todas as suas prerrogativas (ADPF 132 e ADI 4.277). São esses os diplomas normativos internacionais: a Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigos 1, 2 e 7); a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (artigo II); o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (artigos 2 e 26); a Convenção Americana sobre Direitos Humanos artigo I e o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (artigo 2).

Somos diferentes e ao mesmo tempo somos iguais, porque a igualdade à que se referem os tratados não se opõe à diferença, mas à desigualdade, como escreveu o juiz Zaffaroni no seu projeto de sentença sobre a constitucionalidade do casamento homoafetivo:

“A diferença é uma feliz característica dos seres humanos e seu reconhecimento é a base do princípio de igualdade e não discriminação. Distingue-se nitidamente da igualação, que é a pretensão autoritária ou totalitária de uniformização de um grupo humano, ou seja, o desconhecimento das diferenças. Toda igualação postula a inferioridade humana daqueles que permanecem diferentes e implica numa plataforma de hierarquização de seres humanos, pois dela se deriva que os diferentes ou inferiores devem se submeter à disciplina dos superiores igualados ou passam a ser inimigos”[20].

Com base no principio da igualdade, e antes da aprovação da lei do “matrimônio igualitário” em julho de 2010 na Argentina, a juíza Gabriela Seijas explica na primeira sentença que possibilitou o casamento igualitário na Argentina em 2009:

“O direito à igualdade supõe previamente o direito a ser quem se é e a garantia de que o Estado apenas intervirá para proteger essa existência e para contradizer qualquer força que tente cerceá-la ou regulá-la severamente. Não se é igual na medida da lei, mas perante ela; a lei não deve discriminar entre as diferenças de um habitante e outro, mas deve tratar a cada um com igual respeito em função de suas singularidades, sem necessidade de entendê-las ou regulá-las”[21]

Haveria, desse modo, uma diferença muito grande entre a igualdade formal e a igualdade material, sendo que os homossexuais não possuem igualdade nas duas esferas, o que é claramente demostrado pela história e por uma simples análise sociológica e jurídica das leis em favor da população LGBT. Se todos são iguais - ou deveriam ser - no ordenamento jurídico essa igualdade também deveria ser presente na sociedade e no tratamento estatal.

O fato dos homossexuais estarem privados do acesso ao casamento, segundo a juíza Gabriela Seijas, tem consequências negativas não somente em termos quantitativos ou monetários, mas também em termos qualitativos na questão do respeito social e assim os homossexuais teriam um status de seres humanos menos valiosos e menos iguais.

Hannah Arendt, num artigo[22] publicado em 1959 que tratava da discriminação contra os negros no sistema educativo, disse que não era nesse terreno em que devia se livrar a batalha, mas na proibição do casamento interracial, porque “o direito de casar com quem a gente quiser é um direito humano elementar”. Seja por qual motivo se fundamenta uma proibição preconceituosa, sempre será uma ofensa à dignidade da pessoa humana.

No passado havia uma proibição ao casamento entre brancos e negros nos EUA e fora até justificada com as seguintes palavras: “Deus todo-poderoso criou as raças branca, negra, amarela, malaia e vermelha e as colocou em continentes separados. O fato de Ele tê-las separado demonstra que Ele não tinha a intenção de que as raças se misturassem[23]. Muitos chegaram a alegar que o casamento interracial era uma ofensa ao Criador, utilizando dessa proposição para “criticar” o casamento civil igualitário. Contudo tais pessoas não contemplam que o Projeto de Lei não tem a mínima intenção de modificar o casamento religioso consagrado pela Carta Magna, a qual protege as liturgias e dá total liberdade às religiões de celebrarem o casamento religioso. Frisa-se que o casamento religioso tem o mesmo reconhecimento quando solicitado pelos cônjuges como casamento civil[24], sendo que o casamento civil é uma instituição laica que deve atender a todos indiferente da sua manifestação religiosa[25].

Nas palavras do ex-ministro do Superior Tribunal Federal, Ayres Britto, no julgamento da ADPF 132 e ADI 4.277 que reconheceu o regime jurídico de união estável às relações duradouras entre pessoas do mesmo sexo:

“(...) isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família [...] Pena de se consagrar uma liberdade homoafetiva pela metade ou condenada a encontros tão ocasionais quanto clandestinos ou subterrâneos. Uma canhestra liberdade “mais ou menos”.[26]

A “união civil”, como uma possível instituição alternativa ao casamento civil, destinada aos casais homossexuais, traria uma opção inspirada no pensamento “iguais, mas separados”, que serviu para justificar as leis racistas que vigoraram até as décadas de 1950 e 1960 em alguns estados dos EUA. No caso PLESSY Vs. FERGUSON em 1896, por exemplo, a Corte Suprema dos Estados Unidos convalidou uma lei da Luisiana que estabelecia assentos separados para brancos e negros nos ônibus alegando que, desde que os assentos de uns e outros fossem do mesmo tipo e qualidade, não violavam o princípio de igualdade perante a lei. Essa doutrina manteve-se até meados do século XX e agora parece ressuscitar nos discursos de alguns dos opositores ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Dividindo por nomes para mostrar que uns são mais iguais que outros e que essa igualdade deve a todo custo ser demostrada e nomeada. Exercendo que os “menos iguais” podem ter os mesmos direitos que os “mais iguais” desde que andem separados e não convivam[27].

Outro argumento que alguns grupos suscitam contra o casamento igualitário é a referente à “função” procriativa do casamento que e logo não haveria no casamento homoafetivo. Porém se a luta é pela igualdade deve- se usar os mesmos requisitos que são utilizados no casamento civil heterossexual. Não existe a necessidade de um exame prévio de fertilidade ou a possibilidade de uma ação pelo Ministério Público de anulação do casamento se após um tempo o casal não cumprir como a função de gerar filhos dessa relação. As pessoas indiferentes da sua afetividade casam-se porque se amam, têm um projeto de vida em comum e querem receber a proteção que a lei garante aos cônjuges. Algumas pessoas casam e nunca procriam, porque não podem ou não querem, enquanto outras têm vários filhos sem nunca se casarem.

Ainda haverá quem defenda que a proibição do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo não viola o direito ao casamento reconhecido nos tratados internacionais de direitos humanos e na Constituição Federal, nem contradiz o princípio de igualdade perante a lei, já que as pessoas homossexuais têm a mesma possibilidade que as pessoas heterossexuais: elas podem casar com alguém do sexo contrário. No entanto, constitui uma incoerência que contraria o princípio da realidade dado as pessoas homossexuais desejam, apaixonam-se e constroem projetos de vida com pessoas do mesmo sexo.

Na exposição de motivos que o então presidente espanhol José Luís Rodríguez Zapatero realizou pessoalmente no início do debate sobre o matrimônio homossexual no Congresso dos Deputados daquele país, em 2005, ele disse:

“Nós não estamos legislando, V. S., para gentes remotas e estranhas estamos ampliando as oportunidades de felicidade para os nossos vizinhos, nossos companheiros de trabalho, nossos amigos e nossos familiares, e ao mesmo tempo estamos construindo um país mais decente, porque uma sociedade decente é aquela que não humilha seus membros”.[28]

O Superior Tribunal Federal julgou a ADPF 132 e ADI 4.277 e reconheceu o regime jurídico de união estável às relações duradouras entre pessoas do mesmo sexo. Nas palavras dos ilustres Ministros do STF no acórdão:

“O importante é proteger todas as formas de constituição familiar, sem dizer o que é melhor [...] Cuida-se, em outras palavras, de retirar tais relações, que ocorrem no plano fático, da clandestinidade jurídica em que se encontram, reconhecendo-lhes a existência no plano legal, mediante seu enquadramento no conceito abrangente de entidade familiar”.[29]

Cabe ressaltar, que a redação do artigo 226 da Constituição Federal, que menciona as palavras “homem e mulher” para designar a constituição de entidade familiar, não impediu que o Superior Tribunal de Justiça declarasse que “a união estável entre pessoas do mesmo sexo pode ser convertida em casamento civil se assim requererem as partes”. Esse entendimento foi consolidado pela primeira vez no julgamento da Apelação de Kátia Osório e Letícia Perez e vem sendo seguido desde então. Declara tal julgado modelo que a menção “homem e mulher” é meramente exemplificativa e não exaustiva (numerus clausus) e assim ainda permitiu que o Supremo utilizasse da mutação constitucional para adaptar a Carta Magna as mudanças sociais.

Neste sentido, torna-se imprescindível que o Poder Legislativo adeque as leis brasileiras às demandas sociais e, mais do que isso, que todos os brasileiros tenham acesso aos seus direitos de maneira igualitária, cabendo ao legislador exercer seu papel frente à realidade social do povo brasileiro.

4. Considerações Finais

Focados nos debates e discussões sobre as modificações sociais e jurídicas que ocorreram e ainda estão acontecendo com a incorporação do casamento e a união estável homoafetiva no sistema jurídico brasileiro e na sociedade, vê-se que mesmo após grande avanço ainda há a barreira do preconceito sofrido pela minoria homoafetiva. Ficou, pois, a cargo do Poder Judiciário o reconhecimento do direito dessa minoria de ser igual perante a lei, mas esse protagonismo do Judiciário não afasta o dever Poder Legislativo de dar uma resposta a seus representados, que por hora ainda tem como retorno a morosidade ao invés de proteção.

A luta pelos direitos humanos é intrínseca à democracia e quem combate os direitos humanos, combate também à democracia. Dessa maneira, um país no qual setores da sociedade lutam pelo não reconhecimento e prática desses direitos inerentes à pessoa humana luta também contra a democracia.

A aprovação, em alguns países, do casamento igualitário deu-se na sua maioria pelo forte apoio dos líderes do poder executivo, o que infelizmente em nosso país não tem uma decisão clara a favor da luta pelos direitos da população homoafetiva. Os governantes brasileiros, por sua vez, não se pronunciam efetivamente a favor da luta dos direitos das pessoas LGBT e muitos deles são claramente contra o reconhecimento de direito a essa parcela da sociedade.

Portanto o casamento civil igualitário, mesmo sendo uma realidade em nosso país após a movimentação do Judiciário e regulamentação do CNJ, necessita de um debate no Congresso Nacional e na sociedade como um todo. Dessa forma, as pessoas terão a oportunidade de quebrar os fatores que geram o preconceito através do conhecimento de tal maneira que vejam que a luta das minorias é apenas para ver reconhecida a igualdade frente aos demais. Não há uma luta por privilégios, mas uma luta pela igualdade e para que o amor possa ser respeitado.

BIBLIOGRAFIA

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EVES, Maria; ASSUMPÇÃO, Regina Céli. Aprovação de união civil entre gays na Argentina pode facilitar votação no Brasil. Disponível em: <http://www2.câmara.leg.br/camaranoticias/noticias/DIREITOS-HUMANOS/149957-APROVACAO-DE-UNIÃO-CIVIL-E...>. Acesso em: 05 ago. 2010

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VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual Da Homoafetividade:da possibilidade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. 2. Ed. São Paulo: Método, 2012.

VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. O STF e a união estável homoafetiva. Resposta aos críticos, primeiras impressões, agradecimentos e a consagração da homoafetividade no Direito das Famílias. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, nº 2870, 11 maio 2011.


[1] “Ex facto oritur jus”

[2]Mihi factum dabo tibi ius”

[3] Cabe a ele a função ordinária de legislar, conferida pela Constituição Federal de 1998

[4] “Da mihi factum, dabo tibi ius”

[5] Disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/conversas-academicas-luis-roberto-barroso-ii>. Acesso em 19. Abr. 2015

[6] Princípio da legalidade

[7] Ou seja, o ato ser disciplinado por lei.

[8] Vide Referências

[9] Para maior entendimento recomenda-se a leitura do artigo: Conversão de União Estável Homoafetiva em Casamento Civil, do Prof. Ms. Paulo Roberto Iotti Vecchiatti. Disponível em: <<http://pauloriv71.wordpress.com/2012/06/01/sustentacao-oral-no-tjsp-em-prol-da-conversao-de-união-es.../>>. Acesso em 13. Abr. 2015

[10] George Orwell em seu livro a Revolução dos bichos.

[11] Como consagração denominada de família eudemonista, que busca a felicidade e realização individual de seus integrantes, deixando o casamento de ser um fim em si mesmo para se tornar um meio para atingir esses fins.

[12] Existem diversos estudos que demonstram que passagens bíblicas utilizadas para contestar a homossexualidade, não são voltadas para este fim, diversos teólogos e sacerdotes em seus escritos combatem e demonstram que ocorrem erros e interpretações equivocadas entre eles os Padre Marciano Vidal e Padre. James Alisson.

[13] De acordo com o Dicionário Aurélio, família são pessoas aparentadas que vivem na mesma casa, particularmente o pai, a mãe e os filhos; pessoas do mesmo sangue; origem ascendência. (6ª Ed., editora Positivo, ano 2006, p. 296)

[14] Lei Nº 6.515, de 26 de Dezembro de 1977.

[15]Essai sur linégalité des races humanies”, publicado em 1853.

[16] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros escritos. Lisboa: Martin Claret, 2011.

[17] Recomenda-se a leitura do artigo para maior aprofundamento: QUEIROZ, Victor Santos. A dignidade da pessoa humana no pensamento de Kant.. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 757, 31 jul. 2005. Disponível em:. Acesso em: 22 out. 2015.

[18] Grifo nosso musica Diversidade, composição de Lenine

[19] Osvaldo Bazán, jornalista e escritor argentino, num discurso pronunciado na Câmara dos Deputados durante o debate da lei de matrimônio igualitário nas comissões legislativas.

[20] Apud Projeto de Lei 5120/2103 vide referência

[21] Apud Projeto de Lei 5120/2103 vide referência

[22] Apud BIMBI, Bruno. Hannah Arendt e o casamento igualitário: A luta pelos direitos lgbt na Argentina. Nueva Sociedad, Buenos Aires, v. 251, p.93-106, 2014. Mensal. Disponível em:. Acesso em: 22 fev. 2015.

[23] Sentença de 1966 de um tribunal de Virgínia que convalidou a proibição ao casamento interracial.

[24] Artigo 226 § 2 da Constituição Federal

[25] “Algumas pessoas de profundas convicções religiosas, morais e éticas creem que o matrimônio deveria estar limitado à união entre um homem e uma mulher e que a conduta homossexual é imoral. Outros, com iguais convicções éticas, morais e religiosas, creem que os casais do mesmo sexo devem poder casar e que as pessoas homossexuais deveriam ser tratadas do mesmo modo que os seus vizinhos heterossexuais. Nenhum desses pontos de vista diz respeito à questão que devemos decidir. Nossa obrigação é definir a liberdade de todos e não aplicar o nosso próprio código moral”. Sentença do Tribunal Supremo de Massachusetts que legalizou o matrimônio homossexual no estado

[26] Ministro Ayres Britto em seu voto na durante julgamento da ADPF nº 132-RJ

[27] “Chega de desculpas e de rodeios, chamemos as coisas pelo seu nome; chamemos a cada coisa pelo seu nome, não usemos eufemismos. A querer manter a discriminação por motivos de orientação sexual se chama ‘homofobia’; a querer dar um trato de inferioridade a alguns indivíduos ou a uma coletividade se chama discriminação’; quando se quer que apenas um e não todos os cidadãos desfrutem de vantagens que sejam especiais ou exclusivas, como o direito ao matrimônio, este deixa de ser um direito e se chama ‘privilégio’, e a fingir ou aparentar o que não é ou o que não se sente, a dizer uma coisa e fazer outra, se chama ‘hipocrisia’”. Deputa Carmen Montón Giménez durante o debate da lei de matrimônio homossexual na Espanha.

[28] José Luís Rodríguez Zapatero, ex-presidente espanhol em discurso ao parlamento Espanhol no ano de 2005

[29] Ministro Ayres Britto em seu voto na durante julgamento da ADPF nº 132-RJ

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