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4 de Maio de 2024
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    Juiz da 22ª ZE cassa registro, aplica multa, e declara inelegível por 3 anos prefeito eleito de Sino

    (Cuiabá/MT - 15/12) - O juiz da 22ª Zona Eleitoral de Sinop, João Manoel Pereira Guerra julgou procedente a ação de Investigação Judicial por captação ilícita de sufrágio e abuso de poder político e econômico contra o prefeito eleito Juarez Alves da Costa (PMDB) e o seu vice, Aumeri Carlos Bampi, e a coligação "Todos por Sinop". O magistrado cassou o registro de candidatura de Juarez Costa, que também é deputado estadual, e Aumeri, aplicou multa individual de R$ 20 mil (artigo 41-A da Lei 9.504 /97), e ainda declarou a inelegibilidade de ambos por três anos subsequentes à eleição deste ano.

    Considerando que os eleitos conseguiram nas urnas 68,15 por cento dos votos válidos, com base no artigo 224 do Código Eleitoral de cassação do registro, o magistrado declarou totalmente prejudicada a eleição majoritária no município. Caberá à Corte superior, caso seja mantida a cassação em última instância e após o trânsito em julgado da decisão (quando não há mais recursos), marcar novas eleições em Sinop. O prefeito eleito e o vice foram condenados com base nos artigos 222 , 224 e 237 do Código Eleitoral , artigos 41-A e 73 da Lei nº 9.504 /97 e artigos 19 a 22 da Lei Complementar nº 64 /90, artigos 14 parágrafo 9º da CF .

    A ação de investigação judicial foi interposta pela coligação "Ação e Desenvolvimento" sob a alegação de que os representados praticaram abuso de poder econômico por meio de entrega e distribuição de vale-combustível para eleitores, em troca de votos, e ainda cinco fatos que configuravam abuso de poder político, tais como: pronunciamentos do governador Blairo Maggi em favor de Juarez e Aumeri; propaganda eleitoral dos representados em que Juarez diz que Sinop precisa de 310 km de asfalto e que o governador promete ajudá-lo; propaganda eleitoral em que Juarez lê um documento assinado pelo governador Blairo Maggi garantindo asfalto para o próximo ano, para os moradores do bairro "Habitar Brasil"; entrevista de deputado estadual Nilson Santos em que este afirma que Juarez tem o apoio da Assembléia para levar obras à Sinop no próximo ano, e ainda abuso de poder político, diante de "de"investigação"realizada pelo Serviço Reservado de Inteligência da Polícia Militar, tendo como pano de fundo uma estória de que o candidato Juarez teria um caso extraconjugal.

    Confira a íntegra da decisão do juiz da 22ª Zona Eleitoral de Sinop:

    Ação de Investigação Judicial Eleitoral n.º 474/2008

    Representante: Coligação" Ação e Desenvolvimento "

    Investigados: Juarez Alves da Costa, Aumeri Carlos Bampi e Coligação" Todos por Sinop "

    S e n t e n ç a

    Vistos etc.

    A Coligação" Ação e Desenvolvimento ", por sua representante legal, compareceu perante este Juízo Eleitoral, através de advogados, e ofertou Ação de Investigação Judicial Eleitoral por abuso de poder político e econômico, em face das pessoas de Juarez Alves da Costa, Aumeri Carlos Bampi e Coligação" Todos por Sinop ".

    Na inicial, a representante imputou aos investigados os seguintes fatos:

    1) abuso do poder econômico, por que os investigados estariam efetuando a entrega e distribuição de vale-combustível para eleitores, em troca de votos. Afirmou que os vales-combustível pertenciam à empresa ADM, e continham a frase" 100% Mato Grosso "e a Bandeira do Estado, e eram utilizados no Posto Auto Center Cidade, no centro de Sinop/MT, onde os frentistas estavam abastecendo, através desses vales, tanto veículos oficiais dos investigados, como veículos de particulares.

    2) abuso do poder político, diante de pronunciamentos do Governador Blairo Maggi em favor dos investigados, em especial, das afirmações de que" Sinop nunca teve um prefeito que tivesse relações políticas e amizade com o Governador do Estado e com o Governo Federal ", e de que Juarez poderia" contar com o Governador para construir 2.900 casas populares e 330 ou 340 km de asfalto ".

    3) abuso do poder político, diante de propaganda eleitoral dos representados em que Juarez diz que Sinop precisa de 310km de asfalto, e o Governador Blairo Maggi promete ajudá-lo;

    4) abuso de poder político, diante de propaganda eleitoral do candidato Juarez, em que este lê um documento assinado pelo Governador Blairo Maggi, garantindo asfalto para o próximo ano, para os moradores do Bairro" Habitar Brasil ";

    5) abuso de poder político, diante de entrevista com o deputado estadual Nilson Santos, em que este afirma que Juarez tem o apoio da Assembléia, para trazer obras para Sinop, no próximo ano.

    6) abuso do poder político, diante de" investigação "realizada pelo Serviço Reservado de Inteligência da Polícia Militar, tendo como pano de fundo uma estória de que o candidato Juarez teria um caso extraconjugal.

    Ainda, a representante instruiu o pedido com as fotografias de fls. 29/53, vales-combustível de fls. 54/59, CD’s de fls. 60/66, e documentos diversos às fls. 67/99, e ao final, pleiteou pela concessão de liminar, para determinação a busca de apreensão de vales-combustível no Auto Posto Cidade, e ainda, que após a notificação dos investigados, e parecer do MP, fosse considerada procedente a investigação, com a declaração de inelegibilidade dos representados.

    Analisando a liminar pleiteada, este juízo houve por bem deferi-la (fls. 100/101), determinando a realização de busca e apreensão no Auto Posto Cidade, nos vales-combustível da ADM que lá fossem encontrados.

    Às fls. 107/109, a empresa ADM apresentou notas fiscais e recibos de doação de combustível ao candidato Juarez Costa.

    Consta às fls. 112/113 certidão da busca e apreensão realizada no Auto Posto Cidade, seguida dos documentos apreendidos, juntados às fls. 114/245.

    Cota ministerial à fl. 248, seguida das fotografias de fls. 249/257.

    Notificados, os investigados contestaram a inicial (fls. 272/290), alegando que não havia qualquer irregularidade na distribuição dos vales-combustível, já que estavam devidamente declarados na prestação de contas dos representados, pois se tratava de doação de combustíveis, feito pela empresa ADM Comércio e Representações Ltda, não tendo qualquer relação com o Estado de Mato Grosso. Em relação às manifestações de políticos em favor de seus candidatos, os representados defenderam a licitude de tal conduta, já que é permitido a qualquer pessoa, manifestar apoio aos candidatos de sua preferência. Ainda, no tocante à investigação realizada pela Polícia Militar, alegou a inexistência de qualquer indício de que tenha qualquer relação com o Governador do Estado, e muito menos, com a coligação representada. Requereu, assim, a improcedência da representação, juntando, ainda, os documentos de fls. 291/459 - dados parciais da prestação de contas eleitoral do candidato Juarez Costa.

    Certidão complementar, relacionando os vales-combustível apreendidos, às fls. 461/462.

    Atendendo à solicitação do Ministério Público (fls. 464/466), o juízo designou audiência de instrução (fl. 467), momento em que também foram determinadas outras diligências.

    Juntou-se às fls. 476/477 a relação dos funcionários do Auto Posto Cidade.

    Mandados de intimação às fls. 480/491.

    A parte autora apresentou pedido à fl. 500, o qual foi parcialmente deferido.

    Consta às fls. 502/ 503 , ofício da empresa ADM Com. Dist. Serviços e Representações.

    O Ministério Público juntou, às fls. 505/509, o depoimento extrajudicial de Ataíde Tenório da Silva.

    A audiência de instrução foi realizada às fls. 549/577, ocasião em que foram ouvidas as testemunhas Fernandes Aparecido da Silva, Jair Games, Ataíde Tenório da Silva, Sedio Antonio Pasolini, Cláudia Cristina Damacena, Divaldo Rodrigues da Silva, Ednéia Soares de Oliveira, Gilson de Campos Marques, Ivens de Sousa Gonçalves, Neimar Luiz Camelo e Laércio Jorge de Azevedo. Ao final dessa audiência, foi deferida a realização de perícia contábil, entre outros requerimentos das partes.

    Às fls. 549/624 foi juntado, a pedido da parte representante, laudo pericial, como também, às fls. 627/693, 698/734, cópias de propagandas do Estado do Mato Grosso, e às fls. 738/864, fotografias de placas de propaganda do candidato Juarez Costa, ao lado do Governador do Estado e/ou Presidente da República.

    Veio aos autos à fl. 873 , ofício do Auto Posto Cidade, informando que os únicos candidatos que receberam doações dessa empresa foram Leozenir Severo da Silva e Júlio César Timóteo Dias.

    Quesitos do Ministério Público às fls. 875/876.

    À fl. 878, os representados indicaram profissional para funcionar como assistente técnico.

    Petição dos representantes, em que além de formularem os seus quesitos e indicarem o assistente técnico, também requereram a extração de cópias de todos os vales combustíveis apreendidos, bem assim que eles permanecessem em poder da Justiça Eleitoral até final decisão com trânsito em julgado, requerimentos esses que foram deferidos no rosto da petição (fls. 880/882).

    Petição da parte autora requerendo a juntada complementar de fotografias com a vistas a demonstrar o abuso do poder econômico, o que foi deferido no rosto da petição (fls. 884/1028).

    Os representantes atravessam no petitório formulando requerimentos, em especial o de que fosse responsabilizado o dono do Posto Auto Cidade por falso testemunho. No rosto da petição ordenei que fosse ouvido o MPE (fls. 1.030/1.031).

    Manifestação ministerial, no sentido de que fossem extraídas cópias de todos os depoimentos prestados em Juízo, e encaminhados ao Ministério Público Federal (fls. 1;033/1.034), o que foi deferido, ocasião em que este Juízo indeferiu pedido dos representantes para que o Auto Posto Cidade fornecesse ao Juízo o controle do combustível utilizado por candidatos (fl. 1.035).

    Petição do dos representados requerendo cópia dos quesitos formulados tanto pelos representantes como pelo MPE, o que foi deferido no rosto da petição (fls. 1.037/1.038).

    Às fls. 1.044/1.053 aportou aos autos o laudo pericial, cuja perícia foi ordenada a pedido do MPE, sendo que o laudo somente veio assinado pelo Perito nomeado por este Juízo (fls. 1.044/1.053).

    Passada à fase das alegações finais (fl. 1.055), veio para os autos os memoriais das partes.

    Nos memoriais da Coligação Ação e Desenvolvimento (representante), o profissional que os subscreveu sustentou suas posições iniciais, evidentemente que enfatizando certos aspectos que lhe convinha, até por conta das provas que foram produzidas no decorrer da instrução, e as que anexou com suas derradeiras alegações, tendo, ao final, requerido a total procedência da investigação judicial eleitoral, por aplicação dos arts. 41-A e 73 , I , II e IV , todos da Lei 9.504 /97, com a conseqüente cassação do registro da candidatura e declaração de inelegibilidade de Juarez Costa e Almeri Bampi, bem assim pré-questionou tais dispositivos legais, em caso de eventual recurso para o TSE e STF. (fls. 1059/1801).

    Nos memoriais da Coligação Todos Por Sinop, Juarez Costa e Aumeri Bampi (representados), o profissional que os subscreveu, também em longo arrazoado, buscou, efusivamente, rebater as imputações, negando veemente que o candidato Juarez Costa tivesse recebido vales combustível oriundo do Governo, e no mais, apoiado na alegação de que a representante utilizou de uma prova fabricada, encontrável na filmagem gravada no DVD de fl.62, sustentou a tese da imprestabilidade de toda a prova produzida em termos de filmagens e fotos, invocando o princípio dos"frutos da árvore envenenada", como também desenvolveu linha argumentativa no sentido de desacreditar as testemunhas ouvidas em Juízo, em especial o Divaldo e o Gilson, que falaram coisas comprometedoras às candidaturas de Juarez/Aumeri, e com citações e transcrições de ordem doutrinária e jurisprudencial, além de juntada de documentos, finalizou com os pedidos de total improcedência da ação de investigação judicial eleitoral, remessa dos autos ao MPE para apuração do crime previsto no art. 25 , da LC 64 /90 e remessa de cópia dos autos à OAB/MT, para apuração de infração ético-disciplinar praticado pelo advogado Março Aurélio Fagundes, por orientação ilícita de testemunha (fls. 1805/1874).

    A seguir, os autos foram com vistas ao MPE, tendo a Promotora de Justiça Eleitoral Dra. Laís Glauce Antonio dos Santos, emitido judicioso parecer, com documentos, pela procedência parcial da ação, eis que sua conclusão foi de que, efetivamente, restou caracterizado tanto o abuso do poder político, como o abuso do poder econômico, finalizando com requerimentos, a exemplo do pedido de extração das cópias pertinentes dos autos, e remessa para o Promotor de Justiça que atua na área da improbidade administrativa na Capital, em face da empresa ADM ter doado combustíveis custeados pela Assembléia Legislativa do Estado e, portanto, em prejuízo dos cofres públicos (fls. 1876/1897).

    Assim, relatados, tudo visto e examinado,

    Fundamento e decido

    Analisando detidamente os presentes autos de Investigação Judicial Eleitoral, concluí pela sua integral procedência.

    Destarte, no exame amiúde do conjunto probatório, este Julgador monocrático identificou a presença de todas as condutas vedadas pela legislação eleitoral, ou seja, a captação ilícita de sufrágio, o abuso do poder econômico, o abuso de autoridade e o abuso do poder político.

    Com isso, lamentavelmente, a vitória dos candidatos à Prefeito e Vice no pleito municipal/2008 de Sinop - Senhores Juarez Costa e Aumeri Bampi (representados) está impregnada de vícios, de ações delitivas, que influenciaram não apenas a vontade de uma parcela de eleitores, mas também tiveram o condão de gerar desequilíbrio entre os candidatos, em especial os que concorreram na eleição majoritária, afetando indelevelmente no resultado do certame.

    Assim, tenho que os representados ganharam a eleição se valendo de práticas ilegais, que vem sendo reiteradamente condenadas nos nossos Tribunais, capitaneados pelo TSE, e as conseqüências no caso em apreço, para os representados, são: aplicação de multa, cassação dos registros, a inelegibilidade pelos 03 anos seguintes e não diplomação dos mesmos. Valendo registro que da conseqüência da não-diplomação de Juarez/Aumeri, e em sendo confirmada esta decisão pelas Instancias Superiores, decorre uma outra importante conseqüência, qual seja, a necessidade da realização de nova eleição para os cargos da majoritária neste Município de Sinop/MT, por força do que dispõe o artigo 224 , do Código Eleitoral .

    Na seqüência será demonstrado no que estão apoiadas as conclusões deste Juiz Eleitoral. Então vamos à tarefa:

    I) da captação ilícita de sufrágio (art. 41-A , da Lei nº 9.504 /97)

    No particular, colhe-se no bojo processual que os representados, para esse pleito de 2008, elegeram/escolheram, em especial, o combustível como o bem, a vantagem, a ser oferecida aos eleitores, em troca de seu voto, sendo que, evidentemente, a execução desse planejamento corruptivo ficou a cargo de seus representantes, correligionários/cabos eleitorais.

    Dentro do universo de eleitores que, infelizmente, se deixaram corromper, aceitando o recebimento de combustível para votarem no candidato Juarez Costa, dois deles (Divaldo e Gilson), que a propósito trabalham no próprio Auto Posto Cidade onde a benesse era entregue aos eleitores, intimados que foram, compareceram na audiência, e acabaram por confessar que concorreram para a corrupção eleitoral. Confira-se, trechos de seus depoimentos, verbis:

    "...; pelo que o depoente escutava, por meio de comentários e"burburinhos", o pessoal que adesivava seus veículos com propaganda de candidatos, recebia em troca combustível, só que não dá para falar quantas abastecidas eram, por exemplo, por mês, mas eram bastantes, e esses veículos adesivados que abasteciam com o vale da ADM eram ligados à candidatura do número 15, no caso, do Juarez Costa; (...) que o depoente tem carro, mas não chegou a adesivar com propaganda de candidatos, porém, lhe foi pedido voto para o 15, agora não sabe dizer quem fez tal pedido, mas nessa ocasião recebeu um vale de combustível da ADM, sendo que a quantidade era de 10 litros de combustível, e só recebeu uma vez o vale-combustível; esclarece que se sentiu comprometido e acabou votando nos candidatos do 15; que essa mesma proposta foi feita ao colega de trabalho Gilson, na mesma ocasião, e o Gilson também recebeu o vale-combustível, é que o pessoal está oferecendo, e a gente acaba pegando; (...) que o depoente confirma que recebeu a oferta de 10 litros de combustível, para votar no candidato do 15, momento em que lhe foi exibido um vale-combustível da ADM, correspondente a 10 litros, e pegou esse vale, só que não saberia identificar quem lhe fez essa oferta, que foi aceita; que essa pessoa era para o depoente desconhecida; que tal pessoa tinha nas mãos mais vales-combustíveis; que não sabe dizer a data em que isso aconteceu; o depoente não sabe nem dia nem mês em que houve essa proposta aceita; que usou o vale dos 10 litros na hora, pois estava precisando e foi no seu carro Corcel II, ano 1979; que foi o próprio depoente quem abasteceu esses 10 litros em seu Corcel II, e colocou o vale em seu caixa."(Testemunha Divaldo Rodrigues da Silva - fls. 565/566 - g.n.)

    " o depoente, certa vez, chegou a receber de um pessoal ligado à candidatura do Juarez Costa, um vale combustível de 10 litros, e a pessoa que passou não chegou a pedir diretamente voto para o candidato, mas indiretamente acabava pedindo, porque dizia: "LEMBRE-SE DA GENTE", e para um bom entendedor duas palavras bastam, isto é, estavam pedindo voto para o candidato, e no caso era para o Juarez; o depoente, que não tinha carro e nem moto, repassou esse vale combustível para o seu colega de trabalho Divaldo, até por um preço menor. (...) pelo que se recorda, quando recebeu esse vale de 10 litros, foi de pessoas que foram ao posto dirigindo um pálio, e esse veículo estava adesivado com propaganda do candidato Juarez; não sabe dizer agora qual seria a cor do pálio; que nessa ocasião, pelo que se lembre, o pessoal que estava no pálio não chegou a abastecer o carro, só chegaram ali no pátio do posto, e o pessoal ali ficou conversando com eles, e o depoente, num momento de folga, que não tinha carro para abastecer, uma dessas pessoas veio até o depoente e ofereceu o vale, e o depoente pegou; ...;"(Testemunha Gilson de Campos Marques - fls. 569/560 - g.n.)

    Se encontram nos autos corroborando as afirmações dessas testemunhas (Divaldo e Gilson), declarações da pessoa de Ataíde Tenório da Silva, feitas em dois momentos, no sentido de que pessoas ligadas à candidatura do Juarez Costa (representado) ofereciam combustível a donos de carros e motos, em troca de que adesivassem seus veículos com o nome e elementos de propaganda do referido candidato, quando também pediam voto para Juarez.

    As declarações na primeira vez aconteceram nas dependências da Promotoria, mais precisamente no dia 30/10/08. Dessa feita, o referido cidadão compareceu à Promotoria de Justiça, acompanhado do advogado da Coligação Ação e Desenvolvimento (representante), e perante a Promotora Eleitoral e duas testemunhas, declarou entre outras coisas, o seguinte:

    "Que trabalhou por cerca de 06 anos no lavador do Posto Cidade; que no início do período eleitoral, por volta do mês de julho, o declarante recebeu proposta para adesivar seu carro em troca de combustível; que tal proposta partiu de pessoas que trabalhavam para os candidatos Juarez Costa (candidato a Prefeito), Júlio Dias (candidato a Vereador) e Professora Leozenir (candidata a Vereadora); que o declarante mencionou que não poderia adesivar seu veiculo porque sua Igreja não permitia; que por conta disso a candidata Leozenir disse pessoalmente que daria gasolina para o declarante se ele se comprometesse a votar nela para o cargo de Vereadora e em Juarez Costa para Prefeito; ...; que o declarante sabe que quem adesivava o carro recebia uma vale de 10 litros de gasolina por semana e que quem adesivava moto, recebia vale de 05 litros de gasolina por semana;...; que o declarante sabe que o Sr. Fernando que trabalhava no lavador do Posto Cidade adesivou o seu carro e por isso recebia 10 litros de gasolina por semana; que sabe que o Sr. Jair, que também trabalha no lavador do Posto Cidade, adesivou sua moto e por isso recebia 05 litros de gasolina por semana; que sabe também que o Sr. Fernando (Lavador do Posto Cidade) levou também carros de parentes para serem adesivados, pelo que recebiam os vales de gasolina; que todos estes veículos mencionados foram adesivados com propaganda da candidata Leozenir (vereadora) e do candidato Juarez Costa (Prefeito); que o Sr. Fernando disse ao declarante que votaria na Leozenir e no Juarez Costa por conta do combustível que estava recebendo; ...; que o declarante não conhece outras pessoas, além dele próprio, para quem tenha sido prometido combustível em troca de votos; que só recebia combustível quem adesivava o carro ou moto;"(fls. 506/507 - g.n.)

    Da segunda vez, em Juízo, sob o crivo do contraditório, esse cidadão Ataíde Tenório da Silva, pasme, foi trazido por um advogado por nome Marcos Berwig, cujo profissional o trouxe até a porta da sala de audiências, e o aguardou prestar seu depoimento do lado de fora, e depois levou a referida testemunha das dependências do Fórum, conforme constatado por este Juiz Eleitoral que entendeu em tudo isso, como que a testemunha estava sendo pressionada a desdizer o que declarara na Promotoria, e reforço essa conclusão pelo fato de que o Sr. Ataíde no decorrer de seu depoimento em Juízo tremia mais que vara verde.

    Acrescente-se, que esse advogado Marcos Berwig, até onde este Juiz Eleitoral obteve de informações, não tem qualquer relação profissional ou de negócios com os candidatos da majoritária pela Coligação Ação e Desenvolvimento (representante), o que faz com que seja intrigante (muito suspeito) aquela sua ida ao Fórum trazendo, esperando e levando de volta para casa a pessoa da testemunha Ataíde.

    E como já era de se esperar, esse cidadão Ataíde Tenório da Silva, ouvido como testemunha, a pedido da Promotora Eleitoral, em face das declarações que prestou na Promotoria quatro dias antes, demonstrando claramente estar sob pressão, logo foi dizendo que quando esteve na Promotoria, acompanhado do advogado Março Aurélio Fagundes (advogado da Coligação/representante) declarou coisas que não eram exatamente aquilo que ocorreu, orientado que estava por esse profissional, para depois desmentir que houvera sido procurado pessoalmente pela candidata Leozenir para lhe pedir voto a si e ao candidato Juarez em troca de combustível.

    Conquanto tenha acontecido essas coisas relacionadas à pessoa do Sr. Ataíde Tenório da Silva, encontramos no seu depoimento em Juízo, o qual, diga-se de passagem, prestado sob compromisso e com o crivo do contraditório, algumas declarações que estão em perfeita harmonia, não só com o que dissera lá na Promotoria, como também com o que disseram as testemunhas Divaldo e Gilson. Confira-se, verbis:

    "...; que o depoente, é verdade, foi sondado para ter seu veículo adesivado, mas como sua igreja não permitia, não adesivou o carro; que também chegou a ir em busca de combustível no lugar onde estava adesivando carro, mas aí obteve como resposta que só recebia o combustível quem entrava para trabalhar na campanha eleitoral; que escutou que era fornecido combustível aos veículos que trabalhavam nas campanhas eleitorais dos candidatos; ...; que o depoente reafirma que foi sim sondado para colocar adesivo, agora não sabe declinar nomes dessas pessoas, que eram muitas; aonde o depoente foi tentar arrumar combustível foi num lugar onde estavam adesivando carros de candidatos ligados ao Juarez Costa; que é verdade que hoje veio ao Fórum acompanhado do Advogado Dr. Marcos Berwig, o qual soube dessa declaração que prestou junto ao Ministério Público, quando o mesmo esteve lá em sua chácara, ontem, domingo, comprando frango e peixes, e comentou isso com ele, e disse que sua família estava revoltada, pelo que tinha declarado, e como o depoente admite que disse bastantes coisas erradas, o referido advogado disse que então desfizesse perante o juiz aquilo que tinha falado lá no Ministério Público; o depoente não sabe dizer se esse advogado Marcos Berwig tem amizade com o candidato Juarez Costa; que o depoente confirma que os comentários eram de que quem trabalhava na campanha, com seus veículos, recebia 10 litros de combustível semanalmente, no caso de carro, e 05 litros no caso de carro; que esse lavador Fernando, com quem o depoente trabalhava, parece que recebia esse combustível por zelar do carro, lavando carro para o candidato; que o carro desse colega Fernando foi adesivado com propaganda da candidata a vereadora Leozenir e candidato Juarez Costa; que não sabe dizer a época em que o carro do Fernando foi adesivado; é do conhecimento do depoente que a moto do funcionário do posto, por nome Jair, foi também adesivada; pelo que se recorda, o carro do Fernando foi adesivado depois do depoente ter se desligado do posto; que falava-se que carros de parentes do Fernando também foi adesivado, mas o depoente mesmo não viu; que o Advogado Março Aurélio disse ao depoente que não lhe pesaria nada em falando o que declarou perante o Ministério Público, desde que fosse a verdade, mas o certo é que, depois de prestar declaração, isso caiu no conhecimento geral, e hoje está aqui na audiência, tendo que se explicar; que o depoente não recebeu nenhum texto pronto do Dr. Março Aurélio, e foi respondendo às indagações que lhe eram feitas por uma funcionária lá no Ministério Público. que quando esteve na presença da Dra. Promotora, pela mesma foi lhe indagado se prestaria as declarações de forma imparcial, mesmo estando na presença do advogado de um dos candidatos, que inclusive o levou lá, e que se repetiria o que iria falar em juízo, ao que respondeu para a promotora que sim, mas, como já disse, acabou falando coisas orientado que estava, e que não refletia toda a verdade."(fls. 557/559 - g.n.).

    De se ver que essa testemunha (Ataíde), a exceção da cooptação ilícita de sufrágio, acabou por reafirmar quase tudo que dissera perante a Promotora Eleitoral (doc. j. - fls. 506/507), e portanto o seu depoimento deve ser levado em consideração para fins de um juízo de convencimento. E digo mais, pela longa vivência presidindo audiências e colhendo prova oral, afirmo que quando o seu Ataíde se retratou quanto a ter sido procurado para votar nos candidatos Leozenir (vereadora) e Juarez (prefeito), em troca de combustível, o mesmo denotava claramente uma inquietação interior que refletia no seu exterior, pois mexia-se muito na cadeira e demonstrava que queria sair logo da sala de audiências, circunstancias indicativas de que estava violentando a sua consciência (em outras palavras: mentindo neste particular), o que deixou-o muito mal na foto.

    Pois bem.

    Da análise até aqui feita, exsurge, ao ver deste Julgador, delineadas duas situações que configuram, por um lado, a captação ilícita de sufrágio (art. 41-A , Lei 9.504 /97), quando as testemunhas Divaldo Rodrigues da Silva e Gilson de Campos Marques, afirmaram que receberam vale combustível de pessoas ligadas à candidatura do Juarez Costa, para que votassem nesse candidato, e, por outro lado, o abuso do poder econômico na utilização do expediente de fornecer combustível semanalmente para quem adesivasse seus veículos, situação esta que será objeto de exame no próximo tópico.

    Mas continuando na análise desse tema (captação ilícita de sufrágio), é oportuno consignar que por mais empenho com que se houveram os representados, através de seu combativo advogado, o certo é que no caso dessas testemunhas, não tiveram sucesso em fazer contra prova idônea que desconstituísse, que retirasse a credibilidade, do que elas disseram em Juízo, e assim seus testemunhos, diga-se prestados de forma espontânea, firme e corajosa, estão credenciados para apoiar um juízo de convencimento.

    Relembrando o que disseram, observa-se que no caso da testemunha Divaldo Rodrigues da Silva, muito embora ela não se recorde de quando, exatamente, aconteceram os fatos, sabendo apenas dizer que foi durante o pleito eleitoral, a testemunha afirma veementemente que recebeu, de pessoas desconhecidas, um vale-combustível de 10 litros, para que" votasse no candidato do 15 ", que é o número do representado Juarez Costa. Adiciona ainda que imediatamente abasteceu o vale combustível em seu veículo Corcel II, informando que seu colega Gilson também recebeu, na mesma ocasião, a oferta de vale-combustível em troca de voto.

    A testemunha Gilson de Campos Marques, por sua vez, confirma tal assertiva, acrescentando que os indivíduos que ofereceram o vale-combustível estavam num veículo Pálio, adesivado com propaganda dos candidatos representados. Relatou ainda que recebeu deles um vale combustível de 10 litros, acompanhado de um pedido" indireto "de voto, expressado pela frase" lembre-se de nós ", o que, segundo a própria testemunha, foi entendido como um pedido de voto para o candidato Juarez.

    Sem embargo disso, é intuitivo, é incontestável, que todas as pessoas que ganharam combustível da Coligação Todos Por Sinop (representada), bem como de pessoas ligadas às candidaturas de Juarez/Aumeri (representados), também, evidentemente, receberam o pedido de que votassem nos candidatos de aludida Coligação, e como é sabido e consabido, nessas ocasiões o pedido especial de voto é para o candidato da majoritária.

    É oportuno acentuar que o artigo 41-A , da Lei nº 9.504 /97, exige que a promessa ou dádiva esteja vinculada à troca do voto, ou seja, para tipificar a captação ilícita é indispensável a demonstração de que a conduta teve o fim de obter o voto do eleitor, e isso restou também revelado nos depoimentos dessas testemunhas, conforme já transcrito anteriormente.

    Diante da prova oral colhida, e do que normalmente ocorre ainda, infelizmente, no Brasil, em termos de eleições, ou seja, se se oferece qualquer benefício ou dádiva ao eleitor, a contrapartida é o pedido de voto, afinal os políticos só exercem mandato se alcançarem votos suficientes para se eleger, e assim quem se propõe a enveredar para o campo da ilicitude, acaba sendo inevitável o famoso" toma lá, da ca ". O conjunto probatório, enfim, me convence de que no Município de Sinop/MT, a exemplo do Município de Cláudia/MT termo também desta Zona Eleitoral, ocorreu a prática hedionda da compra de votos (corrupção eleitoral).

    Nem se diga, que nos autos somente duas testemunhas disseram que aceitaram vale combustível em troca de votarem no candidato Juarez, e que isso é inexpressivo ante o colégio eleitoral de quase 70.000 eleitores no Município, pois, corrupção eleitoral tem que ser extirpada a todo custo no Brasil, seja em que dimensão for. Trata-se de fato gravíssimo, não sendo demais lembrar que, nesses casos, tais comprovações, ainda que representada por uma, duas ou três pessoas, são claros indícios de que essa prática espúria foi repetidamente utilizada no pleito eleitoral, prejudicando o equilíbrio entre os candidatos, basta compulsar os autos para observar as fotografias e assistir as filmagens encontráveis nos DVDs, para se constatar inúmeras pessoas abastecendo seus veículos, inclusive galões para levar para casa, e pagando as abastecidas com o vale combustível da ADM, e apenas para consignar, já que não foram apreendidos, testemunhas chegaram a dizer que não foi apenas vales dessa empresa que foram utilizados para pagamento, mas também vales que eram imprimidos pelo próprio Auto Posto Cidade.

    Disso também se apercebeu a nobre e digna Promotora de Justiça Eleitoral, ao deixar encetado em sua bem lançada promoção derradeira. Confira-se, verbis:

    " ....observa-se nas filmagens que compõem os DVD’s trazidos à baila uma infinidade de pessoas abastecendo utilizando-se dos vales, inclusive, enchendo galões para "levar combustível para casa" , o que, agregado aos demais elementos que consubstanciam o feito, leva a conclusão de que, de fato, houve a distribuição de combustível a particulares.... ". (fl. 1881 - sic - g.n.)

    Cabe lembrar, nesse ponto, que as testemunhas cujos termos foram transcritos são funcionários do Posto Cidade, e provavelmente só foram arroladas porque quase todos os funcionários dessa empresa foram arrolados. Ora, se os vales-combustíveis foram oferecidos para os próprios funcionários do posto, quanto mais, imagine-se, para o cidadão comum.

    Aliás, outro fato a ser destacado é o de que não havia qualquer controle no fornecimento e recebimento dos vales-combustíveis, já que várias empresas/órgãos públicos da cidade se utilizam deles, inclusive, nas filmagens e fotografias juntadas pelos representados, é possível visualizar um motociclista sem qualquer propaganda política em sua motocicleta, o qual, por pelo menos duas vezes, enche um galão de combustível amarrado ao veículo, pagando, a seguir, com vales-combustíveis.

    A propósito desse câncer que é a corrupção, vale anotar que desde os primórdios da república até os tempos atuais, as eleições brasileiras, conforme registros históricos, sempre foram marcadas, aqui ou acolá, por fraudes, corrupção eleitoral, troca de favores, uso ilegal da máquina estatal e pelo abuso do poder econômico.

    Nesses períodos é comum haver uma escandalosa exploração das carências e da miséria do povo. Conseqüência disso é que o eleitor é iludido, sua vontade é viciada, permitindo que muitos maus políticos, que deveriam ser extirpados da vida pública, acabem se mantendo no poder, ou reconquistando ele, valendo-se das necessidades de pessoas sem condição de bem discernir sobre a importância do voto.

    No Brasil, lamentavelmente, ainda se troca o voto por cestas-básicas, passagens rodoviárias, materiais de construção, medicamentos, dentaduras, vale combustível, prestação de serviços médicos e odontológicos, promessa de cargos, enfim, muitos eleitores se corrompem por conta do oferecimento de qualquer vantagem ou entrega de qualquer coisa de valor.

    Constatando esse grave quadro e diante da necessidade de se suprir uma lacuna na legislação eleitoral no que tange a instrumentos de combate efetivo a tais males, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) iniciou uma campanha nacional contra a corrupção eleitoral. O lema era:" Vamos acabar com a corrupção eleitoral - voto não tem preço, tem conseqüências ".

    Assim é que, o aludido dispositivo legal adveio ao mundo jurídico, como fruto de um projeto de iniciativa popular, com mais de um milhão de assinaturas, ou seja, houve uma mobilização da sociedade civil, que contou, vale registrar, com a participação de várias entidades, a exemplo da AMB, OAB, ABI, CPT, CIMI, CONIC, CUT , etc), redundando na aprovação da Lei Federal nº 9.840 , no dia 28 de setembro de 1999, a qual, indubitavelmente, criou importantes instrumentos de combate da corrupção eleitoral, com vistas à garantia da lisura dos pleitos e o direito de livre escolha do eleitor.

    Pois bem. A Lei nº 9.840 /99 trouxe duas importantes inovações para a legislação eleitoral brasileira. Ela acrescentou o artigo 41-A à Lei nº 9.504 /97 e promoveu mudanças no art. 73 dessa mesma lei, que rege as eleições em nosso país. A primeira inovação é no sentido de punir, com a cassação do registro ou do diploma e multa, o candidato que praticar a captação ilícita de sufrágio em qualquer forma ou modalidade. A outra inovação, que é punida com o mesmo rigor, é a que inibe o uso da máquina administrativa em favor da própria candidatura daqueles que estão concorrendo à reeleição, isso porque participam do pleito eleitoral sem ter que deixar o cargo.

    Neste tópico em que se examina as condutas que configuram a captação ilícita de sufrágio, é de bom alvitre transcrever o dispositivo que trata do assunto (artigo 41-A , da Lei n.º 9.504 , de 30 de setembro de 1997), verbis:

    "Art. 41-A Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta lei o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n.º 64 , de 18 de maio de 1990."

    De se ver assim, que a captação ilícita de sufrágio (compra de votos), além de tipificar o crime de corrupção eleitoral previsto no artigo 299 , do Código Eleitoral , em face da inovação com a edição da norma acima transcrita, também passou a gerar efeitos nefastos, porém necessários, na esfera civil, ou seja, as práticas referidas no dispositivo acima transcrito (doar, oferecer e prometer), além de já serem criminosas, agora passaram a também configurar infração eleitoral cível, punidas severamente com multa e cassação de registro ou do diploma.

    De acordo com a regra legal, o sujeito ativo da nova infração é o candidato. Isso não quer dizer que só haverá punição ao candidato se ele agir pessoalmente. Predomina o entendimento de que poderá haver responsabilização do candidato sempre que concorrer direta ou indiretamente para a prática ilícita. Não fosse assim, o dispositivo legal seria letra morta, pois costumeiramente se delegam as atividades ilegais de compra de votos a coordenadores de campanha, cabos eleitorais, enfim correligionários. Tratando dessa questão, o Tribunal Superior Eleitoral assentou que resta caracterizada a captação de sufrágio prevista no art. 41-A da Lei nº 9.504 /97 quando o candidato praticar, participar ou mesmo anuir explicitamente às condutas abusivas e ilícitas capituladas naquele artigo.

    É inconcebível, ademais, que com a tenacidade, a capacidade de articulação e de costurar" alianças "pelo Senhor Juarez Costa no decorrer da campanha, sempre ativo na divulgação de sua candidatura, presente em reuniões no comitê, venha com alegação de que, se ocorreu a remota, a improvável hipótese, de ter sido doado algum combustível em troca de voto, não pode ser responsabilizado por não ter concorrido de nenhuma forma na prática do ilícito. Ora, ora ! essa falácia lulista do" não sei de nada "pode ter colado lá no Congresso, mas não cola com este Juiz. O convencimento deste Juiz é de que o candidato Juarez tinha pleno domínio e conhecimento de tudo o que ocorria em sua campanha eleitoral, e se não demonstrou que adotou medidas para não ocorrer a captação ilícita de sufrágio, é porque a conduta contava com a sua conivência.

    Ressalte-se que o sujeito passivo é o eleitor. Cabe assinalar que, conforme entendimento jurisprudencial majoritário, estando comprovada a prática de captação ilegal de sufrágio, não é imprescindível que sejam identificados os eleitores que receberam benesses em troca de voto.

    Acresce ser ressaltado que no artigo 41-A , da Lei 9.504 /97, não se protege o resultado da eleição, mas sim a vontade do eleitor; de sorte que, há um bem protegido distinto [do bem jurídico protegido em sede de ação de investigação judicial eleitoral, intentada com fulcro no art. 22 da Lei Complementar nº 64/90], o que não autoriza, com isso, se falar em potencialidade.

    Em sendo assim, pouco importa se a compra de votos teve influencia no resultado do pleito. E essa posição esta revelada na novel jurisprudência do TSE que não está mais exigindo a chamada potencialidade lesiva em casos dessa natureza, isso porque o bem jurídico protegido pelo artigo 41-A é a vontade do eleitor e não é o resultado da eleição. A Ministra Ellen Gracie Northfleet, ao julgar recurso especial eleitoral no feito nº 21.169, em 23/10/2003, abordou com maestria a questão, ponderando que"a captação ilícita de sufrágio, tipificada no artigo 41-A da Lei n. 9.504 /97, configura-se com a ação delitiva do agente tendente a influenciar a vontade de um único eleitor, diferentemente do abuso de poder econômico, que exige potencialidade tendente a afetar o resultado de todo o pleito". Nessa mesma linha decidiu a Corte Eleitoral em diversos outros feitos, entre eles, o Processo nº 1.083 MC - MEDIDA CAUTELAR, em que restou confirmado que"a captação de sufrágio reprimível pelo art. 41-A da Lei nº 9.504 /97 prescinde do nexo de causalidade entre a prática ilícita e o comprometimento da legitimidade das eleições ou mesmo da potencialidade para influenciar no resultado do pleito, a exemplo do que se passa com o abuso do poder econômico".

    Esse entendimento se encontra consolidado conforme estampado em inúmeros julgados pesquisados por este Julgador, quer oriundos dos TREs, como do TSE, dentre os quais escolhi o abaixo transcrito, verbis:

    SESSÃO DE 27/04/2004 (wcv) ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO: PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA PELO ART. 41-A DA LEI Nº 9.504 /97, ACRESCENTADO PELO ART. DA LEI Nº 9.840 , DE 28.9.99: COMPRA DE VOTOS. I - Recurso interposto anteriormente à publicação do acórdão recorrido: tempestividade. Precedentes do TSE. II - Tratando-se de matéria que possibilita a perda de mandato eletivo federal, o recurso para o TSE é ordinário: CF , art. 121 , § 4º , IV . Conhecimento de recurso especial como ordinário. III - Impedimento e suspeição de juízes do TRE: não-acolhimento. IV - Prática de conduta vedada pelo art. 41-A da Lei nº 9.504 /97, acrescentado pelo art. da Lei nº 9.840 /99: compra de votos. Há, nos autos, depoimentos de eleitoras, prestados em juízo, que atestam a compra de votos. V - Para a configuração do ilícito inscrito no art. 41-A da Lei nº 9.504 /97, acrescentado pela Lei nº 9.840 /99, não é necessária a aferição da potencialidade de o fato desequilibrar a disputa eleitoral. Ademais, para que ocorra a violação da norma do art. 41-A , não se torna necessário que o ato de compra de votos tenha sido praticado diretamente pelo próprio candidato. É suficiente que, sendo evidente o benefício, do ato haja participado de qualquer forma o candidato ou com ele consentido: Ag nº 4.360/PB , Min. Luiz Carlos Madeira; REspe nº 21.248/SC , Min. Fernando Neves; REspe nº 19.566/MG , Min. Sálvio de Figueiredo. VI - Recurso especial conhecido como ordinário e provido.

    É imperioso grafar, que o art. 41-A, mais do que proteger a vontade do eleitor, busca alcançar, com a sua efetiva e corajosa aplicação, a lisura dos pleitos eleitorais, para que não tenhamos pessoas exercendo ilegitimamente mandatos.

    Assim, não merece guarida a corrente que sustenta constituir uma ingerência indevida da Justiça Eleitoral quando a mesma, desprezando a vontade popular, e por aplicação do artigo 41-A, cassa registros, diplomas e fixa multas aos que incide nas condutas vedadas.

    Essas vozes defendem a tese de que, a despeito da comprovação da compra de votos, se ela foi de tal dimensão que não influenciou no resultado da eleição, a justiça eleitoral não pode substituir a vontade do povo, cassando o registro ou diploma do (s) candidato (s) vencedor (es).

    Em resposta a essa corrente, parece a este Juiz Eleitoral oportuno lembrar que a Lei nº 9.840 /99, também é fruto da vontade popular, quando o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral - MCCE, coletou nada mais nada menos do que

    assinaturas.

    Ora, a Lei nº 9.840 /99, que trouxe inovações à Lei nº 9.504 /97, é portadora de muitas esperanças, isso porque inibe com rigor a captação ilícita de sufrágio (corrupção eleitoral) e também o uso indevido da máquina administrativa. Não se pode mais permitir que maus políticos, sabedores da impossibilidade de burlar o resultado matemático da votação, impunemente voltem suas energias à prática da mercancia eleitoral e à concessão de benesses sufragistas, fazendo de tudo para alcançar ou se manter no poder político.

    Jamais se pode esquecer da necessidade de proteção da lisura do pleito eleitoral, isso porque vivemos num Estado que se proclama democrático e de direito, o que significa, dentre tantas outras coisas, que os candidatos devem agir conforme as leis na busca dos mandatos almejados.

    Urge, portanto, que as autoridades constituídas façam valer tão importante lei, aplicando-a de modo a combater, com firmeza e equilíbrio, os costumeiros atos de ofensa e violência à democracia, tão duramente conquistada pelo povo brasileiro. Se se quiser mudar o curso da história neste país miserável e cheio de injustiças, será necessário tomar medidas verdadeiramente severas em relação àqueles candidatos que conquistam mandatos desonestamente, sendo que, não fosse o amor ao ilícito, nunca seriam eleitos para ocupar cargo algum.

    Finalizando a análise desse tópico, impende registrar que os TREs e a mais alta Corte Eleitoral (TSE) do país, têm dado clara mostra, através de inúmeras decisões, no sentido de que, uma vez demonstrado a captação ilícita de votos, o (s) candidato (s) beneficiado deve (m) ser (em) punido (s) com a cassação de seus registros ou diplomas, e demais conseqüências, por aplicação do artigo 41-A , da Lei nº 9.504 /97, dando assim efetividade a esse dispositivo legal que trouxe a esperança aos brasileiros de verem extirpado o câncer que é a corrupção eleitoral.

    Exemplo dessa firme posição de nossos Tribunais foi a cassação do casal Capiberibe, e o pitoresco nesse processo foi que a principal prova contra o casal foram os depoimentos de duas mulheres que disseram que haviam recebido a quantia de R$ 26,00 (vinte e seis reais) para votar no casal. O pequeno valor envolvido e o fato de somente duas pessoas confirmarem a" compra "dos votos, além de não haver ficado provado que houve envolvimento direto dos parlamentares levou muita gente do meio jurídico e político a acreditar que eles não teriam seus mandatos cassados, porém o TSE decidiu pela cassação.

    II) do abuso do poder econômico Constituição Federal

    Artigo 14 § 9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. (g.n).

    A doutrina tem definido o abuso de poder econômico, em matéria eleitoral, como o"financiamento direto ou indireto, dos partidos políticos e candidatos, antes ou durante a campanha eleitoral, com ofensa à lei e às instruções da justiça eleitoral, com o objetivo de anular a igualdade jurídica (igualdade de chances) dos partidos, afetando a normalidade e a legitimidade das eleições"(MENDES, 1988, p. 24).

    Em outras palavras, define-se abuso de poder econômico como qualquer conduta em que se ofereça algum tipo de vantagem ao eleitor, com o fim de afetar, influenciar na sua liberdade de voto.

    Pois bem.

    O abuso do poder econômico, conforme já sinalizado anteriormente, se encontra muito bem caracterizado no bojo processual, notadamente pela doação de combustível a particulares, para que adesivassem seus carros e motocicletas.

    Muito ao contrário do alegado pelos representados, não eram somente adesivados os veículos, compreendendo carros e motos, de quem entrava para trabalhar nas campanhas eleitorais dos candidatos.

    Para configurar que a pessoa trabalhou na campanha de um determinado candidato, é necessário que a mesma tenha efetivamente cumprido horário, desempenhado as funções para as quais foi contratado, tudo dentro do planejamento traçado pela coordenação de campanha. Assim é que são considerados trabalhadores: os cabos eleitorais, o pessoal do marketing e propaganda, o pessoal da mídia, os advogados, e outros, os quais, por conta do trabalho que realizam são remunerados, como qualquer outro trabalhador.

    Dessa forma, não são considerados trabalhadores em campanhas eleitorais, quem se limita a autorizar, por uma simples simpatia à candidatura ou em troca de alguma benesse, o adesivamento de seu veículo, com elementos de propaganda de candidatos, embora, eventualmente, tenha pedido voto para o candidato, comparecido a uma reunião/comício, participado de uma carreata. Essas pessoas na verdade não chegaram a mudar a sua rotina do dia a dia, apenas que, transitando com seus veículos adesivados, de casa para o serviço, para a faculdade, para o supermercado, e vice-versa, propagavam as candidaturas constantes do adesivo posto em seu veiculo.

    No caso das eleições em Sinop, todo mundo viu que milhares de veículos, compreendendo pequenos, médios e grandes, motos e até bicicletas, foram adesivados, evidentemente que aqui estou envolvendo todos os participantes do pleito. Esse adesivamento foi tão gritante que impressionou até o dono do Posto Auto Cidade, senão vejamos:"...; que observava que carros eram abastecidos e estavam adesivados, aliás, calcula que uns 50% da frota de veículos em Sinop estava adesivada;..."(Sedio Antonio Pasolini - fl. 560 - g.n.)

    A bem da verdade, com o adesivamento de veículos o que se busca, num primeiro plano, é a divulgação das candidaturas, com a massificação dos nomes e números dos candidatos que constam dos adesivos, e num segundo plano, busca-se demonstrar força, poder, de modo que, quanto mais veículos estiverem adesivados com o nome de uma candidato, acaba por impressionar mais o eleitorado, em especial a parcela não consciente, não politizada, que infelizmente é a parte mais expressiva da população. Assim, a propaganda de candidatos, mediante o adesivamento de veículos, constitui num excelente elemento de marketing para propagar uma candidatura.

    Pois bem. O adesivamento de veículos ainda que pago pelo candidato e/ou Partido e Coligação ao prestador do serviço, de per si, não tem nada de mais, desde que tudo esteja devidamente legalizado e declarado, na prestação de contas. Ocorreu que, no caso dos autos, restou bem evidenciado que o adesivamento dos veículos, sem generalizar, não foi por mera simpatia dos proprietários pelas candidaturas da Coligação Todos Por Sinop (representada), mas porque lhes foi oferecido em troca do espaço do adesivo combustível semanalmente, na dimensão de 10 litros para carro, e 05 litros para moto, sendo que quando iam ao Posto Auto Cidade, da família Pasolini, pagavam as abastecidas na maior parte das vezes com os vales da ADM, já que, como referido alhures, também haviam os tais vales imprimidos pelo próprio Posto de Gasolina.

    Refrescando a memória, confira-se, a respeito, trechos do que disseram as testemunhas, verbis:

    "que o depoente reafirma que foi sim sondado para colocar adesivo, agora não sabe declinar nomes dessas pessoas, que eram muitas; aonde o depoente foi tentar arrumar combustível foi num lugar onde estavam adesivando carros de candidatos ligados ao Juarez Costa; ...;"(Ataíde Tenório da Silva - fls. 557/558)

    "....; que nesse período de campanha eleitoral em Sinop, muitos veículos adesivados com propagandas de candidatos abasteciam lá no posto e pagavam com vale-combustível da ADM, como também com esse outro tipo de vale confeccionado pelo próprio posto de gasolina; que era mais significativa a utilização dos vales da ADM nessa questão do abastecimento de veículos adesivados;...; pelo que o depoente escutava, por meio de comentários e"burburinhos", o pessoal que adesivava seus veículos com propaganda de candidatos, recebia em troca combustível, só que não dá para falar quantas abastecidas eram, por exemplo, por mês, mas eram bastantes, e esses veículos adesivados que abasteciam com o vale da ADM eram ligados à candidatura do número 15, no caso, do Juarez Costa...;"(Divaldo Rodrigues da Silva - fl. 564)

    "....; nesse período de campanha eleitoral, muitos carros adesivados com propagandas de candidatos também abasteceram no posto utilizando desses vales da ADM; esclarece que também havia abastecimentos que eram feitos através da apresentação de vale tantos litros de combustível, feitos por computador, e impresso em folha sulfite; que o depoente não sabe dizer aonde era feito esse tipo de vale, mas o certo é que nesse vale continha o carimbo da razão social do posto, ou seja, Pasolini & Pasolini Ltda, e a assinatura do gerente; que os carros adesivados que continham propaganda de candidatos abasteciam tanto utilizando-se desses vales combustível da ADM como também utilizando-se desse outro vale a que mencionou acima;...;"(Ivens de Sousa Gonçalves - fl. 572)

    "...; o depoente não pode afirmar se quando entrou para trabalhar no posto, isto por volta do dia 14 de agosto, já vinham sendo abastecidos carros adesivados com propagandas de candidatos, utilizando-se de vales-combustíveis da ADM, mas parece que havia uma outra forma de pagamento nesses abastecimentos, que era com um vale feito, como já disse, em papel tipo sulfite; que esses vales eram feitos no computador, em folha sulfite, mas que não aparecia nome de ninguém, apenas era mencionado que ao portador daquele vale poderia abastecer certa quantidade de combustível;...."(Laércio Jorge de Azevedo - fls. 576/577)

    "...; que observava que carros eram abastecidos e estavam adesivados, aliás, calcula que uns 50% da frota de veículos em Sinop estava adesivada;..."(Sedio Antonio Pasolini - fl. 560)

    "que trabalha no Auto Posto Cidade há quatro meses; que pode afirmar que desde quando começou a relação empregatícia, já observava que tantos veículos particulares quanto de órgãos públicos abasteciam utilizando-se na hora do pagamento de vales-combustíveis da ADM, esses mesmos que aparecem à fl. 54 dos autos;;...que nesse período de campanha eleitoral, por várias vezes carros adesivados com propagandas de candidatos abasteceram lá no posto utilizando-se com vales-combustíveis da ADM;...;"(Claudia Cristina Damaceno - fl. 562)

    "...; que o depoente ainda pode afirmar que carros adesivados ou não, ligados à candidatura do sr. Juarez, utilizavam-se, como já disse, de vales-combustível da ADM, e desse outro tipo de vale que apareceu no decorrer da campanha, feita em computador aparentemente, e impresso em papel sulfite;....; pelo que se recorda, quando recebeu esse vale de 10 litros, foi de pessoas que foram ao posto dirigindo um pálio, e esse veículo estava adesivado com propaganda do candidato Juarez;....;"(Gilson de Campos Marques - fls. 569/570)

    "......; o depoente, no desempenho de sua função de frentista, pode afirmar que abasteceu, como abastece até hoje, veículos que se utilizam para pagamento do combustível, de vales da ADM, com quem o Auto Posto Cidade tem contrato; que nesse período eleitoral, chegou a abastecer veículos que estavam adesivados, com propaganda de candidatos, e o motorista pagava o abastecimento com vales desse tipo que está nos autos à fl. 54, mas também o depoente se recorda que havia um outro tipo de vale; o depoente ainda pode dizer que carros adesivados chegaram a abastecer com vales que não tinham nada a ver com a ADM, e eram confeccionados em computador, só que não aparecia nome de ninguém, a não ser que com aquele vale poderia ser abastecido tantos litros de combustível;.... ; o depoente, olhando as fotografias acostadas aos autos, observou que em algumas delas aparece sua pessoa abastecendo carros ou motos adesivados; que é o depoente o frentista que está abastecendo o galão azul que aparece na garupa da motocicleta que se vê à fl. 48 dos autos; que o depoente, olhando as duas fotos anexadas à fl. 48 dos autos, tem a dizer que a motocicleta que aparece numa e noutra foto, aparentemente, é a mesma, porém, também aparentemente, o abastecimento ocorreu em dois momentos diferentes, já que na foto de cima o galão na garupa é de cor preta, e na foto debaixo, é de cor azul;"(Neimar Luiz Camelo - fls. 574)

    Cabe registrar, por oportuno, ser público e notório, que o brasileiro possui uma paixão por carros e, por isso, mesmo cuidam deles até mais que de si próprios, daí até propaganda com essa temática já foi veiculada na televisão. Divagando, ainda, a respeito, esse sentimento por carros não é só dos ricos, mas geral, em todas classes da população; e, assim, não é incomum escutar que determinada pessoa, dessas que na verdade não reúne condições de ter um veiculo, mas fazendo peripécias consegue sabe-se lá como comprar um carrinho usado, e depois acaba deixando-o mais parado, na garagem para quem tem, porque lhe falta recursos para abastecer o veiculo.

    Nesse diapasão, não tenho dúvida em dizer que, para deixar seu veículo ser adesivado, só recebendo alguma coisa em troca. Devemos lembrar que ainda impera no Brasil, a terrível"Lei do Gerson", que tem como lema a pessoa que"gosta de levar vantagem em tudo", no sentido negativo de se aproveitar de todas as situações em benefício próprio, sem se importar com a ética.

    De se ver, pois, que através da prova oral, de fotografias, de filmagens e ainda se valendo de elementos que constitui senso comum, tem-se indubitavelmente provado que proprietários de veículos autorizaram que seus carros, camionetes, motos etc., fossem adesivados com elementos de propaganda dos candidatos da Coligação Todos Por Sinop, notadamente os da majoritária - Srs. Juarez Costa e Aumeri Bampi (representados), em troca de combustível semanalmente e no decorrer de toda a campanha eleitoral, contudo, conforme extraído do conjunto probatório, não foi somente quem deixou adesivar o veiculo que recebeu a benesse, mas também particulares que até levavam o combustível em galões para casa.

    Nesse contexto, o bem doado (combustível) a inúmeras pessoas para adesivarem seus veículos, benesse essa também oferecida indiscrimidamente a outras pessoas que até buscavam em galões para casa, sem que, contudo, a Coligação Todos Por Sinop e nem os candidatos Juarez/Aumeri (representados), tivessem dado qualquer explicação plausível, da legalidade para essa" festança do combustível ", logo, resta, configurado indubitavelmente o abuso do poder econômico, o qual, ao ver deste Juiz Eleitoral, teve potencialidade sim para desequilibrar o pleito de modo ilícito em favor dos candidatos da Coligação Todos Por Sinop, em especial os candidatos da majoritária, no caso os representados Juarez Costa e seu Vice Aumeri Bampi.

    O Promotor de Justiça de Santa Catarina - Doutor Pedro Roberto Decomain, que também naquela unidade da Federação é Professor das Cadeiras de Direitos Difusos e Coletivos e Direito Eleitoral na Escola de Preparação e Aperfeiçoamento do Ministério Público, em palestra proferida tendo como tema"Noções de Abuso de Poder Econômico e Político, assim discorreu, verbis:

    "O fornecimento de dádivas a eleitores, por partidos ou candidatos, em período de campanha eleitoral, é fenômeno nosso conhecido há muito tempo e que o legislador e a Justiça Eleitoral forcejam por diminuir, quando não se entenda possível suprimi-lo por inteiro. Em país onde grande parte da população padece de crônica e acentuada pobreza, vivendo muita vez à míngua até de recursos mínimos para a sobrevivência biológica, e em país onde grande parcela da população também não tem ainda atingido os limites mínimos de escolaridade desejáveis, com analfabetismo acometendo ainda alguns milhões, partidos e candidatos podem pretender aproveitar-se dessa situação, para pura e simplesmente" comprar "os votos de diversos eleitores.

    Essa conduta, do fornecimento de qualquer vantagem, particularmente de cunho econômico, ao eleitor, em troca de promessa de voto, além de constituir crime de corrupção eleitoral, previsto pelo art. 299 do Código Eleitoral , que pune também a conduta do eleitor que recebe essa vantagem, pode importar em nítida situação de abuso do poder econômico, ensejadora de inelegibilidade.

    Também na senda dos possíveis exemplos, seria possível afirmar a existência, em tese, de situação de abuso do poder econômico, sempre que candidato, partido ou coligação, ou alguém em benefício de qualquer deles, impusesse a subordinados seus a exigência do voto em determinado candidato ou partido, sob ameaça de sanções de cunho indiretamente econômico. De lembrar-se a possibilidade de que o proprietário de estabelecimento fabril, candidato a mandato eletivo, impusesse aos seus empregados e, indiretamente, aos respectivos familiares, o voto nele próprio, com veladas (ou nem tanto) ameaças, por exemplo, de perda de emprego.

    Enfim, numa tentativa de generalização do que poderia, em tese, constituir situação de abuso do poder econômico, capaz de redundar em inelegibilidade, poder-se-ia afirmar estar presente referido abuso, sempre que, em contexto eleitoral, ocorra emprego de recursos materiais ou de recursos humanos, ou a ameaça da realização de determinadas atividades em contexto econômico, fora do âmbito permitido pela legislação eleitoral, com o objetivo de obter vantagem para candidato, partido ou coligação." (encontrável no Google, sendo o objeto da pesquisa - o que significa abuso do poder econômico? - g.n.) "

    Ainda encontramos na doutrina

    A doutrina tem definido o abuso de poder econômico, em matéria eleitoral, como o"financiamento direto ou indireto, dos partidos políticos e candidatos, antes ou durante a campanha eleitoral, com ofensa à lei e às instruções da justiça eleitoral, com o objetivo de anular a igualdade jurídica (igualdade de chances) dos partidos, afetando a normalidade e a legitimidade das eleições"(MENDES, 1988, p. 24).

    Em outras palavras, define-se abuso de poder econômico como qualquer conduta em que haja uso de dinheiro que venha a prejudicar a liberdade de voto.

    Nessa questão do abuso do poder econômico, peço vênia à combativa Promotora de Justiça Eleitoral, para colacionar seu r. parecer no corpo desde decisum, quando Vossa Excelência incursionou no assunto, valendo-me, assim, de sua judiciosa análise, tanto fática como jurídica, como fundamentos também de decidir, , verbis:

    " .....No que atine à utilização dos vales oriundos da ADM por particulares eleitores, o que teria ocorrido através da entrega de tais papéis conjugada ao pedido de voto no candidato 15 (Juarez Costa), tenho que esta efetivamente ocorreu, não apenas pelo teor dos depoimentos das pessoas de Gilson de Campos Marques e Divaldo Rodrigues da Silva (fls. 569 e 564, respectivamente), que tomo como razões para manifestar, que, em sendo apenas dois cidadãos, poderia levar à conclusão de configuração de captação ilícita de sufrágio (o que é diferente de abuso do poder econômico)¹, mas sim porque observa-se nas filmagens que compõem os DVD’s trazidos à baila uma infinidade de pessoas abastecendo utilizando-se dos vales, inclusive, enchendo galões para "levar combustível para casa", o que, agregado aos demais elementos que consubstanciam o feito, leva a conclusão de que, de fato, houve a distribuição de combustível a particulares. É fato, sim, que poderia se dizer que os vales foram uma paga por terem as pessoas adesivado o seu veículo, ou seja, o pagamento pela utilização do espaço para adesivagem foi efetivado através da entrega de combustíveis. Mas tal"possibilidade" JAMAIS foi aventada pelos requeridos, tampouco esta hipótese foi apontada na prestação de contas de Juarez Costa, o que seria imprescindível. Isto porque não é possível justificar a entrega a alguém (aliás, a ninguém), sob o qualquer hipótese, de vales custeados pelo poder público em benefício de qualquer candidato.

    Não se pode olvidar, como fez questão de lembrar o Nobre Advogado dos requeridos, que por volta do minuto 15, do DVD juntado às fls. 62, observa-se um "ensaio" promovido pela autora, testando a filmagem, em uma garagem, da utilização do vale-combustível da ADM. O mesmo condutor do veiculo aparece logo em seguida, abastecendo um carro modelo Palio, cor branca (ou seja, o mesmo carro visto no "ensaio" na garagem), utilizando-se do vale-combustível. Mas daí até, por via disso, desacreditar-se no teor dos depoimentos das testemunhas Gilson de Campos Marques e Divaldo Rodrigues da Silva, há uma longa distancia. Mesmo porque, tais depoentes disseram que foram abordados pelo condutor de um veiculo pálio, mas que não se lembram da cor do veiculo, não se podendo afirmar que foi mesmo avistado no ensaio da autora, tratando-se, pois, de "armação". Na ocasião antes referida, o condutor do veiculo pálio lhes entregou o vale-combustível conjugado ao pedido de voto (frase exata: "lembre-se da gente"). Te porque, tais testemunhas disseram ter visto VÁRIOS OUTROS VALES NAS MÃOS DOS OCUPANTES DO VEICULO PÁLIO. O "ensaio" da coligação autora, dentro da garagem, que foi chamado pelos requeridos como "prova da farsa", me parece um teste quanto a zoom e qualidade da filmagem que desejam levar adiante. Te porque, se os vales foram doados aos vereadores, alguém pode me explicar como é que a coligação autora tinha o tal vale ??? Isso só demonstra que qualquer pessoa em Sinop tinha acesso a esses papéis, e que estavam sendo entregues vales-combustível aos eleitores desta urbe (tal qual inúmeras pessoas filmadas), razão pela qual tenho como comprovado o abuso de poder econômico, até porque 20.000 litros de combustível, totalizando mais de R$ 65.000,00 (sessenta e cinco mil reais) economizados pelos requeridos por meio da "doação" da ADM, e/ou da compra (ou "compra") dos R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo candidato Juarez Costa, retira a paridade da disputa.

    Aliás, o insigne doutrinador Marcos Ramayana², já mencionado, Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no que concerne à definição do que vem a ser abuso do poder político ou econômico, ensina que (in verbis) :

    "O abuso do poder econômico ou político é toda conduta ativa ou omissiva que tenha potencialidade para atingir o equilíbrio entre candidatos que almejam determinado pleito eleitoral"

    Não que a lesão efetiva ao equilíbrio do pleito seja conditio sine qua non para o reconhecimento do abuso do poder econômico ou político, exigindo-se tão somente a potencialidade lesiva, visando a lei eleitoral obstar a ocorrência de práticas abusivas que retirem a normalidade das eleições, assegurando os participantes do pleito contra certos excessos potencialmente danosos. In casu, o desequilíbrio foi efetivo, demonstrado pelas próprias pesquisas eleitorais realizadas nesta cidade (e comentadas pelo patrono dos requeridos por ocasião das alegações Finais), sendo patente que Juarez Costa angariou a simpatia dos eleitores ao oferecer-lhes a vantagem de abastecerem seus veículos gratuitamente ou ainda, entregando vales-combustível aos vereadores (vales-combustível custeados pelo erário) para que também o fizessem. Infelizmente, muitos eleitores, apesar dos largos esforços da Justiça Eleitoral (que realiza campanhas publicitárias sobre a importância do voto consciente), não guardam idéia do prejuízo advindo de uma eleição fraudada pela compra de votos.

    Não esqueçamos, ainda, que o Posto Simarelli, conforme declarado nos autos 0699 /2008-Eleitoral (prestação de contas de Juarez Costa) também doou (ou "doou") considerável quantia de combustível para Juarez Costa, o que, aliado aos indícios já apontados, concatenados entre si, leva a crer que o enorme montante de combustível em mãos de Juarez Costa foi distribuído nesta cidade, para eleitores. Forte em tais argumentos, tenho como caracterizado o abuso de poder econômico.

    Por despiciendas outras considerações a respeito da ocorrência, aqui reconhecida, do abuso do poder econômico, finalizo a análise, deixando, no entanto, já encetado, que a conseqüência aqui é também da cassação do registro, porém acrescida da conseqüência da inelegibilidade pelos 03 anos subseqüentes à eleição em que se verificou o abuso, sem prejuízo da remessa de cópia integral dos autos ao MPE para as demais providências e penalizações cabíveis (art. 22 , incisos XIV e XV , da LC 64 /90).

    III) do abuso do poder político ou de autoridade (art. 22 , da LC nº 64 /90). Constituição Federal

    Artigo 14 § 9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. (g.n).

    Com respeito ao abuso do poder político ou de autoridade, sua configuração nas palavras também de MENDES, 1988, p.24, "ocorre quando o detentor do poder, o mandatário, vale-se de sua posição para agir de modo a influenciar o eleitor, prejudicando a liberdade de voto. Define-se dessa forma, como ato de autoridade exercido em detrimento do voto". Neste caso, o abuso se dá quando aquele que tem poder utiliza-se dele para coagir o eleitor, forçando-o a votar nele ou no seu candidato sob pena de perder algum beneficio dado ou oferecido por ele.

    No caso em apreciação, é de conhecimento público que o marketing de campanha dos candidatos Juarez/Aumeri (representados), se valeu também para convencimento do eleitorado o fato do "arco de alianças" estabelecido em torno dessas candidaturas, com destaque para o apoio do Governador do Estado, Blairo Maggi. Este, a propósito, não poupou esforços para deixar bem claro, em todas as suas falas, que o município receberia muito mais recursos, caso o seu candidato fosse eleito. Em outras palavras, caso isso não acontecesse, os eleitores poderiam ficar cientes de que a cidade perderia recursos, o que afirma ser natural do jogo político.

    Feita essa introdução, passo a analisar as condutas imputadas aos representados, separadamente.

    Nessa quadra, conforme já ressaltado por este juiz inicialmente, tenho que restou bastante evidente, durante a campanha do candidato representado, o abuso de poder político praticado por vários correligionários seus, apontando de forma incisiva que o fato de terem em Sinop um aliado político faria com que a cidade recebesse recursos que, conforme pode-se entender tacitamente das mensagens, não viriam que fosse eleito o outro candidato.

    Dessa forma, tenho que a liberdade de voto foi de certa forma cerceada, a partir do momento em que os eleitores concluíram que, como havia uma ampla bancada política favorecendo a candidatura de Juarez, teriam quase que uma "obrigação" de votar nesse candidato, sob pena de verem sua cidade desfavorecida na distribuição dos recursos estaduais e federais.

    Releva consignar, por oportuno, que os últimos Prefeitos de Sinop, inclusive o atual, não foram integrantes dos mesmos Partidos Políticos dos Chefes do Executivo Estadual que governaram o Estado no mesmo período, e ao que consta nem parte do grupo político deles foram; de sorte que, em outras palavras, Prefeitos de Sinop e Governadores do Estado, ao menos nos três ou quatro últimos mandatos, sempre estiveram em lados opostos.

    Essa situação sempre foi explorada por adversários políticos, que acabavam acusando os Prefeitos de que, por serem opositores ao Governo, o Município de Sinop acabava sendo prejudicado porque não vinham verbas lá de cima, ou seja, os Governos não investiam, ou se investiam os recursos eram escassos.

    Desta feita, o candidato a Prefeito de Sinop - Senhor Juarez Costa, na condição de Deputado Estadual e um dos integrantes da base de apoio do Governo de Blairo Maggi, conseguiu reunir em torno de sua candidatura uma grande quantidade de agremiações políticas, com destaque para o PR do Governador Blairo Maggi, e do PT do Presidente Lula, e assim, com base no discurso de que sua candidatura estava alinhada com os Governos Estadual e Federal, no maior arco de alianças da história de Sinop, o candidato Juarez Costa deitou e rolou dessa proeza, pois todos os dias aparecia em sua propaganda política gratuita no rádio e na televisão, algum político enfatizando esse fato, e dizendo que se Juarez fosse vitorioso nas eleições Sinop, o Município seria grandemente beneficiado com recursos, de ordem estadual e federal.

    A massificação dessa idéia foi tão intensa que, no modo de entender deste Magistrado, caracterizou-se o abuso do poder político ou de autoridade, pois para um povo que vem enfrentando tantas crises nos últimos tempos como o de Sinop, com um enorme desemprego em face do fechamento de grande parte das madeireiras, logo, um discurso em que Políticos de expressão até Nacional, a exemplo da Senadora Serys, do Governador Blairo Maggi, Ministros do Governo Lula, além dos da terra (Deputados Estaduais e Federais), manifestando irrestrito apoio à candidaturas Juarez Costa/Aumeri Bampi, só que não limitaram a apenas apoiar, pois sempre passaram a idéia de que, se referidos candidatos lograssem êxito, que fossem guindados ao poder municipal em Sinop, o Município seria muito beneficiado em termos de recursos e ações dos governos estadual e federal, e nessas circunstancias é que tenho que residiu o abuso do poder político ou de autoridade, influenciando, também, na liberdade de voto dos eleitores.

    Destarte, para quem está ligado nas coisas da política, esse negócio de alianças no Brasil é de extrema fragilidade. As alianças em épocas de eleições são feitas, de regra, apenas e tão somente, para que aquele grupo que se compôs chegue ao poder, mas logo depois o que normalmente acontece é cada um para si, e o povão mais uma vez enganado que se dane, se lixe, afinal, historicamente, para grande parte dos políticos, o povo não passa de um detalhe, só tem valor no momento do voto.

    Mas continuando na análise desse tópico, temos que, dentre as diversas falas colacionadas pelos representantes em sua propaganda diária, destaco as seguintes:

    "No dia 05 de Outubro vote no 15. O Juarez tem todo o respaldo da Assembléia Legislativa, tem o respaldo também do Governo do Estado, do nosso vice-governador. Por isso no dia 05 de Outubro eu venho aqui pedir seu voto, e declarar o meu total apoio à campanha do Juarez, e também levarmos obras pra Sinop, se Deus quiser, a partir do ano que vem, com o mandato de Juarez Costa" (Deputado Nilson Santos, aos 02’53 "do CD)

    " somos, sim, avalistas desta candidatura, e também somos responsáveis por esta candidatura; (...) pode contar comigo pra fazer as 2900 casas pode contar comigo para fazer os 320 ou 330m de asfalto "(Governador Blairo Maggi , aos 07’15" e 10’14 "do CD)

    "Apresentadora: Um prefeito que conta com o apoio do Estado e do Governo Federal consegue trazer mais coisas para a sociedade?

    Governador Blairo Maggi: Olha, sem dúvida nenhuma. O alinhamento político entre o Governo Federal, Governo Municipal e o Governo do Estado é de suma importância, é de extrema importância pra que não só os recursos que são constitucionais, que são obrigatórios para serem transferidos para o município, mas sim, aquele algo mais que pode ser trazido em função do grupo político que está envolvido, dos programas que são colocados, mas que não se atende a todos, mas se prioriza alguns programas sempre, algumas cidades, e isto faz parte do jogo político, é natural, que você tenha a possibilidade de ser melhor atendido quando você tem esse alinhamento político, né, eu procuro sempre trabalhar de forma isenta nisso, mas a gente percebe que o Governo Federal tem muito disso e coloca muito isso como uma das questões de política, e a vida da gente é feita de política e portanto, a gente está sempre amarrado uma coisa na outra, pra fazer o bem feito, e pra fazer com que tudo chegue nas cidades, naquelas cidades aonde a gente tem apoios políticos importantes. ("Entrevista" ao Governador Blairo Maggi, aos 07’15"e 10’14" do CD; g.n.)

    "Candidato Juarez Costa - Governador, nós fizemos aqui um PAC Sinop, nós queremos construir 310 quilômetros de asfalto em quatro anos, precisamos do seu apoio e da sua ajuda.

    Governador Blairo Maggi - Ô Juarez, eu acho que você está correto em fazer isso, e pode contar com a ajuda do Governo, tudo que eu puder ajudar, tudo que a gente puder direcionar pelas emendas parlamentares estaduais, federais, e também dos Ministérios das cidades, integração, e é possível fazer isso, a gente tem que trabalhar, você tá correto, vai na direção e conte comigo"("Conversa" entre o candidato Juarez Costa e o Governador Blairo Maggi)

    Das falas transcritas, em especial a do Governador Blairo Maggi, uma mensagem fica bastante clara, mesmo que nas entrelinhas, já que o agente político parece escolher as palavras, para evitar falar o que, na verdade, ele quer dizer: existe uma parcela de recursos públicos que está "à disposição" das autoridades políticas, para fornecerem a quem bem entenderem, e logicamente, irão fornecê-las aos seus apadrinhados políticos, prejudicando - nesse jogo sujo e politiqueiro - os adversários políticos, mesmo que o município que este administre tenha maior mérito ou necessidade de recebê-los.

    Dessa forma, resta evidente o abuso do poder político, à medida em que se tentou coagir os eleitores a votar no candidato representado, sob pena de perda de importantes recursos para a cidade.

    Mais uma das provas de que determinados recursos/investimentos oriundos do Estado, dependeria da assunção de Juarez Costa na Prefeitura de Sinop, ao contrário do alegado pelo ilustre advogado dos representados, é o que se refere ao Fato IV da inicial, e que se encontra estampado no documento que o próprio profissional trouxe com a contestação (fl. 452). Em tal documento, datado frise- se de 07.05.08 , o Deputado Estadual Juarez Costa solicita ao Governador Blairo Maggi a liberação de recursos para execução de projetos de drenagem e pavimentação asfáltica, em vias urbanas da Cohab Habitar Brasil e outras vias públicas adjacentes de Sinop, tendo sua Excelência - o Governador Blairo, despachado na mesma data do documento, porém, passados mais de sete (7) meses que o Chefe do Executivo Estadual autorizou a liberação dos recursos, o certo é que eles até hoje não vieram, o que, no modo de enxergar as coisas por este Juiz, se tais recursos realmente forem alocados pelo Governo, o repasse só se daria no Governo de Juarez Costa, pois não identifico outra razão para reter os recursos por todo esse tempo. Releva deixar encetado, por oportuno, que o Habitar Brasil e adjacências, para onde seriam aplicados os recursos em obras de drenagem e pavimentação asfáltica, possui um expressivo colégio eleitoral, na sua grande maioria de pessoas simples, pobres.

    Ainda, identifico o abuso político ou de autoridade com respeito ao Fato VI da exordial, pois no ver deste Juízo Eleitoral foi sim usado a máquina estatal de forma indevida, sem autorização judicial, em prol de resguardar a candidatura do Juarez Costa, quando se utilizou o "serviço reservado de inteligência da Polícia Militar de Sinop" (doc. j. fls. 95/97), com vistas a impedir que ações fossem desencadeadas por pessoas ligadas aos adversários, para macular a imagem do apaniguado. Conclui, através deste caso que diga-se de passagem é extremamente condenável, que a máquina estatal estava a disposição Juarez Costa, e isso configura abuso do poder político.

    Sobre ainda essa questão do abuso do poder político, largamente utilizado nas últimas eleições nesta Unidade da Federação, e quiçá ocorreu nas outras também, acabou deixando perplexo o próprio Presidente do TRE/MT - Desembargador Leônidas Duarte Monteiro, com as declarações de um dos Ministros do Governo LULA que em apoio a candidaturas em duas das principais cidades de Mato Grosso, declarou no comício "que se determinado candidato fosse eleito, o repasse de recursos do seu ministério estaria assegurado". Essa fonte que o site Só Notícias, cuja matéria foi veiculada em 26 de setembro de 2008 (fl. 94), ainda grafou que sem esconder o seu desencanto, o Presidente do TRE/MT frisou que:

    "seria oportuno lembrar que os recursos públicos não pertencem a este ou àquele agente público e sim a toda a sociedade, em cujo benefício devem ser aplicados, independentemente do resultado do pleito eleitoral".

    Se não bastasse a identificação dessas situações caracterizadoras do abuso do poder político, ainda tem a questão dos Vales Combustível da empresa ADM apreendidos pela justiça eleitoral, com os quais foram abastecidos escancaradamente veículos ligados aos candidatos da Coligação Todos Por Sinop, da qual integrou os candidatos na majoritária Juarez Costa e seu Vice Aumeri Bampi,sendo que foram encontrados entre os apreendidos, vales combustível referentes a lotes que pertenceriam à Assembléia Legislativa, logo, o referido candidato teria recebido ajuda do Legislativo Estadual, mediante a entrega de vales combustível custeados pelo erário público.

    Com essa questão foi objeto do r. parecer ministerial, e tendo a douta Promotora dito tudo que se poderia ser extraído dos autos a respeito, até para não ser redundante, mais uma vez peço vênia à Doutora Laís Glauce Antonio dos Santos, para colacionar seu judicioso trabalho no particular, também como fundamentos de decidir. Assim, confira-se, verbis:

    Explico: Consoante já argüido na exordial, Juarez Costa teria recebido "doação" da ADM, empresa sediada na capital do Estado de Mato Grosso, estabelecimento este que comercializa combustíveis e que teria lhe doado a quantia de 20.000 (vinte mil) litros de combustível (Nota Fiscal 0003315), referente aos lotes 02647, 02569, 02699, 02744, 02594, 02664), que, por sua vez, teriam sido repassados aos candidatos a vereador, bem como, teriam a ADM vendido a Juarez Costa o montante de mais 10.000 (dez mil) litros de combustível, conforme Nota Fiscal 0003492, referente aos lotes 02593, 02547, 02591, 02590.

    Ocorre que os lotes 02647, 02569, 02699, 02744, 02594, 02664, apreendidos no Auto Posto Cidade, em Sinop.MT, referem-se à combustível fornecido pela ADM à Assembléia Legislativa de Mato Grosso, ou seja, custeados pelo erário (dinheiro público), o que, inclusive, e por óbvio, é vedado pela legislação eleitoral (artigo 16 , inciso II , da Resolução TSE 22.715 /08 e 24, inciso II, da Lei 9.504 /97). Nesse sentido, leia-se a sigla "ASSL" nos lotes apreendidos.

    Não se sabe de que forma os ditos vales combustível pertencentes à Assembléia vieram parar nas mãos do candidato Juarez, e nem por ordem de quem (certo é que vieram), o que será analisado oportunamente por ocasião de ação de improbidade administrativa, a ser ajuizada, se este for o entendimento do colega de Ministério Público, na capital do Estado, já que aquele é o foro competente para analisar a matéria (Lei 7.347 /85 - LACP , competência do local do dano). O fato é que, através do recibo eleitoral 15000296874 e Nota Fiscal 0003315 (emitida pela ADM), tentou-se mascarar uma flagrante irregularidade eleitoral, qual seja, a captação/utilização de recursos oriundos de órgão da Administração Direta, prática vedada pelo artigo 16 , inciso II , da Resolução TSE 22.715 /08 e 24, inciso II, da Lei 9.504 /97, tornando evidente o abuso de poder político ocorrido (além da impropriedade administrativa), uma vez que o candidato Juarez (lembre-se: deputado estadual desincompatibilizado) possui inúmeros contatos que tornaram possível a conduta objurgada. Ou há alguma outra explicação para que vales-combustível da ADM com a sigla da Assembléia Legislativa de Mato Grosso estivessem sendo utilizados por Juarez Costa, deputado recém afastado, ainda que para suposto repasse aos vereadores, mediante "doação" da ADM? Porque se esta explicação existe, EM NENHUM MOMENTO ELA FOI TRAZIDA AOS AUTOS PELOS REQUERIDOS.

    Outro aspecto importante a ser ponderado é o fato de que no recibo eleitoral referente a sobredita "doação" da ADM, há uma assinatura completamente diferente daquela lida, NO MESMO RECIBO, dos autos 0699 /2008-Eleitoral (Prestação de Contas de Juarez Costa). Trata-se DO MESMO RECIBO (recibo nº 15000296874), DA MESMA VIA CANDIDATO/COMITE, porém um foi enviado pela ADM (nestes autos) e outro foi juntado por Juarez Costa na prestação de contas já citada (feito 0699/2008/Eleitoral - 22ª Zona). Tal "peculiaridade" não se justifica (nesse sentido, laudo pericial realizado nos autos 0699 /2008, cópia anexa), sendo que nenhuma explicação foi trazida ao feito sobre isso, razão pela qual, este elemento de convicção concatenado à irregularidade salientada no parágrafo anterior deste parecer Ministerial, faz-me ter que a "doação" em testilha trata-se, na verdade, de simulacro tendente a justificar (ou tentar justificar) a obtenção e utilização, por parte dos requeridos, de benesse obtida com abuso do poder político.

    Também impende salientar que a perícia levada a efeito pelo contador judicial, em exaustivo trabalho, conclui que o combustível arrecadado mediante "doação" da ADM foi utilizado na íntegra pelo candidato, mediante repasse aos candidatos a vereador da coligação Todos por Sinop. Todavia, tal não retira a ilicitude cometida, já que o que se refuta é a origem dos recursos que custearam (ou custeariam) os vales em comento, que, conforme já repisado, foram entregues ou pela ADM ao requerido, mediante pagamento pela Assembléia Legislativa do Estado, já que a ela pertenciam (o que é passível de averiguação por meio de eventual Inquérito Civil Público a ser eventualmente instaurado na comarca de Cuiabá, ponto também já citado) ou já estavam em mãos de quem fosse encarregado para tanto na Assembléia Legislativa e esta pessoa repassou os vales a Juarez Costa, tudo sendo mascarado, posteriormente, pelo recibo de doação da ADM. O que é inconteste é a existência dos vales da Assembléia em poder do requerido. Por estas razões, entendo cabalmente demonstrado o abuso do poder político.

    Concluindo este tópico, impende sublinhar que o Abuso de Autoridade, em todas as explicações (jurídicas!) que a ele se busca, tem cunho eminentemente pessoal, representando a própria atuação, direta ou por meio de alguém, da Autoridade ocupante do cargo, para que se faça ou se deixe de fazer alguma coisa, contrário ou com abuso à própria Lei.

    Ocorre que o Abuso de Autoridade também pode advir do Abuso de Poder Econômico, tal como se passou nessa questão dos vales combustível, quebrando a isonomia entre os concorrentes do cargo. Vale dizer, que o Abuso de Autoridade é apenas uma das facetas do Abuso de Poder Econômico, mas que significam, para os efeitos em questão, situação idêntica, igualmente constante do artigo 22 , inciso XIV , da Lei Complementar nº 64 /90.

    Enfatizo, por fim, que a probabilidade de comprometimento (da normalidade ou da legitimidade, mas não necessariamente do resultado) do pleito eleitoral, caracteriza-se sempre que resultem evidenciados comportamentos, como efetivamente se verificou nas eleições em Sinop, que revelem influência do poder político ou econômico no desenvolvimento do processo eleitoral. É que, em tais hipóteses, desaparecem ou a imparcialidade que se exige da administração pública, ou a neutralidade do poder econômico, pressupostos admitidos pela Constituição como necessários à proteção da normalidade e da legitimidade das eleições (art. 14 , § 9º , CF/88).

    Por todo o exposto, e o mais que dos autos consta, em consonância com a posição ministerial, porém indo além porquanto julgo inteiramente procedente a presente ação de investigação judicial, em virtude de reconhecer que houve a caracterização da captação ilícita de sufrágio, bem como do abuso do poder econômico e político, e por conta disso, nos termos dos arts. 222 , 224 e 237 do Código Eleitoral , arts. 41-A e 73 da Lei n. 9.504 /97 e arts. 19 a 22 da Lei Complementar n. 64 /90, art. 14 , § 9º , da CF , e demais disposições legais aplicáveis à espécie:

    a) condeno como condenado tenho os representados, no caso o candidato a prefeito Sr. Juarez Alves da Costa e seu Vice Sr. Aumeri Carlos Bampi, devidamente qualificados nos autos, ao pagamento, por cada um, de uma multa correspondente a 20.000 (vinte mil) UFIRs (art. 41-A , da Lei 9.504 /97);

    b) casso como cassado tenho os registros das candidaturas de Juarez Alves da Costa e seu vice Aumeri Carlos Bampi (art. 41-A , da Lei 9.504 /97);

    c) declaro como declarado tenho, a inelegibilidade dos Senhores Juarez Alves Costa e Aumeri Carlos Bampi, em razão do abuso do poder econômico e político para as eleições a se realizarem nos 03 (três) anos subseqüentes à eleição de 2008 (art. 22 , XIV , da LC 64 /90);

    d) considerando que a chapa composta pelos candidatos na majoritária Senhores Juarez Alves Costa e Aumeri Carlos Bampi, obteve 68,15% (sessenta e oito ponto quinze por cento) dos votos válidos, portanto mais da metade, e considerando a decisão ora proferida que cassou os seus registros, nos termos do artigo 224 , in fine, do Código Eleitoral , declaro totalmente prejudicada as votações na eleição majoritária neste Município de Sinop/MT, ficando este Juízo no aguardo de que a Instância Superior convoque nova eleição para os cargos de Prefeito e Vice Prefeito em Sinop/MT, no prazo de 20 a 40 dias;

    e) defiro o requerimento formulado pelo MPE no seu penúltimo parágrafo, constante de seu r. parecer derradeiro (fl. 1886), cabendo ao Cartório tomar as providências para atendimento do que é requerido;

    f) defiro o requerimento formulado pelo advogado dos representados, deduzido no item 3, in fine, de suas derradeiras alegações (fl. 1830), cabendo ao Cartório tomar as providencias para atendimento do que é requerido; e

    g) dê-se conhecimento imediato, pelo meio mais rápido, do teor desta decisão monocrática, ao Egrégio Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso.

    P. R. I. C.

    Sinop/MT, 13 de dezembro de 2008.

    João Manoel Pereira Guerra

    Juiz Eleitoral

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