Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
4 de Maio de 2024

STF - Advogado - Negativa de dar Acesso aos Autos - Violação a SV nº 14 do STF

há 2 anos

Grupo Mentoria em HC e REsp - Whatsaap - Todo dia Jurisprudência

https://chat.whatsapp.com/FlHlXjhZPVP30cY0elYa10


Decisão: Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado por Alexandre Vieira de Queiroz, em favor de Arthur Paredes Cunha Lima, contra ato praticado pelo Min. Francisco Falcão nos autos da Cautelar Inominada Criminal 24-DF. O ato judicial impugnado, que determinou nova prorrogação do período de afastamento do paciente do cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba por 120 (cento e vinte) dias, foi praticado no contexto de investigação da Operação Calvário, baseado em representação apresentada pela Polícia Federal no âmbito dos Inquéritos 1.289/DF, 1.290/DF, 1.291/DF e 1.292/DF, nos quais são apurados crimes de corrupção passiva e lavagem de ativos por suposta organização criminosa com atuação no Estado da Paraíba. O Ministério Público Federal aponta a participação ativa do paciente em esquema de pagamento de vantagem ilícita em troca da aprovação das prestações de contas da Cruz Vermelha Brasileira/RS relativas ao ano de 2012. Em 13.12.2019, o Relator, no STJ, da Cautelar Inominada Criminal deferiu a realização de buscas e apreensões no gabinete e na residência do paciente. Em 17.12.2019, determinou seu afastamento do cargo público de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba, indicando a suposta existência de “indícios concretos da prática do crime de corrupção, no exercício da função”. O afastamento foi renovado, por mais 120 (cento e vinte) dias, em 13.3.2020, por decisão monocrática, e referendado pela Corte Superior do STJ em 20.5.2020. Em 30.6.2020, após novo requerimento do membro do MPF, o Ministro Relator prorrogou, pela segunda vez, por mais 120 dias (cento e vinte) dias o afastamento do paciente de sua função pública, bem como a validade das demais cautelares impostas. A defesa sustenta ofensa ao livre exercício profissional, dentro dos limites das qualificações profissionais exigidas por lei, do qual não se pode excluir o labor exercido pelo cidadão que se encontra no exercício de uma função pública. Afirma violação à duração razoável do processo e excesso de prazo na persecução penal, sendo que o afastamento do cargo perdura desde o final do ano de 2019. Assevera que não há qualquer indício concreto de que o paciente tenha, de alguma forma, tentado intervir no transcurso das investigações, seja intimidando possíveis testemunhas, seja destruindo ou ocultando provas, tratando-se de argumentação genérica e desprovida de indicação de qualquer elemento concreto. Pede seja concedida a medida liminar, revogando-se as medidas cautelares impostas ao paciente de afastamento cautelar do cargo, de proibição de contato com funcionários e membros e de acesso às dependências do TCE/PB; Requer, ainda, em sede liminar, que se determine a imediata habilitação e acesso pela defesa aos cadernos investigativos que apurem condutas do paciente no bojo da “Operação Calvário”, seus procedimentos, anexos, apensos, e outros elementos de prova já documentados e que não estejam pendentes de cumprimento ou com diligências em andamento. No mérito, pugna pela concessão do habeas corpus, confirmando-se o pedido liminar, para que sejam revogadas, em definitivo, as medidas cautelares impostas. É o relatório. Decido. Diante da constelação fática apresentada, verifico que dois pontos merecem passar por um escrutínio pormenorizado: (1) a legalidade das medidas cautelares impostas, quais sejam, de afastamento cautelar do cargo, de proibição de contato com funcionários e membros e de acesso às dependências do TCE/PB; (2) a negativa, pelo Relator do feito no STJ, de acesso pela defesa aos Autos de Inquérito da chamada “Operação Calvário”. Quanto ao primeiro ponto, ainda que o standart probatório exigido como critério racional para valoração dos elementos aptos a fundamentar a medida cautelar de suspensão do exercício de função pública seja, em verdade, inferior àquele exigido para lastrear a prisão preventiva, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, a determinação da medida se revela, também, medida excepcional, que deve encontrar fundamento em substrato empírico minimamente consistente que demonstre a necessidade de sua realização. No ponto, destaco que, com a entrada em vigor da Lei 12.403/2011, nos termos da nova redação do art. 319 do CPP, o juiz passa a dispor de medidas cautelares de natureza pessoal, viabilizando, diante das circunstâncias do caso concreto, seja escolhida a medida mais ajustada às peculiaridades da espécie, permitindo, assim, a tutela do meio social, mas também servindo, mesmo que cautelarmente, de resposta justa e proporcional ao mal supostamente causado. Especificamente no que interessa ao caso em tela, dispõe a redação do art. 319, inciso VI, do CPP: “VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais”. No caso concreto, em necessário juízo de proporcionalidade, próprio da natureza das medidas cautelares no processo penal, verifico que o suporte fático utilizado como fundamento pelo STJ se mostra apto a justificar a medida de afastamento. Senão vejamos excerto do impugnado: “Quanto aos indícios de corrupção coligidos com relação aos Conselheiros do Tribunal de Contas, Arthur Paredes Cunha Lima e Antônio Nominando Diniz, o Ministério Público aponta que o pagamento de vantagens indevidas teve como finalidade a aprovação, junto ao Tribunal de Contas da Paraíba, das prestações de contas da Organização Social Cruz Vermelha do Brasil – Filial Rio Grande Sul, reativas aos anos de 2012 a 2016 (...) Foram apresentados diversos elementos de corroboração dos fatos apontados pelo colaborador no tocante à corrupção no âmbito da Corte de Contas, inclusive os contratos de prestação de serviços celebrados entre a Cruz Vermelha do Brasil – Filial Rio Grande Sul e os escritórios de advocacia dos causídicos supramencionados, bem como gravação de conversas nas quais há menção do pagamento de propina aos Conselheiros do Tribunal de Contas da Paraíba (...) Após a apresentação, por parte da Polícia Federal, de relatório circunstanciado com o resultado parcial das diligências realizadas, apreciei e deferi o pedido de afastamento cautelar do cargo (...)” (eDOC 13, p. 8) Diante disso e considerando ainda que o paciente é membro do TCE - PB desde 2010, independentemente de sua presidência na Corte de Contas ter se iniciado em 2017, entendo como suficientes os fundamentos utilizados na decisão coatora e não verifico ilegalidade apta a ensejar a revogação das medidas cautelares impostas. Ademais, entendo como oportuno aguardar-se a decisão do Órgão Especial no STJ acerca da nova prorrogação deferida monocraticamente pelo Min. Francisco Falcão. Contudo, com relação à negativa de acesso pela defesa aos Autos de Inquérito da chamada “Operação Calvário” e todos seus elementos de prova, nos termos da Súmula Vinculante 14 desta Corte Suprema, verifico que razão assiste à defesa. Conforme se depreende dos autos, está sendo negado à defesa, de forma injustificada, o devido acesso aos autos dos inquéritos que apuram as condutas imputadas ao paciente na “Operação Calvário”, embora se observe que se tenha peticionado diversas vezes junto à autoridade policial e junto ao STJ – o fato de parte dos procedimentos relativos à “Operação Calvário” estar no STJ, parte no TJPB e parte com a autoridade policial não pode impedir o acesso da defesa ao material já documentado e cujas diligências não se encontram em andamento. Conquanto haja regras para assegurar o sigilo das investigações e resguardar o interesse público, devem ser respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado. Dessa forma, o sigilo do procedimento não é oponível ao defensor, a quem são asseguradas as prerrogativas de consultar os autos, extrair cópias e certidões, bem como fazer apontamentos. O tema já foi objeto de apreciação no RE-RG 593.727 (tema 184 de repercussão geral), no qual o Colegiado firmou a seguinte tese: “O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em nosso País, os Advogados (Lei nº 8.906/94, art. , notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade - sempre presente no Estado democrático de Direito - do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula Vinculante nº 14), praticados pelos membros dessa Instituição”. (Rel. Min. Cezar Peluso, em que fui designado redator do acórdão, Tribunal Pleno, DJe 8.9.2015, grifo nosso) Como preconiza o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei 8.906/1994), ressalvados os procedimentos sob sigilo, é direito do advogado examinar, mesmo sem procuração, os autos de flagrante ou investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital. Tratando-se de feito sigiloso, o exercício do direito está condicionado à apresentação da procuração do indiciado ou suspeito. Confira-se: “Art. 7º São direitos do advogado: (...) XIII - examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estiverem sujeitos a sigilo ou segredo de justiça, assegurada a obtenção de cópias, com possibilidade de tomar apontamentos; XIV - examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital; (...) § 10. Nos autos sujeitos a sigilo, deve o advogado apresentar procuração para o exercício dos direitos de que trata o inciso XIV. § 11. No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências”. (grifo nosso) Ainda sobre o tema, colhe-se da lição de Gustavo Badaró: “Entre as características do inquérito policial, destaca-se tratar-se de um procedimento escrito e sigiloso. O inquérito é um procedimento administrativo escrito, como expressamente previsto no art. 9.º do CPP, o que, aliás, decorre do seu caráter inquisitivo. Ao mais, o CPP prevê também que o inquérito policial é sigiloso ( CPP, art. 20, c.c. o art. 792, § 2.º). Todavia, a Lei 8.906/1994 – que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil –, em seu art. 7.º, XIV, prevê, entre os direitos do advogado, o de ‘examinar em qualquer repartição instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital’ (destacamos). Ora tal dispositivo não faz qualquer restrição quanto ao direito de o advogado consultar autos de inquérito policial ou os denominados ‘procedimentos de investigação criminal, se os mesmos estiverem correndo ‘em segredo de justiça’. Em suma, o segredo de justiça poderá ser decretado pela autoridade policial, nos termos do disposto no art. 20 do CPP, sendo oponível a terceiras pessoas, mas jamais a advogados. Terá, contudo, que apresentar procuração do investigado. A nova Lei 13.245/2016, que acrescentou o § 10, ao art. 7.º do EAOAB estabelece que ‘Nos autos sujeitos a sigilo, deve o advogado apresentar procuração para o exercício dos direitos de que trata o inciso XIV’. Assim, o exame dos autos é condicionado à apresentação de procuração. É verdade que o referido inc. XIV continua a assegurar ao advogado o direito ao exame dos autos, ‘mesmo sem procuração’. Contudo, provavelmente, a manutenção de tal expressão, na nova redação do dispositivo, se deveu a um cochilo do novo legislador. Se assim não for, a contradição entre o inciso XIV do caput, e o § 10 do mesmo dispositivo será insuperável. Aliás, a própria Súmula Vinculante n. 14 do STF assegura o direito de vista dos autos ao defensor, no interesse do representado. Ou seja, é necessário que haja poderes para representação. O enunciado da referida Súmula estabelece: ‘É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo e irrestrito aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório, realizado por órgão de competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa’. Também no caso dos ‘chamados procedimentos criminais diversos” ou de investigações realizadas pelo Ministério Público, é direito do advogado ter acesso aos autos do procedimento investigatório”. (BADARÓ, Gustavo Henrique. Curso de direito processual penal. São Paulo: Thomson Reuters. 2018, cap. 3.4, grifo nosso) No mesmo sentido, destaco o julgado da Segunda Turma do STF: “ADVOGADO. Investigação sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponível ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos. Elementos documentados. Acesso amplo. Assistência técnica ao cliente ou constituinte. Prerrogativa profissional garantida. Resguardo da eficácia das investigações em curso ou por fazer. Desnecessidade de constarem dos autos do procedimento investigatório. HC concedido. Inteligência do art. , LXIII, da CF, art. 20 do CPP, art. , XIV, da Lei nº 8.906/94, art. 16 do CPPM, e art. 26 da Lei nº 6.368/76 Precedentes. É direito do advogado, suscetível de ser garantido por habeas corpus, o de, em tutela ou no interesse do cliente envolvido nas investigações, ter acesso amplo aos elementos que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária ou por órgão do Ministério Público, digam respeito ao constituinte”. ( HC 88.190/RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, Segunda Turma, DJe 6.10.2006, grifo nosso) Logo, de toda a análise, extrai-se que, via de regra, o advogado possui como prerrogativa profissional o acesso aos autos de investigação, mesmo que tramite em sigilo. Entretanto, é possível a sua delimitação havendo diligências em andamento ou ainda não documentadas nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências. Por todo exposto, concedo parcialmente a ordem tão somente para determinar o acesso pela defesa aos autos que apurem condutas do paciente no bojo da Operação Calvário, seus procedimentos, anexos, apensos, e outros elementos de prova já documentados e que não estejam pendentes de cumprimento ou com diligências em andamento, nos termos do Enunciado 14 da Súmula Vinculante desta Corte. Publique-se. Intime-se. Brasília, 8 de setembro de 2020. Ministro Gilmar Mendes Relator Documento assinado digitalmente

(STF - HC: 189058 DF 0099024-14.2020.1.00.0000, Relator: GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 08/09/2020, Data de Publicação: 10/09/2020)

  • Publicações1084
  • Seguidores99
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoNotícia
  • Visualizações92
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/stf-advogado-negativa-de-dar-acesso-aos-autos-violacao-a-sv-n-14-do-stf/1382474954

Informações relacionadas

Notíciashá 13 anos

CNJ cassa portaria e OAB restabelece acesso livre de advogados a processos

Superior Tribunal de Justiça
Notíciashá 11 anos

A jurisprudência do STJ sobre as prerrogativas do advogado

Notíciashá 13 anos

CNJ garante acesso dos advogados aos processos eletrônicos

Cláudia França Lima, Advogado
Artigoshá 3 anos

O que fazer quando a Polícia Civil negar acesso ao Inquérito Policial

Petição Inicial - TJDF - Ação Mandado de Segurança com Pedido de Liminar - Mandado de Segurança Cível

0 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)