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3 de Maio de 2024

STJ Abr23 - Lei Maria da Penha - Dosimetria com bis in idem - Ameaça e Descumprimento de Medida Protetiva

há 10 meses

Inteiro Teor

RECURSO ESPECIAL Nº 2025882 - SP (2022/0286443-2)

RELATOR : MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. PENAL. AMEAÇA E DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA. DELITOS PRATICADOS NO ÂMBITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 61, II, E E F, E 59 DO CP. DOSIMETRIA. AGRAVANTES. ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM. CONFIGURAÇÃO COM RELAÇÃO À AGRAVANTE DO ART. 61, II, F, DO CP. DECOTE NECESSÁRIO. PENA REDIMENSIONADA.

Recurso especial parcialmente provido nos termos do dispositivo.

DECISÃO

Trata-se de recurso especial interposto por XXXXXXX , com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, contra o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo na Apelação Criminal n. 1500240- 26.2020.8.26.0482 (fls. 308/315).

No recurso especial, a defesa aponta violação dos arts. 61, II, e e f , e 59 do Código Penal, sob a tese de que a aplicação das agravantes previstas no primeiro dispositivo legal, com relação ao delito de descumprimento de medida protetiva de urgência, configura bis in idem (fl. 328).

Assevera que o delito de descumprimento de medida protetiva de urgência é previsto no art. 24-A da Lei n. 11.340/2006 ( Lei Maria da Penha), a qual trata especificamente dos delitos praticados em situação de violência doméstica e familiar, tratando-os com a severidade que o legislador entendeu necessária para a sua prevenção e reprovação. Nesse caso, foram consideradas duas circunstâncias do art. 61 do Código Penal, quais sejam, as alíneas e e f do inciso II. Porém, o mesmo contexto de violência doméstica está presente em ambas as agravantes e, portanto, a ponderação das duas circunstâncias implica manifesto bis in idem (fl. 329).

Afirma que, não bastasse isso, estas duas circunstâncias são inerentes ao tipo de descumprimento de medida protetiva, uma vez que é pressuposto para a configuração deste delito a prática de crime em contexto de violência doméstica. Portanto, trata-se de circunstância já sopesada pelo legislador no momento de cominar a pena em abstrato ao delito de descumprimento de medida protetiva (art. 24-A da Lei

n. 11.340/2006), de tal forma que a exasperação, mais uma vez, configura dupla

punição pelo mesmo fato, por ser considerada simultaneamente para tipificar a conduta e para exasperar a pena (fl. 329).

Ao final da peça recursal, requer o provimento da insurgência para reconhecer o bis in idem e redimensionar a pena, afastando as agravantes previstas no art. 61, inciso II, alíneas e e f, do Código Penal, na segunda fase da dosimetria do delito tipificado no art. 24-A da Lei n. 11.340/2006 (fl. 331).

Oferecidas contrarrazões (fls. 335/340), o recurso especial foi admitido na origem (fl. 343).

O Ministério Público Federal opina pelo parcial provimento da insurgência, nos termos da seguinte ementa (fl. 352):

RESP. PENAL. CRIME DE DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA. ART. 24-A DA LEI Nº 11.340/2006. APLICAÇÃO DA PENA. AGRAVANTE DO ART. 61, INCISO II, ‘E’, DO CP. CRIME PRATICADO CONTRA MÃE. CABIMENTO. AGRAVANTE DO ART. 61, II, ‘F’, DO CP. BIS IN IDEM VERIFICADO. A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONSTITUI ELEMENTAR DO CRIME DE DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA.

- No caso, o acórdão recorrido manteve os aumentos de 1/6,aplicado em relação ao crime do art. 24-A da Lei nº 11.340/06, em razão das agravantes prevista no art. 61, II, ‘f’, do CP. Portanto, configurado o bis in idem, já que a violência doméstica já constitui elementar do crime.

- Parecer pelo parcial provimento do recurso especial.

É o relatório.

Para elucidação do quanto requerido, do combatido aresto extraem-se os seguintes fundamentos (fl. 314):

[...] Em segunda fase, houve o reconhecimento da a agravante da reincidência (cf. fls. 62/63), assim como as agravantes previstas no artigo611 1 1, inciso II, alínea f e e, do Código Penal l l l, pelo crime ter sido cometido com violência a mulher e contra irmão.

Inviável a pretensão defensiva de afastamento das agravantes previstas no

artigo 61, inciso II, alíneas f e e, do Código Penal, sob a alegação de bis in idem, eis que os delitos foram praticados em face de duas vítimas, Sidnei Ferreira dos Santos e Cícera Maria da Silva Santos, sendo aquela irmão e está genitora do apelante.

[...]

Por sua vez, da sentença condenatória extraem-se os seguintes fundamentos (fl. 215):

[...] 1) Quanto ao crime do artigo24-AA A, da Lei nº 11.340 00000/06. As condições judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal, lhes são favoráveis. Portanto, para necessária e suficiente reprovação e prevenção em relação ao crime de descumprimento de medidas protetivas, fixo a pena base no mínimo legal em 3 (três) meses de detenção.

Na segunda fase da dosimetria, presente a agravante da reincidência, conforme consta a fls. 62/63 [...], prevista no artigo 61, inciso I, do Código Penal, aumento a pena em 1/6 (um sexto), bem como aumento em 1/6 (um sexto) pela agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea f, do Código Penal, pelo crime ter sido cometido com violência a mulher, acrescento de 1/6 (um sexto) pela presença da agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea e, do Código Penal, que a torno definitiva em 4 (quatro) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção, ante a ausência de causas de aumento e diminuição.

[...]

Observa-se dos trechos acima que a instância de origem fez incidir, quanto ao delito previsto no art. 24-A da Lei n. 11.340/2006 (descumprimento de medida protetiva de urgência), praticado contra a genitora do réu, as agravantes do art. 61, II, e e f , do Código Penal (crime praticado contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge; e com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica).

Ocorre que, de fato, o crime de descumprimento de medida protetiva de urgência pressupõe o contexto de violência doméstica e familiar contra vítima mulher, conforme definido no art. da Lei n. 11.340/2006, razão pela qual a agravante do art. 61, II, f, do Código Penal não pode incidir no caso, sob pena de incorrer em vedado bis in idem .

Nesse sentido:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. OPERAÇÃO EX-CÂMBIO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E LAVAGEM DE DINHEIRO. ALEGADA DEFICIÊNCIA NA DEFESA TÉCNICA. PREJUÍZO NÃO COMPROVADO. SÚMULA 523/STF. TESE DE REVOGAÇÃO TÁCITA DO ART. 385 DO CPP PELA LEI 13.964/2019. PROFERIMENTO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA APÓS PEDIDO ABSOLUTÓRIO DO PARQUET EM ALEGAÇÕES FINAIS. SENTENÇA PROLATADA ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA NOVEL LEGISLAÇÃO. APLICAÇÃO IMEDIATA, E NÃO RETROATIVA, DAS NORMAS PROCESSUAIS PENAIS. ART. DO CPP. ACÓRDÃO SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO QUANTO ÀS ELEMENTARES TÍPICAS DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E DA LAVAGEM DE DINHEIRO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. SÚMULA 7/STJ. REFORMATIO IN PEJUS NÃO CONFIGURADA. ACÓRDÃO QUE APENAS MANTEVE A FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA, SEM LHE ACRESCER ARGUMENTOS. INOVAÇÃO RECURSAL. DESCABIMENTO. REITERAÇÃO DELITIVA NA LAVAGEM. BIS IN IDEM COM A CONDENAÇÃO POR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. AGRAVO REGIMENTAL CONHECIDO EM PARTE E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO PARA EXCLUIR A MAJORANTE DO ART. , § 4º, DA LEI 9.613/1998.

[...]

11. A incidência da majorante do art. , § 4º, da Lei 9.613/1998, pela reiteração delitiva na lavagem de dinheiro, configura bis in idem com a condenação por organização criminosa. Afinal, a prática reiterada da lavagem corresponde justamente ao núcleo nominal "infrações penais" referido no art. , § 1º, da Lei 12.850/2013.

12. Agravo regimental conhecido em parte e, nesta extensão, desprovido. Habeas corpus concedido de ofício, para excluir a majorante do art. , § 4º, da Lei 9.613/1998. (AgRg no REsp n. 1.943.370/RS, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 16/11/2021 - grifo nosso).

Por outro lado, o mesmo não se verifica no que se refere à agravante prevista no art. 61, II, e , do Código Penal, já que o fato de a vítima ser ascendente do réu não pressupõe, necessariamente, a configuração do referido delito, como bem observado pelo Ministério Público em seu parecer.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO QUALIFICADO. BIS IN IDEM NA DOSIMETRIA. INOCORRÊNCIA. CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO QUE NÃO SE CONFUNDEM COM A QUALIFICADORA E A AGRAVANTE.

1. Hipótese em que as circunstâncias do delito não foram aferidas negativamente pelo simples fato de ter havido lesão corporal, nem de ser a vítima idosa, mas pela forma de execução do delito: esperar a vítima ficar sozinha, para então imobilizá-la, aumentando ainda mais seu estado de vulnerabilidade, e assim agredi-la e tentar estuprá-la.

2. Tal conduta não está descrita nas elementares do tipo penal, indo além daquilo que foi previsto pelo legislador, não havendo falar em bis in idem em relação à agravante prevista no art. 61, II, h, do C 3. Agravo regimental improvido. ( AgRg no AREsp n. 1.842.067/TO, Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF/1a Região), Sexta Turma, DJe 16/11/2021).

Diante desse contexto, necessário o decote da agravante prevista art. 61, II, f , do Código Penal, e o refazimento da dosimetria no que tange ao delito previsto no art. 24-A da Lei n. 11.340/2006.

Observada a pena-base estabelecida em primeira instância, na segunda fase a pena é reduzida para 4 meses de detenção , tornando-se definitiva diante da ausência de causas de aumento ou diminuição.

Ante o exposto, com fundamento no art. 255, § 4º, II e III, do RISTJ, dou parcial provimento ao recurso especial para decotar a agravante do art. 61, II, f , do Código Penal, com relação ao crime de descumprimento de medida protetiva de urgência, redimensionando a pena para 4 meses de detenção.

Publique-se.

Brasília, 14 de abril de 2023.

Ministro Sebastião Reis Júnior

Relator

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(STJ - REsp: 2025882, Relator: SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Publicação: 18/04/2023)

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