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29 de Abril de 2024

STJ Mar23 - Execução Penal - Recusa ao Trabalho desclassificada de Falta Grave para Média

ano passado

Inteiro Teor

HABEAS CORPUS Nº 763999 - SC (2022/0255276-8)

RELATOR : MINISTRO ANTONIO SALDANHA PALHEIRO

I

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em favor de XXXXXXXXXXXX apontando como autoridade coatora o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA (Agravo em Execução n. 5012058- 36.2022.8.24.0033).

Depreende-se dos autos que o Juízo das execuções homologou o procedimento administrativo disciplinar que concluiu pela prática de falta grave do paciente, fixando nova data-base e determinando a perda de 1/3 dos dias remidos.

Interposto agravo em execução na origem, o Tribunal a quo negou provimento ao recurso, em acórdão assim ementado (e-STJ fls. 78/79):

RECURSO DE AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO QUE HOMOLOGOU O PAD, RECONHECEU A PRÁTICA DE FALTA GRAVE E APLICOU SANÇÕES. INSURGÊNCIA DEFENSIVA.

AVENTADA ILEGALIDADE DA DECISÃO AGRAVADA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO SUBSTANTIVA. AVENTADA, AINDA, INSUFICIÊNCIA DE PROVAS QUANTO À OCORRÊNCIA DA FALTA GRAVE E PLEITEADO O RECONHECIMENTO DA ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO ACOLHIMENTO. DECISUM QUE ANALISOU A LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR (PAD). ATUAÇÃO DO MAGISTRADO QUE, NESTE PARTICULAR, SEGUIU ORIENTAÇÃO DESTA CORTE E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INDICAÇÃO DE ELEMENTOS COLHIDOS NO PAD PARA FORMAÇÃO DO SEU CONVENCIMENTO. AUTORIDADE ADMINISTRATIVA QUE É COMPETENTE PARA DISCUTIR O MÉRITO DO INCIDENTE E CONCLUIU PELO RECONHECIMENTO DA FALTA GRAVE. ADEMAIS, DEFESA QUE NÃO COMPROVOU QUE A PORTA DA CELA NÃO FOI ABERTA PARA QUE O APENADO SAÍSSE AO TRABALHO OU QUE TERIA SIDO COAGIDO MORALMENTE A PARTICIPAR DA PARALISAÇÃO. DECLARAÇÕES DO GERENTE DE SEGURANÇA E LISTA DE PRESENÇA DA EMPRESA EMPREGADORA QUE DEMONSTRARAM A AUSÊNCIA DO APENADO ÀS OFICINAS DE TRABALHO DURANTE AO MENOS CINCO DIAS. INEXISTÊNCIA DE DÚVIDAS DE QUE O APENADO DEIXOU DE IR TRABALHAR DURANTE QUASE UMA SEMANA. ALÉM DISSO, APENADO QUE NÃO É PRESO PROVISÓRIO , UMA VEZ QUE RESGATA PENA POR DUAS CONDENAÇÕES DEFINITIVAS. OBRIGATORIEDADE AO TRABALHO APLICÁVEL. FALTA GRAVE CARACTERIZADA. PLEITO SUBSIDIÁRIO DE DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA FALTA MÉDIA DO ART. 96, II OU IX, DA LCE N. 529/2011. INVIABILIDADE. CONDUTA IMPUTADA QUE SE SUBSOME À FALTA GRAVE PREVISTA NO ART. 50, VI, C/C ART. 39, V, AMBOS DA LEP. DECISUM MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

Daí o presente writ, no qual alega a defesa que "o ato ilegal efetuado pelo Diretor Prisional consistiu em catalogar uma falta grave, sem provas suficientes, de maneira injusta, e incoerente, ao ponto que teria apenas escolhido alguns internos para responder a tal PAD, ou seja, alguns internos da Galeria 'C', deixando que outros internos da Galeria D sem quer respondessem a um RO" (e-STJ fl. 5).

Sustenta, ainda, que, "além da total ausência de provas em relação a tais 'recusas' e a dificuldade em individualizar a conduta, tem-se que em tal data existiam notícias e rumores sobre uma paralização pacifica por grupos criminais"PGC"para melhores condições nas visitas, higiene dentre outras situações ocorridas dentro das unidades prisionais com as suspensões ocorridas pelo CODIV 19" (e-STJ fl. 6).

Requer, liminarmente e no mérito (e-STJ fls. 25/26):

a) conceda-se a ordem de habeas corpus restabelecendo-se os direitos do Paciente, afastando a falta grave, até julgamento definitivo do habeas corpus, ao final, concedida ou não a liminar, seja reconhecida a ilegalidade do acórdão, para RECONHECER o afastamento da falta grave e subsidiariamente desclassificando-a para média, em observância ao art. 96, inciso IX da Lei Complementar n. 529/2011 do Estado de Santa Catarina;

Subsidiariamente, caso não seja conhecido o habeas corpus, seja a ordem concedida de ofício, diante da manifesta ilegalidade ( CRFB/88, art. 5.º, LXVIII; CPP, art. 654, § 2.º).

Ademais, diante da omissão de todas as instâncias até o momento, que está respeitosa Corte Superior de Justiça, determine que o Juízo de Execuções Penais averigue as irregularidades ocorridas nos procedimentos administrativos, sem prejuízo aos demais internos que não foram prejudicados com a instauração do PAD, no escopo de verificar a catalogação adequada das faltas imputadas.

Requer-se ainda Excelências, diante do tamanho ferimento ao princípio da igualdade, elencado na carta maior em seu artigo , inciso I da Constituição Federal, seja dado tratamento EXTENSIVO a todos o PAD’s decorrentes deste fato, no escopo de não abarrotar ainda mais esta corte, tendo em vista que uma injusta imposição acarreta sérios prejuízos aos reeducandos.

Indeferida a liminar (e-STJ fls. 311/313) e prestadas as informações solicitadas (e-STJ fls.322/341), manifestou-se o Ministério Público Federal pela denegação da ordem (e-STJ fls. 343/347).

É o relatório.

Decido.

No caso, o Tribunal manteve o reconhecimento da falta grave nos seguintes termos (e-STJ fls. 66/77):

Em relação à alegada nulidade da decisão impugnada por apresentar fundamentação genérica, insta salientar que, no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.378.557/RS, os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria de votos, decidiram que compete ao Juiz da execução penal apenas o controle de legalidade dos procedimentos administrativos, de modo que cabe ao diretor do estabelecimento prisional a instauração de incidente disciplinar, a apuração e o reconhecimento de falta grave.

Extraem-se do voto do relator os seguintes fragmentos:

[...] o diretor do presídio deve apurar a conduta do detento, identificá-la como falta leve, média ou grave, aplicar as medidas sancionatórias que lhe compete, no exercício de seu poder disciplinar, e, somente após esse procedimento, quando ficar constatada a prática de falta disciplinar de natureza grave, comunicar ao juiz da Vara de Execuções Penais para que decida a respeito das referidas sanções de sua competência, sem prejuízo daquelas já aplicadas pela autoridade administrativa.(fl. 12)

[...]

Dessa forma, constata-se que a Lei de Execução Penal não deixa dúvida ao estabelecer que todo o "processo" de apuração da falta disciplinar (investigação e subsunção), assim como a aplicação da respectiva punição, é realizado dentro da unidade penitenciária, cuja responsabilidade é do seu diretor, porquanto é quem detém o exercício do poder disciplinar. (fls.12- 13)[...]

Portanto, a competência do magistrado na execução da pena, em matéria disciplinar, revela-se limitada à aplicação de algumas sanções, podendo, ainda, quando provocado, efetuar apenas controle de legalidade dos atos e decisões proferidas pelo diretor do presídio, em conformidade com o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição ( CF/1988, art. , inciso XXXV). (fl. 13)

[...]

Nota-se que os procedimentos não se confundem. Ora, se de um lado, o PAD visa apurar a ocorrência de falta grave, com observância do contraditório e da ampla defesa, bem como a aplicação de diversas sanções disciplinares pela autoridade administrativa; de outro, a oitiva do apenado tem como único objetivo a aplicação da sanção concernente à regressão de regime, exigindo-se, por óbvio, que já tenha sido reconhecida a falta grave pelo diretor do presídio. (fl. 24)

[...]

(STJ - REsp 1.378.557/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellize, 3a Seção, j. em23/10/2013).

[...]

Destarte, é assente que, como regra, não cabe ao Poder Judiciário analisar o mérito da conduta considerada faltosa do reeducando, devendo o Magistrado avaliar, quando necessário, a legalidade do procedimento, de forma a garantir a aplicabilidade do contido no art. , LV, da Constituição da Republica Federativa do Brasil, ou, no máximo, alguma flagrante incorreção ou inadequação na análise dos fatos por parte da autoridade penitenciária. Na hipótese em apreço, o procedimento administrativo disciplinar foi instaurado em razão do seguinte fato (autos do SEEU, seq. 61.1, fl. 4): "nos dias 22,23, 24, 25 e 26 de novembro de 2021, o apenado recusou-se sem justificativa a sair da cela para laborar na indústria Rovitex Costura".

Após elaboração do PAD, foi ouvido o agravante, na presença de seu advogado constituído (autos do SEEU, seq. 61.1, fls. 6-7), bem como o reeducando Ederson Ribeiro de Oliveira, que foi testemunha dos fatos (autos do SEEU, seq.61.1, fl. 12). Foi também juntada ao PAD a lista de comparecimento ao trabalho da indústria Rovitex, na qual constam as faltas do reeducando (autos do SEEU, seq.61.1, fl. 11), bem como as declarações do coordenador de segurança do estabelecimento prisional, informando que os apenados que laboravam no primeiro turno no referido empreendimento se recusaram a sair para trabalhar nos dias 22, 23,24, 25 e 26 de novembro de 2021 (autos do SEEU, seq. 61.1, fls. 8-10).

Em seguida, o conselho disciplinar opinou pela procedência do PAD (autos do SEEU, seq. 61.1, fls. 13-14) e foi apresentada a defesa administrativa do apenado (autos do SEEU, seq. 61.1, fls. 15-28). Posteriormente, o diretor da Penitenciária Masculina de Itajaí reconheceu o cometimento de falta grave, nos termos do art. 50, VI, c/c art. 39, V, ambos da LEP (autos do SEEU seq. 61.1, fls.29-34).

Na sequência, o Ministério Público e a defesa ofereceram manifestação no PEC, respectivamente, nas seqs. 66.1 e 72.1 dos autos do SEEU, de sorte que sobreveio decisão judicial no sentido de homologar o PAD em questão, e aplicar, por consequência, os consectários legais, nos seguintes termos (autos do SEEU, seq.75.1):

I- PAD

Inicialmente, cabe destacar o Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que a audiência de justificação prévia é prescindível para o reconhecimento da falta grave, desde que respeitados os princípios do contraditório e ampla defesa em sede administrativa - estabelecimento penal, uma vez que já garantida a oitiva do apenado, na presença de seu defensor, em procedimento administrativo disciplinar. Segue recente julgado do Superior Tribunal de Justiça:

[...]

No mesmo sentido tem se posicionado o Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Adotando igual entendimento, afasto a alegação de nulidade por ausência de realização de audiência de justificação.

Dito isto, infere-se dos autos que, no curso da execução da pena, o sentenciado supostamente cometeu fatos definidos como falta grave (art. 50, VI, da LEP).

Encerrada a instrução do PAD, a Autoridade Prisional acolheu parecer do Conselho Disciplinar e reconheceu o cometimento da falta grave (Sequencial 61.1).

No caso presente, o procedimento administrativo disciplinar foi absolutamente hígido e a autoridade administrativa, competente para discutir o mérito do incidente, concluiu pelo reconhecimento da falta grave.

Ademais, não encontra respaldo a alegação da Defensoria Pública de que o apenado não teve opção quanto à prática da falta grave, ao passo que, conforme depoimento do policial penal presente no PAD, os apenados não aceitaram ir para a cela do seguro.

Ou seja, mesmo quando ofertado a possibilidade de trabalharem e após serem encaminhados para outra cela, ainda assim não quiseram.

Do mesmo modo, quanto à suposta falta coletiva, observa-se que também não prospera, ao passo que foram ouvidos os custodiados individualmente, assim como os policiais penais. Ainda, foi anexado filmagem dos fatos, não restando dúvidas acerca da conduta delituosa.

[...]

Registre-se, ademais, que os arts. 47 e 48 da LEP estabelecem que, no âmbito da execução penal, a apuração da conduta faltosa, a sua consequente subsunção à norma legal é atribuição exclusiva do diretor do estabelecimento prisional.

O Juízo da execução exerce tão somente competência suplementar, ou seja, na aplicação das sanções cominadas à falta grave sujeitas à reserva de jurisdição, além do controle de legalidade dos atos e decisões proferidas no PAD.

Portanto, inexistindo qualquer mácula no PAD, sua homologação é medida que se impõe, reconhecendo o cometimento da falta grave nos termos do art. 118, I da LEP.

I. II - Da perda dos dias remidos

Nos termos do art. 127 da LEP, em "caso de falta grave, o juiz poderá revogar até1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar".

Por sua vez, dispõe o art. 57 da LEP, que: "Na aplicação das sanções disciplinares, levar-se-ão em conta a natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão".

Conforme consta no art. 39, I e II, da LEP se trata de dever do preso o comportamento disciplinar, cumprimento fiel da sentença e obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com quem deva relacionar-se. Inclusive a Disciplina constitui topologicamente seção específica da Lei de Execucoes Penais, reforçando a ideia de submissão à ordem, na forma do art. 44.

A importância da disciplina é tamanha, que o próprio art. 52, traz regramento diferencial para aquele que comete crime doloso quando ocasiona subversão da ordem ou disciplina internas, sendo o caso primário de aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado.

Considerando o exposto, observando ainda precedentes do TJ-SC que em casos de falta grave por subversão aplicaram a perda de dias remidos nos seu grau máximo, ante a consequência da falta, observando ainda os fatores desabonadores do art. 57, deve-se declarar a perda de 1/3 dos dias remidos. Assim, verifica-se que o apenado, que fazia jus a 9 dias remidos, conforme atestado de penas, perderá o total de 3 dias de remição.

Da mesma forma, em observância ao contido no art. 118, I, da LEP, "a execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado: I - praticar fato definido como crime doloso ou falta grave".

No entanto, considerando que o apenado já se encontra cumprindo a pena atualmente em regime fechado, não há que se falar em regressão.

Conclusão:

Ante o exposto, HOMOLOGO o procedimento administrativo disciplinar instaurado pela Portaria nº 198/2021 e, em consequência:

a) Considerando que o sentenciado já se encontra no regime mais rigoroso, determino a alteração da data-base, para fins de progressão, para o dia do cometimento da falta grave, qual seja, 22/11/2021;

b) Determino a perda de 1/3 dos dias remidos até a data da falta grave (3 dias de remição);

c) Proceda o cartório a validação dos novos dados, lançando-se a regressão, nova data-base, bem como a perda dos dias remidos.

Registre-se que os arts. 47 e 48 da LEP estabelecem que, no âmbito da execução penal, a apuração da conduta faltosa, a sua consequente subsunção à norma legal é atribuição exclusiva do diretor do estabelecimento prisional.

O Juízo da execução exerce tão somente competência suplementar, ou seja, na aplicação das sanções cominadas à falta grave sujeitas à reserva de jurisdição, além do controle de legalidade dos atos e decisões proferidas no PAD.

Como se pode observar, o procedimento administrativo disciplinar respeitou o contraditório.

Ademais, o Magistrado a quo revisou, ainda que de forma breve, o mérito do procedimento ao homologá-lo, bem como fundamentou as sanções aplicada. Assim, nos limites cabíveis à manifestação judicial, não antevejo ilegalidade manifesta na homologação do PAD quanto ao reconhecimento da falta grave, nos termos do inc. VI do art. 50 c/c art. 49, caput, ambos da LEP:

[...]

Ademais, tampouco prosperam os argumentos de que não há provas suficientes de que se recusou a trabalhar na data dos fatos tampouco de que sua conduta seria atípica ou, no máximo, caracterizaria falta média.

É que, embora tenha alegado que não foi trabalhar porque não foi chamado nominalmente e que sequer abriram a porta para que saísse para trabalhar durante os dias da paralisação, o fato de não ter sido chamado não o exime do dever de executar o trabalho, enquanto a afirmação de que a porta da cela não foi aberta nem ao menos foi devidamente demonstrada, uma vez que a testemunha Ederson disse apenas não se lembrar do ocorrido.

Da mesma forma, tampouco há informações de que os apenados cujos depoimentos foram emprestados de outros autos pela defesa no recurso (autos do agravo, doc. 2, fl. 14) fossem da mesma cela que o ora agravante. Por outro lado, as declarações do gerente de segurança da unidade prisional e a lista de presença da indústria Rovitex (referidos no item anterior), denotam que, de fato, recusou a comparecer às atividades laborais por quase uma semana, o que caracteriza a falta grave prevista no art. 50, VI, c/c art. 39,V, da LEP.

E nem se fale em aplicação de sanção coletiva, uma vez que o apenado foi ouvido administrativamente, pôde arrolar suas testemunhas e teve a procedência do PAD e a homologação do procedimento devidamente fundamentadas e baseadas no fato de que efetivamente deixou de trabalhar durante os dias da paralisação.

Ademais, ressalta-se que, embora o agravante tenha aventado a atipicidade da conduta por ser a obrigatoriedade ao trabalho aplicável apenas aos condenados definitivamente, verifica-se no relatório de situação carcerária que o reeducando resgata pena por, pelo menos, duas condenações já transitadas em julgado (autos do SEEU, seq. 35.1, fls. 3 e 4).

Além disso, em que pese a alegação de que a paralisação era de conhecimento do diretor da unidade prisional e que este poderia ter suspendido as atividades laborais para não prejudicar os reeducandos que pretendiam trabalhar, mas tinham medo de represálias, não houve comprovação por parte da defesa de que o agravante estivesse sofrendo ameaças de organização criminosa para que não comparecesse às atividades laborais.

[...]

Assim, inviável o reconhecimento de ilegalidade no PAD ou na decisão que o homologou.

No que se refere ao pedido subsidiário de desclassificação da conduta para a falta média prevista no art. 96, II ou IX, da Lei Complementar Estadual n.529/2011, melhor sorte não assiste ao agravante.

Isso porque a análise quanto à natureza da infração disciplinar também cabe à autoridade administrativa e, além disso, a conduta imputada ao apenado, de fato, subsome-se àquela prevista no art. 50, VI, c/c art. 39, V, da LEP, uma vez que tais dispositivos definem como falta grave a inobservância do dever de execução do trabalho.

Logo, não verificadas ilegalidades, tampouco afronta aos princípios constitucionais, mantém-se a homologação do PAD.

Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

De fato, a recusa ao trabalho não é prevista, de forma específica, no texto do art. 50 da Lei de Execucoes Penais, rol considerado taxativo pela doutrina.

O último julgado desta Corte Superior, que tratou da recusa ao trabalho como falta grave, é de 2018, o AgRg no HC n. 429.608/SP, relator Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJe de 27/4/2018. Embora o precedente não seja antigo, não há outros mais recentes. O penúltimo é de 2010, bem mais antigo.

Além disso, relativo ao Regimento Interno dos Estabelecimentos Penais do Estado de Santa Catarina, o art. 96 da Lei Complementar n. 529/2011 é bem mais específico sobre a matéria, ao mencionar especificamente a falta ao trabalho (e-STJ, fls. 82/83):

Art. 96. São faltas disciplinares médias:

I -praticar ou contribuir para a prática de jogos proibidos, agravando-se a falta quando essa prática envolver exploração de outros presos;

II -resistir, inclusive por atitude passiva, à execução de ordem ou ato administrativo;

II -ofender funcionários;

IV -praticar compra ou venda não autorizada em relação a outro preso;

V -faltar à verdade com o fim de obter vantagem ou eximir-se de responsabilidade;

VI -formular queixa ou reclamação com improcedência, reveladora de motivo reprovável;

VII -explorar companheiro sob qualquer pretexto ou forma;

VIII -desobedecer aos horários regulamentares;

IX -recusar-se sem motivo justo ao trabalho que for determinado;

X -recusar-se à assistência ou ao dever escolar sem razão justificada;

XI -entregar ou receber objetos sem a devida autorização;

XII -desleixar-se da higiene corporal, do asseio da cela ou alojamento e descurar da conservação de objetos de uso pessoal;

XIII -lançar nos pátios águas servidas ou objetos, bem como lavar, estender ou secar roupas em local não permitido;

XIV -produzir ruídos para perturbar a ordem nas ocasiões de descanso, de trabalho ou de reunião;

XV -desrespeitar os visitantes, seus ou de outros internos;

XVI -retardar o cumprimento de ordem com intuito de procrastinação;

XVII -descurar da execução de tarefa; e

XVIII -ausentar-se dos lugares em que deva permanecer.

Segundo a própria Lei de Execucoes Penais, as infrações médias são reguladas por legislação específica:

Art. 49. As faltas disciplinares classificam-se em leves, médias e graves. A legislação local especificará as leves e médias, bem assim as respectivas sanções.

Nesse sentido:

HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DA PENAL. ANOTAÇÃO DE FALTA DISCIPLINAR DE NATUREZA MÉDIA. CONDUTA PREVISTA APENAS EM MANUAL DE PROCEDIMENTOS DE SECRETARIA ESTADUAL. ILEGALIDADE. ART. 49 DA LEP. COMPETÊNCIA DO ESTADO PARA DESCREVER ATOS CARACTERIZADORES DE FALTAS DISCIPLINARES DE NATUREZA MÉDIA E LEVE. PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL. ORDEM CONCEDIDA.

1. Para imputação do cometimento de faltas disciplinares de natureza média ou leve, ex vi do art. 49 da Lei de Execucoes Penais, é necessária previsão legal estadual.

2. Nesse contexto, se o preso foi surpreendido com suposta bebida alcoólica dentro da cela e essa conduta não está prevista como falta disciplinar de natureza média ou leve pela legislação estadual, conduta descrita como infração disciplinar apenas em regimento interno de secretaria estadual, não há como ser reconhecida a falta.

3. Ordem concedida para tornar sem efeito a decisão do Juízo das Execuções que imputou à Paciente a prática de falta média, referente ao PAD n.º 121/09.

( HC n. 176.036/SP, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 2/8/2012, DJe de 13/8/2012.)

Ante o exposto, concedo a ordem para determinar a cassação do acórdão coator, e, por conseguinte, a retificação pelo Juízo das Execuções da classificação da falta disciplinar para falta média, procedendo aos consectários legais próprios dessa classificação.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 07 de março de 2023.

Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO

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(STJ - HC: 763999, Relator: ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Publicação: 09/03/2023)

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