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4 de Junho de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça do Ceará
há 2 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

2ª Câmara Direito Público

Publicação

Julgamento

Relator

FRANCISCO GLADYSON PONTES

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-CE_AC_01196166520168060001_d316c.pdf
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Inteiro Teor

GABINETE DES. FRANCISCO GLADYSON PONTES

Processo: XXXXX-65.2016.8.06.0001 - Apelação Cível

Apelante: Banco Bradesco S/A

Apelado: Estado do Ceará

Custos Legis: Ministério Público Estadual

EMENTA: ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. VIOLAÇÃO DE NORMA ESTADUAL DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. AUTUAÇÃO E MULTA ADMINISTRATIVA. INSCRIÇÃO NA DÍVIDA ATIVA. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO DO EMBARGANTE. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE DA UNIÃO E ESTADOS PARA EDIÇÃO DE NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. ATUAÇÃO DO ÓRGÃO ESTADUAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR NA FISCALIZAÇÃO E APLICAÇÃO DE MULTA PREVISTA EM LEI. AUSÊNCIA DE NULIDADE NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DE APLICAÇÃO DA MULTA. PROPORCIONALIDADE A RAZOABILIDADE DO VALOR DA MULTA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ, por unanimidade, em conhecer da apelação, para negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator, que faz parte desta decisão.

Fortaleza, data registrada no sistema.

FRANCISCO GLADYSON PONTES

Relator

GABINETE DES. FRANCISCO GLADYSON PONTES

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível por via e em sede da qual BANCO BRADESCO S A impugna sentença proferida pelo Juízo da 4a Vara de Execuções Fiscais da Comarca de Fortaleza que, nos autos dos Embargos à Execução nº XXXXX-65.2016.8.06.0001, ajuizados contra o ESTADO DO CEARÁ, julgou improcedente o pedido formulado na peça inaugural.

Na inicial dos embargos ajuizados na origem, o ora apelante afirma que "o PROCON estadual não detém competência para fiscalizar os estabelecimentos bancários ou mesmo aplicar multas" e não pode"em consequência, disciplinar as instituições financeiras e estabelecer regras para o seu funcionamento, seja em relação aos caixas de atendimento ou qualquer outro setor" das unidades bancárias. Reporta que "é patente ... a inconstitucionalidade do Decreto nº 30.906/2012 ... pois não existe respaldo ou espaço constitucional que permita ao Estado do Ceará legislar acerca do Sistema Financeiro em suas mais variadas facetas", pois"a atividade bancária, em especial no que pertine à determinação de instalação de equipamentos de segurança, deve ser objeto de deliberação da União Federal, através do Banco Central do Brasil que fiscaliza, antes de expedir a autorização para o funcionamento, a presença dos requisitos elencados na Lei Federal nº 7.102/1983". Ressalta que o Estado do Ceará e o PROCON estadual não têm "poder para alterar exigências de lei federal, especialmente em face do preceito referido nos arts. 192 e 48 da Constituição Federal" e que "o art. 22 da Constituição Federal, de forma terminativa, evidencia a competência exclusiva e privativa da

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União para legislar sobre direito comercial e sobre política de crédito e de transferência de valores, o que inclui, logicamente, o atendimento da clientela dos bancos comerciais e múltiplos, nos seus caixas", a revelar que"é inconstitucional e, portanto, nulo o Decreto nº 30.906/2012". Acrescenta que as multas "quando fixadas em valor exorbitante, podem e devem, à luz da proporcionalidade e razoabilidade, ser revistas a qualquer tempo pelo magistrado, inclusive ex officio". Requer que seja declarada a "improcedência da ação de execução fiscal".

O Estado do Ceará, na impugnação ao pedido veiculado pelo embargante, aduz que o Estado tem competência concorrente para legislar em caráter suplementar sobre direito financeiro e direito do consumidor, nos termos do art. 24, incisos I e V, da Constituição Federal e que o Decreto versa "somente sobre questões relacionadas à relação de consumo estabelecida entre as instituições financeiras e consumidores, em cumprimento ao art. 55, § 1º, da Lei nº 8.078/90", ao "dispor sobre a instalação de divisórias entre os caixas, no espeço reservado para atendimento aos clientes", com o objetivo de "realizar o mandamento do art. , IV", do Código de Defesa do Consumidor. Ressalta que "é obrigação de todo estabelecimento comercial não somente bancos zelar pela segurança de seus usuários" e que "dúvida não há que a parte autuada transgrediu o art. 39, VIII c/c arts. 1º e 3º da Lei Estadual nº 14.961/11 e art. 1º do Decreto nº 30.906/12". Afirma que "a Lei nº 14.961/11, regulamentada pelo Decreto nº 30.906/12 sequer foi alvo de quaisquer ações de inconstitucionalidade, devendo, pois, ser observada em sua integralidade", que o PROCON "agiu em total consonância tanto com a lei, como com os preceitos constitucionais, assegurando o reclamado

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de seu direito ao contraditório, à ampla defesa, bem como às demais garantias inerentes ao devido processo legal"e que"a multa foi fixada considerando a infração cometida, bem como as circunstâncias em torno da transgressão às regras norteadoras dos direitos da consumidora no caso concreto", pois"o próprio Código de Defesa do Consumidor confirma a competência normativa estatal, no bojo do parágrafo 1º de seu art. 55".

Concluiu o juízo a quo , ao julgar improcedente os embargos à execução, que a Lei Estadual nº 14.961/2001 "trata sobre segurança nas relações de consumo e, portanto, sendo matéria de competência da União, dos Estados, do DF e municípios (interesse local)", evidencia que "o Estado detém plena competência para tratar sobre o tema em questão, que diz respeito não ao sistema financeiro e muito menos sobre regras relativas à atividade fim do serviço bancário, mas sim regula apenas a relação de consumo entre agências bancárias e seus clientes, de modo a conferir mais segurança a estes, não havendo que se falar em inconstitucionalidade da Lei nº 14.961/2011". Fez consignar que o "DECON, órgão integrante das Promotorias de Justiça do consumidor, com atuação na proteção e defesa do consumidor, foi criado pela Lei Complementar Estadual nº 30/02", com atribuições que incluem a "atividade fiscalizatória e sancionatória" no âmbito das relações de consumo, nos termos do art. 4º, inciso II, e que a Lei Estadual nº 14.961/2011 atribui ao órgão estadual de defesa do consumidor a fiscalização do cumprimento de suas disposições e a aplicação das sanções por eventual descumprimento, em processo administrativo iniciado com a lavratura de auto de infração. Fez ainda consignar que não é dado "ao Poder Judiciário adentrar no mérito administrativo no tocante à aplicação da penalidade, mas apenas

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observar se houve respeito à forma legal, ao devido processo legal a aos princípios do contraditório a à ampla defesa" e que "a multa que embasa a execução fiscal, arbitrada em 15.000 UFIRCE mostra-se proporcional e razoável". Fez por fim consignar que "o Estado detém competência para legislar sobre matéria atinente às relações de consumo, não tendo havido violação aos princípios do contraditório e ampla defesa no processo administrativo, assim como não foram violados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade na fixação do valor da multa (cuja fixação acima do mínimo legal fora devidamente fundamentada e obedeceu a critérios razoáveis)".

Nas razões recursais, o apelante afirma que "os fatos havidos não justificam a multa imposta", que foi fixada em valor que viola os "princípios da razoabilidade e da proporcionalidade", que o Estado do Ceará violou "o direito ao contraditório e à ampla defesa, uma vez que apenas cita de forma genérica os dispositivos supostamente infringidos, bem como não acostou aos autos do processo fiscal as cópias dos processos administrativos" e que "a ausência de indicação dos dispositivos legais e regulamentares que foram infringidos, bem como cópia do processo administrativo que ocasionou o débito" acarreta a nulidade da inscrição da dívida. Aduz que "a segurança bancária é objeto de minuciosa regulamentação por parte da Lei Federal nº 7.102/1983", que contém previsão específica "sobre os dispositivos de segurança bancária que as agências devem possuir para poder operar", com base na qual "o sistema de segurança dos Bancos foi delineado, ... sob fiscalização do Ministério da Justiça (que o faz através da Polícia Federal)" , a quem "anualmente os Bancos submetem seus respectivos planos de segurança". Aduz ainda que "os Estados também avocam competência para legislar sobre o tema e

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criam uma séria de exigências, muitas até contrárias ao que a Polícia Federal reconhece como eficaz, exemplo dos biombos em que a Polícia Federal entende servir apenas para criar 'pontos cegos' nas agências"e que"a adoção das divisórias certamente prejudicará as recentes adaptações realizadas nas dependências bancárias", além de não haver"qualquer estudo, laudo ou parecer técnico que indique ser a divisória um mecanismo de segurança eficaz". Afirma que "o Procon Estadual não detém competência para fiscalizar os estabelecimentos bancários ou mesmo aplicar multas" e "não podem, em consequência, disciplinar as instituições financeiras e estabelecer regras para o seu funcionamento, seja em relação aos caixas de atendimento ou qualquer outro setor correspondente". Acrescenta que "é patente ... a inconstitucionalidade do Decreto nº 30.906/2012"e que"não é dado ao Poder Público Estadual a ingerência sobre as atividades bancárias, vez que a atividade bancária, em especial no que pertine à determinação de instalação de equipamentos de segurança, seve ser objeto de deliberação da União federal, através do Banco Central do Brasil", pois"a nenhuma outra entidade pública compete regular o funcionamento dos que exercem atividades subordinadas à lei nº 4.595/64"e não tem o"PROCON Estadual poder para alterar exigências de lei federal, especialmente em face do preceito referido nos arts. 192 e 48 da Constituição Federal". Acrescenta, ainda, que "o art. 22 da Constituição Federal, de forma terminativa, evidencia a competência exclusiva e privativa da União para legislar sobre direito comercial e sobre política de crédito e de transferência de valores, o que inclui, logicamente, o atendimento da clientela dos bancos comerciais e múltiplos, nos seus caixas", por isso ser "inconstitucional e, portanto, nulo o Decreto nº 30.906/2012". Destaca, por fim, que "o valor pecuniário de multa estabelecido em sede de procedimento

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administrativo pelo PROCON colide frontalmente com o solene e geral princípio da proporcionalidade" , vez que "a multa administrativa deve, necessariamente, ser compatível com a obrigação, não podendo, portanto, seu valor se tornar tão vantajoso que acarrete enriquecimento ilícito".

O Estado do Ceará apresentou resposta à apelação, na qual afirma ser vedado ao Poder Judiciário "exercer o controle do mérito sobre a sanção aplicada ao autor, limitando-se à aferição do atendimento aos pressupostos e requisitos legais", pois "somente à vista de escancarada violação à legalidade ou aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, seria viável a intervenção do Poder Judiciário, de forma a escoimar eventual ilegalidade ou abuso". Aduz que "a sanção aplicada, não se pode negar, findou por ser fixada em estrita obediência aos princípios da legalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade" e que o valor da multa "encontra-se dentro dos padrões da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo o julgador levado em consideração à capacidade econômica das empresas transgressoras das normas do CDC" e foram observados os "parâmetros plasmados no art. 57 da Lei nº 8.078/90".

Com vista dos autos, o Ministério Público não identificou a presença no caso de interesse jurídico para apresentação de parecer de mérito.

É o breve relatório.

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VOTO

Como dado a conhecer, BANCO BRADESCO S A impugna sentença proferida pelo Juízo da 4a Vara de Execuções Fiscais da Comarca de Fortaleza que julgou improcedente o pedido formulado na inicial dos Embargos à Execução nº XXXXX-65.2016.8.06.0001, ajuizados contra o ESTADO DO CEARÁ.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação.

Examino, inicialmente, o fundamento recursal que afirma não ter o Estado competência para determinar a instalação de equipamentos de segurança em agências bancárias, por estar tal matéria minuciosamente regulamentada na Lei nº 7.102/83, editada pela União, ente federativo titular da competência privativa para legislar sobre direito comercial e política de crédito ( CF, art. 22), âmbito esse no qual se insere "o atendimento da clientela dos bancos comerciais e múltiplos, nos seus caixas".

Registre-se, a propósito do tema, que o Superior Tribunal de Justiça há muito pacificou a compreensão de que o Código de Defesa do Consumidor aplica-se às instituições financeiras. Tanto que tal orientação é objeto de enunciado específico aprovado pela Segunda Seção, verbis:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

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(Súmula 297, DJ 08.09.2004, p. 129)

A Constituição Federal dispõe que a proteção do consumidor, a ser implementada na forma da lei, constitui direito fundamental (art. 5º, XXXII), e atribui à União a competência privativa para legislar sobre direito comercial (art. 22, I) e política de crédito (art. 22, VII). Estabelece ainda a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre consumo e responsabilidade por dano ao consumidor, verbis:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

V - produção e consumo;

VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

Vale destacar que o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle abstrato de constitucionalidade, explicitou o sentido e o alcance da atribuição de competência concorrente prevista nos incisos V e VIII, do art. 24, da Constituição Federal, relativamente às instituições bancárias.

Eis a ementa do acórdão proferido no julgamento

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da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4633, verbis:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL. LEI 14.364/2011 DO ESTADO DE SÃO PAULO. OBRIGAÇÃO DE INSTALAÇÃO DE DIVISÓRIAS INDIVIDUAIS ENTRE OS CAIXAS E O ESPAÇO RESERVADO PARA CLIENTES QUE AGUARDAM ATENDIMENTO NAS AGÊNCIAS E POSTOS DE SERVIÇOS BANCÁRIOS. NORMA SUPLEMENTAR DE PROTEÇÃO AOS CONSUMIDORES. HARMONIA COM AS NORMAS GERAIS PREVISTAS NA LEI FEDERAL 7.102/1983 QUE DISPÕE SOBRE SEGURANÇA PARA ESTABELECIMENTOS FINANCEIROS E NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (LEI FEDERAL 8.078/1990). DIRETO DO CONSUMIDOR. MATÉRIA AFETA À COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE DA UNIÃO E DOS ESTADOS-MEMBROS (ARTIGO 24, V E VIII, DA CONSTITUIÇÃO DA FEDERAL). AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE CONHECIDA E JULGADO IMPROCEDENTE O PEDIDO.

1. As relações de consumo no âmbito bancário são reguladas à luz da competência concorrente da União e dos Estados-membros (artigo 24, V e VIII, da Constituição Federal).

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Precedentes: RE 610.221-RG, Rel. Min. Ellen Gracie, Plenário, DJe de 20/8/2010, Tema 272; ARE 1.013.975-AgR-segundo, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe de 22/11/2017; RE 830.133-ED-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe de 14/11/2014; RE 254.172- AgR, Rel. Min. Ayres Britto, Segunda Turma, DJe de 23/9/2011; AI 709.974-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJe de 26/11/2009; AI 747.245-AgR, Rel. Min. Eros Grau, Segunda Turma, DJe de 6/8/2009; AC 1.124-MC, Rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, DJ de 4/8/2006; AI 491.420-AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, Primeira Turma, DJ de 24/3/2006; e AI 347.717- AgR, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJ de 5/8/2005.

2. A obrigação para as agências e os postos de serviços bancários de instalar divisórias individuais entre os caixas e o espaço reservado para clientes que aguardam atendimento é norma suplementar de proteção aos consumidores dos serviços bancários no Estado de São Paulo, que se encontra em harmonia com as normas gerais previstas na Lei federal 7.102/1983, que dispõe sobre segurança para estabelecimentos financeiros, e no Código de Defesa do Consumidor (Lei federal 8.078/1990).

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3. A Lei 14.364/2011 do Estado de São Paulo instituiu obrigação para as agências e os postos de serviços bancários de instalar divisórias individuais entre os caixas e o espaço reservado para clientes que aguardam atendimento, sob pena de multa, de forma a proporcionar "privacidade às operações financeiras".

4. Ação direta conhecida e julgado improcedente o pedido.

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4633, Rel. Min Luiz Fux, Pleno, DJ 05.04.2019

De acordo com a orientação firmada pelo intérprete último e mais qualificado da Constituição Federal, em julgamento de processo de controle abstrato de constitucionalidade, a lei estadual que estabelece a "obrigação para as agências e os postos de serviços bancários de instalar divisórias individuais entre os caixas e o espaço reservado para clientes que aguardam atendimento é norma suplementar de proteção aos consumidores dos serviços bancários" que constitui matéria da "competência concorrente da União e dos Estados-membros (artigo 24, V e VIII, da Constituição Federal)".

Como demonstrado, é improcedente o fundamento da falta de competência estadual para legislar, fiscalizar e determinar a instalação de equipamentos de segurança em agências bancárias, com eventual aplicação de multa administrativa.

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Afirma o apelante a existência nulidade decorrente da violação ao contraditório e à ampla defesa, da ausência de indicação dos dispositivos legais e regulamentares violados e dos próprios autos do processo administrativo de aplicação da multa.

Observo, no particular, que o Auto de Infração nº 0211, de 01 de agosto de 2012, faz expressa menção a "que o autuado infringiu o art. 39, VIII, da Lei Federal 8078/90 c/c arts. 1º, 2º e 3º do Decreto Estadual 30906/12", pois "no local não há divisórias individuais entre os caixas e espaço reservado para clientes que aguardam atendimento" e que na fiscalização "foram flagradas 04 (quatro) pessoas utilizando telefone celular no interior do estabelecimento", com a informação expressa de que "a impugnação escrita deverá ser apresentada no prazo improrrogável de 10 (dez) dias". (fl 66)

Verifico, ainda, que o apelante apresentou impugnação administrativa em 09 de agosto de 2012, que o auto de infração foi julgado procedente pela Secretária Executiva do DECON em 14 de agosto de 2012, que foi por ele interposto recurso administrativo em 01 de outubro de 2012 e que a Junta Recursal do Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor, em 07 de janeiro de 2013, negou provimento ao mencionado recurso e manteve a multa em 15.000 (quinze mil) UFIRCE. (fls 70/75, 78/89, 86/91 e 93/99)

Por estar concreta e objetivamente descrita a situação identificada na agência bancária, com a indicação dos dispositivos legais e regulamentares violados, e haver o autuado apresentado impugnação e posterior recurso administrativo contra a decisão inicial de procedência, não há nulidade a ser declarada ou

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violação ao contraditório e à ampla defesa a ser reconhecida.

Aduz o recorrente que o valor da multa aplicada viola os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

O Código de Defesa do Consumidor dispõe:

Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas , conforme o caso, às seguintes sanções administrativas , sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas:

I - multa ;

Art. 57. A pena de multa , graduada de acordo com a gravidade da infração, a vantagem auferida e a condição econômica do fornecedor , será aplicada mediante procedimento administrativo, revertendo para o Fundo de que trata a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, os valores cabíveis à União, ou para os Fundos estaduais ou municipais de proteção ao consumidor nos demais casos.

Parágrafo único. A multa será em montante não

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inferior a duzentas e não superior a três milhões de vezes o valor da Unidade Fiscal de Referência (Ufir), ou índice equivalente que venha a substituí-lo.

Nota-se que o valor da multa por infração às normas de defesa do consumidor pode variar de duzentas a três milhões de Unidades Fiscais de Referência (Ufir), a ser aplicada com observância dos critérios da gravidade da infração, da condição econômica do fornecedor e, quando for o caso, da vantagem auferida pelo infrator.

Ao exame da decisão administrativa que arbitrou a multa no valor na sequência mantido pela Junta Recursal do Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor constata-se estar ali consignado que a conduta do autuado traz "consequências danosas à segurança dos consumidores de serviços bancários" e que "a condição econômica do fornecedor ... é de grande porte". Como se constata, foram considerados e aplicados exatamente os critérios da gravidade de infração e da condição econômica do fornecedor, tais como previstos na Lei nº 8.078/90, para a fixação da multa em 15.000 (quinze mil) UFIR do Ceará.

Registre-se que a UFIR foi extinta pelo art. 29, § 3º, da Medida Provisória nº 1.973-67, de 26 de outubro de 2000, mas a Lei Estadual nº 13.083, de 29 de dezembro de 2000, criou a Unidade Fiscal de Referência do Estado do Ceará (UFIRCE) e estabeleceu que os valores e índices expressos em Unidade Fiscal de Referência

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(UFIR) deveriam ser convertidos em UFIRCE. No Estado do Ceará a UFIRCE é o "índice equivalente" que veio substituir a UFIR, de que trata o Parágrafo único, parte final, do art. 57, do Código de Defesa do Consumidor.

O valor da multa aplicada ao apelante corresponde a 0,5% (meio por cento) do valor máximo e a apenas 75 (setenta e cinco) vezes o valor mínimo estabelecido em lei para a multa. Inexiste, à toda evidência, violação aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação da multa, em especial quando considerado que o valor máximo da multa previsto em lei corresponde a 15.000 (quinze mil) vezes o valor mínimo.

Por fim, cumpre destacar que a sentença recorrida está em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal de Justiça sobre a matéria. Confira-se:

APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DECORRENTE DO PODER DE POLÍCIA. INFRAÇÃO À LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. MULTA APLICADA PELO DECON/CE. INSTALAÇÃO DE DIVISÓRIAS EM AGÊNCIAS BANCÁRIAS. COMPETÊNCIA CONCORRENTE PARA LEGISLAR SOBRE A MATÉRIA. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE NÃO AFASTADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

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1. O ponto central da discussão desenvolvida no presente recurso está na aferição da regularidade do procedimento administrativo instaurado pelo Decon/Ce, que resultou na aplicação de multa em desfavor do apelante Banco Santander Brasil S/A, por infração à legislação consumerista no tocante à ausência de instalação de divisórias individuais entre os caixas e o espaço reservado aos clientes que aguardam atendimento.

2. Observo que as teses desenvolvidas em sede de apelação quanto à nulidade do procedimento administrativo por ausência de notificação e prazo razoável para regularização da suposta infração, bem como a falta de critérios na aplicação da multa, são matérias que representam inovação recursal e que, portanto, não foram apreciadas na origem, razão pela qual não serão objeto de apreciação no presente recurso.

3. A despeito da argumentação desenvolvida pela parte recorrente quanto à competência exclusiva da União para legislar sobre segurança bancária, filio-me ao entendimento expresso pelo Supremo Tribunal Federal sobre as normas que regulam a obrigação de instalação de divisórias

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nas agências bancárias possuírem caráter suplementar de proteção aos consumidores e, portanto, caracteriza-se como matéria afeta à competência concorrente expressa no art. 24, VIII, da CF/88.

4. Ademais, a Suprema Corte igualmente se expressa quanto à competência dos Municípios para legislar sobre matérias de interesse local, a exemplo da instalação de divisórias em agências bancárias e do tempo máximo de espera de clientes em filas de banco (Repercussão Geral - Tema 272).

5. Pode-se aferir, ainda, que a questionada multa é decorrente do exercício do Poder de Polícia pelo DECON/CE, órgão que detém as atribuições de fiscalização das relações de consumo e aplicação das sanções administrativas previstas no Código de Defesa do Consumidor, dentre outras competências referidas na Lei Complementar nº 30, de 26.07.2002.

6. Igualmente observo que o processo administrativo instaurado junto ao mencionado órgão de defesa do consumidor observou o devido processo legal, oportunizando ao apelante o pleno exercício do contraditório e da

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ampla defesa, sendo certo que, após apreciação do respectivo recurso administrativo, concluiu-se pela manutenção da multa por infração à legislação consumerista, com aplicação da dosimetria prevista na legislação.

7. Assim, entendo que a debatida multa foi aplicada com observância dos princípios da legalidade, proporcionalidade e razoabilidade, não se desincumbindo a parte apelante do ônus de afastar a presunção de legitimidade do ato administrativo impugnado.

8. Apelação conhecida e desprovida.

Apelação Cível nº XXXXX-87.2016.8.06.0001, Rel Min Washington Luis Bezerra de Araújo, Terceira Câmara de Direito Público, Unânime, DJ 05/07/2021

ADMINISTRATIVO E CONSUMIDOR. APELAÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA. MULTA ADMINISTRATIVA APLICADA PELO PROGRAMA ESTADUAL DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR - DECON POR DESCUPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. CONTROLE DE LEGALIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. REDUÇÃO DO

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VALOR DA MULTA ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE. OBEDIÊNCIA AOS CRITÉRIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. PRECEDENTES DO TJ/CE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Nos termos do art. 4º, II, da Lei Complementar Estadual nº 30/2002, o Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor - PROCON/DECON detém competência para, no exercício regular do poder de polícia, impor sanções administrativas relacionadas às transgressões dos preceitos estabelecidos pelo Código de Defesa do Consumidor.

2. É pacífico o entendimento de que o controle jurisdicional do processo administrativo se limita ao exame da regularidade do procedimento e à legalidade do ato, não sendo possível adentrar na análise do mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade determinadas pela autoridade competente. Permitir a intervenção indiscriminada do Poder Judiciário nos atos administrativos implicaria em indevida ingerência deste Poder na esfera administrativa, em total desrespeito ao princípio da Separação dos Poderes. No entanto, o Poder Judiciário tem o poder de examinar se a conduta

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foi praticada dentro dos limites da discricionariedade, o que é feito com base no sopesamento de princípios como a razoabilidade e a proporcionalidade, tratando-se, na verdade, de uma análise de legalidade, e não de mérito. De fato, o Judiciário pode decidir, se for o caso, que a atuação da Administração se deu fora da esfera legal de discricionariedade, uma atuação ilegítima, com desproporcionalidade.

3. No caso em análise, conforme se observa da documentação acostada à peça inicial e corretamente consignado pela magistrada de origem, não há vício capaz de macular a regularidade do processo administrativo, na medida em que foi devidamente assegurado às partes integrantes do procedimento o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.

4. Por outro lado, a multa aplicada à apelante no processo administrativo, embora respeite os limites previstos no parágrafo único do art. 57, do CDC (não inferior a duzentas e não superior a três milhões de vezes o valor da Unidade Fiscal de Referência), não se mostrou razoável e proporcional às circunstâncias do caso sub examine. Evidencia-se, pois, a desproporcionalidade da multa fixada no valor supramencionado, considerando-se as

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circunstâncias que nortearam o feito, mormente o valor reclamado pelo consumidor, e a condição financeira da apelante, razão pela qual entendo como correta e razoável a redução do valor da multa administrativa.

5. Apelação conhecida e parcialmente provida.

Apelação Cível nº XXXXX-38.2020.8.06.0001, Rel Des Francisco Gladyson Pontes, Segunda Câmara de Direito Público, Unânime, DJ 09/03/2022

Por todas essas razões, nego provimento à apelação.

Ficam majorados para 15% (quinze por cento), na forma do disposto no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, os honorários advocatícios arbitrados na sentença em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa.

É como voto.

Fortaleza, data registrada no sistema.

FRANCISCO GLADYSON PONTES

Relator

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-ce/1674669560/inteiro-teor-1674669564