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29 de Maio de 2024

Parecer - Aplicação da pena - Excesso e falta de fundamentação

há 9 anos
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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA

PROCURADORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL

APELAÇÃO CRIMINAL Nº. 17033-2/2009

APELANTE: IGOR WILLIAM BISPO SANTOS

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO

RELATORA: DESEMBARGADORA VILMA COSTA VEIGA

PARECER Nº. 2514/2009

Trata-se de uma apelação criminal interposta por Igor William Bispo Santos, irresignado com a sentença condenatória proferida nos autos da ação penal nº. XXXXX-9/2007, que tramitou perante o Juízo de Direito da 2ª. Vara dos Feitos Criminais da Comarca de Ilhéus, cujo teor o condenou a uma pena de cinco anos e quatro meses reclusão, pela prática da conduta tipificada no art. 157, § 2º., I e II, do Código Penal.

Recebida a denúncia (fls. 36) e apresentada a defesa prévia (fls. 51/52), foi o réu citado para audiência de qualificação e interrogatório.

Ultimada a instrução criminal e oferecidas as alegações finais, do Ministério Público às fls. 80/83 e do apelante às fls. 89/93, sobreveio a sentença (fls. 97/99), que julgou procedente o pedido formulado na denúncia.

Inconformado, o apelante interpôs o presente recurso (fls. 100), pleiteando, em síntese, nas razões recursais de fls. 105/114, a sua absolvição em razão da precariedade de provas, além de arguir algumas preliminares adiante enfrentadas.

Por sua vez, em sede de contra-razões (fls. 115/118), o Ministério Público entendeu que a sentença não deve ser reformada, pugnando seja negado provimento ao recurso de apelação interposto, ratificando in totum a decisão condenatória do juízo a quo.

Eis um sucinto relatório.

Inicialmente, aduzimos que, apesar do recurso ter sido interposto antes da intimação do apelante, considera-se tempestivo, pois a interposição de recursos contra decisões monocráticas ou colegiadas proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) pode, a partir de agora, ser realizada antes da publicação dessas decisões na imprensa oficial. A medida, que se contrapõe a jurisprudência anteriormente firmada no Tribunal, decorre de decisão tomada pela maioria dos ministros da Corte Especial. Antes de o STJ modificar seu entendimento sobre o assunto, a interposição de recursos contra acórdãos ou decisões individuais emanadas do Tribunal só podia ser realizada depois da publicação desses respectivos atos processuais no Diário da Justiça da União. Assim, se o recurso fosse interposto antes da publicação, não era sequer conhecido pelos ministros por ser considerado intempestivo, ou seja, fora do prazo. Agora, para ingressar com recurso no Tribunal, basta que o representante da parte tome conhecimento oficial da decisão seja por meio de sua veiculação pela internet seja por intermédio da vista do processo em cartório. Na avaliação da ministra Eliana Calmon, integrante da Corte Especial, a mudança na jurisprudência do STJ acompanha a evolução tecnológica do Poder Judiciário. Ela sustenta que a nova sistemática dará mais agilidade à tramitação dos processos no Tribunal. "Do jeito que estava antes, o advogado ficava preso numa camisa de força. Via a decisão, mas não podia recorrer", afirma a ministra. Desde meados deste ano, parte dos acórdãos, relatórios e votos proferidos pelos ministros do STJ vêm sendo veiculados na página do Tribunal na internet, horas depois de a respectiva decisão ter sido tomada. O Tribunal também dispõe do serviço de intimação das partes por meio eletrônico. "Entendo que, no momento em que há publicação das decisões pela internet, tendo criado o Tribunal, inclusive, a Revista Eletrônica, é um contra-senso falar em tempestividade recursal a partir da publicação pelo Diário da Justiça da União", pondera a ministra Eliana Calmon, em voto proferido no julgamento de um recurso julgado pela Segunda Turma do STJ em. Outubro de 2002. A alteração da jurisprudência realizada pela Corte Especial ocorreu no julgamento de um recurso no qual a parte questionava decisão anterior que não conheceu de outro recurso previamente ajuizado, exatamente por ele ter sido interposto antes da publicação da decisão no Diário da Justiça. O argumento utilizado pela parte, um posto de gasolina de Minas Gerais, foi o de que o direito de recorrer não está condicionado à espera da intimação (comunicação) solene. Amparado na jurisprudência anterior do STJ e em decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), o relator do caso na Corte Especial, ministro Gilson Dipp, votou contra o provimento do recurso, um agravo regimental. Seu voto foi acompanhado pelos ministros Fernando Gonçalves, Felix Fischer, Paulo Gallotti e Carlos Alberto Direito. Este último, antes de votar, ponderou não ser possível alterar a jurisprudência sobre o tema, sem prévia mudança na legislação processual. A ministra Eliana Calmon foi a primeira integrante da Corte a divergir do voto do relator sob o argumento de que o STJ deveria curvar-se à modernidade. Às suas ponderações, somaram-se as dos ministros Ary Pargendler e Peçanha Martins, para quem não é possível apenar quem se antecipa. O ministro Luiz Fux ressaltou que o direito de recorrer nasce com a decisão. Já o ministro Franciulli Netto observou que o STJ precisa se adaptar à nova realidade tecnológica. Além desses integrantes da Corte Especial, seguiram o entendimento da ministra Eliana Calmon os ministros Francisco Falcão, Barros Monteiro, Gomes de Barros, Cesar Rocha e José Delgado. Durante a sessão de julgamento, o presidente do STJ e da Corte Especial, ministro Edson Vidigal, lembrou que se encontra em tramitação no Senado projeto de lei que prevê a concessão de feitos legais às decisões judiciais publicadas na internet. Segundo o ministro Vidigal, o objetivo da proposição legislativa é dar agilidade à tramitação dos processos. A nova sistemática para interposição de recursos vale para os processos que tramitam no STJ. No entanto, a ministra Eliana Calmon acredita que ela deverá ser adotada por outros tribunais do País. Os prazos limite para a interposição de recursos após a intimação das decisões continuam a ser os mesmo previstos na legislação processual. (ERESP XXXXX).

A doutrina assim nos ensina:

“No entanto, embora tenha o posicionamento acima assinalado, rendo-me, ressalvando meu ponto de vista, à posição assumida pela maioria da Corte Especial deste Sodalício, pelo seu caráter uniformizador no trato das questões jurídicas no país que, com base em recente decisão (EResp XXXXX/MG), datada de 17/11/2004, consignou que a interposição de recursos contra decisões monocráticas ou colegiadas proferidas pelo STJ pode, a partir de agora, ser realizada antes da publicação dessas decisões na imprensa oficial. 4. Embargos de divergência acolhidos. (STJ, Corte Especial, EAG XXXXX/RS; Embargos de Divergência em Agravo nº 2004/XXXXX-4, Rel. Min. José Delgado, DJ 04.04.2005) Nesse sentido também se posiciona o colendo Tribunal Superior Eleitoral: ELEIÇÃO MUNICIPAL, PLEITO DE 2000. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA JULGADO PROCEDENTE PELA CORTE REGIONAL. INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL. PRELIMINARES. Preliminar de intempestividade do recurso especial, argüida pelo recorrido. Não é intempestivo o recurso interposto antes da publicação da decisão. Afastada (Precedentes: REspe nº 15.358/GO de 17.8.99; Ag nº 3.174/CE, de 23.4.2002; AgRgAg nº 3.236/CE, de 18.6.2002). (...) (TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 19.898/MT, Rel. Min. Luiz Carlos Madeira, DJ 13.12.2002). É oportuno recordar, a propósito, as abalizadas palavras da ilustre Ministra do STJ Eliana Calmon, a qual já vinha defendendo que, "no momento em que há publicação das decisões pela internet, tendo criado o Tribunal, inclusive, a Revista Eletrônica, é um contra-senso falar em tempestividade recursal a partir da publicação pelo DJU". E advertia: "a demora na publicação das decisões, via Imprensa Oficial, não coloca o Judiciário em condições de cobrar dos causídicos o acompanhamento das lides pelo Diário Oficial." E prossegue: “Da mesma forma, o advogado cearense Hugo de Brito Machado Segundo assegura que a interposição de recurso antes de publicada a decisão recorrida não é "fora do prazo", nem intempestiva. Em excelente estudo sobre o tema, o nobre articulista enumerou os seguintes motivos a favor da tempestividade recursal: a) O termo inicial do prazo para a interposição do recurso é a intimação da parte, ou seja, o momento no qual a parte toma ciência da decisão recorrida, sendo que a intimação torna-se induvidosa no momento em que é manejado o recurso. Afirma que a publicação é apenas uma forma de intimação, estabelecida para a segurança das partes e por isso não pode ser invocada em prejuízo das mesmas; b) O prazo para recorrer não é de natureza dilatória (antes do qual não se pode praticar o ato), mas sim de natureza aceleratória (depois do qual não se pode praticar o ato). Assim, a parte não está obrigada a interpor recurso, no mínimo, com a publicação da decisão respectiva. Está obrigada, tão-somente, a interpor recurso no máximo em 15 dias contados da publicação (em se tratando de recurso extraordinário, por exemplo). Por conta disso, pode manejá-lo tão logo disponha dos elementos materiais para a elaboração do recurso, quais sejam: o conhecimento de que a decisão ocorreu e os termos dessa decisão. C) Além de ser completamente irrazoável, considerar o recurso intempestivo em tais casos, implicaria impor às partes restrição ao seu direito de recorrer completamente inútil, desnecessária e desproporcional”.

Assim sendo, verificada a tempestividade do recurso em tela, bem como os demais requisitos de admissibilidade exigidos para o seu manejo, passamos à análise do recurso.

Preliminarmente, pugnamos, concordando com o apelante, pela nulidade da sentença por falta de fundamentação na aplicação da pena. Lendo-se a respectiva decisão, percebe-se, com clareza solar, que ela não observou a disposição contida no art. 93, IX da Constituição Federal, o que a torna absolutamente nula. Neste sentido, vejamos entendimentos jurisprudenciais aplicáveis:

“É eivada de nulidade absoluta e sentença em que o magistrado se omite na fixação da pena-base da indispensável fundamentação para alcançá-la, em flagrante desrespeito ao art. 93, inciso IX, da CR/88 e art. 59 e 68 do Código Penal, não se podendo em segundo grau, suprir as falhas técnicas da decisão se não há interposição de apelo da acusação, sob pena de se suprimir um grau de jurisdição. Declarada nulidade da sentença” (TJMG – 5ª C. – AP – 1.0707.05.104195-2/001 (1) – rel. Maria Celeste Porto – j.23.09.2008 – DOE 06.10.2008).

“HABEAS CORPUS N.º 33.200-SP - Rel.: Min. Paulo Medina/6.ª Turma - EMENTA- Penal e processo penal. Habeas corpus. Individualização da pena. Fundamentação deficiente. Exacerbação da pena-base. Motivos concretos não-apontados. Art. 59 e 68 CP. Método trifásico. Inobservância. Constrangimento ilegal caracterizado. Ordem concedida. Ao fixar a pena, mister a observância, pelo magistrado, do procedimento estabelecido no art. 59 e art. 68 do Código Penal, em consonância com os dispositivos constitucionais, mormente a garantia fundamental insculpida no art. 93, IX da Carta Política, que estabelece que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)”. O édito constritivo de liberdade deve ser concretamente fundamentado, com a exposição dos elementos reais e justificadores de que a pena-base aplicada no mínimo legal se mostra insuficiente ante os fatos expostos no processo. A reincidência é circunstância agravante que deve ser considerada na segunda fase da dosimetria da pena, e não na pena-base. O quantum referente à aplicação de causa de aumento de pena - associação eventual para o tráfico - deve vir explicitado e embasado, sob pena de nulidade. Ordem concedida.” (STJ/DJU de 26/2/07, pág. 642).

“Não se mostra aceitável que para se evitar a indesejável incidência da prescrição penal se adote, sem pertinente e objetiva fundamentação (art. 59 do CPB), a exarcebação para além do mínimo legal da quantidade da pena imposta ao réu primário, de bons antecedentes e sem registro de qualquer nota desfavorável à sua conduta social, como expressamente proclamado na sentença condenatória e no acórdão que a confirmou. Ordem concedida para, mantendo-se a condenação, fixar a pena no seu mínimo legal e, por conseqüência, reconhecer a extinção da punibilidade em decorrência do lapso prescricional” (STJ – 5ª T. – HC 115.611 – rel. Napoleão Nunes Maia Filho – j. 05.05.2009 – Dje 18.05.2009).

Em outro julgamento, por votação unânime, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal deferiu em parte o Habeas Corpus (HC) 96590, mantendo a condenação do paciente à prisão por tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o tráfico, porém determinando ao juiz de primeiro grau de São Paulo que proceda novo cálculo da pena, fundamentando-a. A Turma acompanhou voto do relator, ministro Celso de Mello que, citando doutrina, lembrou que “não há direito à pena em grau mínimo”, mas, por outro lado, tampouco pode haver exacerbação da pena base sem a devida fundamentação. A Turma endossou o voto do Ministro Celso de Mello no sentido de que é preciso fundamentar esta sentença, obedecendo as etapas para fixação da pena estabelecidas nos artigos 59 e 68 do Código Penal, sopesando motivos, circunstâncias e elementos de prova e considerando circunstâncias atenuantes e agravantes, assim como as causas de diminuição ou aumento da pena. Celso de Mello citou, entre outros precedentes utilizados para embasar seu voto, decisões tomadas pela Suprema Corte nos HCs 92917, relatado pelo ministro Eros Grau, e 86623, relatado pelo Ministro Gilmar Mendes.

Ademais, “ao requerer o aumento, o Ministério Público considerou como desfavoráveis as próprias elementares do tipo legal no qual incorreu o apelado: ter agido intencionalmente, com naturalidade e intenção de obter proveito patrimonial, ter mantido em depósito as mercadorias ilegais e não ter a vítima contribuído para a prática delituosa. Dessa forma, não podem ser consideradas para o aumento da reprimenda, sob pena de ser o apelado duplamente sancionado pelo mesmo fato.” (TRF 5ª R. - 2ª T. - AP XXXXX-4 – rel. Joana Carolina Lins Pereira – j. 03.02.2009 – DJU 18.02.2009).

Caso ultrapassada esta preliminar, pugnamos pelo improvimento do recurso, inicialmente por não concordamos que seja o caso de denúncia genérica; com efeito, o Ministério Público ofereceu denúncia imputando aos apelantes a prática do delito tipificado no art. 157, § 2º., I, II do Código Penal.

Às fls. 107, o apelante afirma que “a denúncia é inepta, pois não individualiza as condutas nem expõe com clareza os fatos”, ou seja, tratar-se-ia de uma denúncia genérica. Tal assertiva não merece ser acolhida, pois a peça acusatória cumpriu todos os requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal, ainda mais se considerarmos que se tratou de um delito de autoria coletiva.

Neste sentido, trazemos à colação o ensinamento de Eugênio Pacelli de Oliveira:

“Quando o órgão de acusação imputa a todos, indistintamente, o mesmo fato delituoso, independentemente das funções exercidas por eles na empresa ou sociedade (e, assim, do poder de gerenciamento ou de decisão sobre a matéria), a hipótese não será nunca de inépcia da inicial, desde que seja certo e induvidoso o fato a eles atribuídos. A questão relativa à efetiva comprovação de eles terem agido da mesma maneira é, como logo se percebe, matéria de prova, e não pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo”. Para concluir: “Não há, em tais situações, qualquer dificuldade para o exercício da defesa ou para a correta capitulação do fato imputado ao agente”.

E não deixando dúvidas quanto à desnecessidade da descrição pormenorizada da conduta de cada réu, arremata o festejado doutrinador: “O que deve ser observado, pois – e insistimos nisso – é o preenchimento, pela peça acusatória, das exigências relativas à tutela da efetividade do processo (correta classificação do fato pelo juiz) e da ampla defesa. Somente sob tal perspectiva explica-se a orientação jurisprudencial no sentido de que, tratando-se de crimes de autoria coletiva, é admitida uma imputação geral aos acusados, reservando-se à fase instrutória a delimitação precisa de cada uma delas (HC n. 22.265/BA – STF – DJ, I, 17.2.2003)”.

Esclarecida a diferença conceitual entre uma imputação genérica e uma imputação geral, conclui Pacelli, com apoio no Supremo Tribunal Federal: “Somente sob tal perspectiva se explica a orientação jurisprudencial no sentido de que, em se tratando de crimes de autoria coletiva, é admitida uma imputação geral aos acusados, reservando-se à fase instrutória a delimitação precisa de cada uma delas (HC nº. 22.265/BA-STF-DJ, I, 17/02/2003).”

Mirabete, enfrentando a questão, afirma também com apoio na jurisprudência pátria:

“Evidentemente, caso não seja possível a individualização do comportamento de cada um dos participantes, como acontece, por exemplo, nos crimes societários, uma descrição geral de que concorreram para o ilícito é perfeitamente aceitável. (...) A descrição, porém, não deve ser necessariamente exaustiva; se, embora concisa, contém os elementos essenciais à descrição do fato criminoso, a omissão de circunstâncias (dia, hora, local, nome da vítima, instrumento do crime, etc.) não a invalida. Desde que o acusado tenha conhecimento, pela descrição, do fato que lhe é imputado, a denúncia está em termos de ser recebida.”

Neste aspecto, também a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (grifo nosso):

“RESP XXXXX / RO; RECURSO ESPECIAL XXXXX/XXXXX-2. Relator: Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA. Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA. Data do Julgamento: 28/04/2004. Data da Publicação/Fonte: DJ 31.05.2004 p. 358. Ementa: RECURSOS ESPECIAIS. HOMICÍDIO. CONFLITO ARMADO. CONTENDA GENERALIZADA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL. ARTS. 564 E 593, III, D, AMBOS DO CPP. QUESITAÇÃO GENÉRICA. INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA INVIÁVEL. COMPLEXIDADE DOS ACONTECIMENTOS. CONTRARIEDADE À PROVA DOS AUTOS. EXISTÊNCIA DE DUAS TESES. ESCOLHA DE UMA DELAS. NECESSIDADE DO EXAME PROBATÓRIO. SÚMULA 7. DESSEMELHANÇA COM O CASO DE CO-RÉU ABSOLVIDO. IMPRESTABILIDADE DO FUNDAMENTO DO APELO. DISSENSO PRETORIANO INOCORRENTE. Mostrando-se a causa complexa do ponto de vista da individualização das condutas, tendo em vista a diversificação das ações empreendidas, não resulta ilegal ou despropositada a indicação genérica da participação dos acusados, restando apenas imperiosa a similitude com os termos da denúncia, da pronúncia e do libelo. (Precedentes).”

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal negou o pedido de Habeas Corpus (HC) 94160, impetrado em favor do advogado Ezio Rahal Melillo, que responde a centenas de processos na justiça federal em São Paulo por supostas fraudes ao INSS. O objetivo da ação era anular a denúncia apresentada pelo Ministério Público em uma dessas ações, por falta de individualização da conduta do indiciado. Para a defesa do advogado, a falta de individualização da participação de seu cliente na denúncia do MP estaria acarretando cerceamento da defesa. Como o Ministério Público não retrata quais as condutas do advogado, a defesa não tem informações para defender seu cliente em juízo, disse a defesa. De acordo com o relator, ministro Carlos Alberto Menezes Direito, no entanto, a alegação da defesa “é baldia”. Para o ministro, a denúncia identifica claramente o fato que justifica a abertura de ação penal e os indícios da participação do advogado nos fatos imputados a ele. A denúncia está lastreada em fato detalhadamente descrito nos autos, concordaram os Ministros da Primeira Turma.

Em outra oportunidade, a Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha indeferiu pedido de liminar formulado no Habeas Corpus (HC) 96100 em que se pedia o trancamento de ação penal movida contra os pacientes na 2ª. Vara Federal Criminal Especializada em Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e Crimes de Lavagem ou Ocultação de Bens, Direitos e Valores da 1ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo. Eles foram denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) pelo crime de operações de câmbio não autorizadas (artigo 22 da Lei nº 7.492/1986) em concurso de pessoas. Ao negar o pedido de liminar, a Ministra Cármen Lúcia afirmou que há entendimento pacífico, no STF, de que “o trancamento de ação penal pela via de habeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade”. Contrariando argumento dos autores do HC, a Ministra observou que "a denúncia encontra-se em total conformidade com o disposto no artigo 41 do Código de Processo Penal, porquanto demonstra, de forma clara e objetiva, os fatos supostamente criminosos, com todas as suas circunstâncias, bem como o possível envolvimento dos pacientes nos delitos em tese, de forma suficiente para a deflagração da ação penal, bem como para o pleno exercício de suas defesas”. Ademais, observou a Ministra, “segundo entendimento reiterado desta Corte, nos crimes societários é dispensável a descrição minuciosa e individualizada da conduta de cada acusado, bastando, para tanto, que a exordial narre a conduta delituosa de forma a possibilitar o exercício da ampla defesa, o que, no caso, ocorre”.

“HC N. 86.914-SE - RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE – (...) O cerne deste habeas corpus é a suposta ausência de descrição de fatos que pudessem caracterizar a relação de causalidade material entre as condutas desenvolvidas pelo paciente, pelo co-réu e pelos executores materiais dos crimes descritos. Não há violação ao devido processo legal ou à ampla defesa, porquanto é clara a narrativa quanto à existência de acerto realizado entre os denunciados e os executores materiais a respeito da morte da vítima, o que poderia ser considerado o objeto principal do" consórcio "realizado entre os dois prefeitos municipais. Tal imputação - relacionada ao acerto feito entre os denunciados com os executores materiais - deve ser objeto de reação pela defesa do paciente, logicamente representada pelos fatos efetivamente descritos na denúncia. Eventuais omissões da denúncia poderão ser supridas a qualquer tempo, desde que antes da sentença final ( CPP, art. 569). A conduta do paciente foi suficientemente individualizada, ao menos para o fim de se concluir no sentido do juízo positivo de admissibilidade da imputação feita na denúncia. Presentes todos os pressupostos e condições de procedibilidade para o ajuizamento e prosseguimento da ação penal em face do paciente. A descrição dos fatos cumpriu o comando normativo contido no art. 41, do Código de Processo Penal, tendo sido descrita a conduta do paciente de modo individualizado, estabelecendo-se a correlação entre sua conduta e a imputação da prática dos crimes de homicídio (consumado e tentado).9. Substrato fático-probatório suficiente para o início e desenvolvimento da ação penal pública de forma legítima. Não há dúvida de que a justa causa corresponde à uma das condições de procedibilidade para o legítimo exercício do direito de ação penal. Habeas corpus denegado.”

“HC N. 88.525-SP - RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE - (...) Nos casos de autoria e participação em crimes societários - como ocorre em relação ao paciente -, não é comum que se obtenha prova direta acerca de determinados aspectos relacionados às circunstâncias referentes a dados acessórios à prática do delito. A denúncia apresenta um conjunto de fatos conhecidos e provados que, tendo relação com a decretação da falência da empresa. Ademais, eventuais omissões da denúncia poderão ser supridas a qualquer tempo, desde que antes da sentença final ( CPP, art. 569). Houve, pois, atendimento às exigências formais e materiais contidas no art. 41, do Código de Processo Penal, não se podendo atribuir a peça exordial os qualificativos de ser"denúncia genérica"ou"denúncia arbitrária". Existe perfeita plausibilidade (viabilidade) na ação penal pública ajuizada pelo órgão do Parquet. Habeas corpus denegado.”

Uma ação penal contra os sócios da empresa Telebinguinho, do Rio Grande do Norte, por crimes contra as relações de consumo, vai continuar tramitando na Vara Criminal de Natal. A decisão foi da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, que negou pedido para suspender a ação, por suposta inépcia da denúncia apresentada pelo Ministério Público. De acordo com o MP, a empresa teria cometido irregularidades em premiações realizadas, uma vez que os sorteios seriam realizados antes de sua transmissão pela TV. Dessa forma, os empresários podiam confeccionar as cartelas que seriam sorteadas. No Habeas Corpus (HC) 94670, a defesa pedia o trancamento da ação penal contra seus clientes, com o argumento de que a denúncia apresentada não individualizou a conduta de cada um dos acusados, conforme determina o artigo 41 do Código de Processo Penal. Dessa forma, conclui, não existe como exercitar o direito à defesa para cada um dos sócios. A relatora do processo, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, salientou em seu voto que a jurisprudência do STF se encaminha cada vez mais no sentido de reconhecer, mesmo em relação aos delitos societários, que a denúncia deve conter, ainda que minimamente, a descrição individualizada da conduta, supostamente praticada por cada um dos denunciados. Nesse sentido, ela citou a decisão da Corte no julgamento do HC 85549, em que o Supremo entendeu ser suficiente, para a aptidão da denúncia por crimes societários, a indicação de que os denunciados são responsáveis, de algum modo, pela condução da sociedade. No caso, prosseguiu a ministra, a denúncia atende aos requisitos do artigo 41 do CPP, porque descreve a conduta considerada delituosa, indica o momento de quando começou, como era praticada e a responsabilidade de cada sócio na gestão da empresa. Assim, concluiu a relatora, apesar de a denúncia não pormenorizar a participação individual de cada um, as condutas foram imputadas aos empresários de forma a permitir que eles possa se defender. A decisão de negar o habeas corpus foi unânime. Fonte: STF.

Também não merece acolhida a tese de absolvição por falta de provas. Vale fazer referência, neste aspecto, à palavra da vítima que, às fls. 58, de maneira segura, declarou que “não tem dúvida em reconhecer os dois acusados momentos antes no recinto deste Fórum; que na delegacia o declarante ficou em uma sala e chegou a reconhecer os acusados que foram colocados em outra sala (...) que um dos acusados estava com uma faca peixeira (...)”. Ora, a palavra da vítima, em tais hipóteses assume relevância que salta aos olhos.

Tais delitos, no mais das vezes, têm natureza eminentemente clandestina, pelo que difícil será a sua comprovação por meio de testemunhas. Nestes casos, é induvidoso que a palavra da vítima adquire relevo especial.

Como se sabe, o valor probatório desse depoimento é relativo, devendo o Juiz avaliá-lo à luz das demais provas produzidas em conformidade, aliás, com o sistema do livre convencimento. A esse respeito, nota-se que a posição da vítima é um tanto quanto paradoxal, pois ao lado de ter sido, muitas das vezes, um expectador privilegiado do fato objeto da ação penal, a posição de ofendido pela ação delituosa, no entanto, torna-o suspeito de parcialidade, ao contrário do que acontece, em regra, com a testemunha. Mas, por outro lado, há determinados delitos em que, na maioria dos casos, apenas a vítima tem condições de depor sobre os fatos, dada a clandestinidade característica dessas infrações penais.

Nestes delitos, é induvidoso que a palavra da vítima adquire relevo especial. Assim, apesar da declaração de uma vítima não ser “tan aséptica e imparcial como pueda ser la declaración de cualquier outro testigo presencial del delito, que no ha sufrido ningún perjuicio por razón del mismo” e, nada obstante a séria suspeita de que “su declaración está impulsada por algún motivo espúrio de resentimento, ódio, venganza, enemistad, etc”, o certo é que em alguns delitos, “por sus especiales características”, a sua palavra reveste-se de suma importância, mesmo porque “no se cuenta con más prueba directa de cargo que el testemonio de la víctima”.

Borges da Rosa já pontificava haver “casos em que as declarações da vítima têm valor preponderante, superior às do acusado; chegam mesmo a ter um valor primacial, como sucede nos crimes de violência carnal e outros, em que os elementos de prova da autoria do fato ficam reduzidos quase que exclusivamente às referidas declarações”.

É de Júlio Fabbrini Mirabete a seguinte lição:

“Todavia, como se tem assinalado na doutrina e jurisprudência, as declarações do ofendido podem ser decisivas quando se trata de delitos que se cometem às ocultas... São também sumamente valiosas quando incidem sobre o proceder de desconhecidos, em que o único interesse de lesado é apontar os verdadeiros culpados e narrar-lhes a atuação e não acusar inocentes. É o que ocorre, por exemplo, nos crimes de roubo, extorsão mediante seqüestro, etc.” (Grifo nosso).

A esse respeito, confiram-se os seguintes julgados:

“Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 1ª Câmara Criminal, Apelação Nº 200705004417 - Relator: Marcus Basílio, Sessão de Julgamento: 23/10/2007 - EMENTA: ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO - PROVA RECONHECIMENTO EM JUÍZO - PENA - DUPLA MAJORAÇÃO REGIMEPROVA - PALAVRA DA VÍTIMA: Nos crimes de roubo a palavra da vítima é decisiva para a condenação, mormente quando as partes não se conheciam anteriormente, não havendo motivo para que terceira pessoa desconhecida fosse injustamente acusada. Na verdade, neste tipo de infração, a vontade da vítima é a de apontar o verdadeiro autor da subtração que sofreu.”

“TJDFT - Órgão: PRIMEIRA TURMA CRIMINAL - Classe:APR – APELAÇÃO CRIMINAL - Nº. Processo: 2004.08.1.001291-9 - Relator Des.:JOÃO TIMÓTEO DE OLIVEIRA - Revisor Des.:IRAN DE LIMA – EMENTA: PENAL. ROUBO. CONDENAÇÃO. RECURSO DO RÉU. ALEGADA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. PALAVRA DA VÍTIMA EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS. RECURSO IMPROVIDO. 1. As informações e o reconhecimento das vítimas têm especial relevo na determinação da autoria dos réus nos crimes de roubo, eis que, de regra, somente presenciados por elas; ademais, quando se encontram em harmonia com outras provas vindas aos autos.2. Negado provimento ao recurso.”

“Em crimes contra o patrimônio a palavra da vítima é de fundamental importância para a identificação do autor, mesmo porque a execução desses delitos sempre se dá de forma favorável ao agente ativo, que se traduz na vulnerabilidade da vítima e ausência de testemunhas.” (TACRIM- SP-VER- 7ª, GR. CS. - Rel. Oldemar Azevedo - j. 26/06/96 - RJDTACRIM 31/409).

“TJDFT – AP XXXXX-4 – 1ª T. CRIM. - REL. DES. ALFEU MACHADO – PUBL. 30.05.2007 - Órgão: PRIMEIRA TURMA CRIMINAL - Classe: APR – APELAÇÃO CRIMINAL - Nº. Processo: 2003.04.1.012684-4 - Relator Des.: ALFEU MACHADO - Revisor Des.: SÉRGIO BITTENCOURT – EMENTA: DIREITO PENAL. ROUBO. NEGATIVA DE AUTORIA. ACUSADO RECONHECIDO PELAS VÍTIMAS. REJEIÇÃO DA TESE. CRIME DE DISPARO DE ARMA DE FOGO. AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. CONDENAÇÃO MANTIDA. 1. Nos crimes de roubo, geralmente carentes de testemunhas, a palavra das vítimas, como ocorre nos crimes sexuais, é relevante para a descoberta da verdade real, devendo-se presumir que elas não tenham interesse de acusar inocentes. A negativa de autoria, assim, não encontra respaldo nas demais provas coligidas nos autos, sobretudo quando o acusado é reconhecido em juízo pelas vítimas que o apontaram com segurança como sendo o autor da prática delituosa.”

“TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS - EMENTA: PENAL - ROUBO MAJORADO - AUTORIA COMPROVADA - PALAVRA DA VÍTIMA - CONDENAÇÃO MANTIDA - PENA PECUNIÁRIA - REDUÇÃO - NECESSIDADE DE ESTRITA PROPORCIONALIDADE COM A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. A palavra da vítima é de extrema importância na elucidação de crimes contra o patrimônio, que soem ocorrer na clandestinidade, e faz prova suficiente da autoria do delito.” (Apelação Criminal Nº 2.0000.00.492054-1/000 - Recurso: Apelação (Cr)Órg. Julgador: Quinta Câmara Criminal - Relator: Hélcio Valentim -05/09/05).”

" Nos delitos contra o patrimônio, em regra, praticados na clandestinidade, a palavra da vítima assume fundamental importância, prevalecendo, mesmo, sobre a negativa do agente, mormente quando reforçada por outros elementos de convicção "(TJMG - 5ª Câm. Criminal - Apelação nº 1.0672.00.028923-7/001 - Rel. Des. Antônio Armando dos Anjos - j. 25/04/2006 - p. 09/06/2006).

“TJRS. ROUBOS. AUTORIA. PALAVRAS DAS VÍTIMAS. RECONHECIMENTOS. EMPREGO DE ARMA. FALTA DE APREENSÃO. IRRELEVÂNCIA. PENA. No cotejo entre as palavras de vítimas de roubo e do acusado, devem, em princípio, prevalecer as primeiras, desde que nada indique propósito escuso, visto que o interesse do réu na auto-preservação é inerente à sua própria condição humana, assim tisnada a credibilidade do que disser. Vítimas, no caso, que reconheceram o réu, na polícia, em ato cercado das formalidades legais, a quem sequer conheciam, confirmando, em juízo, que o réu presente nas audiências fora, mesmo, quem as assaltou no interior de coletivos. (...) Apelo provido parcialmente. APELAÇÃO CRIME Nº 70012962684 SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL. DES. MARCELO BANDEIRA PEREIRA, Relator."

“TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS APELAÇÃO CRIMINAL Nº. 1.0625.05.044924-2/001 (1) - Relator: WILLIAM SILVESTRINI Data do acordão: 24/05/2006 Data da publicação: 21/06/2006 - EMENTA: EXTORSÃO - AMEAÇA À VÍTIMA -DECLARAÇÕES DA VÍTIMA E TESTEMUNHAS - VALOR PROBATÓRIO - TENTATIVA - OCORRÊNCIA. Em crimes patrimoniais, dentre eles a extorsão, rotineiramente praticados na clandestinidade, é de suma relevância as palavras da vítima que, sem qualquer animosidade específica contra o réu, descreve com firmeza o modus operandi e o reconhece como a pessoa que praticou o delito. Muito embora seja um delito formal, o crime de extorsão admite a figura da tentativa, na hipótese em que a vítima não cede às exigências do autor. (...) Deste modo, as declarações da vítima estão em perfeita sincronização, harmônica e coincidente com as das testemunhas supracitadas, podendo-se aferir de tais narrativas que há prova efetivas da participação do apelante na empreitada criminosa, não havendo qualquer dúvida em tal sentido, pois sabe-se que a maioria dos delitos patrimoniais são cometidos às ocultas, em que, geralmente, quem fica frente a frente são somente vítima e o agente do crime; portanto, em tais circunstâncias, a palavra da vítima é de suma relevância para o deslinde da questão, já que, na maioria das vezes, sem a presença de testemunhas e, sendo seguros e coerentes suas declarações, têm mais credibilidade que as declarações do acusado, ainda mais quando em consonância com outros elementos probatórios, a tornar mais do que suficientes para ensejar um decreto condenatório. A orientação jurisprudencial nos casos como os da espécie, entende: "Nos crimes contra o patrimônio, entre eles a extorsão, rotineiramente praticados na clandestinidade, prevalece a palavra da vítima sobre a negativa dos agentes, especialmente quando coerente com sólido acervo probatório" (TAMG - AP n.º 404.106-1 - 2003 - 2ª C. Mista - Juiz Antônio Armando dos Anjos - j. 07.10.2003 - unânime). "Não se diga que o depoimento isolado da vítima não tenha valor probante. Desde que se trate de pessoa idônea, sem qualquer animosidade específica contra o réu, não se poderá imaginar que a vítima vá mentir em Juízo e acusar um inocente" (JUTACRIM 90/318). "A palavra da vítima é de fundamental importância em casos de delitos contra o patrimônio, em regra, cometidos na clandestinidade, devendo prevalecer sobre a negativa do réu, principalmente quando reforçada por outros elementos de convicção" (TAMG - 2ª C. Criminal - AP n.º 332.052-7 - Rel. Juiz Tibagy Salles, v. U., j. 15/05/2001). "Nos crimes de repercussão patrimonial, mesmo que não haja testemunhas presenciais, de extrema valia a palavra da vítima, especialmente quando descreve, com firmeza, o modus operandi e reconhece, do mesmo modo, a pessoa que praticou o delito, vislumbrando-se o propósito único de identificar os culpados" (TAMG - 1ª C. Crim., AP n.º 316.956-0, Rel. Juiz Sérgio Braga, v. U., j. 13/12/2000; in RJTAMG 81/336).”

Além disso, vale salientar a palavra das testemunhas arroladas pelo Ministério Público, em seus depoimentos às fls. 59, 60 e 70, em que todas elas, policiais militares, afirmaram ter visto o uso da faca por parte dos réus. Às fls. 59, Manoel Santos da Conceição afirmou que “os acusados portavam uma faca tipo peixeira”. Silvio Mota Santos, às fls. 60, disse que “a princípio os acusados negaram a autoria, contudo próximo aos mesmos o depoente observou um boné com algumas moedas e uma faca (...) que em princípio negaram mas após assumiram a autoria (...)”. Já Reginaldo Costa Souza, às fls. 70, afirmou que “o instrumento do crime que serviu para ameaçar o motorista foi uma faca (...) tipo peixeira (...)”.

Sabe-se que o depoimento de policiais que participaram da investigação que originou o processo criminal longe de ser incomum, encontra-se presente em grande número de feitos criminais, até porque, muitas vezes, são realmente as únicas testemunhas do fato criminoso, mormente quando se trata de prisão em flagrante de delito clandestino. Há uma corrente jurisprudencial que afasta por completo a admissibilidade desta prova por entender, em suma, que estas pessoas seriam suspeitas e estariam, portanto, impedidas de depor. Corrente majoritária, porém, caminha em sentido oposto, admitindo-a, pois não enxergam suspeição pelo simples fato da atuação funcional. Estamos com este segundo entendimento, tendo em vista que, à luz do nosso sistema de apreciação de provas, cabe ao Juiz, com critério, dar o devido valor à prova colhida. Se os depoimentos dos policiais não forem, por exemplo, objeto de qualquer contestação por parte do réu, como os desqualificar? E, mesmo que o sejam, como não os admitir se provada estiver a materialidade do fato e os outros testemunhos corroborá-los?

Nessa linha de intelecção, trecho de entendimento jurisprudencial oriundo da Corte Suprema:

“(...) o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento no sentido de que não há irregularidade no fato de o policial que participou das diligências ser ouvido como testemunha. Ademais, o só fato de a testemunha ser policial não revela suspeição ou impedimento."(HC nº 76557/RJ, 2ª Turma, Relator para acórdão: Min. Carlos Velloso, DJ 02.02.2001).

A respeito, vejam-se as decisoes do Supremo Tribunal Federal, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e de outros Tribunais:

“VALIDADE DO DEPOIMENTO TESTEMUNHAL DE AGENTES POLICIAIS. O valor do depoimento testemunhal de servidores policiais – especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório – reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal. O depoimento testemunhal do agente policial somente não terá valor, quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou quando se demonstrar – tal como ocorre com as demais testemunhas – que as suas declarações não encontram suporte e nem se harmonizam com outros elementos probatórios idôneos. Doutrina e jurisprudência.” (HC XXXXX-5/SP, 1.ª T STF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ 18.10.1996).

“O depoimento testemunhal de agente policial somente não terá valor quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou quando se demonstrar - tal como ocorre com as demais testemunhas - que as suas declarações não encontram suporte e nem se harmonizam com outros elementos probatórios idôneos." (STF - HC XXXXX-5, Rel. Celso de Mello - DJU - 18.10.96, p. 39.846).

“TRF3 - ACR XXXXX-2 – (22547) – 5ª TURMA – REL. DES. FED. SUZANA CAMARGO - (...) O fato da prova testemunhal estar consubstanciada, também, em declarações prestadas por policiais, por si só, não descaracteriza a sua verossimilhança, tendo em vista que não foram esses depoimentos analisados isoladamente, mas sim em consonância com todo o conjunto probatório colhido sob o crivo do contraditório.” Vejamos este trecho do voto: “(...) Ademais, o simples fato daquela prova testemunhal estar consubstanciada, também, em declarações prestadas por policiais, por si só, não descaracteriza a sua verossimilhança, tendo em vista que não foram esses depoimentos analisados isoladamente, mas sim em consonância com todo o conjunto probatório colhido sob o crivo do contraditório. É que neste particular, não é dado olvidar que os policiais não se encontram legalmente impedidos de depor sobre atos de ofício nos processos de cuja fase investigatória tenham participado, no exercício de suas funções. Em sendo assim, tais depoimentos revestem-se de inquestionável eficácia probatória, sobretudo quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório, sendo que nesse sentido já decidiu o colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp XXXXX/BA, Ministra Laurita Vaz, 5ª Turma, DJ 26.09.2005 p. 438 LEXSTJ vol. 194 p. 332).”

“Tribunal Regional Federal - TRF4ªR. APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2004.70.08.001071-0/PR - RELATOR: Juiz Federal Marcelo Malucelli – O flagrante delito consiste meio hábil a produzir presunção relativa quanto à materialidade e autoria delitiva, cabendo ao acusado fazer prova em sentido contrário. 3. Não há irregularidade no fato de o policial que participou das diligências ser ouvido como testemunha. Ademais, o só fato de a testemunha ser policial não revela suspeição ou impedimento. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. 4. Inquéritos e processos em andamento não podem ser considerados como maus antecedentes para fins de exacerbação da pena-base, sob pena de violação ao princípio da presunção de inocência. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Remanesce, contudo, a possibilidade de computá-los a título de personalidade do agente porquanto indicativos de uma inclinação à prática de ilícitos. 5. "Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos;(...)" (artigo 44, parágrafo segundo, 1ª parte, do Caderno Criminal).” VOTO: (...) “Diga-se, também, não haver qualquer irregularidade em o magistrado empregar os depoimentos prestados pelos agentes policiais que acompanharam o flagrante na construção de sua convicção. Consabido que os policiais têm como função precípua a repressão penal, condição profissional que, todavia, não autoriza a censura das informações que venham a prestar, salvo quando evidenciadas contradições com o restante da prova processual. Nesse sentido, as seguintes ementas: "PROCESSUAL PENAL. PENAL. TESTEMUNHA POLICIAL. PROVA: EXAME. I. - O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento no sentido de que não há irregularidade no fato de o policial que participou das diligências ser ouvido como testemunha. Ademais, o só fato de a testemunha ser policial não revela suspeição ou impedimento. II. - Não é admissível, no processo de habeas corpus, o exame aprofundado da prova. III. - H. C. Indeferido." (STF, HC XXXXX/RJ, 2ª Turma, Relator: Min. Marco Aurélio, DJ 04.08.1998); "PENAL. CRIME CONTRA O SISTEMA DE TELECOMUNICAÇÕES. ARTIGO 183 DA LEI Nº 9.472/97. INSIGNIFICÂNCIA. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL. ATIPICIDADE. PERMANÊNCIA DO VÍNCULO ASSOCIATIVO. FALTA DE PROVAS. CORRUPÇÃO ATIVA. ARTIGO 333 DO ESTATUTO REPRESSIVO. EVIDÊNCIAS INSUFICIENTES. CONTRABANDO E DESCAMINHO. ARTIGO 334 DO CP. CRIME ÚNICO. DELITO DE BAGATELA. NÃO APLICABILIDADE. ALTO VALOR DOS IMPOSTOS DEVIDOS. ELEMENTOS APURADOS NO INQUÉRITO. CORROBORADOS EM JUÍZO. TESTEMUNHO DE POLICIAIS. VALIDADE. VERSÕES DEFENSIVAS CONTRADITÓRIAS E LACUNARES. AUTORIA. CONJUNTO PROBATÓRIO ROBUSTO. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. (...) 8. A palavra dos policiais que atuaram na persecução possuem tanto valor quanto a de qualquer testemunha idônea, não havendo razão lógica para desqualificá-los, se nada sugere seu interesse no deslinde da causa, e prestam depoimento sob compromisso.(...)" (TRF4ªRegião, ACR XXXXX70020018759/PR, 8ª Turma, Relator: Des. Élcio Pinheiro de Castro, DJU 14.01.2004). (D. J. U. De 09/08/2006). Grifo nosso.

“TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS – EMENTA: Processo penal. Tráfico de entorpecentes. Prova. Depoimento de policial militar. Flagrante forjado.1. Incensurável a decisão condenatória proferida com base em depoimento prestado por policial militar, quando este se encontra em consonância com as demais provas dos autos.2. Nas alegações de flagrante forjado, cabe ao autor da infração provar o especial interesse dos policiais em incriminá-lo, pois, sendo servidores públicos, presume-se que agiram dentro da estrita legalidade.” (APR XXXXX-4, 2.ª Turma Criminal, Rel. Des. Getulio Pinheiro, DJ 18/04/2001).

“TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL - Classe do Processo: APELAÇÃO CRIMINAL XXXXXAPR DF Registro do Acórdão Número: XXXXX Data de Julgamento: 25/08/2005 - Órgão Julgador: 2ª Turma Criminal - Relator: ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS - Publicação no DJU: 01/12/2005 – Ementa: PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES (ART. 12, CAPUT, C/C ART. 14, CAPUT, AMBOS DA LEI Nº 6.368/76). DEPOIMENTO PRESTADO POR POLICIAIS. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. FIXAÇÃO DA PENA. ART. 59, DO CP. DELITO DE ASSOCIAÇÃO. ART. , § 1º, DA LEI N.º 8.072/90. INAPLICABILIDADE. 1. INVIÁVEL A ABSOLVIÇÃO DO DELITO IMPUTADO AO APELANTE QUANDO TODO O CONJUNTO PROBATÓRIO CARREADO NOS AUTOS DEMONSTRA, INEQUIVOCADAMENTE, A PRÁTICA DELITUOSA DESCRITA NA DENÚNCIA. 2. ESTE TRIBUNAL JÁ CONSOLIDOU O ENTENDIMENTO DE QUE O DEPOIMENTO DE POLICIAIS, QUANDO EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS CARREADAS AOS AUTOS, É SUFICIENTE PARA AMPARAR A CONDENAÇÃO.” (Grifo nosso).

“TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO - PRIMEIRA TURMA - 2006.03.99.015299-6 24326 ACR-MS - PAUTA: 21/11/2006 JULGADO: 21/11/2006 - RELATOR: DES. FED. VESNA KOLMAR - REVISOR: JUIZ CONV. MÁRCIO MESQUITA –Policiais federais, que participaram da investigação, foram unânimes em confirmar a apreensão da mercadoria ilegal em poder do apelante e de Gelson Pereira da Silva, tanto em sede administrativa, como em juízo. 4. A condição de policial não torna as testemunhas de acusação impedidas ou suspeitas. Seus depoimentos são válidos e críveis, ou seja, suficientes para embasar a condenação.”

Vejamos este trecho do voto:

“Observo, por oportuno, que a condição de policial não torna as testemunhas de acusação impedidas ou suspeitas. Seus depoimentos são válidos e críveis, ou seja, suficientes para embasar a condenação, vez que não se vislumbra nos autos motivos concretos a justificar a incriminação do apelante por parte dos policiais. É este o entendimento desta Corte: APELAÇÃO CRIMINAL - MOEDA FALSA - AUSÊNCIA DE DOLO NÃO DEMONSTRADA - BOA FÉ - DEPOIMENTO DE POLICIAIS - VALIDADE DA PROVA - CONDENAÇÃO MANTIDA - SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL PELA RESTRITIVA DE DIREITOS. 1. Insubsistente a alegação de desconhecimento da falsidade da cédula diante dos depoimentos testemunhais e das circunstâncias dos fatos. 2. A boa-fé deve ser entendida como "a convicção de que a moeda recebida é verdadeira ou a ignorância de que é falsa". Nenhuma das possibilidades restou demonstrada nos autos. 3. É sedimentado o entendimento de que o depoimento de policial tem valor probante idêntico ao de qualquer outra testemunha. 4. Recurso a que nega provimento, substituindo-se, de ofício, a sanção corporal pela restritiva de direitos, nos termos do artigo 44 do Código Penal. Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO Classe: ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 8574 Processo: XXXXX03990050603 UF: SP Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA Data da decisão: 10/04/2001 Documento: TRF300055571 DJU DATA:18/06/2001 PÁGINA: 296 Relator: JUIZ OLIVEIRA LIMA.”

“Primeira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região APELAÇÃO CRIMINAL XXXXX-5 - RELATOR: DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA HELENA CISNE - ORIGEM: QUINTA VARA FEDERAL CRIMINAL DO RIO DE JANEIRO (XXXXX51015108175) –O fato de as testemunhas ocuparem cargos de Agentes da Polícia Federal não desautoriza ou invalidada seus depoimentos, mormente quando prestados em sede judicial, com observância do princípio do contraditório, e confirmados por outros elementos probatórios.” Vejamos este trecho do voto: “(...) Em relação à prova testemunhal, sustenta o apelante, objetivando descaracterizar a prova testemunhal produzida em juízo, que sua condenação se pautou exclusivamente em depoimentos de policiais envolvidos nas investigações. Entretanto, é importante ressaltar que o MM. Magistrado sentenciante não se baseou exclusivamente na prova testemunhal para a expedição do decreto condenatório, sendo certo que o conjunto probatório dos presentes autos é robusto e composto por outros elementos. Cabe salientar, ainda, que o fato das testemunhas ocuparem cargo de agentes da Polícia Federal não constitui justificativa para invalidar seus depoimentos. É o que se depreende dos arestos que se transcrevem:“CRIMINAL – HC – CONDENAÇÃO EM PORTE ILEGAL DE ARMAS E USO DE ENTORPECENTES – APELAÇÃO – DESCLASSIFICAÇÃO PARA TRÁFICO DE DROGAS – NULIDADE – FUNDAMENTAÇÃO NO DEPOIMENTO DE POLICIAIS – POSSIBILIDADE – DECISÃO MOTIVADA TAMBÉM EM OUTROS ELEMENTOS DE PROVA – IMPROPRIEDADE DO HABEAS CORPUS – REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO – ORDEM DENEGADA O depoimento de policiais pode ser meio de prova idôneo para embasar a condenação, principalmente quando tomados em juízo, sob o crivo do contraditório. Precedentes do STF e desta Corte.”(STJ, HC 40162, processo nº 200401733897, Relator Min. GILSON DIPP, publicado no DJ de 28/03/2005).

“Ainda que a condenação tivesse sido amparada apenas no depoimento de policiais – o que não ocorreu na espécie -, de qualquer forma não seria caso de anulação de sentença, porquanto esses não se encontram legalmente impedidos de depor sobre atos de ofício nos processos de cuja fase investigatória tenha participado, no exercício das funções. Em sendo assim, tais depoimentos revestem-se de inquestionável eficácia probatória, principalmente quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório.(...)”(STJ, HC 30776, processo nº 200301744786, Relator Min. LAURITA VAZ, publicado no DJ de 08/03/2004).”

Deve ser salientado, outrossim, que as testemunhas indicadas pela defesa, em seus depoimentos às fls. 71, 72 e 73, afirmaram nada saber a respeito dos fatos, limitando-se a tecer considerações genéricas a respeito da conduta social dos réus.

Demais disso, o correu Gilmárcio de Souza Tomaz, em depoimento de fls. 45, confessou a prática do delito e reconheceu a participação do ora apelante.

Conclui-se, destarte, que a condenação do recorrente fundou-se em robusto conjunto probatório. Evidentemente a delação do correu Gilmárcio foi de extrema importância para embasá-la, já que se mostrou coerente e apoiada nas demais provas produzidas durante a instrução. Neste sentido têm se manifestado os nossos Tribunais Superiores:

“A palavra do co-réu, condenado no mesmo processo, é importante elemento de convicção do juiz, quando se ajusta ao conjunto da prova dos autos.” (STJ – REsp XXXXX/MG – 6ª Turma – Rel. Hamilton Carvalhido – DJU 17.09.2001, p. 200).

“Prova – Delação – Validade. Mostra-se fundamentado o provimento judicial quando há referência a depoimentos que respaldam delação de co-réus. Se de um lado a delação, de forma isolada, não respalda condenação, de outro serve ao convencimento quando consentânea com as demais provas coligidas.” (STF – HC XXXXX/MS – 2ª. Turma – Rel. Marco Aurélio – DJU 19.09.97, p. 45.528).

A propósito, veja-se a lição de Damásio de Jesus:

“A delação (não-premiada) de um concorrente do crime por outro, em sede policial ou em juízo, denominada "chamada de co-réu" ou "confissão delatória", embora não tenha o condão de embasar, por si só, uma condenação, adquire força probante suficiente desde que harmônica com as outras provas produzidas sob o crivo do contraditório (STF, HC n. 75.226; STJ, HC n. 11.240 e n. 17.276). Esse entendimento, objetado por parte da doutrina, ganhou reforço após o advento da Lei n. 10.792/2003, a qual garantiu à acusação e à defesa a possibilidade de solicitar ao Juiz o esclarecimento de fatos não tratados no interrogatório, conferindo-lhe natureza contraditória e, conseqüentemente, maior valor e credibilidade (art. 188 do CPP). Devendo o Juiz avaliá-lo à luz das demais provas produzidas em conformidade, aliás, com o sistema do livre convencimento.”

Outrossim, argumenta o apelante, às fls. 112, que “não houve um reconhecimento legal dos acusados”. Trata-se de equívoco e alegação inservível no presente caso, pois, apesar de não ter havido, efetivamente, observância dos requisitos legais previstos na legislação processual penal, o certo é que o reconhecimento feito perante a autoridade judiciária deve ter relevância, principalmente quando inteiramente corroborada pelos demais elementos de prova. Lembremos que o Juiz deve firmar o seu convencimento pela livre apreciação da prova. Neste sentido, vejamos a jurisprudência:

“Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 1ª Câmara Criminal, Apelação Nº 200705004417 - Relator: Marcus Basílio, Sessão de Julgamento: 23/10/2007 - EMENTA: ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO - PROVA RECONHECIMENTO EM JUÍZO - PENA - DUPLA MAJORAÇÃO REGIMEPROVA - PALAVRA DA VÍTIMA: (...) Na linha de pacífica jurisprudência da Câmara e do STJ, o reconhecimento em juízo tem valor idêntico àquele realizado com a observância do artigo 226 do CPP.”

Em decisão unânime, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal manteve a condenação do professor Marcelo Buzetto, integrante do Movimento dos Sem Terra (MST), a seis anos e quatro meses de reclusão, em regime aberto, por roubo e receptação de 14 toneladas de macarrão, avaliados em R$ 14 mil, na Rodovia Castelo Branco, em São Paulo. Marcelo foi preso em flagrante no dia 28 de maio de 1999, após participar de manifestação do MST em que dois caminhões de alimentos foram saqueados. Um dia depois, ele foi reconhecido por um dos motoristas do caminhão. Segundo a defesa alegou em Habeas Corpus (HC 89799) impetrado no Supremo, várias nulidades teriam ocorrido ao longo da tramitação da ação penal aberta contra o professor. Muitas dessas supostas nulidades não chegaram a ser avaliadas pela Segunda Turma, já que não foram sequer citadas na decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), contra a qual o habeas foi impetrado no Supremo. A única ilegalidade apontada pela defesa que chegou a ser analisada com maior profundidade pela Turma foi o suposto vício no reconhecimento de Marcelo pelo motorista do caminhão saqueado. Para os advogados do professor, esse reconhecimento não seguiu as regras previstas no Código Penal. Sobre essa questão, o relator do caso, ministro Joaquim Barbosa, ponderou que, ao longo do processo, o acusado teve oportunidades de contestar o reconhecimento, mas não o fez. Marcelo não compareceu à audiência de depoimento do motorista, apesar de ter conseguido responder à ação em liberdade, com o compromisso de comparecer em todos os atos do processo. O professor também não requereu audiência de reconhecimento em juízo, um direito seu, como explicou Barbosa. Fonte: STF.

“TJRS. ROUBOS. AUTORIA. PALAVRAS DAS VÍTIMAS. RECONHECIMENTOS. EMPREGO DE ARMA. FALTA DE APREENSÃO. IRRELEVÂNCIA. PENA. No cotejo entre as palavras de vítimas de roubo e do acusado, devem, em princípio, prevalecer as primeiras, desde que nada indique propósito escuso, visto que o interesse do réu na auto-preservação é inerente à sua própria condição humana, assim tisnada a credibilidade do que disser. Vítimas, no caso, que reconheceram o réu, na polícia, em ato cercado das formalidades legais, a quem sequer conheciam, confirmando, em juízo, que o réu presente nas audiências fora, mesmo, quem as assaltou no interior de coletivos. (...) Apelo provido parcialmente. APELAÇÃO CRIME Nº 70012962684 SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL. DES. MARCELO BANDEIRA PEREIRA, Relator. VOTOS: DES. MARCELO BANDEIRA PEREIRA (RELATOR) Conquanto louvável o esforço defensivo, o juízo absolutório com o que cogita a digna Defensoria Pública não tem como ser acolhido. A propósito, com absoluta correção, a r. Sentença apelada, da lavra do eminente decisor ÂNGELO FURLANETTO PONZONI, examinou a prova produzida, com o natural destaque para os depoimentos das vítimas, cujos trechos essenciais transcreveu, realçando que reconheceram o apelante, sem sombra de dúvidas, como o autor dos assaltos de que trata a espécie. Pela tônica expressa no recurso, vale o registro de que, em fato sem testemunhas, presentes apenas o criminoso e a vítima, curial que se empresta maior significado às palavras desta, desde que, é óbvio, nada indique que movida por propósito outro que não o de colaborar para a descoberta da autoria do crime. Até porque, do outro lado, o réu, este, sim, tem suas declarações indelevelmente tisnadas pelo natural e humano propósito de auto-preservação. No caso dos autos, as vítimas sequer conheciam o apelante, sem razão, assim, para acusá-lo injustamente, o que, ao fim e ao cabo, acabaria deixando impune seu algoz. De mais a mais, chama a atenção que as duas vítimas reconheceram o apelante, imputando-lhe prática de roubo cometido em circunstâncias assemelhadas, com o uso de arma branca, em interior de coletivo. Mais do que isso, também uma terceira vítima (Emerson, fl. 269, com reconhecimento na polícia a fl. 21) lhe atribuiu outro roubo, do qual foi denunciado, mas acusação de se viu liberto simplesmente porque menor ao tempo daqueles acontecimentos. A tais comemorativos, que dão a segurança para o suporte do juízo condenatório, se agregou a falta de comprovação do álibi desfiado no interrogatório. Com essa indicação primeira, para fechar, de vez, a incriminação, bastaria, em juízo, a confirmação de que o réu, pessoa reconhecida na polícia, fora, mesmo, o autor do roubo. Nem se exigiria, assim, novo reconhecimento formal, com a colocação do réu em meio a outras pessoas, providência que, se realizada, teria meramente o cunho utilitário, não indispensável. Até porque, convém não perder de vista, vige no processo penal o sistema da persuasão racional, e não o positivo ou de tarifamento do valor das provas. Deste modo, insisto, perfeitamente válido, com aptidão para convencer, o ato, expresso a fl. 320, em que Auri, que já havia reconhecido o apelante na polícia, confirmou a imputação. Da mesma forma, válida a providência, registrada em meio ao depoimento da vítima Luis Fernando (fl. 268), pela qual, posta diante de três elementos, procedeu ao mesmo reconhecimento, reiterando, pois, o que expressara em ato formalizado perante a autoridade policial (fl. 23). Pouco importa, bem se vê, que ditas as pessoas postas junto ao apelante não tivessem a mesma característica física. Afinal de contas, Luis não estava obrigado a reconhecer qualquer deles, nem mesmo o réu. Até porque, mesmo para o reconhecimento formal, previsto no art. 226 do CPP, nem é obrigatória a colocação de outros indivíduos junto ao suspeito, o que deve ser feito se possível, na dicção legal. Em suma, a prova é confiável, dando suporte ao juízo condenatório. (...)."

Ante o exposto, o parecer do Ministério Público é pelo conhecimento e provimento parcial do recurso para decretar a nulidade da sentença por falta de fundamentação na aplicação da pena; caso ultrapassada a preliminar, pelo conhecimento da presente apelação e pelo seu improvimento.

Salvador, 12 de maio de 2009.

Rômulo de Andrade Moreira

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