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1 de Maio de 2024
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    Doméstica desempregada de Fortaleza com coxatrose grave tem direito a auxílio-doença

    Médica constatou incapacidade física parcial e definitiva

    Publicado por Everton Vilar
    há 3 anos

    S E N T E N Ç A

    I – RELATÓRIO

    A parte autora ajuizou ação de rito especial em face do Instituto Nacional do Seguro Social almejando o deferimento (concessão e/ou restabelecimento) de benefício por incapacidade (temporária e/ou permanente).

    Devidamente citado, o INSS pugnou pela total improcedência da demanda (v. anexo 11).

    Não tendo chegado as partes à conciliação, julga-se a lide.

    Relatado no essencial, decido.

    II - FUNDAMENTAÇÃO

    Pedido de gratuidade da justiça.

    A gratuidade da justiça já foi deferida (v. anexo 10) e não tendo sido apresentada qualquer contraprova à condição financeira alegada na inicial, mantenho o deferimento do benefício à parte autora.

    Do interesse de agir

    Alega o INSS, preliminarmente, que o autor não teria ingressado com pedido de concessão do seu benefício, nos termos do RE 631.240/MG, proferido em sede de Repercussão Geral, em 3/9/2014, por maioria e nos termos do voto do relator Ministro Roberto Barroso, razão pela qual o feito deveria ser extinto sem julgamento do mérito.

    Contudo, analisando detidamente os autos, vê-se que a parte autora requereu, em 15/12/2020, a concessão do benefício por incapacidade (temporária e/ou permanente), o qual restou indeferido pelo INSS (v. anexo 5).

    Afasto, portanto, a preliminar ventilada.

    Mérito

    De início, registre-se que com o advento da Emenda Constitucional n.º 103/2019, a aposentadoria por invalidez e o auxílio-doença passaram a ser denominados, respectivamente, aposentadoria por incapacidade permanente e auxílio por incapacidade temporária, embora a legislação infraconstitucional (Lei n.º 8.213/91) ainda mantenha a nomenclatura antiga.

    Para a concessão do auxílio por incapacidade temporária faz-se necessária a demonstração da incapacidade temporária por mais de 15 dias para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual e a suscetibilidade de recuperação. O auxílio por incapacidade temporária será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz. Imprescindível, portanto, a comprovação de incapacidade temporária para o trabalho ou para atividade habitual (arts. 59 e 60 da Lei n.º 8.213/91).

    Já a aposentadoria por incapacidade permanente será devida ao segurado que for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência (art. 42 da Lei n.º 8.213/91). Exige-se, portanto, a comprovação da incapacidade permanente para o trabalho e a impossibilidade de reabilitação.

    A questão a ser dirimida consiste na análise do preenchimento dos requisitos necessários à fruição da aposentadoria por incapacidade permanente ou do auxílio por incapacidade temporária: a) manutenção da qualidade de segurado; b) carência; e c) incapacidade permanente para a atividade laboral (aposentadoria por incapacidade permanente) ou temporária e suscetível de recuperação para a mesma ou para outra atividade (auxílio por incapacidade temporária).

    Para a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente ou do auxílio por incapacidade temporária exige-se a carência de doze contribuições, segundo reza o art. 25, I, da Lei n.º 8.213, de 1991, exceto nos casos previstos no art. 26, II, c/c art. 151 da mesma Lei. Segundo o art. 39, os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 da Lei n.º 8.213/91, precisam comprovar o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido (no caso, os doze meses).

    No que concerne ao requisito da incapacidade laborativa, com amparo na perícia realizada, concluo que merece acolhida a pretensão exposta na inicial.

    Nos termos do laudo médico pericial acostado aos autos (anexo 18), tem-se que a autora foi diagnosticada com coxartrose grave, CID10: M16.0, encontrando-se, desde outubro de 2020, incapacitada, de forma parcial e definitiva, para exercer atividades laborais que exijam sobrecarga de membros inferiores, como permanecer longos períodos em ortostase, subir escadas, agachar-se com frequência e aplicar força com os membros inferiores.

    Em tese, há incapacidade para o exercício de suas atividades habituais (auxiliar de produção e empregada doméstica), tendo sido sugerida a reabilitação profissional da parte autora para o exercício de atividades compatíveis com suas limitações físicas, sobretudo para aquelas em que permaneça sentada.

    Para corroborar o posicionamento, transcrevo trecho do laudo pericial acerca da existência de impedimentos laborais:

    (...)

    06) Caso a doença, deficiência ou sequela acarrete a incapacidade laborativa, qual a data do início da incapacidade (data precisa ou pelo menos aproximada)?

    Data do início da incapacidade (DII): outubro/2020.

    07) Caso o (a) periciando (a) esteja incapacitado (a), tal incapacidade é temporária (ou indefinida), ou seja, há, em tese, a possibilidade de cessação de tal incapacidade para que ele volte a exercer atividade laborativa; ou definitiva, quer dizer, de acordo com a evolução atual dos conhecimentos médicos, não há possibilidade de cessação de tal incapacidade?

    A perícia médica constatou incapacidade física parcial e definitiva para atividades de carga de quadris, sem possibilidade de cessação.

    08) Considerando apenas a situação médica do (a) periciando (a), sua incapacidade pode ser considerada total, ou seja, para toda e qualquer atividade laborativa; ou parcial, quer dizer, apenas para algumas atividades laborativas (neste último caso, especificar quais)?

    A incapacidade física apresentada é parcial, para atividades de sobrecarga de membros inferiores como permanecer longos períodos em ortostase, subir escadas e agachar-se com frequência e aplicar força com os membros inferiores. O (A) periciado (a) poderá ser reabilitado (a) para exercer função em que permaneça sentado (a)

    (destaques acrescidos)

    Desse modo, percebe-se que a autora possui incapacidade laboral definitiva para o exercício de suas atividades habituais (auxiliar de produção e empregada doméstica), bem como para outros ofícios que exijam esforço físico extenuante, sobretudo com os membros inferiores.

    Ponderando que a autora apresenta incapacidade parcial e definitiva, mostra-se imprescindível o cumprimento do enunciado n.º 47 da TNU: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez”.

    No caso, verifica-se que a autora informou em entrevista pericial que possui formação incompleta no ensino fundamental; possui apenas quarenta e quatro anos de idade; e, dentre as funções que já exerceu, ambas exigem esforço físico intenso com os membros inferiores.

    O reconhecimento das habilidades e capacidades de pessoas com deficiência para fins de participação no mercado laboral configura medida de conscientização e respeito pela dignidade inerente, autonomia individual e independência, princípio geral da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

    Assim, considerando as vicissitudes acima narradas, é viável a reabilitação do promovente para algumas das atividades compatíveis com sua limitação física.

    Desse modo, conclui-se que a parte autora apresenta incapacidade laboral parcial e definitiva, apta a ensejar, caso preenchidos os demais requisitos (qualidade de segurado e carência), a concessão do benefício de auxílio por incapacidade temporária, sendo indevida, entretanto, a sua conversão em aposentadoria por incapacidade permanente, já que não há incapacidade total e definitiva para o desempenho de todo e qualquer ofício que lhe garanta o sustento.

    Da qualidade de segurado (a) e do cumprimento do período de carência

    Analisando-se os dados do CNIS (v. anexo 12), verifica-se que a autora ingressou no Regime Geral de Previdência Social, em 3/6/2013, na qualidade de segurada empregada, sendo seu último contrato de trabalho, como doméstica, com admissão em 2/1/2017 e rescisão em 8/1/2019.

    Consta, ainda, que, após o fim deste último vínculo, a promovente recebeu seguro-desemprego (v. anexo 8, fl. 12), presumindo-se que se encontrava em situação de desemprego involuntário.

    Assim, tomando como base o término do seu último vínculo, em 8/1/2019, bem como aplicando-se a extensão do período de graça, conforme disposto no art. 15, II c/c §§ 2º e da Lei nº. 8.213/91, não resta dúvidas de que, quando do início da incapacidade laboral, em outubro de 2020, a promovente se enquadrava como segurada e já tinha cumprido o período de carência, que, no caso, é de 12 (doze) contribuições mensais, a teor do disposto no art. 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91.

    Quanto ao prazo estimado para a duração do benefício

    É imperioso registrar que a Lei n.º 8.213/91 foi modificada pela Lei n.º 13.457, de 26 de junho de 2017, decorrente da conversão da Medida Provisória n.º 767, de 6 de janeiro de 2017, cujas vigências tiveram início nas datas das respectivas publicações, ocorridas em 27/6/2017 e 6/1/2017. Relativamente ao prazo estimado para a duração do benefício de auxílio por incapacidade temporária, foram incluídos os seguintes parágrafos ao art. 60 da Lei de Benefícios. Vejamos o teor das novas disposições:

    “§ 8.º Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício.

    § 9.º Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei.

    § 10. O segurado em gozo de auxílio-doença, concedido judicial ou administrativamente, poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, observado o disposto no art. 101 desta Lei.”.

    Da alteração legislativa, depreende-se que se deve estipular um período estimado para a percepção do auxílio por incapacidade temporária, que será de cento e vinte dias se outro prazo não houver sido fixado, seja judicial ou administrativamente. Destarte, transcorrido tal prazo, o benefício será, automaticamente, cessado, salvo se houver requerimento de prorrogação (PP) junto ao INSS, na forma do regulamento, ocasião em que o segurado deve ser submetido à nova perícia administrativa a fim de avaliar sua capacidade laboral, observados os princípios do contraditório e da ampla defesa.

    No caso concreto, a perícia médica judicial fez consignar, expressamente, a insuscetível recuperação para sua atividade habitual e a possibilidade de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade compatível com suas limitações, razão pela qual o benefício de auxílio por incapacidade temporária deverá ser mantido até que o segurado (a) seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez, conforme disposição contida no art. 62, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91.

    Destarte, comprovados os requisitos de carência, qualidade de segurado (a) e havendo o laudo pericial atestado a incapacidade laboral da parte autora, outra senda não resta a esse Juízo senão o deferimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária ora perseguido, com início a partir da data do requerimento administrativo (DER: 15/12/2020, v. anexo 5). Nesse sentido, mutatis mutandis, o enunciado n.º 22 da Turma Nacional de Uniformização: “Se a prova pericial realizada em juízo dá conta de que a incapacidade já existia na data do requerimento administrativo, esta é o termo inicial do benefício assistencial.”.

    III – DISPOSITIVO

    Com base nestes esteios, afasto a preliminar da falta de interesse de agir e, no mérito, julgo procedente o pedido, resolvendo o feito com exame de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para condenar o INSS a implantar (obrigação de fazer), em favor da parte autora, o benefício de auxílio por incapacidade temporária, com DIB correspondente à data do requerimento administrativo (DER: 15/12/2020, v. anexo 5), e a pagar-lhe as parcelas atrasadas, assim entendidas as devidas desde esta data até a efetiva implantação do benefício, observada a fundamentação desta sentença quanto ao prazo estimado para a sua duração (condicionado à reabilitação profissional).

    A DIP deve ocorrer a partir do dia 1.º do mês correspondente à prolatação desta sentença.

    À vista da declaração de inconstitucionalidade parcial por arrastamento do art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, com redação dada pela Lei n.º 11.960, de 29 de junho de 2009 (STF, ADI 4357/DF e ADI 4425/DF), assim como do entendimento do STJ de que a referida declaração parcial de inconstitucionalidade diz respeito ao critério de correção monetária, mantida a eficácia do dispositivo relativamente ao cálculo dos juros de mora, à exceção das dívidas de natureza tributária, REsp 1.270.439/PR (Rel. Ministro Castro Meira, DJe de 2/8/2012) e AgRg no REsp 1263644/PR (Rel. Ministro Sérgio Kukina, DJe 18/10/2013), determino que as parcelas atrasadas sejam corrigidas monetariamente pelo INPC (art. 41-A da Lei n.º 8.213/91) e demais indexadores constantes no manual de cálculos da Justiça Federal e com os juros aplicáveis à caderneta de poupança, desde a citação, montante a ser atualizado na data do efetivo pagamento.

    Após o trânsito em julgado, expeça-se a Requisição de Pequeno Valor – RPV em favor da parte demandante, nos termos do art. 17 da Lei nº 10.259/01, observando-se o teto de 60 (sessenta) salários-mínimos na data da sua expedição. Ultrapassado o referido valor e não havendo renúncia ao excedente, expeça-se precatório.

    Determino, ainda, que o referido benefício seja implantado pelo INSS em favor da parte autora no prazo de 15 (quinze) dias da intimação desta sentença, sob pena de cominação de multa diária por dia de atraso, independentemente de eventual interesse em recorrer, haja vista o seu caráter alimentar, a comprovação dos requisitos para a obtenção do direito postulado e o efeito apenas devolutivo do recurso porventura interposto (arts. 42 e 43 da Lei n.º 9.099/95).

    Sem custas. Sem honorários. Sem reexame necessário.

    Interposto recurso voluntário, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões e encaminhem-se os autos para a Turma Recursal. Do contrário, cumpridas as condenações/obrigações desta sentença, arquivem-se os autos.

    P. R. Intimem-se.

    Fortaleza/CE, data supra.

    SÉRGIO FIUZA TAHIM DE SOUSA BRASIL

    Juiz Federal – 26.ª Vara/CE

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