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6 de Maio de 2024

STJ Mar 23 - Lava Jato - Incompetência Absoluta - Juízo Eleitoral deve Conhecer o Feito

ano passado

Decisão Monocrática

HABEAS CORPUS Nº 733317 - PR (2022/0095218-0)


Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, com pedido de liminar, impetrado em favor de XXXXXXXXX contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4a Região.

Consta dos autos que o paciente foi condenado, nos autos da Ação Penal n. 5022182-33.2016.4.04.7000, à pena de 5 anos de reclusão, em regime prisional fechado, mais 100 dias-multa, pela prática do crime de lavagem de dinheiro (art. , § 4º, da Lei nº 9.613/1998).

Irresignadas, ambas as partes apelaram ao Colegiado de origem, que desproveu o recurso defensivo e deu parcial provimento ao recurso ministerial, a fim de estabelecer a pena em 6 anos de reclusão, mais 150 dias-multa, nos termos da seguinte ementa:

"PENAL. PROCESSUAL PENAL. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. COMPETÊNCIA DA 13a VARA FEDERAL DE CURITIBA. CONDUÇÃO COERCITIVA DETERMINADA NA FASE DE INQUÉRITO. INAPLICABILIDADE DO ART. 260 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MEDIDA DISTINTA DAS PRISÕES CAUTELARES. PREJUÍZO NÃO COMPROVADO. LAVAGEM DE DINHEIRO. OPERAÇÕES SUB-REPTÍCIAS COM UTILIZAÇÃO DE INTERMEDIÁRIOS. RECURSOS ORIGINÁRIOS DO DELITO ANTECEDENTE DE GESTÃO FRAUDULENTA DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CARACTERIZAÇÃO DO ILÍCITO. MATERIALIDADE E AUTORIA. CONDENAÇÕES MANTIDAS. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS QUANTO A RÉUS ABSOLVIDOS. MANUTENÇÃO DAS ABSOLVIÇÕES. DOSIMETRIA DAS PENAS. PENA- BASE. CULPABILIDADE. READEQUAÇÃO. REPARAÇÃO DO DANO. REDUÇÃO DO VALOR MÍNIMO INDENIZATÓRIO. JUROS DE MORA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. 1. A competência do Juízo da 13g Vara Federal de Curitiba/PR firmou-se em razão da inequívoca conexão dos fatos denunciados na presente ação penal com o grande esquema criminoso de corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito da empresa Petróleo Brasileiro S/A. 2. A condução coercitiva determinada na fase de inquérito policial, fundamentada no art. 6Q do Código de Processo Penal, justifica-se quando todas as medidas pré-processuais, inclusive oitiva dos investigados, tiverem de ser realizadas simultaneamente, a fim de preservar a higidez da prova e o ajuste de versões, não lhe sendo aplicável a regra do art. 260 do CPP. Sendo medida temporária, para um ato específico e no qual é assegurado o direito constitucional ao silencio, tampouco se confunde com as prisões cautelares. 3. O processo penal é regido pelo princípio pas de nullité sans grief , não sendo possível o reconhecimento de nulidade, ainda que absoluta, sem a demonstração do efetivo prejuízo. Precedentes do STJ e do STF. 4. Não há falar em inépcia da denúncia, uma vez que esta narra os fatos com todas as circunstâncias, individualiza a conduta de cada denunciado e aponta o tipo penal infringido, permitindo, por conseguinte, o exercício pleno da ampla defesa. Ademais, com a superveniência de sentença condenatória resulta preclusa a alegação de inépcia da denúncia e de ausência de justa causa. Precedentes do STJ. 5. A lavagem de ativos é delito autônomo em relação ao crime antecedente (não é meramente acessório a crimes anteriores), já que possui estrutura típica independente (preceito primário e secundário), pena específica, conteúdo de culpabilidade própria e não constitui uma forma de participação post- delictum ou mero exaurimento da corrupção. 6. Caracteriza o tipo penal do art. da Lei nº 9.613/1998 a realização de operações financeiras sub-reptícias, com a utilização de intermediários, com o objetivo de encobrir o rastro do dinheiro proveniente do crime antecedente de gestão fraudulenta de instituição financeira e facilitar a inserção dos recursos na economia formal. 7. Comprovada a prática do crime de lavagem de dinheiro, diante do conjunto probatório documental e testemunhal, por parte dos réus XXXXXXXXXXXX. 8. Mantidas as absolvições de XXXXXXXXXXXXXXXXXXX da imputação de prática do crime de lavagem de dinheiro, por falta de prova suficiente para condenação criminal, com base no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Rejeitado o pedido subsidiário de condenação de XXXXXXXXXXXXX pelo crime antecedente de gestão fraudulenta, considerando os limites fixados pela própria denúncia. 9. A legislação pátria adotou o critério trifásico para fixação da pena, a teor do disposto no art. 68, do Código Penal. A pena base atrai o exame da culpabilidade do agente (decomposta no art. 59 do Código Penal nas circunstâncias do crime) e em critérios de prevenção. Não há, porém, fórmula matemática ou critérios objetivos para tanto, pois a dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena ( HC 107.409/PE, 1. Turma do STF, Rel. Min. Rosa Weber, un., j. 10.4.2012, DJe-091, 09.5.2012). É no juízo subjetivo de reprovação que reside a censurabilidade que recai sobre a conduta. 10. Regra geral, a culpabilidade é o vetor que deve guiar a dosimetria da pena. Readequadas as penas-base impostas a quatro dos réus. 11. Cabível a aplicação da atenuante genérica a um dos acusados - que apresentou documentos relevantes à investigação no curso do inquérito -, na fração de 1/6 (um sexto). 12. Reduzido o valor mínimo para reparação do dano, considerando os limites do objeto da causa, assim como o próprio pedido formulado na denúncia. 13. Ainda que a lei trate de valor mínimo, a recomposição dos prejuízos causados visa à adequada reparação dos danos sofridos pela vítima dos crimes, devendo, para tanto, ser composta não apenas de atualização monetária, mas, também, da incidência de juros, nos termos da legislação civil. 14. Em observância ao quanto decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus nº 126.292/SP, tão logo decorridos os prazos para interposição de recursos dotados de efeito suspensivo, ou julgados estes, deverá ser oficiado à origem para dar início à execução das penas" (e-STJ, fls. 5225-5227).

Irresignada, a defesa opôs embargos de declaração, que foram desprovidos, conforme se depreende a seguinte ementa:

"PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 619 DO CPR REQUISITOS. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. OBSCURIDADE OU AMBIGUIDADE. INEXISTÊNCIA. LIVRE APRECIAÇÃO. CONCLUSÕES DO ÓRGÃO JULGADOR. PREQUESTIONAMENTO. 1. Os embargos de declaração têm lugar exclusivamente nas hipóteses de ambiguidade, omissão, contradição ou obscuridade da decisão recorrida, não se prestando para fazer prevalecer tese diferente daquela adotada pelo órgão julgador ou para reavaliação das conclusões surgidas da livre apreciação da prova. 2. Inocorrendo qualquer das hipóteses previstas no art. 619 do Código de Processo Penal, a modificação do julgamento deve ser buscada pelas vias recursais apropriadas. 3. Ainda quando ajuizados para efeito de prequestionamento, os embargos de declaração só têm cabimento nas restritas hipóteses elencadas no art. 619 do CPP, quais sejam, omissão, ambiguidade, obscuridade ou contradição. 4. 'Para se ter prequestionada a matéria, não há necessidade de referência expressa ao artigo ofendido. Basta debate e decisões anteriores fulcrados na norma em questão' (STF, AI 616427 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado em 09/09/2008). 5. Embargos de declaração parcialmente providos em relação a um dos acusados, para sanar contradição quanto ao valor mínimo da reparação de danos" (e- STJ, fl. 5481).

Ainda conformada, a defesa opôs novos aclaratórios, que não mereceram conhecimento (e-STJ, fls. 5600-5602).

Em seguida, foram interpostos recurso especial e extraordinário, que foram admitidos, sem efeito suspensivo.

Neste recurso, a defesa sustenta, em síntese, a incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o crime de lavagem de capitais denunciado na Ação Penal n. 5022182- 33.2016.4.04.7000.

Afirma que a Ação Penal n. 5061578-51.2015.4.04.7000, em que o ora paciente foi denunciado pelo crime de gestão fraudulenta, infração penal antecedente ao crime de lavagem que é objeto da Ação Penal n. 5022182-33.2016.4.04.7000, foi remetida à Justiça Eleitoral por força da decisão proferida pela Quinta Turma nos autos do REsp 1.854.892/PR.

Assevera que a Ação Penal n. 5052995-43.2016.4.04.7000, também oriunda da Ação Penal n. 5061578-51.2015.4.04.7000, a qual versa sobre outro crime de lavagem de capitais que apresentaria como infração antecedente o delito de gestão fraudulenta, já teria sido encaminhada à Justiça Eleitoral por ordem desta Corte Superior concedida no RHC 120.590/PR.

Argumenta que a tese de incompetência não foi apreciada no REsp 1.797.969/PR, extraído de uma das ações penais que versa sobre os crimes de lavagem de capitais, de modo que não haveria reiteração de pedidos.

Pontua, também, que proferi voto condutor no REsp 1.854.892/PR, o que me tornou prevento para o julgamento de todos os recursos, incidentes e ações conexos àquele recurso especial no âmbito da Quinta Turma.

Requer, ao final, a concessão de medida liminar para suspender a Ação Penal n. 5022182-33.2016.4.04.7000.

No mérito, pugna pela concessão da ordem para declarar a competência da Justiça Eleitoral para o processo e julgamento da Ação Penal n. 5022182-33.2016.4.04.7000, com anulação de todos os atos processuais praticados.

Distribuído por prevenção ao Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), fui consultado a respeito de eventual prevenção para a relatoria deste mandamus (e-STJ, fls. 10983-10985). Aceita a prevenção (e-STJ, fl. 10999), indeferi a liminar (e-STJ, fl. 11004).

Ajuizado pedido de reconsideração, foi indeferido (e-STJ, fl. 11045).

A Subprocuradoria-Geral da República manifestou-se pelo não conhecimento do writ ou, caso conhecido, pela sua denegação (e-STJ, fls. 11049-11055).)

É o relatório.

Decido.

Esta Corte - HC 535.063/SP, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis Junior, julgado em 10/6/2020 - e o Supremo Tribunal Federal - AgRg no HC 180.365, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 27/3/2020; AgR no HC 147.210, Segunda Turma, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 30/10/2018 -, pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.

Inicialmente, ao contrário do sustentado no parecer ministerial, percebe-se que o pleito de reconhecimento da incompetência material da Justiça Federal comum para o exame do processo-crime não foi analisado no bojo do REsp 1797969/PR, ainda que tenham sido formulados sucessivos pedidos incidentais pela defesa, os quais não foram examinados, tendo o feito sido encaminhado ao Supremo Tribunal Federal para o exame do recurso extraordinário interposto nos autos.

Nesse contexto, em que pese o princípio da unirrecorribilidade das decisões judiciais, se os pedidos não foram apreciados nos autos do recurso especial, deve ser procedido ao exame da existência de manifesta ilegalidade sanável nesta via do habeas corpus.

Com efeito, segundo o decidido pelo Supremo Tribunal Federal, no bojo do Inq n. 4.435/DF, compete à Justiça Eleitoral julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhe forem conexos - inteligência dos artigos 109, inciso IV, e 121 da Constituição Federal, 35, inciso II, do Código Eleitoral e 78, inciso IV, do Código de Processo Penal.

No caso, nos moldes do sustentado nas razões da impetração, a competência da Justiça Eleitoral, oriunda da interpretação dada pela Suprema Corte à Constituição Federal e à legislação dela decorrente, exsurge sempre que na ação penal houver qualquer menção a crime dessa espécie, seja na descrição feita pelo órgão acusatório a respeito da suposta conduta ilícita, seja nas decisões oriundas dos órgãos jurisdicionais.

A propósito do tema, o seguinte julgado:

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIMES DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, CONCUSSÃO, EXTORSÃO, FALSIDADE IDEOLÓGICA E LAVAGEM DE DINHEIRO. DESTINAÇÃO DOS RECURSOS OBTIDOS COM OS CRIMES PARA O FINANCIAMENTO DE CAMPANHA ELEITORAL. DENÚNCIA QUE DESCREVE A PRÁTICA DE CRIME ELEITORAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESPECIALIZADA. ENTENDIMENTO DO STF E PRECEDENTE RECENTE DESTA COLENDA QUINTA TURMA. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES.

1. Os embargos de declaração têm a finalidade simples e única de completar, aclarar

ou corrigir uma decisão ambígua, omissa, obscura ou contraditória, conforme dispõe o art. 619 do Código de Processo Penal.

2. No caso em tela constato a existência de omissão em relação ao decido no AResp

1925104/PR.

3. Verifica-se que a denúncia de e-STJ fls. 3.486/3.514 estabeleceu vínculo entre as

condutas imputadas aos réus com a campanha eleitoral, o que atrai a competência da justiça especializada.

4. A competência da Justiça Eleitoral, oriunda da interpretação dada pela Suprema

Corte à Constituição Federal e à legislação dela decorrente, se aplica sempre que na ação penal houver qualquer menção a crime dessa espécie, seja na descrição feita pelo órgão acusatório a respeito da suposta conduta ilícita, seja nas decisões oriundas dos órgãos jurisdicionais (ut, AgRg no REsp 1.854.892/PR, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO - Desembargador convocado do TJDFT), Relator p/ acórdão Ministro RIBEIRO DANTAS, julgado em 8/10/2021)

5. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes, a fim de proclamar a

incompetência da Justiça Comum Estadual e declarar a nulidade dos atos decisórios proferidos neste processo.

( EDcl no AgRg no AREsp n. 1.921.112/PR, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 15/2/2022, DJe de 21/2/2022.);

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. COMPETÊNCIA. INOVAÇÃO RECURSAL. AFASTAMENTO. CORRUPÇÃO E LAVAGEM DE ATIVOS. DOAÇÕES ELEITORAIS EFETUADAS COMO SUBTERFÚGIO PARA DAR APARÊNCIA DE LICITUDE AO REPASSE DE VANTAGENS ILÍCITAS A AGREMIAÇÕES PARTIDÁRIAS. ALEGADO PREJUÍZO ÀS ELEIÇÕES DISTRITAIS DE 2014. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL PARA O CONHECIMENTO E JULGAMENTO DO CRIME ELEITORAL E CRIMES COMUNS CONEXOS. ACOLHIMENTO DOS ACLARATÓRIOS.

1. Não caracteriza indevida inovação recursal a pretensão de aplicação ao caso

concreto de decisão paradigmática prolatada pelo Supremo Tribunal Federal em momento posterior à interposição do recurso especial.

2. A narração, na denúncia, de mecanismos que envolvem a ocultação da origem e

natureza de valores ilícitos com utilização da estrutura da Justiça Eleitoral para lhes dar aparência de legitimidade caracteriza, em tese, a prática de falsidade ideológica eleitoral, atraindo a competência daquela Justiça especializada para seu julgamento e o dos crimes comuns conexos.

3. Embargos aos quais se dá provimento para reconhecer a competência da Justiça

Eleitoral para o processamento dos crimes eleitorais e dos crimes comuns que lhes são conexos, com prejuízo das demais alegações do embargante"

( EDcl no AgRg no REsp n. 1.784.037/PR, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), relator para acórdão Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 8/2/2022, DJe de 25/2/2022.).

Deveras, conforme se extrai da sentença, foi realizado empréstimo reconhecido como fraudulento, no valor de R$ 12.176.850,80, tomado no XXXXXXXXXXXXXXXXXXXX e, após, a fim de dissimular a origem e movimentação, o valor fora transferido para o XXXXXXXXXXXXXX que, instruído pelo pelo ora paciente DXXXXXXXXXXX, teria feito a lavagem do dinheiro, dissimulando sua origem, distribuindo o valor entre campanhas eleitorais (não havendo a integral declaração dos valores quando das prestações de contas à Justiça Eleitoral) e outros beneficiários envolvidos com partidos políticos (PT e PDT).

Com efeito, os pagamentos foram efetuados para pagamento de dívidas eleitorais, o que, de fato, evidencia a competência material de Justiça Eleitoral para o julgamento do processo-crime dos crimes comuns perpetrados com crime eleitorais, nos moldes do reconhecido pelo STF, no julgamento do Inquérito 4435/DF, tratando-se de incompetência absoluta, o que, portanto, não se convalida, ainda que não tenha sido formalmente descrito crime eleitoral na peça acusatória, dada a presença de inequívoco contexto eleitoral indicativo da prática de delitos dessa natureza a atrai a competência da Justiça especializada. Tal entendimento, decerto, impede que o acusador escolha o juízo da causa e evita que ele manipule a tipificação legal para evitar a Justiça Eleitoral.

Nesse sentido:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. DENÚNCIA QUE NARRA FATOS QUE SE AMOLDAM, EM TESE, AO CRIME PREVISTO NO ART. 350 DO CÓDIGO ELEITORAL. PRÁTICA CONHECIDA COMO CAIXA 2 PARA O FINANCIAMENTO DE CAMPANHA ELEITORAL. EMENDATIO LIBELLI. MOMENTO ADEQUADO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESPECIALIZADA.

1. Como regra, a emendatio libelli deve ser realizada na sentença, nos termos do art.

383 do Código de Processo Penal. Entretanto, em casos específicos, nos quais a classificação do delito possa ensejar repercussões imediatas ao acusado, admite-se a antecipação desse juízo, a fim de que sejam observadas regras de competência absoluta e de procedimento, bem como para que possam ser aplicados institutos processuais favoráveis à defesa (v.g transação penal e o sursis processual). Precedentes.

2. No caso em exame, a descrição dos fatos narrados na denúncia sinaliza para a prática do delito de falsidade ideológica eleitoral, descrito no art. 350 do Código Eleitoral, consistente na prática conhecida por "caixa dois", ou seja, o emprego de valores, fruto de práticas delitivas, na campanha ao Governo Estadual, não declarados à Justiça Eleitoral, e utilizados para a compra de apoio político e para o pagamento de dívidas a ela relacionadas.

3. Segundo decidido pela Suprema Corte no Inq n. 4.435/DF, "compete à Justiça Eleitoral julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhe forem conexos - inteligência dos artigos 109, inciso IV, e 121 da Constituição Federal, 35, inciso II, do Código Eleitoral e 78, inciso IV, do Código de Processo Penal".

4. Ordem concedida. ( HC n. 541.994/RN, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 4/5/2021, DJe de 12/5/2021, negritos não originais);

"AGRAVO REGIMENTAL. CONSTITUCIONAL. PENAL. PROCESSO PENAL. COMPETÊNCIA. INOVAÇÃO PROCESSUAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. IMPUTAÇÃO DA PRÁTICA DE CRIMES COMUNS CONEXOS A FEITO REMETIDO À JUSTIÇA ELEITORAL PELO RECONHECIMENTO DA PRÁTICA DE CRIMES ELEITORAIS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESPECIALIZADA. PROVIMENTO DO AGRAVO.

1. A competência é matéria de ordem pública de especial relevância nos feitos criminais, já que o correto exercício da jurisdição é garantia assegurada aos réus no processo penal, de acordo com a moldura constitucional conferida ao tema.

2. A Justiça Eleitoral é competente para o julgamento de crimes eleitorais e dos comuns que lhes forem conexos, na forma dos arts. 109, IV, e 121 da Constituição Federal.

3. A anterior remessa à Justiça Eleitoral de feito diverso no qual houve o reconhecimento de imputações de crimes eleitorais impõe igual destino a feito conexo relacionado a crimes comuns praticados naquele mesmo contexto delituoso.

4. Agravo regimental prejudicado. ( AgRg nos EDcl no REsp n. 1.896.888/PR, relator Ministro Jesuíno Rissato

(Desembargador Convocado do TJDFT), relator para acórdão Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 24/5/2022, DJe de 7/6/2022, negritos não originais)

Ante o exposto, não conheço do writ, mas concedo a ordem, de ofício, para reconhecer a competência da Justiça Eleitoral para o julgamento da Ação Penal n. 5052995- 43.2016.4.04.7000/PR, determinando a remessa dos autos à Justiça Eleitoral. Reconhecida a incompetência da Justiça Federal, devem ser considerados nulos os atos decisórios, ressalvada a possibilidade de ratificação pelo juízo competente.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 03 de março de 2023.

Ministro Ribeiro Dantas


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(STJ - HC: 733317 PR 2022/0095218-0, Relator: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Publicação: DJ 06/03/2023)

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