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23 de Maio de 2024
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    Justiça Federal mantém curso de Engenharia Agronômica destinado aos Sem Terra

    Publicado por Expresso da Notícia
    há 17 anos

    O juiz Edmilson da Silva Pimenta, da 3ª Vara Federal de Aracaju, manteve o Curso Superior Especial em Engenharia Agronômica, criado pela Universidade Federal de Sergipe especialmente para os trabalhadores "Sem Terra" do Nordeste. Na avaliação do magistrado, não há ilegalidade na criação do curso. Ao contrário, o curso encontra respaldona política de ações afirmativas, que constituem"uma realidade disseminada por todo o corpo da Constituição Federal"

    A seu ver, o cursovisa "dar uma maior efetividade ao princípio da isonomia", por procurar "diminuir o fosso existente entre os estudantes vinculados a assentamento destinados à Reforma Agrária, visivelmente menos favorecidos pela política educacional de base e pelo contexto social, e outros estudantes que têm acesso aos cursos preparatórios para vestibulares". Para Pimenta, os alunos mais privilegiados, que têm acesso aos cursinhos,alcançam melhores condições de disputar as vagas oferecidas pela universidade pública.

    A Associação dos Engenheiro Agrônomos do Sergipe - AEASE - propôs ação civil pública contra a Universidade Federal de Sergipe, alegando ser ilegal a criação do Projeto de Qualificação em Engenharia Agronômica para jovens e adultos, não graduados em nível superior, vinculados a Assentamentos de Reforma Agrária do Nordeste – PROQUERA.

    A Associação se opõe ao Curso 610 – Engenharia Agronômica, que tem duração de quatro anos e meio, porque as 60 vagas serão preenchidas por "Vestibular Especial", com apenas duas provas. O Vestibular não prevê itens do programa oficial. Os candidatos terão de fazer uma redação, versando sobre um tema relacionado à agricultura e ao meio ambiente, e uma prova de Conhecimentos Gerais, sobre o histórico da questão agrária e dos movimentos sociais no campo, com pesos três e sete, respectivamente, e de caráter meramente classificatório.

    Na avaliação da AEASE, o PROQUERA foi criado de forma discriminatória, porque "privilegia, injustificavelmente, uma parcela da sociedade brasileira, criando critérios de avaliação diferenciados para esta, em detrimento dos candidatos ao Curso Regular de Engenharia Agronômica, que se submetem à prova de Conhecimentos Curriculares, com 40 (quarenta) questões sobre português, matemática, geografia, física, biologia, química e língua estrangeira, e à prova de Redação". A associação questionou também a carga horária reduzida do curso recém-criado.

    Isonomia e ação afirmativa

    A Universidade Federal de Sergipe argumentou que a criação do curso "se constitui em política de ação afirmativa". Por isso, prosseguiu a defesa da Universidade, foram adotadas algumas medidas diferenciadas em relação ao curso regular de engenharia agronômica, como o "direcionamento do curso para o filho de beneficiário de reforma agrária em assentamentos do nordeste". Outros diferenciais do curso seriam o vestibular especial e os períodos letivos "ministrados de forma intensiva".

    No entendimento do juiz, porém, o PROQUERA obedeceu à legislação prevista para o Ensino Superior porque "esta apenas exige, para o acesso aos cursos de graduação, a conclusão do ensino médio e a classificação em processo de seleção que aplique prova de redação obrigatória em língua portuguesa".

    Pimenta destacou também que a carga horária de 200 dias por semestre se refere a trabalho acadêmico, abrangendo também tarefas executadas fora da sala de aula, "requisito facilmente preenchido pelos beneficiários do curso". Ele frisou que a "vasta experiência de vida no campo" dos "Sem-Terras" supre o requisito refeenrete ás tarefas práticas.

    Para o magistraddo, o curso especial poderá tornar "ainda mais sólida a proposta da Reforma Agrária no Brasil". Ele entende que a formação acadêmica proporcionada ao homem do campo terá um efeito "multiplicador e eficaz", pois os futuros Engenheiros Agrônomos divulgarão seus conhecimentos e técnicas junto aos trabalhadores do campo. Pimenta enfatizou que o curso alia "a experiência do homem do campo ao conhecimento científico, assegurando-lhes a plena vivência do princípio da dignidade humana e do primado do trabalho".

    Processo nº 2004.85.00.0255-9

    Leia, abaixo, a íntegra da decisão:

    "PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERALSeção Judiciária do Estado de Sergipe

    Processo nº 2004.85.00.0255-9 - Classe 5023 - 3ª Vara

    Ação: Ação Civil Pública

    Partes:

    Autora: Associação dos Engenheiros Agrônomos de Sergipe - AEASE

    Réus: Universidade Federal de Sergipe – UFS, Fundação de Apoio à Pesquisa e Extensão de Sergipe – FAPESE e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA

    ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CURSO ESPECIAL DE ENGENHARIA AGRONÔMICA. PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. REJEITADA. QUESTÃO ATINENTE À CATEGORIA DOS ENGENHEIROS AGRÔNOMOS E DOS CANDIDATOS A INGRESSO NOS CURSOS DE GRADUAÇÃO DA UFS, ATRAVÉS DE CONCURSO VESTIBULAR. DIREITO COLETIVO. ART. , V , DA LEI Nº 7.347 /85. BENEFÍCIO A JOVENS E ADULTOS VINCULADOS A ASSENTAMENTOS DE REFORMA AGRÁRIA. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E À LEGISLAÇÃO REGULAMENTADORA DO ENSINO SUPERIOR DO BRASIL. POLÍTICA DE AÇÃO AFIRMATIVA. SUBMISSÃO AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. REGRAS QUE OBEDECEM À LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS AUTORAIS.

    S E N T E N Ç A:

    Vistos etc.

    A ASSOCIAÇÃO DOS ENGENHEIROS AGRÔNOMOS DE SERGIPE - AEASE, representada por seu Presidente, propõe a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA, por via do advogado que subscreve a inicial, contra UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE - UFS, qualificada na exordial, alegando que o Conselho Universitário da ré – CONSU expediu a Resolução nº 09 /2003, aprovando a implementação do Projeto de Qualificação em Engenharia Agronômica para jovens e adultos não graduados em nível superior vinculados a Assentamentos de Reforma Agrária do Nordeste – PROQUERA, por meio do Curso 610 – Engenharia Agronômica, com duração de quatro anos e meio.

    Expõe que as 60 vagas disponibilizadas serão preenchidas atra (sessenta) vés de Vestibular Especial, do qual constaram apenas duas provas, sendo uma de redação, versando sobre um tema relacionado à agricultura e ao meio ambiente, e outra de Conhecimentos Gerais, sobre o histórico da questão agrária e dos movimentos sociais no campo, com pesos 3 e 7 , respectivamente, e de caráter meramente (três) cla (sete) ssificatório.

    Salienta que o PROQUERA, da forma como foi criado, é discriminatório, porquanto privilegia, injustificavelmente, uma parcela da sociedade brasileira, criando critérios de avaliação diferenciados para esta, em detrimento dos candidatos ao Curso Regular de Engenharia Agronômica, que se submetem à prova de Conhecimentos Curriculares, com 40 (quarenta) questões sobre português, matemática, geografia, física, biologia, química e língua estrangeira, e à prova de Redação.

    Aduz que a instituição do curso de graduação em Engenharia Agronômica Especial se afasta dos princípios norteadores das ações das Universidades Públicas, por abrir espaço ao interesse de poucos e contrariar a norma vigente para a fixação dos currículos dos cursos oferecidos pela UFS, isso porque, embora a requerida possua autonomia para a criação, organização e extinção de cursos (art. 53 , I , da Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB), o mesmo não acontece com a fixação dos currículos destes, que encontra limitação nas diretrizes curriculares fixadas pelo Conselho Nacional de Educação (Lei nº 9.131 /95, art. , § 2º , “c”), fundamentado nos arts. , VII , e 53 , II , da Lei nº 9.394 /96.

    Afirma que o procedimento operacional do PROQUERA, contido no Projeto anexado à peça pórtica, em seu item 6.2, indica que as aulas serão ministradas tão-somente durante 2 (dois) meses por semestre, violando a norma contida no art. 47 da Lei nº 9.394 /96, que prevê a duração do ano letivo regular de 200 (duzentos) dias de efetivo trabalho acadêmico, no mínimo.

    Sustenta que não prospera a alegação segundo a qual o curso será ministrado nos moldes do Programa de Qualificação Docente – PQD, uma vez que este foi destinado aos profissionais já atuantes no ensino e que, por força da exigência contida no art. 62 da Lei nº 9.394 /96, deveriam ser qualificados, contando, para tanto, com a coordenação do MEC e das Secretarias de Estado da Educação de todos os Estados da Federação.

    Enfatiza que, apesar de ser legítima a causa defendida pelo MST, no pertinente à criação de condições para o fortalecimento da educação nos assentamentos da Reforma Agrária, o curso ora contestado, observando-se os objetivos específicos do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária - PRONERA, deveria ser desenvolvido e oferecido na modalidade de “Formação Técnico-Profissional”, cujos aprovados receberiam Certificados de Técnico em Agronomia, com validade em todo o território nacional.

    Requer o seguinte:

    “a) Concessão de mandado liminar, ‘INAUDITA ALTERA PARS’, no sentido de que seja sustada a realização do Concurso Vestibular Especial no dia 25. 01 .2004, domingo próximo, conforme previsto no Edital nº 01/2004, em anexo, tudo de conformidade com as razões alhures declinadas. Na eventual hipótese de realização do certame , que seja determinada a suspensão do início do Curso – 610 Engenharia Agrônoma Especial;

    b) Requer a citação da Requerida, através de seu representante legal, no endereço já nominado nesta peça, para, querendo, responder aos termos da presente demanda, no prazo de lei, sob pena de confissão e revelia;

    c) Seja determinado à Requerida que promova a juntada dos documentos: 1 – De aprovação do Curso de Engenharia Agronômica Especial pelo Conselho Universitário – CONSU, realizada no dia 24.10.2003, inclusive com os votos dos membros discordantes; 2 – Projeto do Curso; 3 – Documento de aprovação do Curso pelo PRONERA; e, 4 – Documentação relativa ao Convênio firmado com a Superintendência Regional do INCRA;

    d) A intimação do ilustre representante do MPF para acompanhar o feito em todos os seus termos;

    e) Ao final requer seja confirmada a liminar concedida, determinando-se, via de conseqüência, a extinção do Curso – 610 – de Graduação em Engenharia Agronômica Especial, da forma como concebido;

    f) Condenação da Requerida, ainda, ao pagamento das custas processuais totais, honorários advocatícios a serem arbitrados por Vossa Excelência, e demais cominações legais e de estilo.”

    Junta a procuração e os documentos de fls. 10/80.

    A Universidade Federal de Sergipe prestou informações, em virtude do previsto no art. da Lei nº 8.437 /92, nas fls. 118/126, argüindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva para figurar no feito, por entender que a ação deveria ter sido endereçada à União, já que o órgão competente para suspender e desativar curso superior é o Ministério da Educação, nos moldes do art. 22 , XXIV , da Constituição Federal e do art. 36 do Decreto 3.860 /2001.

    No mérito, defende que o PROQUERA foi aprovado pela Resolução nº 09 /2003 do seu Conselho Universitário, com o objetivo de oferecer ao homem do campo, sobretudo ao público ligado à reforma agrária, em caráter especial, acesso à educação formal, ofertando-se uma turma única de 60 (sessenta) vagas.

    Noticia que tal providência se constitui em política de ação afirmativa e, por isso, foram adotadas algumas medidas diferenciadas em relação ao curso regular de engenharia agronômica, consubstanciada: a) no direcionamento do curso para o filho de beneficiário de reforma agrária em assentamentos do nordeste, desde que tenha declaração do INCRA em Sergipe informando tal condição, conforme convênio celebrado entre a UFS, o INCRA e a FAPESE; b) a realização de um concurso vestibular especial; e c) os períodos letivos serão ministrados de forma intensiva.

    Garante que não há violação ao princípio da isonomia insculpido nos arts. , IV , e 206 , I , da Constituição Federal , haja vista a isonomia reclamar tratamento diferente para situações distintas, não sendo juridicamente possível a equiparação do homem do campo, em decorrência da dificuldade do seu acesso à educação formal, aos estudantes em geral.

    Sustenta que o art. 47 da LDB não pode ser interpretado literalmente, sob pena de inviabilização dos cursos especiais ofertadas pelas universidades, ressaltando que oferece cursos de extensão que não utilizam os 200 (duzentos) dias de efetivo trabalho e nem por isso são considerados irregulares.

    Assevera que o currículo no curso de Engenharia Agronômica Especial é idêntico ao regular, salvo pela ausência da disciplina Educação Física I na grade do curso especial.

    Pleiteia a citação da União Federal, do INCRA e da FAPESE para funcionarem no feito, na qualidade de litisconsortes passivos necessários, bem como o indeferimento da liminar.

    Junta os documentos de fls. 127/224.

    Nas fls. 226/248, foi proferida decisão, suspendendo o início do Curso 610 – Engenharia Agronômica Especial, até ulterior deliberação, ocasião também em que foi rejeitada a preliminar suscitada pela ré e admitido o litisconsórcio passivo da FAPESE e do INCRA.

    A UFS, nas fls. 262/263, informa que interpôs agravo de instrumento contra a decisão de fls. 226/248, juntando cópia da petição inicial do recurso nas fls. 266/276.

    A FAPESE apresentou contestação nas fls. 277/299, alardeando que o Curso Especial de Agronomia, objeto desta lide, visa cumprir o papel social da universidade, amenizando as dificuldades dos jovens e adultos assentados de chegarem ao ensino superior, salientando que o vestibular especial se justifica na necessidade de diminuir o abismo, do ponto de vista educacional, existente entre eles e os outros estudantes.

    Pontua que, consoante o art. , e seu § 2º , da LDB , a educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social, finalidade que se amolda, perfeitamente, ao caso dos beneficiários do curso superior aqui contestado, pois ostentam larga experiência no campo.

    Reforça que um dos objetivos finais mais importantes do Curso Especial “é a concretização da Reforma Agrária em sua integralidade, compreendendo-a como um conjunto de ações e como um instrumento para se alcançar a ideal erradicação das desigualdades sociais, a minoração das injustiças, gerando maiores possibilidades de trabalho, aumentando a produtividade e integrando o indivíduo ao seio da sociedade”; e que, por esse motivo, o Plano de Trabalho do Curso preceitua, no item 10.5, que o estudante concludente do curso especial em Engenharia Agronômica deverá permanecer vinculado ao assentamento rural por um período mínimo de quatro anos e meio.

    Pondera que o Curso Especial não necessita das duzentas horas-aulas, no mínimo, exigidas pelo art. 47 da LDB , porquanto os jovens e adultos assentados já o iniciam vivenciando, na prática, um verdadeiro estágio.

    Assegura que o PRONERA tem por objetivo desencadear um amplo processo de promoção da educação, em todos os níveis, nos Projetos de Assentamento da Reforma Agrária, e, por ser apenas um programa, não tem capacidade para exercer direitos e contrair obrigações, cabendo ao INCRA e à FAPESE a implementação do Curso Especial, espancando-se qualquer dúvida acerca da legalidade deste.

    Pugna pela rejeição dos pedidos autorais.

    Nas fls. 429/436, o INCRA acostou sua contestação, argüindo, em preliminar, a inadequação da ação civil pública para veicular as pretensões autorais, uma vez que estas não tratam das matérias elencadas no art. da Lei nº 7.347 /85.

    No mérito, garante que o Curso Especial não prejudica os candidatos ao Curso Regular de Engenharia Agronômica, pois foram criadas 60 (sessenta) vagas especificamente para abarcar os alunos daquele; que o vestibular aplicado pela Universidade Federal de Sergipe, aos candidatos dos projetos de reforma agrária, está completamente dentro dos limites estabelecidos no art. 44 da Lei nº 9.394 /96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação); que a Portaria/MEC/nº 391 , de 07.02.2002, e o Parecer nº 98 /99, do Conselho Nacional de Educação, aprovado em 06.07.1999 determinam que a única prova obrigatória nos vestibulares das instituições públicas e privadas do ensino superior é a de redação; que, conforme parecer expedido pela Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal de Sergipe – UFS, o curso de Agronomia oferecido aos trabalhadores rurais tem carga horária idêntica ao do curso regular, e que há o oferecimento de atividades acadêmicas que totalizam ou ultrapassam o período mínimo estabelecido no art. 47 da Lei nº 9.394 /96; que a importância do curso superior para estes trabalhadores reflete diretamente na economia dos projetos de assentamento; e, por fim, que o curso especial é exatamente igual ao oferecido regularmente pela UFS e adota a Pedagogia da Alternância, na qual é privilegiada a situação e os conhecimentos dos alunos.

    Requer a improcedência dos pedidos, caso ultrapassada a preliminar suscitada.

    Nas fls. 486/496, a Universidade Federal de Sergipe apresenta contestação, ratificando, em suma, os argumentos de mérito declinados na peça de fls. 118/126.

    Na fl. 594, foi acostada cópia do acórdão proferido nos autos do AGTR nº 54.359-SE, interposto pela Universidade Federal de Sergipe, conferindo efeito suspensivo à decisão de fls. 226/248.

    A autora se manifesta sobre as contestações dos demandados nas fls. 607/616, ratificando todos os argumentos da peça pórtica.

    O Ministério Público Federal exara seu Parecer nas fls. 647, pronunciando-se pela rejeição da preliminar de inadequação da ação civil pública para viabilizar a pretensão autoral, sustentando que se trata de direito coletivo dos engenheiros agrônomos, e, no mérito, pela improcedência da pretensão autoral.

    Nas fls. 661/663, há decisão acolhendo o pedido de assistência formulado por ALDO ANDRADE BEZERRA E OUTROS (29).

    Vieram-me os autos conclusos para prolação de sentença.

    É O RELATÓRIO.

    PASSO A DECIDIR.

    Em preliminar, o INCRA suscitou a inadequação da via eleita, por entender que a pretensão autoral não se insere nas matérias elencadas no art. da Lei nº 7.347 /85. Não vejo razão legal para acatar tal alegação.

    Preceitua o art. da Lei nº 7.347 /85:

    Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (Redação dada pela Lei nº 8.884 , de 11.6.1994)

    l - ao meio-ambiente;

    ll - ao consumidor;

    III – à ordem urbanística;

    IV – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; (Renumerado do Inciso III, pela Lei nº 10.257 , de 10.7.2001)

    V - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.

    VI - por infração da ordem econômica.

    Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados.

    O assunto tratado nestes autos versa sobre direito coletivo, por abranger questões atinentes a toda a categoria dos engenheiros agrônomos, como salientado pelo Ministério Público Federal, em seu douto Parecer. Ademais, há interesse coletivo dos candidatos a ingresso na UFS através de Concurso Vestibular e dos próprios beneficiários dos assentamentos de trabalhadores rurais “Sem Terra”, tudo convergindo para a viabilidade processual da demanda por via da ação civil pública, nos termos do art. , V , da Lei nº 7.347 /85.

    Rejeito a preliminar aventada, passando ao exame meritório.

    A política de ações afirmativas, como bem lembrou o Ministério Público Federal, é hoje uma realidade disseminada por todo o corpo da Constituição Federal , transmudada em direitos fundamentais do indivíduo, a exemplo do art. 5º , XLVIII , LXXIV , LXXVI , e do art. 7º , XVIII , XIX , da Lei Magna. Ela visa, precipuamente, cumprir os princípios da isonomia e da dignidade da pessoa humana, insculpidos nos arts. 5º , 1º , III , da Lei Suprema.

    Diante desse contexto, foi criado o PRONERA, por via da Portaria nº 10 , de 16 de abril de 1998, expedida pelo Ministro de Estado Extraordinário de Política Fundiária, em decorrência da autorização dada pelo art. 87 da Carta Magna , com escopo de fortalecer a educação nos Assentamentos de Reforma Agrária.

    No rastro da aludida Portaria e da sua autonomia didático-científica e administrativa, esta última conferida pelo art. 207 da Constituição Federal , o Conselho Universitário da UFS expediu a Resolução nº 09 /2003/CONSU e criou o PROQUERA, firmando convênio com a FAPESE e o INCRA para a implementação do Curso Especial de Engenharia Agronômica – 610, destinado aos jovens e adultos não graduados em nível superior vinculados a Assentamentos de Reforma Agrária do Nordeste. De acordo com os arts. 3º , I e II , e 4º da referida Resolução:

    “O PROQUERA será destinado aos jovens e adultos não graduados em nível superior vinculados a Assentamentos de Reforma Agrária do Nordeste e que apresentem no ato da inscrição para o Concurso Vestibular Especial:

    - certificado de concluso do ensino médio ou de curso equivalente;

    - declaração da Superintendência do INCRA em Sergipe informando que o candidato é beneficiário ou filho de beneficiário da Reforma Agrária em Assentamentos no Nordeste.

    Do Concurso Vestibular Especial constarão apenas duas provas, ambas classificatórias, Redação e Conhecimentos Gerais, com peso 3 (três) e 7 (sete) respectivamente, não podendo , o candidato, zerar quaisquer das provas, sob pena de eliminação do processo.”

    Sob outro ângulo, a legislação que cuida do Ensino Superior no Brasil dispõe: Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB (Lei nº 9.394 /1996):

    “A educação superior abrangerá os seguintes cursos e programas:

    - de graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e tenham sido classificados em processo seletivo;

    Na educação superior, o ano letivo regular, independente do ano civil, tem, no mínimo, duzentos dias de trabalho acadêmico efetivo, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver.”

    Portaria nº 391 , de 07 de fevereiro de 2002, do Ministro de Estado da Educação:

    “Art. Os processos seletivos para ingresso nas Instituições Públicas e Privadas pertencentes ao Sistema de Ensino Superior, a que se refere o Inciso II do art. 44 da Lei de Diretrizes e Bases da Educacao Nacional , deverão seguir as determinações do Parecer nº 98 /99, de 6 de julho de 1999, do Conselho Nacional de Educação e as disposições da presente Portaria.

    Art. 2º Todos os processos seletivos que se refere o artigo anterior incluirão necessariamente uma prova de redação em língua portuguesa, de caráter eliminatório, segundo normas explicitadas no edital de convocação do processo seletivo.

    Art. 3º Somente serão aceitas inscrições nos processos seletivos, a que se refere o artigo 2º, de candidatos que estejam cursando o Ensino Médio ou que possuam o Certificado de Conclusão deste nível de ensino, obtido pela via regular ou da suplência.”

    Do confronto dos dispositivos legais acima transcritos, entendo haver legalidade na criação do Curso Superior Especial em Engenharia Agronômica, ora examinado. A uma, porque ele, ao contrário do que afirma o autor, procura dar uma maior efetividade ao princípio da isonomia, por objetivar diminuir o fosso existente entre os estudantes vinculados a assentamento destinados à Reforma Agrária, visivelmente menos favorecidos pela política educacional de base e pelo contexto social, e outros estudantes que têm acesso aos cursos preparatórios para vestibulares, habilitando-se a disputar, em melhores condições, as vagas ofertadas regulamente pela Universidade Pública. A duas, porque o PROQUERA obedeceu à legislação prevista para o Ensino Superior, na medida em que esta apenas exige, para o acesso aos cursos de graduação, a conclusão do ensino médio e a classificação em processo de seleção que aplique prova de redação obrigatória em língua portuguesa. A três, porque a carga horária de duzentos dias por semestre se refere a trabalho acadêmico, abrangendo também tarefas executadas fora da sala de aula, requisito facilmente preenchido pelos beneficiários do curso, haja vista terem uma vasta experiência de vida no campo, A quatro, porque o curso especial tem aptidão para tornar ainda mais sólida a proposta da Reforma Agrária no Brasil, ao aliar a experiência do homem do campo ao conhecimento científico, assegurando-lhes a plena vivência do princípio da dignidade humana e do primado do trabalho. A cinco, porque a formação acadêmica do homem do campo, nos moldes do questionado curso, terá um efeito multiplicador e eficaz, pois os futuros Engenheiros Agrônomos terão a oportunidade de disseminar seus conhecimentos e técnicas junto àqueles que laboram no campo, orientando-os na otimização dos recursos públicos investidos na Reforma Agrária, bem assim viabilizando o emprego de recursos privados.

    A matéria foi objeto de exame pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, ao julgar o Agravo de Instrumento nº 54359/SE, cujo Relator foi o eminente Desembargador Federal Marcelo Navarro e teve lavrada a seguinte ementa:

    “EMENTA: ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEDIDA LIMINAR. ENSINO SUPERIOR. CURSO ESPECIAL DE ENGENHARIA AGRONÔMICA DIRIGIDO AOS BENEFICIÁRIOS OU FILHOS DE BENEFICIÁRIOS DA REFORMA AGRÁRIA EM ASSENTAMENTOS DO NORDESTE. CONVÊNIO DO INCRA, FAPESE E UFS. LEI Nº 9.394 /96.

    - A Universidade Federal de Sergipe, no gozo de sua autonomia didático-científica e administrativa, dada pela norma constitucional, em conjunto com a FAPESE, firmou convênio com o INCRA/PRONERA para implementação do Curso Especial de Engenharia Agronômica – 610, o qual revela-se um instrumento de inclusão social que garante ao homem do campo, vinculado aos assentamentos de reforma agrária do Nordeste, o acesso ao ensino superior ou de 3º Grau.

    - A Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei nº 9.394 /96 – exige para o acesso aos cursos de graduação a conclusão do ensino médio e a classificação em processo de seleção, o que teria sido cumprido pela Universidade Federal de Sergipe na realização do Curso Especial de Engenharia Agronômica.

    - A carga horária de 200 dias por semestre, prevista para o aludido curso, refere-se a trabalho acadêmico, pelo que poderia parte dela ser executada fora da sala de aula.

    - A exigência de prova de redação em língua portuguesa, na referida seleção especial, satisfaz, em princípio, as normas expedidas pelo MEC.

    - Agravo provido.”

    Ex positis, julgo improcedente o pedido da autora, condenando-a no pagamento das custas processuais.

    Condeno-a, também, no pagamento de honorários advocatícios no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil , a ser rateado equitativamente, em favor dos réus.

    Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

    Aracaju, 05 de dezembro de 2006.

    Juiz Edmilson da Silva Pimenta"

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