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29 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça STJ - HABEAS CORPUS: HC XXXXX RJ XXXX/XXXXX-8

Superior Tribunal de Justiça
há 4 anos

Detalhes

Processo

Publicação

Relator

Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR

Documentos anexos

Decisão MonocráticaSTJ_HC_606592_5a88d.pdf
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Decisão

HABEAS CORPUS Nº 606592 - RJ (2020/XXXXX-8) RELATOR : MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR IMPETRANTE : JOAO PEDRO COUTINHO BARRETO ADVOGADO : JOÃO PEDRO COUTINHO BARRETO - RJ210903 IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO PACIENTE : FABIO PAULA CAMANHO (PRESO) CORRÉU : ADILSON MENEZES DOS SANTOS CORRÉU : RODRIGO PADILHA DE SOUZA CORRÉU : ANDRE LUIZ MENEZES DOS SANTOS CORRÉU : LUIZ CLAUDIO TEIXEIRA MADALENA JUNIOR INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO DECISÃO Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em benefício de Fábio Paula Camanho, apontando-se como autoridade coatora o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que denegou o HC n. XXXXX-02.2020.8.19.0000. Consta dos autos que o paciente foi denunciado, com outros corréus, pela suposta prática dos crimes tipificados no art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal; e art. , §§ 2º e , da Lei n. 12.850/2013 (Processo n. XXXXX-55.2020.8.19.0001, em curso na 1ª Vara Criminal do Rio de Janeiro/RJ). Eis a natureza da imputação (fls. 112/115): [...] I ? DO CRIME DE HOMICÍDIO Em horário que não se pode precisar, mas com certeza entre 14h do dia 27 e 10h40min do dia 28 de junho de 2019, e em local que também não se pode precisar, mas com certeza entre a Travessa Pastor, nº 2, Brás de Pina, e a Rua Antônio João, nº 1.004, Cordovil, nesta comarca, os denunciados ADILSON MENEZES DOS SANTOS, vulgo "Magrão", e RODRIGO PADILHA DE SOUZA, vulgo "Cacau", com vontade livre e consciente de matar, em comunhão de desígnios e ações com terceiros ainda não identificados, efetuaram disparos de arma de fogo contra a vítima LUCAS GABRIEL LEITE DA SILVA, provocando-lhe as lesões corporais descritas no Laudo de Exame de Corpo de Delito de Necropsia de fls. 35/37, que por sua natureza, sede e gravidade, foram a causa eficiente de sua morte. Conforme restou apurado, em comunhão de desígnios com os DOIS PRIMEIROS denunciados, os denunciados FÁBIO PAULA CAMANHO, vulgo "Taca Bala", e ANDRE LUIZ MENEZES DOS SANTOS, vulgo "Morte Certa", na condição de líderes da organização criminosa que atua na comunidade Quitungo, de forma livre e consciente, concorreram eficazmente para o crime de homicídio acima descrito, na medida em que determinaram a conduta dos executores, ordenando matar a vítima. Consta integrante do da incluso facção procedimento que a vítima foi criminosa "Comando Vermelho" que atuava na comunidade do juramento e, segundo apurado nas investigações, foi detido no 12 de junho de 2019, por Policiais Militares (ainda não identificados) ligados à organização criminosa dos denunciados, oportunidade em que, após acessaram o seu telefone celular e observarem fotos dele portando fuzis do tráfico, passaram a ameaçá-lo de morte. No dia 27 de junho de 2019, por volta das 14h, os denunciados ADILSON MENEZES DOS SANTOS e RODRIGO PADILHA DE SOUZA e seus comparsas foram até a Lan House situada na Travessa Pastor, nº 2, Brás de Pina, nesta cidade, e capturaram a vítima, levando-a para local incerto e não sabido, onde vieram a efetuar três disparos de armas de fogo em sua cabeça, além de outros dois em outras regiões de seu corpo. O crime foi perpetrado por motivo torpe, eis praticado em razão da disputa existente entre a milícia privada constituída pelos denunciados, que atua na comunidade Quitungo, e a facção criminosa ("Comando Vermelho") que domina o tráfico de drogas no Complexo da Penha. O crime foi, ainda, cometido mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido, tendo em vista que a vítima foi surpreendida pela presença numérica e armada dos DOIS PRIMEIROS denunciados e de seus comparsas (ainda não identificados), que a levaram para local ermo e efetuaram disparos de arma de fogo, sem qualquer chance de defesa. II ? DO CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA Durante período que não se pode precisar, mas com certeza até 28 de junho de 2019, os denunciados, com vontade livre e consciente, constituíram entre si e integraram com os outros indivíduos não identificados, de modo estruturalmente ordenado e com divisão de tarefas, organização criminosa que atua na comunidade Quitungo, no bairro Brás de Pina, nesta comarca, voltada para a prática reiterada de diversos crimes, cujas penas máximas são superiores a 4 (quatro) anos. Conforme restou apurado, a comunidade Quitungo é dominada por organização criminosa popularmente conhecida por "milícia", que atua na região há muitos anos, explorando de forma irregular o fornecimento de canais de televisão por assinatura ("gatonet"), a cobrança de pontos de moto-táxis, o monopólio de venda de gás, o empréstimo de valores a juros exorbitantes, entre outras atividades, tudo através do império da força e da violência, praticando ameaças e, até mesmo, homicídios contra as pessoas que se recusam a obedecê-los. Com base nas investigações perpetradas, pode-se identificar que a estrutura da "milícia" na localidade se dava da seguinte forma: O denunciado FÁBIO PAULA CAMANHO, vulgo "Taca Bala", após a prisão do líder histórico da organização criminosa, "Marquinhos Tiroteio", assumiu o seu posto, sendo, no período dos fatos, a liderança maior na comunidade. Os denunciados ADILSON MENEZES DOS SANTOS, vulgo "Magrão", e ANDRE LUIZ MENEZES DOS SANTOS, vulgo "Morte Certa", ambos também conhecidos como "IRMÃOS MENEZES", são Policiais Militares inativos e, juntamente, com Fábio Paula Camanho, exercem a Iiderança na comunidade, determinando as atuações dos demais integrantes, após decisões adotadas previamente entre eles. Por fim, os denunciados RODRIGO PADILHA DE SOUZA, vulgo "Cacau", e LUIZ CLAUDIO TEIXEIRA MADALENA JUNIOR figuram como o "braço armado" da organização criminosa, exercendo as ordens definidas pela liderança, juntamente com os demais integrantes não identificados. Assim agindo, estão os denunciados incursos nas seguintes penas: Os denunciados FÁBIO PAULA CAMANHO, vulgo "TACA BALA", e ANDRE LUIZ MENEZES DOS SANTOS, vulgo "MORTE CERTA", estão incursos nas penas dos artigos 121, § 2º, incisos I e IV, n/f do art. 29, ambos do Código Penal; e 2º, .§.¢ 2º e 3º, da Lei 12.850/13; na forma do art. 69 do Código Penal; O denunciado ADILSON MENEZES DOS SANTOS, vulgo "MAGRÃO", está incurso nas penas dos artigos 121, . 42º, incisos I e IV, do Código Penal; e 2º, §§ 2º e 3º, da Lei 12.850/13; na forma do art. 69 do Código Penal; O denunciado RODRIGO PADILHA DE SOUZA, vulgo "CACAU", está incurso nas penas dos artigos 121, 9 - , incisos I e IV, do Código Penal; e 2, § - 2º, da Lei 12.850/13; na forma do art. 69 do Código Penal; O denunciado LUIZ CLAUDIO TEIXEIRA MADALENA JUNIOR, está incurso na pena do artigo , § 2º, da Lei 12.850/13. [...] Ao receber a denúncia, o Magistrado acolheu a representação ministerial e decretou a prisão preventiva do paciente, aos seguintes fundamentos (fls. 118/120 - grifo nosso): [...] Certo é que a segregação cautelar somente se justifica quando presentes os requisitos do art. 312 e nas hipóteses previstas nos incisos I, II, III e parágrafo único do artigo 313, ambos do CPP. Nesse sentido, o que deve nortear a aplicação de tais medidas cautelares é o binômio necessidade (art. 282, I, CPP) e adequação (art. 282, II, CPP): "necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou instrução criminal (...) e adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado". Com base em cognição superficial, verifica-se que a materialidade e os indícios de autoria da prática de crime doloso contra a vida encontram-se consubstanciados no lastro probatório mínimo produzido através do Inquérito Policial que instruiu a denúncia, mormente os termos de declaração de fls. 31/32, 33/34, 60/62, laudo de exame de necropsia de fls. 35/36 e esquema de lesões de fl. 37, auto de reconhecimento de objeto de fls. 49/50. Assim, presente o fumus comissi delicti, passa-se à análise do periculum libertatis, conforme art. 312 do CPP. A garantia da ordem pública, um dos pressupostos ensejadores da prisão preventiva, indica que a custódia cautelar é necessária para afastar os acusados do convívio social em razão da periculosidade evidenciada pelas próprias circunstâncias do fato. Consta nos autos que, no dia 28/06/2019, o corpo da vitima Lucas Gabriel Leite da Silva foi encontrado dentro de um valão, na Rua Antônio João, altura do nº 1004, Cordovil, Rio de Janeiro, sendo o corpo reconhecido pela irmã da vítima, Adriely Cristina Leite da Silva, que chegou ao local. De acordo as declarações prestadas pela mãe da vítima, Andreia Leite da Silva, (termo de declaração de fls. 60/62), a vitima não pertencia a nenhuma organização criminosa, embora tenha resolvido entrar para o tráfico de drogas do Juramento, duas semanas antes de ser executado, em razão de se sentir revoltado por ter sido considerado inapto para servir as Forças Armadas. Relatou que a atuação no tráfico de drogas não durou muito tempo, mas, durante o período que esteve junto aos traficantes da localidade, a vítima teria sido abordada por policiais da UPP/FÉ/SERENO, detido, levado à 27º DP e, após, liberado, sendo ameaçado pelos policiais que teriam dito: "SE VOCÊ NÃO MORRE NO QUITUNGO, VOCÊ VAI MORRER DENTRO DE CASA, PORQUE A GENTE SABE ONDE VOCÊ MORA E VAMOS TIRAR VOCÊ DE DENTRO DE CASA E TE MATAR". Acrescentou que a vítima, após sair da Delegacia, informou aos traficantes que os policiais haviam pego o seu celular teriam feito várias ligações. Disse que teria conversado com seu filho para que ele não frequentasse mais a localidade do Quitungo porque os mesmos policiais que o haviam detido, trabalhavam para os milicianos atuantes naquela área. Informou que, após a morte de seu filho, obteve informações por moradores do Quitungo que os milicianos haviam executado seu filho. Soube que os milicianos conhecidos como "IRMÃOS MENEZES" teriam organizado e ordenado a execução da vitima, sendo os executores os milicianos "ANDREZINHO BAIÃO", "JAIME" e "CACAU". Alegou que, atualmente, reside em outro endereço com medo de sofrer represálias. No mesmo sentido foram as declarações de Suellen Cristina Leite Santos Silva (termo de declaração de fls.31/33 33/34), irmã da vitima, em relação ao fato da vitima ter ficado pouco tempo no tráfico do Juramento, facção criminosa do Comando Vermelho, por ter sido considerado inapto o para o Exército, e que teria sido abordado por policiais e que estava sofrendo ameaças de policiais da UPP/Penha/Sereno. Soube que seu irmão foi alvejado por disparos de arma de fogo por vários indivíduos, que estavam em um veículo de cor branca, marca Renault Logan, sendo comentado que a vitima teria sido retirada de uma Lan House que fica na Comunidade do Quitungo. Com efeito, a dinâmica da conduta imputada aos réus é extremamente grave, eis que, conforme consta dos autos, os "Irmãos Menezes", Adilson Menezes dos Santos e André Luiz Menezes, ambos 3º Sargentos da PMERJ, inativos, orquestraram a execução da vítima Lucas Gabriel Leite da Silva, sendo os executores Rodrigo Padilha de Souza, Andrezinho Baião e Jaime Luciano, que transitam pela localidade do Quitungo, portando a armas de fogo, extorquindo moradores e comerciantes. De acordo com as informações apuradas sobre a investigação (fls. 101/103), existe uma milicia na localidade do Quitungo, sendo o acusado Fabio Paula Macanho, vulgo "Taca Bala", apontado como um dos chefes da referida Milícia. Conforme relatado, o acusado Fabio teria se unido aos Irmãos Menezes e a Rodrigo Padilha de Souza, vulgo "Cacau", formando assim a Milícia atuante na Comunidade do Quitungo. Extrai-se dos autos que, investigando a estrutura organizacional da Milícia do Quitongo, foi apurado que Rodrigo Padilha de Souza, vulgo "Cacau", Jaime Luciano e Luiz Claudio Teixeira Madalena Junior exercem a função de arrecadação de valores extorquidos das vítimas. Registre-se, ainda, que constam informações que a Comunidade do Quitungo vem sofrendo uma intensa disputa de território entre Milícia do Quitungo e o Tráfico de Drogas da facção Comando Vermelho dos morros da Fé e do Sereno. Assim, a custódia se faz necessária para prevenir novas investidas criminosas, bem como para se evitar sentimento de intranquilidade coletiva. Com efeito, são imputados aos réus fatos de extrema gravidade e de alta periculosidade para a sociedade e, nesse sentido, a prisão cautelar se impõe como forma de se assegurar a ordem pública. A medida também se justifica por conveniência da instrução criminal. A prova deve ser produzida em sede judicial, sob o crivo do contraditório, de forma isenta de influências externas, sendo certo que a liberdade dos réus poderia acuar testemunhas, possivelmente parentes e vizinhos da vitima, que se sentiriam desencorajadas a revelar o que sabem em juízo. Sendo assim, certamente a liberdade dos réus obstaria a realização da instrução criminal de forma lisa, equilibrada e influenciaria na colheita de provas. Ressalte-se que, conforme declaração da mãe da vitima, ela passou a residir em outro endereço por temer represálias. Por fim, a medida cautelar se apresenta ainda como assecuratória da futura aplicação da lei penal, devendo ser considerado que os acusados como integrantes de uma organização criminosa, sendo razoável se presumir que não se submeterão a aplicação da lei penal. Assim, constata-se que a substituição da prisão preventiva por outras medidas cautelares listadas no art. 319 do Código de Processo Penal não atenderia as finalidades da lei, sendo a medida extrema a única adequada, a fim de assegurar a instrução bem como para se evitar a reiteração destes tipos de delitos na sociedade. [...] A decisão foi mantida na análise do pedido de revogação da prisão, indeferido pelo Magistrado, aos seguintes fundamentos (fls. 176/177): [...] Com efeito, os fatos são graves, uma vez que, conforme constante dos autos, o acusado Fábio seria um dos líderes da milícia na localidade do Quitungo, tendo determinado a execução da vítima juntamente com André Luiz Menezes, de acordo com os fatos narrados na denúncia. Registre-se, ainda, que mãe da vítima declarou que precisou mudar de residência por medo de sofrer represálias, não havendo outra medida cautelar que possa garantir sua integridade física. Assim, constata-se a insuficiência de imposição de medidas cautelares alternativas à segregação da liberdade do denunciado, que não atenderiam as finalidades da lei, sendo a medida extrema a única adequada, a fim de assegurar a ordem pública, evitando-se a reiteração destes tipos de delitos na sociedade. Ressalta-se que a Defesa não logrou trazer nenhum dado efetivamente consistente capaz de modificar os fundamentos explicitados na decisão que decretou a prisão preventiva do réu, às fls. 178/182. Nesse sentido, reitero os fundamentos da referida decisão para manter a prisão do réu. Frise-se que é indispensável que a prova seja produzida em sede judicial, sob o crivo do contraditório, de forma isenta de influências externa para garantia da instrução criminal. No que tange à alegação de ser primário e de bons antecedentes, tais alegações não impedem, por si sós, a decretação da custódia cautelar, notadamente quando presentes os requisitos para sua imposição, como restou demonstrado, ressaltando-se que o acusado ostenta anotações no relatório de vida pregressa, estando, inclusive, em monitoramento eletrônico. Em relação a alegação de que o acusado não poderia ter participado da empreitada criminosa por estar portando a tornozeleira eletrônica, verifica-se da denúncia que os executores apontados são os acusados Rodrigo Padilha de Souza, Andrezinho Baião e Jaime Luciano, sendo o requerente descrito como mandante. Por fim, em relação ao pedido de substituição da prisão preventiva pela domiciliar previsto no artigo 318 do CPP, verifica-se que o próprio acusado informa que reside com sua esposa e sua filha menor, não sendo o mesmo o único responsável por seus cuidados. Ademais, conforme decisão proferida nos autos do Habeas Corpus Coletivo nº 143.641/SP foram excetuadas algumas hipóteses de cabimento do artigo 318 do CPP, dentre as quais, os casos de crimes praticados por mulheres mães de menores mediante violência ou grave ameaça, razão pela qual indefiro o pedido por analogia. [...] Inconformada, a defesa impetrou habeas corpus no Tribunal de Justiça local, que denegou a ordem, nos termos do acórdão assim ementado (fls. 70/72): HABEAS CORPUS ? PENAL ? PROCESSO PENAL ? ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ? HOMICÍDIO QUALIFICADO ? PRISÃO PREVENTIVA ? EXAME DA PROVA ? VIA ELEITA IMPRÓPRIA ? GRAVIDADE EM CONCRETO ? POSSIBILIDADE ? PACIENTE CONDENADO PROVISORIAMENTE POR OUTRO FATO ? PRISÃO DOMICILIAR ? NECESSIDADE DA MEDIDA EXTREMA NO CASO CONCRETO ? PANDEMIA - AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL ? ORDEM DENEGADA A via estreita do habeas não é a própria para o enfrentamento da prova, o que deve ocorrer no curso da instrução, quando presente o contraditório, apenas se exigindo para a deflagração da ação penal respectiva a prova da ocorrência de crime e indícios suficientes da autoria, certo que, no caso concreto, ao paciente é imputada a conduta de integrar associação criminosa e ser o mandante do homicídio descrito na inicial acusatória, havendo suficiente início de prova a justificar a imputação respectiva. Não se controverte acerca da excepcionalidade da prisão cautelar, aquela determinada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, que somente deve ser decretada ou mantida quando evidenciada a sua necessidade, sendo indispensável que esteja escorada em elementos concretos que ensejem a sua adoção, não satisfazendo esta exigência constitucional a simples referência à gravidade em abstrato do fato. Todavia, quando a narrativa concreta do fato indicia a periculosidade dos agentes, a prisão pode ser decretada com tal fundamento, ficando indiciado o risco para a ordem pública, mormente quando se trata de crime com pena elevada, as circunstâncias e a forma de cometimento do crime sejam particularmente conotativas de sua gravidade (periculosidade indiciada) e que exista pequena distância temporal entre o cometimento do crime e o decreto de prisão (contemporaneidade). A presença de tais circunstâncias aponta que a substituição da prisão por cautelares diversas se mostra insuficiente. No caso presente, a decisão que decretou a prisão preventiva do paciente se escorou nas circunstâncias efetivas do caso, configurando-se em concreto a periculosidade de todos os envolvidos no homicídio descrito na denúncia, mormente em razão da motivação do crime e do modus operandi, não havendo que se falar em falta de contemporaneidade, eis que o crime de homicídio imputado ocorreu em junho de 2019 e a investigação se encerrou em fevereiro de 2020, quando foi requerida a prisão preventiva. O fato de o paciente, quando da ocorrência do crime que lhe está sendo imputado, estar cumprindo pena por outra infração grave em PAD, com tornozeleira eletrônica, por si só, não impede que venha a ser decretada a prisão preventiva pelo novo fato delituoso, ficando indiciado, na verdade, que as cautelares antes a ele impostas não o inibiram de se manter envolvido em outros fatos criminosos, sem esquecer que a denúncia o aponta como mandante do crime e líder da organização criminosa envolvida, sendo irrelevante o fato de ele estar com tornozeleira eletrônica que não detectou sua saída do local no qual deveria permanecer no cumprimento da anterior medida alternativa. Ainda irresignada, a defesa impetrou o presente writ, no qual reiterou a tese de inidoneidade dos fundamentos do decreto de prisão, bem como de possibilidade de substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar ou cautelares diversas, inclusive em razão pandemia do novo coronavírus. Pugnou, assim, em liminar, pela substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, inclusive humanitária; no mérito, pela revogação da prisão e, subsidiariamente, pela substituição da prisão por cautelares diversas. Antes de decidir o pedido liminar, requisitei ao Juízo processante informações acerca do estabelecimento prisional e sobre o estado de saúde do paciente (fl. 270). Em petição subsequente, a defesa do paciente pugnou pela análise do pedido liminar e concessão do pleito, independentemente da juntada das informações requisitadas (fls. 273/279). É o relatório. Na Petição n. 597.023/2020, a defesa do paciente suscitou uma suposta mora na prestação das informações requisitadas (fl. 275): [...] 9. Ora, D. Ministro Relator, conforme se pode observar, a D. Autoridade Coatora simplesmente não responde as informações solicitadas por Vossa Excelência, utilizando o argumento de que o Cartório se encontra em regime de "home office" para justificar o atraso ou negativa nas informações solicitadas. [...] Tal argumento, no entanto, é manifestamente improcedente, pois as informações foram solicitadas ao Juízo no dia 20/8/2020, ou seja, em data recente, dependendo diretamente do estabelecimento prisional e, portanto, de procedimentos e trâmites que refogem ao controle da autoridade judiciária. Contudo, diante da insistência na análise do pleito liminar, passo ao exame do pedido, considerando exclusivamente os elementos colacionados na impetração. No que se refere ao decreto de prisão em si, não diviso ilegalidade flagrante nos fundamentos lançados - pressuposto indispensável à concessão do pleito liminar -, sobretudo considerando a gravidade concreta do crime (extraída do modus operandi), a conduta imputada ao paciente (chefe de milícia, acusado de ser mandante de crime homicídio), e a existência de outros apontamentos criminais contra o réu, expressamente referenciadas nas decisões do Juízo processante, aptas, em juízo preliminar, a justificar a prisão pela garantia da ordem pública. Quanto ao pedido de prisão domiciliar humanitária e com base na Recomendação n. 62/CNJ, também não diviso ilegalidade flagrante no indeferimento. Consoante o art. 318, VI, do CPP, o Juiz poderá substituir a prisão preventiva por domiciliar quando o agente for homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos. No caso, a instância ordinária expressamente rechaçou a existência de prova no sentido de que o paciente fosse o único responsável pelo cuidado de sua filha (fl. 78), co nvicção essa que, em princípio, não comporta rediscussão na via eleita (cognição sumária). Com relação à Recomendação n. 62/CNJ, o deferimento da benesse dependeria da análise das condições do estabelecimento prisional (lotação, existência de equipe de saúde, protocolo para a pandemia, contexto local de disseminação do vírus e o estado de saúde do paciente), pois são essas as diretrizes que norteiam a benesse na forma do art. 4º da referida resolução. Sucede que, no caso, ainda não há informações acerca do estabelecimento, tampouco sobre o estado de saúde atual do paciente, afigurando-se prudente aguardar a juntada das informações requisitadas e do parecer do Ministério Público Federal. Ante o exposto, indefiro a liminar. Aguardem-se as informações requisitadas, devendo a serventia reiterar o pedido, caso as informações não sejam prestadas no prazo de 15 dias, contados do despacho exarado à fl. 270. Com a juntada das informações, dê-se vista ao Ministério Público Federal para parecer. Publique-se. Brasília, 27 de agosto de 2020. Ministro Sebastião Reis Júnior Relator
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