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20 de Maio de 2024

STJ Out22 - Prisão Preventiva Revogada - Tipo Tráfico de Drogas - Gravidade Abstrata do Delito

ano passado

Inteiro Teor

HABEAS CORPUS Nº 775640 - GO (2022/0316509-9)

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de CARLOS CASTRO SILVA contra decisão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS que denegou a ordem no julgamento do HC n. 5539137-49.2022.8.09.0000, assim ementad o:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. NEGATIVA DE AUTORIA. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. AUSÊNCIA DE REQUISITOS. PREDICADOS PESSOAIS. PRISÃO DOMICILIAR. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. 1 - Na via estreita do Habeas Corpus não é possível discussão sobre negativa de autoria ou nulidades do inquérito, por demandar amplo exame do conjunto fático probatório, mais apropriado para a ação de conhecimento. 2 - O ingresso forçado em domicílio é legítimo quando justificado pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem ocorrer situação de flagrante delito, como ocorreu no presente caso, a priori. 3 - A existência de predicados pessoais favoráveis não garante, de forma automática, a liberdade do paciente, especialmente quando presentes os pressupostos e requisitos da prisão preventiva. 4 - Inexistente nos autos qualquer documento que permita inferir que o paciente pertence a algum grupo de risco social, tampouco comprovação de pedido de concessão de prisão domiciliar no juízo a quo, deixa-se de conhecer da tese, sob pena de indevida supressão de instância. 5 - Presentes os pressupostos e requisitos autorizadores da prisão preventiva (arts. 312 e 313 do CPP), não prospera a assertiva de constrangimento do paciente pela ilegalidade da prisão ou violação dos Princípios da Presunção de Inocência e Dignidade da Pessoa Humana. 6 - Demonstrada a necessidade da medida extrema de privação de liberdade, inviável a substituição da prisão preventiva por outra medida cautelar mais branda. Ordem parcialmente conhecida e, nesta extensão, denegada.

O paciente foi preso em flagrante no dia 2/9/2022, e convertida a custódia em preventiva, pela suposta dos crimes previstos nos artigos 33, caput, da Lei n. 11.343/2006; e art. 14 da Lei n. 10.826/2003.

Inconformada com a prisão, a defesa impetrou o habeas corpus originário, cujo ordem, como antes relatado, foi denegado (e-STJ fls. 512/521). Esta é a decisão impetrada.

Nas razões do presente mandamus (e-STJ fls. 3/92), a defesa sustenta a ilegalidade da prisão preventiva, por fundamentação inidônea (gravidade abstrata do delito), ausência dos requisitos autorizadores da medida extrema e de indicação de elementos concretos que justificassem a necessidade da medida extrema.

Aduz que o paciente desconhece a origem das drogas, que se trata de flagrante forçado, baseado em denúncia anônima e sem qualquer evidência da prática de traficância. Aduz que as provas obtidas de maneira ilícita são ilegítimas: o agente foi abordado em via pública, os policiais adentraram em sua residência mas nada de ilícito foi ali encontrado. Ressalta que não houve confissão, tampouco autorização para adentrar no domicílio do paciente.

Sustenta, ainda, a nulidade do flagrante, por violação de domicílio.

Destaca que o paciente é primário, trabalhador (construtor de imóveis), com residência fixa e sem antecedentes criminais.

Invoca a situação de pandemia pelo Covid-19 e a superlotação dos presídios brasileiros para amparar o pedido de prisão domiciliar.

Ressalta ser possível a impetração de habeas corpus preventivo, e a superação do enunciado n. 691 da Súmula do Supremo Tribunal Federal.

A defesa requer, liminarmente e no mérito, a revogação da prisão preventiva do paciente, mesmo mediante a imposição de medidas cautelares, inclusive a prisão domiciliar.

É o relatório. Decido.

As disposições previstas nos arts. 64, III, e 202, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça não afastam do relator a faculdade de decidir liminarmente, em sede de habeas corpus e de recurso em habeas corpus, a pretensão que se conforma com súmula ou a jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores ou a contraria ( AgRg no HC n. 513.993/RJ, Relator Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 25/6/2019, DJe 1º/7/2019; AgRg no HC n. 475.293/RS, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 27/11/2018, DJe 3/12/2018; AgRg no HC n. 499.838/SP, Relator Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 11/4/2019, DJe 22/4/2019; AgRg no HC n. 426.703/SP, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 18/10/2018, DJe 23/10/2018; e AgRg no RHC n. 37.622/RN, Relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 6/6/2013, DJe 14/6/2013).

Nesse diapasão, "uma vez verificado que as matérias trazidas a debate por meio do habeas corpus constituem objeto de jurisprudência consolidada neste Superior Tribunal, não há nenhum óbice a que o Relator conceda a ordem liminarmente, sobretudo ante a evidência de manifesto e grave constrangimento ilegal a que estava sendo submetido o paciente, pois a concessão liminar da ordem de habeas corpus apenas consagra a exigência de racionalização do processo decisório e de efetivação do próprio princípio constitucional da razoável duração do processo, previsto no art. , LXXVIII, da Constituição Federal, o qual foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela EC n. 45/2004 com status de princípio fundamental" ( AgRg no HC n. 268.099/SP, Relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 2/5/2013, DJe 13/5/2013).

Na verdade, a ciência posterior do Parquet, "longe de suplantar sua prerrogativa institucional, homenageia o princípio da celeridade processual e inviabiliza a tramitação de ações cujo desfecho, em princípio, já é conhecido" ( EDcl no AgRg no HC n. 324.401/SP, Relator Ministro GURGEL DE FARIA, Quinta Turma, julgado em 2/2/2016, DJe 23/2/2016).

Em suma, "para conferir maior celeridade aos habeas corpus e garantir a efetividade das decisões judiciais que versam sobre o direito de locomoção, bem como por se tratar de medida necessária para assegurar a viabilidade dos trabalhos das Turmas que compõem a Terceira Seção, a jurisprudência desta Corte admite o julgamento monocrático do writ antes da ouvida do Parquet em casos de jurisprudência pacífica" ( AgRg no HC n. 514.048/RS, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 6/8/2019, DJe 13/8/2019).

No entanto, nada impede que, de ofício, este Tribunal Superior constate a existência de ilegalidade flagrante, circunstância que ora passo a examinar.

De início, a preliminar de nulidade da prova obtida por invasão de domicílio não poderá ser analisada porque representa indevida supressão de instâncias.

O Tribunal de Justiça local enfrentou apenas a questão da ilegalidade da prisão, por invasão de domicílio. Nesse aspecto, considerou se tratar de crime permanente e a priori, reputou legítima a segregação cautelar, sem afastar a possibilidade de discussão aprofundada da questão, no decorrer da ação penal, com respeito ao princípio do contraditório e da ampla defesa.

Confira-se (e-STJ fls. 513/514):

2) Ilegalidade da prisão decorrente de violação de domicílio Afirma o impetrante que houve ilegalidade na prisão em flagrante, em razão da violação do domicílio do paciente, argumentando que a entrada dos policiais na residência não foi precedida de autorização expressa do morador ou lastreada por mandado judicial, não havendo justa causa para o ingresso forçado no imóvel, o que provoca a nulidade do flagrante e dos elementos probatórios dele decorrentes.

É sabido que o Supremo Tribunal Federal, na oportunidade do julgamento do RE n. 603.616/RO, sob a sistemática da repercussão geral (tema 280), firmou o entendimento vinculante de que "a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito".

No caso em tela, conforme consta do inquérito policial, os agentes policiais receberam denúncia anônima de que um indivíduo estaria portando uma arma de fogo dentro de um veículo, que tal pessoa pertencia a organização criminosa e que estaria praticando traficância na região.

Assim, os policiais militares iniciaram patrulhamento para averiguar os fatos.

Consta que foi realizada a abordagem do veículo, ocasião em que o paciente foi identificado como condutor. Com ele, foi supostamente encontrada a pistola apreendida.

Após entrevista com o autuado, este teria revelado a existência de maconha em sua casa. Assim, procederam com a busca domiciliar, mediante autorização expressa da esposa do paciente. Na ocasião, encontraram as porções de maconha, munições, carregadores de pistola e uma balança de precisão.

Assim, em análise provisória, vislumbra-se a existência de razões que justificaram a abordagem do suspeito e o ingresso dos policiais na residência do paciente. Entretanto, saliento que a avaliação da licitude da ação policial e dos elementos probatórios produzidos poderá ser aprofundada e melhor debatida no bojo da ação penal em andamento perante o juízo de origem, após a necessária instrução criminal.

Quanto à alegação de que o paciente não se encontrava na posse de armas ou drogas na ocasião do flagrante, os depoimentos colhidos na fase policial apontam em sentido contrário.

De qualquer modo, tal fato carece de apuração mais ampla, com produção de provas sob o crivo do contraditório, incompatível com o rito da ação mandamental.

Convém consignar que eventuais alegações de irregularidades da prisão em flagrante restam prejudicadas pela conversão da custódia em preventiva, uma vez tratar-se, agora, de novo título a amparar a custódia.

A propósito, "a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é remansosa no sentido de que a homologação da prisão em flagrante e sua conversão em preventiva tornam superado o argumento de irregularidades na prisão em flagrante, diante da produção de novo título a justificar a segregação" ( HC n. 535.753/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 10/12/2019, DJe 19/12/2019).

Ante o exposto, considero prejudicada a preliminar de irregularidade da prisão em flagrante, em virtude da conversão da custódia em preventiva, e não conheço da preliminar de nulidade da prova.

No mérito, a questão jurídica limita-se a verificar se é possível revogar a prisão preventiva do paciente, por fundamentação inidônea.

A resposta é sim.

A prisão preventiva é uma medida excepcional, de natureza cautelar, que autoriza o Estado, observadas as balizas legais e demonstrada a absoluta necessidade, a restringir a liberdade do cidadão antes de eventual condenação com trânsito em julgado (art. , LXI, LXV, LXVI e art. 93, IX, da CF).

Para a privação desse direito fundamental da pessoa humana, é indispensável a demonstração da existência da prova da materialidade do crime, da presença de indícios suficientes da autoria e do perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado, bem como a ocorrência de um ou mais pressupostos do artigo 312 do Código de Processo Penal, que assim dispõe:

A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.

Embora a nova redação do referido dispositivo legal tenha acrescentado o novo pressuposto - demonstração do perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado -, apenas explicitou entendimento já adotado pela jurisprudência pátria ao abordar a necessidade de existência de periculum libertatis. Portanto, caso a liberdade do acusado não represente perigo à ordem pública, econômica, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal, não se justifica a prisão ( HC nº 137.066/PE, Rel. Ministro DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 21/2/2017, DJe 13/3/2017; HC n. 122.057/SP, Rel. Ministro DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 2/9/2014, DJe 10/10/2014; RHC n. 79.200/BA, Relator Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 22/6/1999, DJU 13/8/1999; e RHC n. 97.893/RR, Rel. Ministro ANTÔNIO SALDANHA PALHEIRO, Sexta Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019; HC n. 503.046/RN, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019).

Exige-se, ainda, na linha inicialmente perfilhada pela jurisprudência dominante deste Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, e agora normatizada a partir da edição da Lei n. 13.964/2019, que a decisão esteja pautada em motivação concreta de fatos novos ou contemporâneos, bem como demonstrado o lastro probatório que se ajuste às hipóteses excepcionais da norma em abstrato e revelem a imprescindibilidade da medida, vedadas considerações genéricas e vazias sobre a gravidade do crime ( HC n. 321.201/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, julgado em 6/8/2015, DJe 25/8/2015; HC n. 296.543/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 2/10/2014, DJe 13/10/2014).

No caso, assim foi fundamentada a prisão preventiva do paciente (e-STJ fls. 302/310):

[...] Tem-se, ainda, que a autuação dos policiais se deu em virtude de constatação inicial de armas e entorpecentes no local, sendo que, após busca local, evidenciou-se situação de flagrante que autorizou constitucionalmente a entrada da polícia em domicílio particular, hipótese em que o resguardo da privacidade é afastado posto que utilizado para o cometimento de crime.

Por sua vez, a quantidade de entorpecente apreendida afasta a possibilidade de conclusão do que se destinava apenas ao uso, ainda, quanto a alegação de que os entorpecentes e as armas seriam de propriedade do acusado do segregado, tem-se que as informações prestadas pelo mesmo frente a este juízo demonstram o contrário.

Em que pese as alegações do segregado e de seu defensor acerca da negativa de propriedade dos ilícitos, noto que o segregado informou que não tem contato com seu cunhado a mais de 07 (sete) anos, situação que leva a crer a impossibilidade de manutenção de tais objetos na propriedade do segregado sem que o mesmo tenha ciência, tendo em vista o lapso temporal informado pelo mesmo.

Ainda, verifico que o condutor, junto a autoridade policial informou que teria a esposa do indiciado permitido a entrada dos agentes policiais em sua residência, informação esta que, embora circunstancialmente diferente, foi corroborada pela defesa do autuado, de onde se extrai a legalidade da revista realizada pelos policiais.

Desta forma, frisa-se que as alegações da defesa não foram contundentes a justificar o relaxamento da prisão do segregado, mormente por encontraram-se desacompanhadas de provas desta irregularidade.

Portanto, não há que se falar em irregularidades aptas a macularem o presente flagrante vez que não houve sequer a conclusão do inquérito policial, momento em que serão verificadas todas as diligências necessárias a elucidação do feito.

De igual teor não é possível vislumbrar, em face dos elementos carreados ao feito, até o momento, quaisquer vícios formais ou materiais que possam macular a peça, razão pela qual HOMOLOGO o auto de prisão em flagrante, nos termos dos artigos 302, 304 e 306, todos do Código de Processo Penal.

Noutro prisma, em atenção ao disposto no art. 310 do CPP, passo à análise da necessidade da segregação preventiva ou imposição de outra (s) medida (s) cautelar (es).

De acordo com o caput do art. 312 do CPP, com a alteração promovida pela Lei nº. 13.964/2019, são requisitos para a decretação da prisão preventiva prova da existência do crime, indícios suficientes de autoria e perigo do gerado pelo estado de liberdade do imputado, aliados à presença de um dos pressupostos enumerados no mesmo artigo que justifiquem a medida, quais sejam:

a) garantia da ordem pública;

b) garantia da ordem econômica;

c) conveniência da instrução criminal; e d) garantia de aplicação da lei penal.

Outrossim, além dos requisitos e pressupostos acima enumerados, o artigo 313, do Código de Processo Penal fixou outras condições para a. decretação da custódia cautelar, quais sejam:

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.

No caso em apreço, o auto de prisão em flagrante, notadamente os termos de declarações dos policiais responsáveis pela prisão do autuado, bem como os registros integrados de ocorrência lavrados para tratar dos crimes em questão demonstram a ocorrência da materialidade delitiva, bem como revelam indícios suficientes de que o autuado é seu autor.

Sopeso que alegação de ausência de autoria é matéria de mérito, inviável, portanto, de ser apreciada nesse momento, bastando, por ora, a existência de indícios suficientes, o que vislumbro ocorrer na hipótese em testilha, ante os depoimentos constantes nos autos.

Os delitos em questão, tipificados nos artigos 33, caput, da Lei 11.343/06 e 14, da lei n. 10.826/03, possuem, quando somados, pena máxima superior a 04 (quatro) anos, perfazendo, assim, uma das hipóteses autorizadoras de prisão preventiva.

Outrossim, verifico que as circunstâncias em que os crimes, em tese, foram perpetrados, revelam a necessidade de se garantir a ordem pública, ante a gravidade concreta das condutas atribuídas ao autuado.

Nessa toada, é medida impositiva a manutenção da prisão do autuado, a fim de restaurar a ordem pública e de inibir o cometimento de novos crimes, não sendo nenhuma das medidas cautelares diversas da prisão, estabelecidas no artigo 319 do Código de Processo Penal, suficientes, ao menos segundo os elementos existentes por ora, para tal desiderato.

Este, a propósito, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça de Goiás:

[...] Ressalto, todavia, que esta decisão poderá ser revista a qualquer momento se a situação fática e processual for alterada, nos termos do art. 316 6 do Código de Processo Penal l.

Ante o exposto, CONVERTO EM PREVENTIVA a prisão flagrancial de Carlos Castro Silva, com fulcro nos artigos 310, II, 312 e 313, I, todos do Código de Processo Penal.

Ao examinar a matéria, o Tribunal manteve a custódia cautelar da paciente (e-STJ fls. 512/521).

Cumpre verificar se o cárcere preventivo foi decretado em afronta aos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal e sem fundamentação idônea, como aduz a inicial.

Ora, é da jurisprudência pátria a impossibilidade de se recolher alguém ao cárcere se inexistentes os pressupostos autorizadores da medida extrema, previstos na legislação processual penal.

No ordenamento jurídico vigente, a liberdade é a regra. A prisão antes do trânsito em julgado, cabível excepcionalmente e apenas quando concretamente comprovada a existência do periculum libertatis, deve vir sempre baseada em fundamentação concreta, não em meras conjecturas.

Note-se ainda que a prisão preventiva se trata propriamente de uma prisão provisória; dela se exige venha sempre fundamentada, uma vez que ninguém será preso senão por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente ( Constituição da Republica, art. , inciso LXI), mormente porque a fundamentação das decisões do Poder Judiciário é condição absoluta de sua validade ( CRFB, art. 93, inciso IX).

No particular, afere-se que o decreto prisional não resiste ao controle de legalidade quanto à demonstração da efetiva necessidade da prisão, notadamente no que se refere à imprescindibilidade da medida extrema. Não houve descrição/individualização das condutas do agente, que é primário (e-STJ fl. 206); inexiste qualquer elemento concreto que evidencie a periculosidade social ou o envolvimento com organização criminosa. Referências sobre a gravidade abstrata do delito de tráfico ilícito de entorpecentes, bem como relativas ao mal social decorrente de sua prática, não servem de fundamento para a prisão preventiva. Devem ser ponderados, especialmente, os critérios da necessidade e adequação, e do periculum libertatis, o que, no particular, não foi feito.

De fato, a quantidade de substância entorpecente supostamente apreendida (sequer mencionada no decreto prisional) não é ínfima (cerca de 950g de maconha). Todavia, há fundadas dúvidas sobre a legalidade da operação policial e das provas obtidas, em tese, na residência do paciente: consta do auto de prisão em flagrante que denúncia anônima motivou a busca pelo veículo (Fiat Siena) que era conduzido pelo paciente. Abordado pela viatura policial, com ele teria sido encontrada uma arma. O paciente teria comunicado haver drogas em sua residência (fato negado pela defesa do agente) e a autoridade policial para lá se deslocou. Com a suposta anuência da esposa (procedimento questionado pela defesa) a substância entorpecente teria sido localizada *(a defesa nega a apreensão de drogas). A casa da mãe do paciente também foi alvo de busca, mas nada de ilícito se encontrou (e-STJ fls. 137/138).

É consabido que "a mera denúncia anônima, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime, não legitima o ingresso de policiais no domicílio indicado, estando, ausente, assim, nessas situações, justa causa para a medida." ( HC 512.418/RJ, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, julgado em 26/11/2019, DJe 3/12/2019.) Por certo, todas essas questões suscitadas pela defesa serão analisadas, em ampla extensão e profundidade, pelo Magistrado de primeiro grau, assim como consignou o Tribunal de Justiça local, no acórdão recorrido.

Em sede de segregação cautelar, entretanto, não bastam a materialidade do crime e os indícios de autoria. A gravidade abstrata do delito de tráfico de drogas não serve de fundamento para a imposição de custódia cautelar, porquanto o pleno do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da expressão "e liberdade provisória", constante do art. 44 da Lei n. 11.343/2006, determinando a apreciação dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal, para que, se for o caso, seja decretada a segregação cautelar.

Com efeito, "nem a gravidade abstrata do delito, nem a natureza hedionda do tráfico de drogas, tampouco a simples referência à perniciosidade social do crime e a meras conjecturas, sem nenhuma menção a fatores reais de cautelaridade, servem de motivação idônea para a manutenção da prisão preventiva do réu" ( HC n. 288.589/SP, Relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 8/4/2014, DJe 25/4/2014).

A prisão provisória - que não deve se confundir com a prisão-pena - carcer ad poenam - não detém o objetivo de atribuir punição ao agente que, em tese, praticou uma conduta típica.

A finalidade específica do cárcere cautelar deve ser a de possibilitar o desenvolvimento válido e regular do processo penal.

Vale dizer, somente há de ser decretado quando houver nos autos elementos concretos que indiquem a real possibilidade de obstrução na colheita de provas, ou a real possibilidade de reiteração da prática delitiva, ou quando o agente demonstra uma intenção efetiva de não se submeter à aplicação da lei penal.

Ademais, "a jurisprudência desta Corte Superior não admite que a prisão preventiva seja amparada na mera gravidade abstrata do delito, por entender que elementos inerentes aos tipos penais, apartados daquilo que se extrai da concretude dos casos, não conduzem a um juízo adequado acerca da periculosidade do agente. 4.

Quanto ao tráfico de drogas, fundamentos vagos, aproveitáveis em qualquer outro processo não são idôneos para justificar a decretação de prisão preventiva, porque nada dizem acerca da real periculosidade do agente" ( HC n. 459.536/SP, Relatora Ministra LAURITA VAZ, Sexta Turma, julgado em 25/9/2018, DJe 18/10/2018).

Avaliando as circunstâncias do caso concreto, para garantir a ordem pública e assegurar a instrução processual, mister substituir a prisão preventiva do paciente por medida cautelar, a critério do Juízo local.

Nesse sentido:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO.

TRÁFICO DE ENTORPECENTES. DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO. ANÁLISE FÁTICO-PROBATÓRIA. INADMISSIBILIDADE NA VIA ELEITA. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. DESNECESSIDADE DA CUSTÓDIA.

QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA QUE NÃO SE MOSTRA ELEVADA.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

1. Por se tratar de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração não deve ser conhecida, segundo a atual orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal - STF e do próprio Superior Tribunal de Justiça - STJ. Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável a análise do feito para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal.

2. É inadmissível o enfrentamento da alegação acerca da desclassificação para o delito de porte de substância entorpecente para uso próprio, ante a necessária incursão probatória, incompatível com a via estreita do recurso ordinário em habeas corpus.

3. Em vista da natureza excepcional da prisão preventiva, somente se verifica a possibilidade da sua imposição quando evidenciado, de forma fundamentada e com base em dados concretos, o preenchimento dos pressupostos e requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal - CPP. Devendo, ainda, ser mantida a prisão antecipada apenas quando não for possível a aplicação de medida cautelar diversa, nos termos previstos no art. 319 do CPP.

4. No caso dos autos, verifica-se que a prisão preventiva foi decretada sem a demonstração concreta da sua necessidade, tendo as instâncias ordinárias se limitando a afirmar a necessidade de preservação da ordem pública, ante a gravidade abstrata do delito, baseada apenas em elementos constitutivos do tipo penal. Ademais, é certo que a quantidade de droga apreendida - 141,9g de maconha - não se mostra exacerbada, o que permite concluir que a potencialidade lesiva da conduta imputada ao paciente não pode ser tida como das mais elevadas. Tais circunstâncias, somadas aos fato de de não haver nos autos notícias de envolvimento do réu em outros delitos, sendo, a princípio, primário e com bons antecedentes, indicam a prescindibilidade da prisão preventiva e a suficiência das medidas cautelares menos gravosas.

5. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para revogar a prisão preventiva do paciente, ressalvada a aplicação de medidas cautelares alternativas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, a serem definidas pelo Juiz de primeiro grau e a possibilidade da decretação de nova prisão preventiva, desde que devidamente fundamentada ( HC 552.194/RS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 11/2/2020, DJe 21/2/2020).

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ART. 305 DO CTB. SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE MANTEVE A PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO VÁLIDA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. RECURSO PROVIDO.

1. Conforme preconiza o § 1º do art. 387 do CPP, o magistrado, ao proferir sentença condenatória, decidirá fundamentadamente sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.

2. Hipótese em que é manifesta a ilegalidade imposta ao recorrente, pois a manutenção da prisão preventiva está fundamentada apenas na gravidade abstrata do delito de tráfico de drogas. Ademais, nem mesmo a quantidade de droga apreendida - 175 gramas de maconha - isoladamente, autorizaria o encarceramento cautelar a pretexto de acautelamento do meio social, sobretudo porque certificada a primariedade do recorrente.

3. Recurso provido para revogar a prisão preventiva imposta ao recorrente mediante a aplicação de medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP, a critério do Juízo de primeiro grau.

( RHC 119.380/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 26/11/2019, DJe 5/12/2019) Acolhida a tese de fundamentação inidônea do decreto prisional, resta prejudicada a análise dos demais tópicos suscitados pela defesa.

Ante o exposto, não conheço do habeas corpus. Entretanto, concedo a ordem de ofício para revogar a prisão preventiva de CARLOS CASTRO SILVA sob a imposição de medidas cautelares, a critério e sob acompanhamento do Magistrado de primeiro grau.

Comunique-se. Publique-se.

Brasília, 03 de outubro de 2022.

Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA Relator

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(STJ - HC: 775640, Relator: REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Publicação: 05/10/2022)

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