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24 de Maio de 2024
  • 1º Grau
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TJMG • XXXXX-26.2015.8.13.0024 • Tribunal de Justiça de Minas Gerais - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de Minas Gerais
há 8 anos

Detalhes

Processo

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JUÍZO DE DIREITO DA 12ª VARA CRIMINAL
DA COMARCA DE BELO HORIZONTE-MG

Processo: 024.15.163.109-0

Réu: CHRISTIAN SOUZA ALMEIDA

Tipificação: Art. 303, Parágrafo Único, c/c art. 302, § 1.º, incisos I e III e art. 306, § 1.º, inciso II, todos da Lei 9.503/97, na forma do art. 69 do CP.

Vistos etc.

CHRISTIAN SOUZA ALMEIDA, qualificado nos autos, foi denunciado como incurso nos artigos 303, Parágrafo Único, c/c art. 302, § 1.º, incisos I e III e art. 306, § 1.º, inciso II, todos da Lei 9.503/97, na forma do art. 69 do CP., porque, segundo narra a exordial, em 23.05.2015, na Avenida Dom Pedro I, com Avenida Portugal, nesta capital, conduzia o veículo I/HYUNDAI VELOSTER, placa de identificação HJV-5719, com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool e sem possuir habilitação e, de forma imprudente, pois imprimia velocidade incompatível com o local, negligentemente, perdeu o controle direcional e colidiu com a traseira da motocicleta Honda/CB 1000R, placa de identificação NYE – 5119, causando lesões corporais no condutor FÁBIO AMORIM DA SILVA GAMARANO e, ainda, deixou de prestar socorro à vítima, quando era possível fazê-lo sem risco pessoal.

A denúncia foi recebida em 21.07.2015, às fls. 72.

O Ministério Público deixou de oferecer proposta de suspensão do processo, nos termos do art. 89 da Lei 9.099/95, eis que ausentes os requisitos exigidos para concessão do benefício, fls. 73.

O denunciado foi citado e apresentou resposta a acusação, através do Defensor Constituído, nos termos do art. 396 do C.P.P, as fls. 74/75 e 77.

Durante a instrução criminal foram inquiridas quatro testemunhas da acusação e uma da defesa (fls. 94/95, 96/97, 98/99, 100 e 101).

Encerrada a instrução, o acusado foi interrogado, às fls. 102/103.

As partes requereram diligências e, após o cumprimento, vieram as alegações finais.

Primeiro, o Ministério Público requereu a condenação do acusado, nos termos propostos na denúncia (fls. 116//123).

Em seguida, a Defesa sustentou a absolvição do réu, por falta de provas e, em caso de condenação, requereu a aplicação da pena no mínimo legal e o direito de recorrer em liberdade (fls. 125/128).

Relatados. Examinados. Decido.

Processo regularmente instruído, livre de nulidades e apto à decisão do mérito.

1) Quanto ao delito previsto no art. 303, parágrafo único, c/c art. 302, § 1.º, incisos I e III da Lei 9.503/97:

A materialidade delitiva restou comprovada através do Boletim de Ocorrência e pelo exame de corpo de delito de lesão corporal da vítima Fábio Amorim da Silva Gamarano, fls.08/11 e 108/109.

Da mesma forma, a autoria restou inconteste.

O acusado, em Juízo, confirmou que estava na condução do Hyundai Velloster quando houve o acidente, mas alegou que foi a motocicleta envolvida no acidente que atingiu seu veículo, por trás, na lateral esquerda e, por esta razão, perdeu o controle direcional e bateu na mureta de proteção:

“...que a denúncia não é verdadeira; que estava conduzindo o veículo Hyundai Velloster quando houve o acidente; que sua habilitação tinha sido apreendida em 28 de dezembro de 2015; (…); que estava trafegando quando a motocicleta da vítima se aproximou por trás; (…); que a motocicleta atingiu o veículo do depoente por trás, na lateral esquerda, e depois disso o depoente perdeu o controle, foi batendo na mureta de proteção; que trafegou alguns metros após o impacto, uns dez a vinte metros; que o air bag não foi acionado, o que teria ocorrido se estivesse em alta velocidade; que não deixou o local logo após o acidente; que ficou no local por uns dez a quinze minutos, até ser agredido por um motociclista; que pretendia caminhar para encontrar um táxi, para garantir a sua integridade física; que no momento que pretendia deixar o local, o SAMU já estava presente; que estava a uns sete passos do veículo quando foi abordado pelos policiais; que não chegou a se afastar do local; que um rapaz em uma moto disse que era policial, e por isso se sentiu seguro e voltou para o local; que o rapaz ficou no local até a polícia chegar;...” (fls.102/103).

Além disso, a testemunha Fabiano, confirmou o depoimento prestado perante a Autoridade Policial, onde reconheceu o acusado como sendo o condutor do veículo Veloster no momento do acidente:

“...que confirma o depoimento de fls. 03; que reconhece o réu presente; que no momento que chegou ao local o réu estava próximo ao seu veículo; que uma testemunha, Irley, disse que o réu tinha tentado evadir do local; (…); que conversou com o réu logo que chegou ao local; ...” (Fabiano Ângelo de Jesus - fls.100).

Portanto, não restam dúvidas de que era o acusado quem conduzia o veículo Hyundai Velloster, no momento do acidente.

Quanto à tipicidade, a conduta do réu amolda-se perfeitamente à descrita no art. 303 da Lei 9.503/97, que prescreve:

Art. 303. Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor:

Penas - detenção, de seis meses a dois anos e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. Aumenta-se a pena de um terço à metade, se ocorrer qualquer das hipóteses do parágrafo único do artigo anterior.”

Segundo as provas produzidas, restou demonstrado nos autos que a conduta imprudente e negligente do acusado foi determinante para o resultado lesivo, eis que o acidente não ocorreria caso estivesse trafegando com o dever de cuidado que se exigia, tornando-se inconteste a responsabilidade pelo pratica da conduta delituosa descrita na denúncia.

A versão apresentada pelo acusado, em Juízo, de que o acidente ocorreu em razão da conduta do condutor da motocicleta, da vítima Fabio, que colidiu na traseira do seu veículo e, por esta razão, perdeu o controle direcional e bateu na mureta de proteção, não merece acolhimento e revela a nítida intenção de eximir-se da responsabilidade penal imputada.

No caso, observa-se que na fase policial, divergindo da versão fantasiosa apresentada em Juízo, o acusado admitiu que atingiu a motocicleta, quando ela surgiu repentinamente e em alta velocidade a sua frente.

“...encontrava-se na direção do Hyundai Veloster, placa HJV- 6719, e na Av. Dom Pedro I, Avenida Portugal, capital, trafegando em uma curva suave, e informa que estava trafegando a 55 km/horas, quando repentinamente surgiu a sua frente uma moto em alta velocidade, que não conseguiu evitar o impacto, vindo a atingir a motocicleta; que perdeu o controle direcional vindo a atravessar o canteiro e chocando no canteiro divisor da pista...” (fls. 05/05v).

Por certo, se a motocicleta apareceu a frente do veículo, mostra-se incoerente que a mesma tivesse colidido na sua traseira, como alegou o réu no interrogatório e quer fazer crer a Defesa nas alegações finais.

Além disso, a toda evidência, se fosse confirmada a versão apresentada pelo réu em Juízo, é pouco provável que a batida de uma motocicleta na traseira do veículo fizesse com que este perdesse o controle direcional com tamanha violência, a ponto alterar sua trajetória e fizesse com que atingisse o canteiro central da avenida como descrito pelas testemunhas.

No mesmo passo, no histórico do boletim de ocorrência, redigido no calor dos acontecimentos, a versão apresentada pelo réu também menciona que a motocicleta, surgiu a sua frente, o que demonstra, mais uma vez, ser inacreditável a dinâmica do acidente relatada em Juízo.

“... Condutor do V1, relata que estava a 55 km/h transitando na citada via quando a motocicleta, conduzida pelo Sr. Fábio, que transitava em alta velocidade, surgiu repentinamente a frente do V1, momento em que perdeu o controle da direção e saiu da pista. Acrescenta ainda que o hair bag do veículo não foi acionado pois o acionamento ocorre somente quando o veículo atinge velocidade superior a 60 km/h...” (fls. 10verso).

Por outro lado, a prova produzida em Juízo corrobora a acusação e demonstra que o veículo conduzido pelo acusado colidiu na traseira da motocicleta, nos termos em que relatou a vítima, quando ouvida em Juízo:

“...que confirma o depoimento de fls. 33/36; que reconhece o réu presente; que o amigo do depoente que estava em outra motocicleta, trafegava alguns metros atrás; que não se lembra de ter passado pelo veículo conduzido pelo réu; que no momento que estava fazendo uma curva, também existindo um aclive, ouviu uma derrapada e foi atingido; que foi atingido na traseira da motocicleta; que a motocicleta ficou girando na pista; que reduziu a velocidade por causa da curva; que após o acidente viu um Corsa se aproximando e se imobilizando na mesma faixa onde o depoente caiu; que não visualizou o veículo que atingiu a sua motocicleta; que perguntou a uma menina, que trabalha próximo, na Estação do Move, e ela disse que o veículo estava do outro lado, na outra faixa; que a menina disse a Irley, quando ele se aproximou, que o condutor do veículo estava fugindo, momento em que Irley foi atrás dele; que um policial, à paisana, segundo Irley, o auxiliou para conter o condutor do veículo; que não teve contato com o condutor do veículo; ...” (Fábio Amorim da Silva Gamarano - fls. 94/95).

Além disso, a versão da vítima foi confirmada pela testemunha Irley, que relatou ter presenciado o momento exato da colisão e que viu quando a motocicleta foi atingida na traseira pelo veículo do réu:

“... que não havia veículos trafegando entre o depoente e Fábio, exceto o réu no momento da colisão; que estava trafegando atrás da motocicleta de Fábio; que presenciou o momento exato da colisão; que visualizou o veículo do réu quando ele passou pelo depoente, e achou estranho em razão da velocidade em que ele estava; que o veículo do réu passou pela esquerda do depoente; que iria fazer uma conversão para adentrar na avenida Portugal; que Fábio e o réu tinham passado um pouco da entrada para a avenida Portugal; que antes do local onde iria fazer a conversão, Fábio trafegava na faixa do meio e o depoente na faixa da direita; que Fábio estava entre as faixas da direita e do meio quando foi atingido; que no local existem várias curvas; que Fábio tinha acabado de fazer uma curva quando foi atingido; que Fábio foi atingido na traseira; que a motocicleta foi arremessada a quatrocentos ou quinhentos metros para a frente; que Fábio não acompanhou a motocicleta, foi jogado para cima e rolou para o lado esquerdo; que após o acidente Fábio foi para a vala existente no final da pista, na extremidade, para evitar ser atingido por outros veículos; que após atingir a motocicleta, o veículo do réu transpôs o passeio à direita, duas faixas de rolamento, e parou junto à barra de proteção de concreto; que a princípio se dirigiu ao local onde estava Fábio para prestar socorro; (…); que não ouviu nenhum barulho de frenagem do veículo do réu; que o veículo do réu estava em alta velocidade, e fazia uma curva quando houve a colisão; que o réu mudou de faixa umas duas vezes desde o momento que ultrapassou o depoente até o momento da colisão; que Fábio não mudou de faixa quando terminou de fazer a curva; que Fábio não sofreu lesões graves, apenas “ralou”....” (Irley Efigênio Barbosa – fls.96/97).

Registre-se que o depoimento da testemunha Ana Paula, não trouxe nenhum esclarecimento aos fatos narrados na denúncia (fls. 101).

Por conseguinte, a versão do réu restou isolada nos autos e conclui-se que faltou com os cuidados necessários, pois não observou à distância de segurança que deveria manter dos demais veículos, segundo a regra prevista no art. 29, II do CTB.

"Art. 29. O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas:
(...)
II - o condutor deverá guardar distância de segurança lateral e frontal entre o seu e os demais veículos, bem como em relação ao bordo da pista, considerando-se, no momento, a velocidade e as condições do local, da circulação, do veículo e as condições climáticas;"

Assim, se o acusado estivesse conduzindo o veículo com o dever objetivo de cuidado e estivesse guardado a distância de segurança exigida, evitaria a colisão com a motocicleta a sua frente.

O fato da vítima estar trafegando em velocidade acima da permitida para o local, como alega a Defesa, por si só, ainda que procedente, como reconheceu a mesma, não beneficia o acusado.

No caso, a causa determinante no acidente foi a imprudência do acusado, que não guardou à distância de segurança exigida, que pudesse evitar a colisão com a motocicleta a sua frente e não a conduta da vítima.

Outrossim, cumpre ressaltar que eventual contribuição da vítima, por conduzir a motocicleta acima da velocidade permitida para o local, não tem o condão de afastar a responsabilidade penal do acusado, pois a compensação de culpas é incabível no ordenamento jurídico pátrio no Direito Penal.

De igual forma, a alegação da Defesa de que o acusado não estava trafegando em velocidade excessiva, pois no momento da batida o Air Bag não foi acionado, não o isenta da prática da conduta culposa.

A falta do acionamento do Air Bag no momento da batida, não comprova, estreme de dúvidas, a velocidade empreendida pelo acusado no momento do acidente, uma vez que não é qualquer colisão que desencadeia o funcionamento deste sistema de segurança.

Os Air Bags são acionados em situações específicas e não há como utilizá-los como parâmetro para medir a velocidade empreendida pelo veículo, por mera dedução, sem qualquer outra prova que o ratifique, como quer a Defesa.

No mais, têm-se que a velocidade pode ser um indício para comprovação de uma conduta culposa, porém, por si só, não é o único fator determinante, podendo ocorrer a hipótese em que o condutor de um veículo estar em velocidade compatível e, mesmo assim, praticar uma conduta considerada negligente, imprudente ou imperita.

Neste contexto, não há como afastar a responsabilidade penal que está sendo imputada ao acusado, pois agiu culposamente, concorrendo assim, para o evento danoso.

Por outro lado, quanto ao reconhecimento da causa de aumento de pena prevista no inciso I,do § 1º, do art . 302, CTB, conforme as provas coligidas para os autos, a conduta do acusado em conduzir o veículo sem habilitação, amolda-se ao tipo penal previsto no art. 309 do mesmo diploma legal.

Como ressabido, descabe a interpretação extensiva em prejuízo do réu, pois o art. 302, § 1º, I da Lei 9503/97, é taxativo, referindo-se somente a ausência de habilitação, ou seja, “sem possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação”, não abarcando a hipótese de ter sido a mesma cassada.

No caso, sem qualquer ofensa ao princípio da correlação, verifica-se que se faz necessária a aplicação da emendatio libelli, prevista no art. 383 do C.P.P, para o reconhecimento do delito previsto no art. 309 do CTB, narrado e não capitulado na inicial acusatória.

Como se sabe, o acusado no decorrer da instrução criminal, se defende dos fatos narrados na denúncia e não, da classificação feita, podendo o Juiz, na sentença, condená-lo por outro crime ou adequar a capitulação do delito, desde que a conduta esteja narrada pela acusação, sem a necessidade de aditamento.

Neste sentido:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - FURTO - NULIDADE - INEXISTÊNCIA -CONTINUIDADE DELITIVA - ELEMENTOS DESCRITOS NA DENÚNCIA - EMENDATIO LIBELI - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - NOVO EXAME DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS - REDUÇÃO PENA - PATAMAR DE AUMENTO DO CRIME CONTINUADO - NÚMERO DE CRIMES - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO E, DE OFÍCIO, SUBSTITUÍDA A PENA CORPORAL. 1- O instituto da emendatio libeli, previsto no art. 383 do CPP, permite ao juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, atribuir definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave. 2-Restando comprovadas a materialidade e a autoria, mostra-se descabida a pretensão absolutória. 3- O exame negativo das circunstâncias judiciais deve ser realizado com base em elementos concretos. 4- Havendo nova análise das circunstâncias judiciais, a pena deve ser reestruturada. 5- Sendo 02 (dois) os furtos praticados em continuidade delitiva, o respectivo percentual de aumento deve ser de 1/6 (um sexto), nos termos do art. 71, caput, do CP. ( Apelação Criminal Nº 1.0472.04.004436-5/001 - Relator: Exmo. Sr. Des. Júlio César Lorens Data de Julgamento: 26/07/2011- Data da publicação da súmula – 08/08/2011).

Neste contexto, a conduta do acusado em conduzir o veículo sem habilitação, em razão da mesma ter sido cassada, narrado na denúncia, amolda-se ao tipo penal do art. 309 da Lei 9503/97:

“Art. 309. Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida

Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano:

Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa.”

O próprio acusado no interrogatório afirmou que a sua carteira de habilitação tinha sido apreendida em 28 de dezembro de 2015 e, portanto, conduzia o veículo, violando a suspensão.

Além disso, conforme consulta de dados do condutor, realizada pela Polícia Civil juntada as fls. 20, o condutor possuía, à época dos fatos, 37 pontos na carteira de habilitação.

Entretanto, em obediência ao princípio da consunção, o delito previsto no art. 309 do CTB, por ser considerado crime menos grave, é absorvido pelo delito mais grave, que é o de lesão corporal, previsto no art. 303 do CTB.

Neste sentido, se manifestam os Tribunais Superiores, de que o crime de lesão corporal culposa, absorve o delito de direção sem habilitação:

“EMENTA: PROCESSUAL PENAL - RECEBIMENTO PARCIAL DA DENÚNCIA - LESÃO CORPORAL E FALTA DE HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULO AUTOMOTOR - "BIS IN IDEM" - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO - Deve ser mantida a decisão que recebeu parcialmente denúncia, sob pena de se incorrer no vedado "bis in idem", pois já se pacificou na doutrina e na jurisprudência dos nossos Pretórios, inclusive nos Tribunais Superiores, que delito de lesão corporal culposa, cometido na direção de veículo automotor ( CTB, art. 303), por agente sem a devida permissão ou habilitação para dirigir, absorve o delito de falta de habilitação ou permissão tipificado no art. 309 do CTB. Recurso desprovido. (Rec em Sentido Estrito XXXXX-6/001 - Relator> Antônio Armando dos Anjos – 3ª Câmara Criminal – Data de Julgamento: 21.10.2008 – Data da publicação da súmula – 29.10.2008).

Assim, a absolvição pelo crime do art. 309 do CTB é medida que se impõe.

Por fim, quanto à causa de aumento de pena, de omissão de socorro, prevista no inciso III,do § 1.º, do art. 302, CTB, conclui-se que não restou comprovada.

Em Juízo, o acusado alegou que afastou-se do local para resguardar sua segurança, pois foi agredido por um motoqueiro que chegou ao local minutos após o acidente.

Com efeito, a testemunha Maklene Lúcia, corroborou a justificativa apresentada pelo acusado e relatou que o retirou do local, porque havia um grupo de motociclista que estava exaltado:

“... que a pessoa que se identificou como policial disse que estava contendo o acusado, porque ele estava tentando fugir, mas que depois pessoas chegaram ao local e tentaram agredi-lo; que a pessoa que se identificou como policial não foi identificada pela guarnição; que conversou com o réu, e o retirou do local, porque havia um grupo de motociclista que estava exaltado; ...” (Maklene Lúcia Silva Carvalho - fls. 98/99).

Não bastasse, o laudo pericial juntado às fls. 106/106, descreve que o acusado possuía “escoriação localizada na face interna do lábio inferior associada a equimose de coloração avermelhada”, condizente com sua narrativa de ter sido agredido por um motoqueiro.

Neste contexto, não há como reconhecer a causa de aumento de pena, prevista no art. 302, § 1.º, inciso III do CTB.

2) Quanto ao delito previsto no art. 306 da Lei 9.503/97:

O réu negou, no interrogatório, que estivesse sob efeito de álcool:

...que não tinha ingerido bebidas alcoólicas; que ficou exaltado após o acidente, porque os motoqueiros queriam lhe agredir; (…); que não foi oferecido ao depoente para fazer o teste do etilômetro; que foi conduzido ao IML para exame; que após o acidente viu o motociclista amigo da vítima no local; que não se lembra se foi ele quem lhe agrediu com o capacete; que uns cem a cento e cinquenta motociclistas estiveram no local; que foi processado e absolvido por crime do art. 306; que em nenhum momento precisaram lhe segurar porque estava embriagado; que não precisou de nenhuma ajuda, que não estava embriagado; que não estava ingerindo bebidas alcoólicas, porque estava respondendo a processo, e em razão de ter sido orientado por seu advogado.(...); que foi examinado por um médico no IML; que não fez exame de sangue ou de urina; que foi a delegada quem mandou o depoente para o IML.; ...” (fls.102/103).

Entretanto, a prova produzida contraria a negativa do réu e demonstra que encontrava-se sob efeito de álcool, com a capacidade psicomotora alterada, no momento do acidente:

“... ...que no momento que se dirigiu ao réu, se deparou com ele descendo do veículo arrogante, completamente embriagado; que a pessoa que acompanhava o réu também estava embriagada; que voltou para próximo de Fábio; que retirou as motocicletas dos locais onde estavam para evitar que ocorressem outros acidentes; que depois disso, ao visualizar o réu antes, não o viu; ....” (Irley Efigênio Barbosa – fls.96/97);

...que confirma que o réu apresentava sintomas de ter ingerido bebidas alcoólicas; que a fala do réu estava alterada; que o réu somente apresentou sua versão mais ou menos uma hora depois; que o réu estava com o rosto muito vermelho e com odor de álcool; que o réu mal ficava em pé; que o réu se recusou a fazer o teste do bafômetro; que não sabe se o réu foi encaminhado ao IML; que assinou o Termo de Constatação, mas foi preenchido por outro policial; que confirma os sinais assinalados como positivos no Termo de Constatação; ...” (Maklene Lúcia Silva Carvalho - fls. 98/99).

Entretanto, segundo a Jurisprudência dominante, o crime do art. 306 do CTB, de embriaguez ao volante é absorvido pelo delito mais grave, ou seja, o de lesão corporal (art. 303 do CTB).

No caso, o crime de perigo é absorvido pelo delito de dano, em razão do princípio da subsidiariedade.

Assim, ainda que comprovado que o acusado estava com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, tal conduta é absorvida pela lesão corporal.

Neste sentido:

“EMENTA: PENAL - PROCESSO PENAL - APELAÇÃO - CRIME DE TRÂNSITO - HOMICÍDIO CULPOSO E EMBRIAGUEZ AO VOLANTE - CONFLITO APARENTE DE NORMAS - ABSORÇÃO. - Se da embriaguez ao volante resulta homicídio culposo, haverá concurso aparente de normas a ser resolvido pelo princípio da subsidiariedade e o acusado responderá apenas pelo delito de dano (homicídio culposo), já que o delito de perigo (embriaguez) é por aquele absorvido.” ( APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.0024.03.890271-4/001 - RELATOR: EXMO. SR. DES. ELI LUCAS DE MENDONÇA - Data do Julgamento: 09/01/2008 Data da Publicação: 30/01/2008).

Assim, a absolvição pelo crime do art. 306 do CTB é medida que se impõe.

Portanto, comprovadas a autoria, a materialidade e a tipicidade e não incidindo no caso, nenhuma causa de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade, a condenação do réu se impõe, nos termos do art. 303 do Código de Trânsito.

Ante o exposto, julgo procedente, em parte, o pedido formulado na denúncia, opero a emendatio libelli, e absolvo o réu CHRISTIAN SOUZA ALMEIDA, com relação aos delitos previstos nos artigos 306 e 309 da Lei 9.503/97, e o condeno como incurso no art. 303 da Lei n.º 9.503/97, passando à análise das circunstâncias judiciais, rumo à aplicação da pena.

Culpabilidade acentuada, pois restou comprovado que havia ingerido bebida alcoólica e estava com a carteira de habilitação suspensa, expondo a incolumidade pública a perigo concreto de dano. Sem antecedentes, pois não registra condenação além daquela capaz de gerar a reincidência, conforme certidão de fls.66/67. Não constam nos autos informações que permitam tecer considerações quanto à sua personalidade e conduta social. Os motivos e consequências do crime emolduram-se dentro dos limites estabelecidos pelo tipo penal.

Assim, fixo-lhe a pena base em 01 (um) ano de detenção, que concretizo como definitiva, compensando-se a atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência e inexistindo outras causas especiais de aumento ou diminuição e, na mesma proporção, Suspendo a habilitação do acusado, por quatro meses, nos termos dos arts. 292 e 293 da Lei 9503/97.

Fixo o regime semiaberto para cumprimento da pena, em face da reincidência.

Fixo o dia-multa no equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos.

Defiro a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, de prestação de serviços à comunidade, por igual período da condenação, em instituição a ser indicada pelo Juízo de Execução, tendo em vista que não é reincidente específico e a substituição é recomendável.

Condeno o réu ao pagamento das custas processuais.

Suspendo os direitos políticos do réu, nos termos do art. 15, III, da CF/88.

Transitada em julgado, expeça-se Guia de Execução, oficie-se ao T.R.E. e ao Detran, para providências, nos termos do art. 293, § 1.º da Lei 9503/97.

P.R.I.

Belo Horizonte, 4 de novembro de 2016

Kenea Márcia Damato de Moura Gomes

Juíza de Direito

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