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16 de Junho de 2024
  • 1º Grau
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TJSP • Ação Penal - Procedimento Ordinário • Crimes de Trânsito • XXXXX-62.2020.8.26.0228 • 3ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de São Paulo
há 3 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

3ª Vara Criminal

Assuntos

Crimes de Trânsito

Juiz

Carlos Eduardo Lora Franco

Partes

Documentos anexos

Inteiro TeorRazões de Apelação (pag 305 - 327).pdf
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3a Vara Criminal do Foro Central da Capital

Autos nº XXXXX-62.2020.8.26.0228

Controle nº 2021/000056

Apelante: GEOVÁ FERREIRA DA SILVA

Apelado: Ministério Público Estadual

RAZÕES DE APELAÇÃO

EGRÉGIO TRIBUNAL

COLENDA CÂMARA

ÍNCLITOS JULGADORES

GEOVÁ FERREIRA DA SILVA foi regularmente processado e condenado às penas de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, com suspensão da habilitação pelo mesmo prazo, pela prática das condutas previstas nos artigos 302, § 3º e 303, § 2º do Código de Trânsito Brasileiro, na forma do art. 70 do Código Penal.

Em que pesem os fundamentos erigidos na sentença condenatória, faz-se necessária a reforma da r. decisão, utilizando-se do art. 593, inciso I, e art. 600, ambos do Código de Processo Penal, nos termos a seguir expostos.

I - DA ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA

Da acurada análise do conjunto fático-probatório produzido em Juízo, único capaz de sustentar um decreto penal condenatório ( CF, art. , LIV e LV, c/c CPP, art. 155), verifica-se que a autoria e materialidade não restaram adequadamente provadas pelos elementos coligidos na fase judicial.

Sandro da Conceição do Nascimento, vítima, narrou que estavam indo trabalhar (estava de garupa) e de repente saiu um carro e começou a fazer manobras para fazer um "gato" na frente dos bombeiros. Teve movimento de zig- zag. A colisão ocorreu porque o carro virou e interceptou a motocicleta. Ficou ferido na boca e na perna. Não pode trabalhar por 16 dias. Explicou ter ficado no chão porque a perna estava machucada. O semáforo, que ficava antes, estava verde. Estavam usando capacetes no momento do acidente. Lucas não tinha habilitação. A velocidade que a motocicleta imprimia era de 60, 70km/h. Não viu se o pneu estava estourado. Ele freou na hora que tentou virar. O automóvel provavelmente saiu da casa de show que fica ao lado.

Francisco das Chagas de Almeida, testemunha de acusação, narrou que estavam saindo da casa de shows Coração Sertanejo e quando foram atravessar na frente do corpo de bombeiros o carro estava meio parado. Nesse momento veio um motoqueiro rápido e colidiu com o automóvel. O pneu estourou. Iam fazer o retorno na frente do Bombeiros sentido bairro. Acredita que o pneu estourou na batida. Quando a moto bateu o carro se arrastou. Estavam em quatro pessoas. Enquanto estavam na boate todos beberam cerveja.

Franklin Dias de Moura, policial militar, narrou se recordar da ocorrência. Sobre o fato, explicou que a motocicleta veio pela faixa da esquerda e o veículo Ideia estava na faixa do meio. No local viram o Ideia com um pedaço na faixa de ônibus aparentemente para fazer a conversão e retornar. O réu disse que estourou o pneu. A moto bateu na parte da frente do automóvel. Não se recordou no caso se o réu estava alcoolizado. Afirmou que possivelmente o acusado fez o "bafômetro".

Cristina Neves da Mota Silveira, policial militar, narrou que também participou da ocorrência. O pneu dianteiro estava estourado, não sabendo precisar se foi antes ou depois do acidente. O acusado tinha dito que perdeu o controle do veículo. Não sabe dizer se os demais pneus estavam em bom estado. Não se lembra se havia sinais de frenagem. Nas proximidades é comum esse tipo de acidente porque há vários retornos que atravessam a faixa de ônibus.

Já atendeu ocorrências semelhantes nesta via, não sendo incomum que as pessoas se confundam nas manobras de retorno.

Em seu interrogatório, o Apelante explicou que tinham acabado de sair do Coração Sertanejo e estavam na terceira faixa. Estava em velocidade baixa e o pneu veio a estourar. Tentou frear, mas não conseguiu e o veículo virou. Nesse momento o motoqueiro veio em alta velocidade e colidiu. Ia fazer o retorno mais à frente. Tinha ingerido quatro latas de cerveja.

A versão apresentada é crível e merece crédito, já que o interrogatório, mais do que meio de defesa, constitui verdadeiro elemento de prova, razão pela qual deve ser devidamente considerado quando da análise das demais evidências contidas nos autos. Nesse sentido:

"Que continue a ser uma espécie de prova, não há maiores problemas, até porque as demais espécies defensivas são também consideradas provas. Mas o fundamental, em uma concepção de processo via da qual o acusado seja um sujeito de direitos, e no contexto de um modelo acusatório, tal como instaurado pelo sistema constitucional das garantias individuais, o interrogatório do acusado encontra-se inserido fundamentalmente no princípio da ampla defesa." [OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. Del Rey, 6a edição, p. 239]

Verifica-se do laudo pericial de págs. 78/90 que todos os pneus estavam em bom estado de conservação, exceto o dianteiro direito, que se encontrava desinflado e parcialmente deslocado do eixo da roda, de forma trazer credibilidade à versão do Apelante de que o acidente apenas ocorreu em razão de o pneu direito ter estourado, ainda que previamente em bom estado de conservação.

Além disso, cumpre ressaltar que o documento técnico de págs. 67/69 constatou que o Apelante estava lúcido, com atenção preservada, atitude normal, apenas com hálito discretamente etílico.

Portanto, não há comprovação que o risco assumido consubstanciado na direção sob efeito de álcool se materializou no resultado, sendo certo que o laudo pericial não conseguiu precisar técnica e materialmente o porquê de o veículo pilotado pelo Apelante ter saído da pista da direita para a esquerda, não se podendo descartar a versão trazida por ele de que o acidente só ocorreu pelo rompimento do pneu.

Ressalte-se, ainda, que foi constatado marcas de frenagem no asfalto, o que demonstra que o Apelante tentou evitar o resultado.

Assim, contra o Apelante, pesam apenas as palavras da vítima e dos policiais que realizaram a abordagem, que devem ser considerados com extrema cautela.

Sabe-se que a palavra da vítima é de extrema relevância. Não se trata, no entanto, de prova de caráter absoluto. É fundamental que seja confirmada por outros elementos de prova, isto porque, como está emocionalmente envolvida, tem a natural tendência de proceder a indesejáveis equívocos causados pela ânsia em reconhecer e fornecer elementos aptos a bem fundamentar o pretendido castigo de seus ofensores. Por isso, ainda que dotado de grande relevância, o valor de seu depoimento não traz a certeza exigida para julgar procedente a ação penal.

Quanto às testemunhas policiais, em razão da própria posição que ocupam no feito - foram os responsáveis pela prisão em flagrante do Apelante, é natural a tendência a legitimar uma atuação pretérita.

Com efeito, não se desconhece, aqui, a importância de seu depoimento para a persecução penal, entretanto, tal depoimento deve ser relativizado, até mesmo pela atuação que teve ao longo do feito. É natural que busque com suas palavras legitimar a prisão efetuada.

Para sustentar a condenação, a acusação deveria ter produzido provas contundentes capazes de demonstrar a conduta do Apelante, o resultado e o nexo causal entre esses elementos.

Assim, constata-se que a prova produzida é frágil para sustentar uma condenação, já que se de um lado, para a deflagração da ação penal basta que existam indícios de autoria e materialidade, de outro, contudo, para que haja uma condenação é imprescindível que haja prova inequívoca de que o réu seja realmente o autor do fato criminoso, o que provém, tão somente de um juízo exauriente.

Desta forma, a inexistência de outras provas capazes de fundamentar o decreto condenatório fere o princípio da presunção de inocência encartado na Constituição Federal, pois a prova oral colhida em juízo não está apta a sustentar o decreto condenatório.

E, como se sabe, o Direito Penal exige a convicção plena do julgador, ancorada em dados objetivos, concretos, irrefutáveis. A dúvida , menor que seja, milita em favor dos acusados , como determina o secular princípio do in dubio pro reo ( CF, art. , LVII).

Ante o exposto, requer seja a presente ação julgada improcedente, com a consequente ABSOLVIÇÃO do Apelante , com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

II - TESES SUBSIDIÁRIAS

II.1 - Da fixação da pena de suspensão do direito de dirigir no mínimo legal

O crime em questão não está revestido de gravidade exacerbada ou além da normal para a espécie, o Apelante é absolutamente primário e, através do ofício de págs. 185/188, verifica-se que não detém nenhuma pontuação em sua carteira de motorista, o que denota que os fatos apurados nestes autos resultaram de aspecto pontual e único em seu histórico, razão pela qual faz jus à aplicação da penalidade mínima de 2 meses, nos termos do artigo 293 do CTB.

Além disso, vale destacar que o MM. Juiz manteve a pena base no mínimo legal, o que demonstra circunstâncias judiciais favoráveis, e, inobstante, a pena de suspensão deve manter proporcionalidade com a pena privativa de liberdade, e, por isso, deve ser mantida no mínimo, já que, além das circunstâncias favoráveis, não há qualquer agravante ou causa de aumento de pena que possa justificar a penalidade da suspensão em patamar tão alto. Neste sentido é o entendimento dos tribunais, inclusive do E. Tribunal de Justiça de São Paulo:

(...) As diversas espécies de penas devem guardar proporcionalidade. As reprimendas acessórias de suspensão do direito de dirigir, tais quais as corporais e pecuniárias, devem partir do mínimo legal, do montante de dois meses, e posteriormente sofrer alterações nos mesmos patamares que as aplicadas às penas principais . Mantida, portanto, a pena final de 2 meses de suspensão do direito de dirigir. Recurso desprovido. (TJSP; Apelação Criminal XXXXX- 55.2014.8.26.0589; Relator (a): Gilda Alves Barbosa Diodatti; Órgão Julgador: 15a Câmara de Direito Criminal; Foro de São Simão - Vara Única; Data do Julgamento: 02/06/2020; Data de Registro: 02/06/2020 - grifos nossos)

II.2 - Do reconhecimento da atenuante da confissão

In casu , temos que o Apelante CONFESSOU espontaneamente a prática do crime, contribuindo com a efetiva elucidação dos fatos, deslinde do processo e com a verdade real buscada pelo processo penal.

Contudo, na segunda fase da dosimetria, o MM. Juiz sentenciante não reconheceu a atenuante pela confissão do Apelante , o que não deve prevalecer.

Ao confessar espontaneamente a prática do crime, o Apelante revelou que possui honestidade, espírito de colaboração para com o processo, resignação em relação à verdade encontrada no processo, pois renunciou ao seu direito de autodefesa para colaborar com a Justiça. E, com esta postura, demonstrou arrependimento e vontade de regeneração.

Ainda que a confissão seja considerada parcial, cumpre ressaltar que a jurisprudência pátria é no sentido do reconhecimento da atenuante da confissão. Também incide a referida atenuante nos casos em que a confissão, em qualquer momento processual, seja na fase inquisitiva, seja na judicial, desde que tenha sido utilizada com fundamento para a condenação, como se deu no presente caso, em que diversas vezes ao longo da sentença o MM. Juiz cita a versão dada pelo Apelante. É o que consta dos seguintes julgados:

HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO. RECONHECIMENTO DA TENTATIVA: IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. CONFISSÃO PARCIAL DO CRIME. CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE. RECONHECIMENTO OBRIGATÓRIO. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA E

AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. RÉU REINCIDENTE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS. REGIME INICIAL FECHADO. IMPROPRIEDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 269 DESTA CORTE. ORDEM DE HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. Não há como ser reconhecida a forma tentada na hipótese. Para a consumação dos delitos de furto ou de roubo, basta que, após cessada a violência, ameaça ou a clandestinidade, tenha havido a posse da res furtiva pelo autor do fato. É desinfluente, para tanto, ter havido imediata perseguição policial, não ter ocorrido a posse tranqüila do bem, ou que o objeto do crime tenha saído da esfera de vigilância da vítima. Precedentes. 2 . A atenuante do art. 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, tem caráter objetivo, configurando-se, tão- somente, pelo reconhecimento espontâneo do acusado, perante a autoridade, da autoria do delito, não se sujeitando a critérios subjetivos ou fáticos. In casu, o Paciente confessou a subtração, logo, ainda que tenha negado o emprego de ameaça contra a vítima, impõe-se a aplicação da atenuante. 3. A Terceira Seção desta Corte Superior de Justiça, após o julgamento do EREsp n.º 1.154.752/RS, pacificou o entendimento no sentido

da inexistência de preponderância entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, a teor do art. 67 do Código Penal, pelo que é cabível a compensação dessas circunstâncias . 4. Estabelecida a pena-base no mínimo legal, porque favoráveis as circunstâncias judiciais, a condição de reincidente não impede a fixação de regime prisional intermediário, nos termos da Súmula n.º 269 do Superior Tribunal de Justiça. Precedentes. 5. Ordem de habeas corpus parcialmente concedida, para, mantida a condenação, fixar a pena do Paciente em 04 anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e pagamento de 10 dias-multa. (STJ - HC XXXXX / SP, Quinta Turma STJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 27/08/2013)

Da mesma forma, é de se anotar que o instituto da confissão espontânea, ainda que parcial como na hipótese, tem por objetivo o estímulo à verdade processual, revestindo-se de fundamental importância para a certeza quanto à condenação. Não obstante subsistirem entendimentos no sentido de que a reincidência possa indicar inadaptação ao meio social, era de rigor compensá-la com a atenuante da confissão, pois o artigo 67 do CP não autoriza desprezar-se esta última. A pena deve ficar mais próxima da circunstância preponderante e se a confissão diz respeito à personalidade do autor do delito, tem valor equivalente a reincidência, devendo por isso anular o aumento aplicado em face desta. (TJ SP - Apelação nº XXXXX-14.2012.8.26.0506, REL. Figueiredo Gonçalves - 16/12/2013).

II.3 - Da fixação de regime menos gravoso

Em caso de acolhimento dos pedidos relacionados a dosimetria, acima expostos, imperiosa será a alteração do regime inicial para cumprimento de pena.

O Apelante é PRIMÁRIO e as circunstâncias, o dolo e a culpabilidade do agente são normais para a espécie, não tendo havido nenhum excesso ou peculiaridade que aumentasse a gravidade inerente ao crime .

Além disso, a pena base foi mantida no mínimo legal, demonstrando que as circunstâncias judiciais são favoráveis.

Ainda que não sejam acolhidos os pedidos acima deduzidos, ficando a pena acima do limite de 4 anos para o regime aberto, a fixação não pode se dar apenas com base na quantidade de pena, devendo-se observar o caso concreto e as circunstâncias pessoais do Apelante, sendo, neste caso, absolutamente recomendável e razoável a imposição de regime menos gravoso, por todo o exposto anteriormente nestas razões de apelação.

Estabelecendo o regime semiaberto, a fundamentação apontada pelo douto Magistrado não se coaduna com o princípio constitucional da individualização da pena e é absolutamente inidônea, visto que não demonstrada a necessidade concreta da imposição de regime mais gravoso que o autorizado de acordo com a pena aplicada.

Com efeito, o princípio da proporcionalidade determina que a pena imposta ao condenado, assim como a forma de seu cumprimento, deve ser não apenas adequada, como também necessária e proporcional, em sentido estrito, ao alcance da sua função ressocializadora e preventiva, não sendo razoável aplicar-se sanção mais gravosa do que aquela indispensável para a concretização de tais finalidades.

Por sua vez, o princípio da individualização da pena exige que no momento de fixação da reprimenda e de seu regime de cumprimento o magistrado leve em consideração as circunstâncias pessoais do condenado e o fato concreto por ele praticado, de modo que a imposição de regime mais gravoso do que aquele admitido em razão da pena tão somente com base na natureza ou gravidade em abstrato do delito afronto referido princípio.

Vale lembrar, ainda, que constitui entendimento sumulado pelo

c. Supremo Tribunal Federal que se faz necessária motivação idônea para a imposição de regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permite ( Súmula 719 do STF) .

Nesse sentido, tem-se a Súmula 440 do STJ que veda o estabelecimento de regime inicial mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta com base na gravidade em abstrato do delito.

Portanto, considerando o total da pena aplicada - ainda passível de ser reduzida - e as circunstâncias do caso concreto, requer-se que o Apelante cumpra a pena imposta em regime aberto .

II.4 - Da substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos. Fato ocorrido antes da Lei nº 14.071/2020. Inaplicabilidade do artigo 312-B do CTB.

O d. Magistrado de primeiro grau entendeu pela não substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos. Contudo, mostra- se imperiosa a substituição da pena. Senão vejamos.

De início, destaque-se que, de acordo com o art. 44, I , parte final do CP, nos casos de crime culposo , é possível a substituição QUALQUER QUE SEJA A PENA APLICADA , não se aplicando o limite de 4 anos. Nesta banda, mesmo que não se aplique tal limite, considerando a proporcionalidade e razoabilidade partindo de tal parâmetro, cabe salientar que o Apelante foi condenado a uma pena de 5 anos e 10 meses, não muito acima dos 4 anos, o que mostra totalmente razoável e proporcional a substituição.

Ademais, o delito foi cometido sem violência e grave ameaça, o Apelante é PRIMÁRIO e preenche os requisitos subjetivos, como exige o artigo 44 do CP.

Não obstante, o crime ocorreu antes da publicação da Lei 14.071/2020 que inseriu o artigo 312-B do CTB, sendo, portanto, inaplicável tal dispositivo em razão da irretroatividade da lei mais grave. É esse o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS. ART. 302, § 3.º, DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA

PRIVATIVA DE LIBERDADE POR SANÇÕES RESTRITIVAS DE DIREITOS. POSSIBILIDADE, NO CASO DE CRIMES CULPOSOS. CONDUTA PRATICADA ANTES DA EDIÇÃO DA LEI N. 14.071/2020. ART. 44, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. JURISDIÇÃO ORDINÁRIA QUE SE LIMITOU A INDICAR CIRCUNSTÂNCIAS INERENTES AO TIPO PENAL PARA CONSIDERAR A MEDIDA NÃO SOCIALMENTE RECOMENDÁVEL. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA. 1. Paciente condenado pela prática do crime previsto no art. 302, § 3.º, do Código de Trânsito Brasileiro, às penas de 5 (cinco) anos de reclusão e 3 (três) meses de suspensão da habilitação. 2. Como regra, a possibilidade de substituição da pena reclusiva por reprimendas restritivas de direito é legalmente cabível para penas maiores de quatro anos, no caso de crimes culposos, nos termos do art. 44, inciso I, in fine, do Código Penal. 3. Outrossim, o crime foi praticado pelo Paciente em 13/07/2018, ou seja, antes da edição da Lei n. 14.071/2020, que acrescentou ao Código de Trânsito Brasileiro o art. 312-B - dispositivo que prescreveu que "[a]os crimes previstos no § 3º do art. 302 e no § 2º do art. 303 deste Código não se aplica o disposto no inciso I do

caput do art. 44 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940". Portanto, é indiscutível que não há vedação legal para que, no crime de homicídio culposo na direção de veículo cometido sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência, praticado antes do início da vigência da nova redação do art. 312-B do CTB, ocorra a substituição da reprimenda reclusiva por sanções restritivas de direito s. 4. No caso, a Corte a quo limitou-se a consignar circunstâncias inerentes às elementares do tipo para afastar a medida, quais sejam, a gravidade da conduta e a influência de álcool. Por outro lado, o Tribunal local não esclareceu se o Paciente trafegava acima da velocidade permitida (o que não está evidente nos atos decisórios proferidos pelas instâncias ordinárias, notadamente porque na Rodovia Anhanguera há trechos em que o limite é de 110 km/h), nem ressaltou se a quantidade de álcool ingerido era exacerbada. 5. A Justiça Estadual deixou de consignar motivação válida para afastar o direito do Condenado - notadamente porque concorre, em seu benefício, as circunstâncias de que a prova dos autos demonstrou que a luz traseira da motocicleta em que colidiu estava desligada, e de que no cálculo da pena o

Tribunal estadual assinalou a primariedade do réu, seus bons antecedentes, que a Documento: XXXXX - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2021 Página 1 de 4 Superior Tribunal de Justiça conduta não extrapolou a culpabilidade normal e as consequências são próprias do delito. 6. "A favorabilidade das circunstâncias mencionadas evidencia que a substituição da pena se mostra medida socialmente recomendável" (STJ, HC XXXXX/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 23/03/2021, DJe 29/03/2021).

7. Em suma, na hipótese, a Jurisdição ordinária, ao deduzir que a substituição da reclusão por sanções restritivas de direitos não era socialmente recomendável pelo mero fato de que o Paciente ingeriu bebida alcoólica, sem declinar conjuntura extraordinária, esvaziou o permissivo legal que garantia a referida substituição a condenados pelo delito do art. 302, § 3.º, do Código de Trânsito Brasileiro, de forma apriorística - ou seja, sob fundamento que constituiria igual óbice a todos os réus nessa situação, indistintamente. Ocorre que, conforme já decidiu a Suprema Corte, a vedação, a priori, da conversão da pena corporal por sanções restritivas de direitos "não pode ser admitida, eis que se revela manifestamente incompatível com o

princípio da individualização da pena, entre outros postulados consagrados pela Constituição da Republica, independentemente da gravidade objetiva do delito" (HC XXXXX/PI, Rel. Ministro CELSO DE MELLO, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/05/2013, DJe 23/09/2014). 8. No mais, concluir que as instâncias ordinárias não se valeram do melhor direito para afastar a possibilidade de substituição da pena reclusiva não implica reavaliar fatos e provas, mas apenas reconhecer que não foi consignada, no caso, fundamentação válida pelo Tribunal de origem - ônus do qual a Corte estadual não se desincumbiu, por tratar-se do sistema acusatório. 9. Ordem de habeas corpus concedida para determinar ao Tribunal de origem que substitua a pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos, nos termos do art. 312-A, do Código de Trânsito Brasileiro . (STJ - HC XXXXX SP 2021/XXXXX-5, Relator: Ministra Laurita Vaz, Data de Julgamento: 22/06/2021, T6 - Sexta Turma, Data de Publicação: DJE 30/06/2021 - grifos nossos)

No mais, a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos é um direito público do réu e, preenchido os requisitos legais, como no caso, não pode ser negada.

Esse direito é constitucionalmente garantido, especialmente à luz da individualização e proporcionalidade da pena, como decide o STF:

Habeas Corpus. 2. Tráfico ilícito de entorpecentes. Paciente condenado à pena de um ano e oito meses de reclusão. 3. Pedido de fixação de regime aberto para o início do cumprimento da pena. Possibilidade. Paciente que cumpre os requisitos previstos no art. 33, § 2º, c, do Código Penal. 4. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Possibilidade. Precedente do Plenário (HC n. 97.256/RS). 5. Necessidade de análise dos requisitos dispostos no art. 44 do CP. 6. Ordem deferida. (STF. HC XXXXX/SP. Rel. Min. Gilmar Mendes. J. 08/02/2011. DJ 22/02/2011 - grifos nossos)

Assim, a quantidade de pena imposta, a primariedade e a ausência de violência ou grave ameaça, aliadas à adequabilidade da medida, levam ao cabimento da pena restritiva de direitos.

O cumprimento da pena em privação de liberdade pode frustrar os fins da pena e da manutenção da paz social. Isto porque o indivíduo é levado a um ambiente desumano e criminógeno, havendo tratamento desproporcional às suas ações. A pena restritiva de direitos surgiu justamente em razão desse cenário.

Ressaltando o defendido, o relatório de atividades da comissão temporária de acompanhamento do sistema prisional do CNJ concluiu o seguinte:

A terceira constatação traduz-se na necessidade de maior aplicação das penas alternativas, nas condenações criminais. Mister ressaltar que a referida aplicação deve estar acompanhada de sólidos programas de reinserção social, nos quais se demonstrasse ao preso o que deveria ser feito, em termos de disciplina, para lhe tornar merecedor daquele benefício. Outro dado não menos relevante, no que tange aos resultados práticos obtidos com as penas alternativas, está evidenciado em atuais estudos que demonstram um baixo índice de reincidência entre os beneficiários de tais medidas. (Conselheiros Jorge Antonio Maurique, Rui Stoco, José Adonis, Felipe Locke e Marcelo Nobre, 10/02/2009)

Assim, em estando presentes os requisitos subjetivos e objetivos, requer seja substituída a pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos.

DOS PEDIDOS

Com base nas argumentações acima, requer seja o réu ABSOLVIDO, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal . Caso não seja esse o entendimento, que sejam acolhidos os pedidos subsidiários , suso aludidos.

São Paulo, 31 de agosto de 2021.

LEONARDO GONÇALVES FURTADO LIMA

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