Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
20 de Junho de 2024
    Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

    Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

    Tribunal Superior Eleitoral TSE - RECURSO ORDINARIO: RO-El XXXXX-45.2022.6.19.0000 RIO DE JANEIRO - RJ XXXXX - Inteiro Teor

    Tribunal Superior Eleitoral
    há 2 anos

    Detalhes

    Processo

    Partes

    Publicação

    Julgamento

    Relator

    Min. Benedito Gonçalves

    Documentos anexos

    Inteiro TeorTSE_RO-EL_06030074520226190000_83a52.pdf
    Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

    Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

    Inteiro Teor

    TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

    ACÓRDÃO

    RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL Nº XXXXX-45.2022.6.19.0000 - RIO DE JANEIRO - RIO DE JANEIRO

    Relator: Ministro Benedito Gonçalves

    Recorrente: Wilson José Witzel

    Advogado: Ricarlos Almagro Vitoriano Cunha - OAB: 91993/RJ

    Recorrida: Daniella Monteiro da Silva

    Advogado: Rodrigo Burgos de Azevedo Mangabeira - OAB: XXXXX/RJ

    Recorrido: Renan Ferreirinha Carneiro

    Advogados: Gabriel Gomes Ferreira de Oliveira Lima - OAB: XXXXX/SP e outro

    Recorrido: Ministério Público Eleitoral

    RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2022. GOVERNADOR. REGISTRO DE CANDIDATURA. INDEFERIMENTO.

    1. Recurso ordinário interposto contra acórdão unânime do TRE/RJ, que indeferiu o registro de candidatura do recorrente ao cargo de governador do Rio de Janeiro nas Eleições 2022 diante da inelegibilidade do art. , I, c , da LC 64/90, da inabilitação para exercer função pública e da ausência de certidões de objeto e pé relativas a processos da Justiça Estadual de segundo grau.

    INELEGIBILIDADE. ART. , I, C , DA LC 64/90. PERDA. MANDATO. INFRINGÊNCIA. CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. CONFIGURAÇÃO. EXAME. ASPECTOS. CONDENAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA XXXXX/TSE.

    2. Consoante o art. , I, c , da LC 64/90, são inelegíveis "o Governador e o Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal e o Prefeito e o Vice-Prefeito que perderem seus cargos eletivos por infringência a dispositivo da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término do mandato para o qual tenham sido eleitos".

    3. Na linha do entendimento desta Corte, é despiciendo que o ato de decretação de perda do mandato contenha referência expressa à Constituição Estadual, bastando compatibilidade material desta com os dispositivos que fundamentaram o édito condenatório.

    4. A inelegibilidade do art. , I, c , da LC 64/90 incide quando a perda do cargo fundar-se na Lei 1.079/50 ou no DL 201/67, que constituem extensão das Constituições Estaduais e das Leis Orgânicas em matéria de crimes de responsabilidade. Precedentes.

    5. No caso, o recorrente teve decretada a perda do cargo de governador, em 30/4/2021, por órgão misto integrado pelos poderes Legislativo e Judiciário do Rio de Janeiro, pela prática de crime de responsabilidade, com inabilitação para o exercício de função pública pelo prazo de cinco anos.

    6. Os arts. , V, e , item 7, da Lei 1.079/50 - que ensejaram o decreto e segundo os quais são crimes de responsabilidade atos que ofendam a probidade administrativa e a dignidade, a honra e o decoro do cargo - guardam inteira compatibilidade material com o art. 146, V, da Constituição do Rio de Janeiro.

    7. Inviável apreciar a tese de nulidade do processo de cassação. Conforme a Súmula XXXXX/TSE, "não cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas por outros órgãos do Judiciário ou dos tribunais de contas que configurem causa de inelegibilidade".

    8. Não é relevante para o desfecho da controvérsia a alegação de que a validade do decreto estaria sendo discutida na Justiça Comum, o que por si só não afasta o art. , I, c , da LC 64/90.

    9. Inelegibilidade - que se constitui a partir da valoração negativa de determinado fato, repercutindo na capacidade eleitoral passiva - não se confunde com crime de responsabilidade (Lei 1.079/50), infração político-administrativa que culmina na perda do cargo e na inabilitação para exercer função pública.

    INABILITAÇÃO. EXERCÍCIO. FUNÇÃO PÚBLICA. PRAZO. CINCO ANOS. ABRANGÊNCIA. EXERCÍCIO. MANDATO ELETIVO. PRECEDENTE.

    10. A perda do cargo do recorrente, decretada em 30/4/2021, também acarretou sua "inabilitação por cinco anos para o exercício de qualquer função pública".

    11. Em caso análogo, consoante a Suprema Corte, "compreende-se o desempenho de mandato eletivo na pena de inabilitação temporária para o exercício de função pública, cominada no parágrafo único do art. 52 da Constituição" ( RE XXXXX/DF, Rel. Min. Octavio Gallotti, 1a Turma, DJ de 12/5/2000).

    CERTIDÕES DE OBJETO E PÉ. JUSTIÇA ESTADUAL DE SEGUNDO GRAU. PENDÊNCIA.

    12. Apesar de pontual desencontro no caso - o candidato fora instado a trazer certidão criminal da Justiça Estadual de segundo grau, porém na intimação houve referência a três feitos cíveis -, de todo modo não se apresentou certidão de objeto e pé quanto ao quarto

    processo, mesmo nas razões do recurso ordinário.

    CONCLUSÃO.

    13. Recurso ordinário a que se nega provimento, determinando-se a imediata cessação de atos de campanha (art. 16-A da Lei 9.504/97) e do recebimento de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

    Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao recurso ordinário eleitoral, mantendo o indeferimento do pedido de registro de candidatura de Wilson José Witzel ao cargo de governador do Rio de Janeiro nas eleições de 2022, devendo cessar de imediato a prática de atos de campanha, incluído o horário eleitoral gratuito e o recebimento de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, nos termos do voto do relator.

    Brasília, 27 de setembro de 2022.

    MINISTRO BENEDITO GONÇALVES - RELATOR

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES: Senhor Presidente, trata-se de recurso ordinário interposto por Wilson José Witzel, candidato ao cargo de governador do Rio de Janeiro nas Eleições 2022, contra acórdão proferido pelo TRE/RJ assim ementado (ID 158.071.474):

    ELEIÇÕES 2022. REQUERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. CANDIDATO A GOVERNADOR. IMPUGNAÇÃO. CONDENAÇÃO POR CRIME DE RESPONSABILIDADE (IMPEACHMENT). INABILITAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DE QUALQUER FUNÇÃO PÚBLICA. CONSEQUENTE IMPOSSIBILIDADE DE SE CANDIDATAR A CARGO ELETIVO. INELEGIBILIDADE. ART. , I, C, DA LC 64/90. AUSÊNCIA DE CERTIDÕES DE OBJETO E PÉ. INDEFERIMENTO DO REGISTRO. TUTELA DE URGÊNCIA. SUSPENSÃO EXCEPCIONAL DA UTILIZAÇÃO DO HORÁRIO ELEITORAL GRATUITO E DO ACESSO A VERBAS PÚBLICAS. DEVOLUÇÃO DOS RECURSOS PÚBLICOS RECEBIDOS E NÃO UTILIZADOS.

    1. A condenação do impugnado à perda do cargo de Governador do Estado do Rio de Janeiro e à inabilitação para o exercício de qualquer função pública pelo prazo de 5 anos, em razão do cometimento de crime de responsabilidade, com base no art. 4º, inciso V, e art. , item 7, da Lei nº 1.079/1950, torna inviável a candidatura por ele pleiteada, por dois motivos.

    2. Em primeiro lugar, a inabilitação para o exercício de qualquer função pública pelo prazo de 5 anos tem como consequência a impossibilidade de se candidatar a cargo eletivo enquanto perdurar a sanção, uma vez que é evidentemente inviável a candidatura de alguém que se encontra impedido de exercer as funções inerentes ao cargo. Precedente do TSE.

    3. Segundo, a condenação do impugnado à perda do cargo eletivo atrai a incidência da causa de inelegibilidade estabelecida no art. , I, c, da Lei Complementar nº 64/90.

    4. O art. 146 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro estabelece que são crimes de responsabilidade os atos do Governador do Estado que atentarem contra a Constituição da Republica, a do Estado e, especialmente, contra a probidade na administração (inciso V), entre outras hipóteses, enquanto o parágrafo único do mesmo artigo dispõe que a definição dos crimes de responsabilidade é a estabelecida por lei federal.

    5. A lei federal mencionada pelo referido dispositivo é, justamente, a Lei nº 1.079/50, que foi indicada como fundamento legal na condenação do impugnado. Dessa forma, a Lei nº 1.079/50 complementa o disposto no art. 146 da Constituição Estadual e, por tal motivo, deve ser considerada como extensão da aludida norma constitucional.

    6. De acordo com a jurisprudência atual do TSE, não é necessário que o ato extintivo do mandato faça remissão expressa a dispositivo da Constituição estadual ou da lei orgânica, sendo suficiente que haja compatibilidade material entre o dispositivo legal que fundamentou a condenação e o dispositivo da Constituição estadual ou da lei orgânica tido por violado, como ocorre no presente caso.

    7. Não há antinomia entre o art. da LC 64/90 e o art. 78 da Lei nº 1.079/50. A inelegibilidade estabelecida nas alíneas do inciso I do art. da LC 64/90 não constitui sanção a ser aplicada nas decisões ali mencionadas, mas efeito secundário delas, na medida em que são consideradas como fatos que revelam a incompatibilidade da vida pregressa do candidato com a probidade administrativa e a moralidade exigidas pelo art. 14, § 9º, da Constituição Federal, como já decidiu por diversas vezes a mais alta Corte eleitoral.

    8. Alegação de nulidade das sanções aplicadas na decisão do Tribunal Especial Misto por extrapolação do prazo previsto no art. 82 da Lei nº 1.079/50. As decisões mencionadas no art. da LC 64/90 são consideradas pela Justiça Eleitoral como fatos ou situações objetivas, e, dessa forma, não estão sujeitos ao exercício do controle jurisdicional por esta Justiça especializada. Súmula nº 41 do TSE. Precedente daquela Corte.

    9. O ajuizamento de mandando de segurança em face da decisão do Tribunal Especial Misto não lhe retira o seu caráter definitivo, ainda que possa, eventualmente, ser suspensa ou cassada. Isso, no entanto, não ocorreu até o momento.

    10. Considerando-se que a decisão do Tribunal Especial Misto não foi suspensa, anulada ou reformada, e não havendo sequer algum fato a indicar a probabilidade de que isso venha a ocorrer, não é possível negar-lhe a produção de seus efeitos.

    11. Além da inabilitação para o exercício de função pública e da incidência da causa de inelegibilidade estabelecida no art. , I, c, da Lei Complementar nº 64/90, o candidato não apresentou todas as certidões de objeto e pé dos processos constantes da certidão da Justiça Estadual de 2º grau.

    12. Mantida a tutela de urgência deferida liminarmente para (i) suspender a utilização do horário eleitoral gratuito pelo impugnado; (ii) suspender o dispêndio de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha pelo impugnado; (iii) suspender a realização de repasses de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha pelo Partido da Mulher Brasileira ao impugnado;

    (iv) estabelecer multa cominatória de 20% em caso de descumprimento da decisão.

    13. Os recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha porventura recebidos pelo candidato que não tenham sido utilizados por ele devem ser devolvidos ao partido, a fim de que possam ser direcionados a candidatos que não estejam impedidos de utilizá-los.

    14. PROCEDÊNCIA das impugnações e INDEFERIMENTO do registro de candidatura, mantendo-se a tutela de

    urgência concedida e determinando-se, ainda, a devolução ao Partido da Mulher Brasileira dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha porventura recebidos pelo candidato que não tenham sido utilizados por ele, no prazo de 5 dias, sob pena de multa diária de 10% do valor a ser devolvido.

    Na origem, o Ministério Público Eleitoral, Daniella Monteiro da Silva (candidata ao cargo de deputado estadual) e Renan Ferreirinha Carneiro (também candidato ao mencionado cargo) impugnaram o registro de candidatura do recorrente com fundamento na inelegibilidade prevista no art. , I, c , da LC 64/90 e na ausência de pleno exercício dos direitos políticos (art. 14, § 3º, II, da CF/88), ambas deduzidas a partir do mesmo fato.

    Apontou-se, em suma, que o candidato tivera decretada a perda do cargo de governador, em decisão proferida em 30/4/2021 pelo Tribunal Especial Misto, composto por integrantes do Poder Legislativo e do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, com inabilitação para o exercício de função pública pelo prazo de cinco anos, em virtude do cometimento de crime de responsabilidade, nos termos dos arts. , V, e , item 7, da Lei 1.079/50.

    O TRE/RJ, de início, acolhendo pedido do Ministério Público, deferiu tutela provisória de urgência para "(i) suspender a utilização do horário eleitoral gratuito pelo impugnado; (ii) suspender o dispêndio de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha pelo impugnado; (iii) suspender a realização de repasses de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha pelo Partido da Mulher Brasileira ao impugnado; (iv) estabelecer multa cominatória de 20% (vinte por cento) em caso de descumprimento da presente decisão" (ID 158.071.450).

    Após o processamento do feito, a Corte de origem, por unanimidade, acolheu as impugnações e indeferiu o registro, assentando também que não foram apresentadas certidões de objeto e pé relativas a processos oriundos da Justiça Estadual de segundo grau. Confirmou-se, ainda, a tutela de urgência concedida.

    Nas razões do recurso ordinário, alegou-se o seguinte (ID 158.071.485):

    a) no que se refere às certidões faltantes, "a suposta omissão teria sido noticiada unicamente pela Procuradoria Regional Eleitoral por ocasião do seu parecer e, portanto, posteriormente à manifestação do candidato, em sua contestação" (fl. 3), de modo que, não observado o contraditório e a ampla defesa, a hipótese é de "decisão surpresa", nos termos do art. 10 do CPC/2015;

    b) de todo modo, "os processos cuja [sic ] certidões não foram juntadas não se referem a feitos criminais" (fl. 4), cuidando-se de ações cíveis;

    c) quanto à cassação por tribunal misto, não há falar em incidência da inelegibilidade do art. , I, c , da LC 64/90, visto que, "pela Lei n.º 1.079/50, a única sanção que pode decorrer da condenação do Governador de Estado pela prática de crime de responsabilidade é a de perda do cargo eletivo e a de inabilitação para o exercício de cargo público pelo prazo de até 5 anos. Todavia, a Lei Complementar prevê a sua inelegibilidade pelo prazo de 8 anos" (fl. 8);

    d) a inelegibilidade também não incide porque "o Tribunal Especial Misto, como visto, impôs ao ora impugnado a sanção de proibição do exercício de qualquer função pública baseado unicamente em dispositivos constantes na Lei n.º 1.079/50", não havendo falar, assim, no requisito de "perda do cargo por infringência a dispositivo da Constituição Estadual" (fl. 16);

    e) "como o impedimento do exercício da função pública está atrelado à prática de crime de responsabilidade, a lei especial, neste caso, é a Lei n.º 1.079/50; não a Lei Complementar n.º 64/90, razão pela qual o consequente normativo a prevalecer aqui é o do art. 78 daquele diploma" (fl. 9);

    f) nulidade do processo de impeachment, visto que o art. 82 da Lei 1.079/50 prevê o prazo de 120 dias para sua

    conclusão, o que não foi observado no caso, em que a acusação foi admitida em 23/9/2020 e o decreto condenatório, por sua vez, ocorreu apenas em 30/4/2021;

    g) a decisão de perda do mandato não é definitiva e "está sendo impugnada judicialmente através de Mandado

    de Segurança, em curso no órgão Especial do TJRJ (processo n.º XXXXX-15.2021.8.19.0000)" (fl. 14).

    Contrarrazões apresentadas (IDs 158.071.493, 158.071.495 e 158.071.497).

    A d. Procuradoria-Geral Eleitoral opinou pela negativa de provimento ao recurso (ID 158.083.291).

    É o relatório.

    VOTO

    O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (relator): Senhor Presidente, conforme se relatou, a hipótese cuida de recurso ordinário interposto contra acórdão unânime do TRE/TJ, que indeferiu o registro de candidatura do ora recorrente ao cargo de governador do Rio de Janeiro nas Eleições 2022, haja vista, de um lado, a inabilitação para exercer função pública e a inelegibilidade do art. , I, c , da LC 64/90, e, de outra parte, a ausência de certidões de objeto e pé de processos constantes de certidão da Justiça Estadual de segundo grau.

    Aprecio, ponto a ponto, a irresignação do recorrente.

    1. Inelegibilidade do Art. , I, c, da LC 64/90

    Consoante o art. , I, c , da LC 64/90, são inelegíveis, pelo prazo remanescente do mandato e nos oito anos seguintes ao seu término, o chefe do Poder Executivo e seus respectivos vices, em âmbito estadual e municipal, que perderem seus cargos por afronta a dispositivos da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município. Confira-se:

    Art. 1º São inelegíveis:

    I - para qualquer cargo:

    [...]

    c) o Governador e o Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal e o Prefeito e o Vice-Prefeito que

    perderem seus cargos eletivos por infringência a dispositivo da Constituição Estadual , da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término do mandato para o qual tenham sido eleitos ;

    [...]

    O Tribunal Superior Eleitoral estabeleceu, em sua jurisprudência, duas premissas decisivas para a aplicação da mencionada causa de inelegibilidade.

    Em primeiro lugar, é despiciendo que o ato de decretação de perda do mandato contenha referência expressa à Constituição Estadual, bastando sua compatibilidade material frente aos dispositivos que fundamentaram o édito condenatório. Confira-se:

    ELEIÇÕES 2020. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. RRC. VEREADOR. INDEFERIMENTO NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. INELEGIBILIDADE. ALÍNEA B . CASSAÇÃO POR QUEBRA DE DECORO. ATO EXTINTIVO DE MANDATO FUNDAMENTADO TÃO SOMENTE EM DISPOSITIVO DO DECRETO-LEI Nº 201/1967. CORRESPONDÊNCIA COM DISPOSITIVO DE LEI ORGÂNICA MUNICIPAL E COM O ART. 55, II, DA CF. DESNECESSIDADE DE REMISSÃO EXPRESSA A DISPOSITIVO DE CONSTITUIÇÃO ESTADUAL OU LEI ORGÂNICA. COMPATIBILIDADE MATERIAL. EXISTÊNCIA. INELEGIBILIDADE CARACTERIZADA. JURISPRUDÊNCIA JÁ APLICADA À INELEGIBILIDADE DELINEADA NA ALÍNEA C DO INCISO I DO ART. DA LC Nº 64/1990. TRATAMENTO ISONÔMICO E CONGRUENTE ENTRE OS DISPOSITIVOS. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

    [...]

    2. A decisão agravada manteve o aresto regional em razão de haver jurisprudência deste Tribunal Superior - atinente à alínea c do inciso I do art da LC nº 64/1990 - pela desnecessidade de que o ato extintivo do mandato faça remissão expressa a dispositivo de Constituição estadual ou lei orgânica tido por violado, desde que haja compatibilidade material entre os dispositivos .

    [...]

    4. Assim, revela-se despiciendo que o ato extintivo de mandato seja fundamentado diretamente em dispositivo de lei orgânica municipal ou Constituição estadual, desde que os referidos normativos também disciplinem a hipótese que culminou na perda do cargo ou mandato e, por conseguinte, na inelegibilidade do candidato.

    [...]

    (AgR-REspEl XXXXX-40/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJE de 3/8/2021) (sem destaques no original)

    Como desdobramento, esta Corte também reconhece que a inelegibilidade incidirá sempre que a perda do cargo estiver fundamentada na Lei 1.079/50 ou no DL 201/67, por representarem verdadeira extensão das Constituições Estaduais e das Leis Orgânicas em matéria de crimes de responsabilidade.

    De fato, como bem salienta Rodrigo López Zilio, "a cassação de mandato [...] com base, respectivamente, na Lei nº 1.079/1950 e no Decreto-Lei nº 201/1967 também pode gerar essa inelegibilidade, sobremodo quando a Constituição Estadual ou a Lei Orgânica fizer expressa remissão à aludida legislação [...]" (Direito Eleitoral. 6. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2020. p. 269).

    Nesse sentido:

    ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. ART. , I, ‘c’, da LC 64/90. SÚMULA XXXXX/TSE. DESPROVIMENTO.

    [...]

    2. O TRE/SP manteve o indeferimento do registro de candidatura do Agravante em razão da incidência da inelegibilidade prevista pelo art. , I, c , da LC 64/1990. Extrai-se do acórdão regional que "o recorrente teve cassado seu mandato de Prefeito [...] em razão de condutas tipificadas no artigo 4.º, incisos III, VII e VIII, do Decreto-Lei nº 201/67".

    3. Esta CORTE SUPERIOR firmou o entendimento de que "aludida causa de inelegibilidade incidirá sempre que houver a violação das disposições contidas no Decreto-Lei nº 201/1967 na medida em que se afiguram extensões das Constituições estaduais e nas Leis Orgânicas, distrital ou municipal, em temas de crimes de responsabilidade" RO XXXXX (redator designado Min. EDSON FACHIN, PSESS em 3/10/2018).

    [...]

    (AgR-REspEl XXXXX-95/SP, Rel. Min. Alexandre de Moraes, publicado em sessão em 9/12/2020) (sem destaques no original)

    No caso dos autos , é inequívoco que o recorrente teve decretada a perda do cargo de governador, em decisão proferida em 30/4/2021 pelo Tribunal Especial Misto, composto por integrantes dos poderes Legislativo e Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, com inabilitação para o exercício de função pública pelo prazo de cinco anos, diante do cometimento de crime de responsabilidade, nos termos do arts. , V, e , item 7, da Lei 1.079/50. Veja-se:

    Crime de Responsabilidade. Denúncia contra o Governador do Estado do Rio de Janeiro . Incidência da Lei Federal nº 1.079/1950, segundo as balizas da Súmula Vinculante nº 46 e do julgamento de mérito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 378-DF, ambos do Supremo Tribunal Federal. Competência do Tribunal Especial Misto. Pandemia reconhecida pela Organização Mundial de Saúde, em 11 de março de 2020. Imputações de improbidade na administração e conduta incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo de Governador do Estado , em virtude da requalificação supostamente delituosa do Instituto Unir Saúde, bem como da alegada improbidade da avença com o Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde. Fatos sobejamente comprovados. Incidência, em ambos os eixos da Denúncia, do art. , item 7, da Lei Federal nº 1.079/1950 . Culpabilidade configurada. Circunstâncias e consequências dos crimes de responsabilidade que determinam a condenação , em ambos os eixos, à perda do cargo eletivo e à consequente inabilitação por cinco anos para o exercício de qualquer função pública , nos termos do caput do art. 78 do mesmo diploma.

    (sem destaques no original)

    Os mencionados dispositivos estabelecem que são crimes de responsabilidade os atos que atentem contra a probidade administrativa e, nesse contexto, a atuação incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo:

    Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra:

    [...]

    V - A probidade na administração;

    ----------------------------------

    Art. 9º São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração:

    [...]

    7 - proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo.

    Essas normas, por sua vez, encontram plena correspondência no art. 146, V, da Constituição do Rio de Janeiro, segundo o qual constituem crimes de responsabilidade do chefe do Executivo os atos que atentem contra a "probidade na administração".

    Desse modo, atendeu-se de modo pleno o requisito da compatibilidade material entre os dispositivos que fundamentaram a perda do mandato e aqueles constantes da Constituição Estadual.

    Além disso, as demais alegações do recorrente de igual modo não merecem prosperar.

    No que se refere à tese de nulidade do processo de cassação - por suposto excesso prazo -, a

    Súmula XXXXX/TSE é cristalina no sentido de que "não cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas por outros órgãos do Judiciário ou dos tribunais de contas que configurem causa de inelegibilidade". Nessa mesma linha:

    [...]

    11. A competência para análise de eventual nulidade em decreto legislativo é da Justiça Comum e não

    desta Justiça Especializada, nos termos da Súmula nº 41/TSE.

    [...]

    (AgR-REspEl XXXXX-14/SP, Rel. Min. Edson Fachin, DJE de 16/8/2021) (sem destaque no original)

    Quanto ao argumento de que o decreto não ostentaria caráter definitivo, pelo fato de sua validade estar sendo discutida no âmbito da Justiça Comum, a alegação não possui relevância para o desfecho da controvérsia.

    Em primeiro lugar, porque o caráter de definitividade do decreto de perda do cargo não está previsto no art. , I, c , da LC 64/90 como um dos requisitos para incidência do óbice à capacidade eleitoral passiva.

    Em segundo lugar, essa interpretação ofenderia de modo frontal o espírito da Lei de Inelegibilidades, que, alterada pela LC 135/2010 (conhecida como"Lei da Ficha Limpa"), alterou profundamente o regramento então vigente e passou a estabelecer em inúmeros dispositivos a desnecessidade de pronunciamento definitivo.

    Por fim, inexiste qualquer incompatibilidade entre a Lei 1.079/50 e a Lei de Inelegibilidades, que disciplinam matérias absolutamente distintas.

    Com efeito, enquanto a Lei 1.079/50 "define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento", a Lei Complementar 64/90 "estabelece, de acordo com o art. 14, § 9º da Constituição Federal, casos de inelegibilidade , prazos de cessação, e determina outras providências". Confira-se, no ponto, o dispositivo constitucional em apreço:

    Art. 14. [omissis]

    [...]

    § 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

    Inelegibilidade não se confunde com crimes de responsabilidade . Estes, na lição de Gilmar Mendes, Inocêncio Mártires e Paulo Gonet Branco, consistem em "infrações político-administrativas que dão ensejo à perda do cargo e à inabilitação para o exercício de função pública" (Curso de Direito Constitucional . São Paulo: Saraiva, 2007. p. 878), ao passo que aquela representa "fator negativo cuja presença obstrui ou subtrai a capacidade eleitoral passiva do nacional, tornando-o inapto para receber votos e, pois, exercer mandato representativo" (Direito Eleitoral. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 225).

    Por todas essas razões, verifica-se que o recorrente se encontra inelegível para as Eleições 2022.

    2. Inabilitação para Exercer Função Pública

    A perda do cargo de governador do recorrente - decretada, reitere-se, em 30/4/2021 pelo Tribunal Especial Misto pela prática de crimes de responsabilidade - também acarretou sua "inabilitação por cinco anos para o exercício de qualquer função pública".

    Trata-se de sanção que, por sua natureza e abrangência, de igual modo compreende a

    impossibilidade de exercício de mandato eletivo durante esse período.

    Nesse sentido, assim já decidiu a c. Suprema Corte em julgado envolvendo ex-presidente da República, cuja hipótese é análoga à dos presentes autos:

    Crime de responsabilidade do Presidente da República. Compreende-se o desempenho de mandato eletivo na pena de inabilitação temporária para o exercício de função pública , cominada no parágrafo único do art. 52 da Constituição.

    (STF, RE XXXXX/DF, Rel. Min. Octavio Gallotti, 1a Turma, DJ de 12/5/2000) (sem destaque no original)

    Mais uma vez, portanto, se constata o óbice à candidatura.

    3. Ausência de Certidões de Objeto e Pé - Justiça Estadual de Segundo Grau

    O TRE/RJ também indeferiu o registro sob o fundamento de que "o candidato não apresentou todas as certidões de objeto e pé dos processos constantes da certidão da Justiça Estadual de 2º grau, conforme informou a Secretaria Judiciária" (ID 158.071.474).

    Em consulta aos autos, verifica-se que a pendência diria respeito a "certidão criminal para fins eleitorais da Justiça Estadual de 2º grau, do domicílio do candidato ou da candidata", com o detalhamento "apresentar certidão de objeto e pé relativa aos processos: 0204825-97.2020.819.0001; 0204394- 63.2020.819.0001; 0057189.96-2021.8.19.0000; XXXXX-50.2021.8.19.0000; [...]" (ID 158.071.408).

    No que tange aos três primeiros processos acima, demonstrou-se, no recurso ordinário, que eles dizem respeito a feitos cíveis, de modo que há aparente contradição na exigência de certidão criminal.

    Todavia, no caso específico dos autos essa discussão não possui relevância, visto que:

    a) como se viu, a negativa do registro está sendo mantida com base em dois outros fundamentos autônomos -

    inelegibilidade do art. , I, c, da LC 64/90 e inabilitação para o exercício de função pública;

    b) o recorrente, a despeito de intimado na origem (ID 158.071.408), não apresentou naquela instância certidão

    de objeto e pé relativa ao quarto processo ( XXXXX-50.2021.8.19.0000);

    c) no presente recurso ordinário também não se procedeu à juntada, tampouco se prestaram quaisquer

    esclarecimentos no particular.

    Por essas razões, assim como nos dois primeiros tópicos deste voto, impõe-se manter o indeferimento do registro de candidatura.

    4. Conclusão

    Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário, nos termos do art. 36, § 6º, do RI-TSE. Mantido o indeferimento do registro de candidatura pelo Plenário desta Corte, devem cessar de

    imediato a prática de atos de campanha, incluído o horário eleitoral gratuito (art. 16-A da Lei 9.504/97), e o recebimento de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

    É como voto.

    EXTRATO DA ATA

    RO-El nº XXXXX-45.2022.6.19.0000/RJ. Relator: Ministro Benedito Gonçalves. Recorrente: Wilson José Witzel (Advogado: Ricarlos Almagro Vitoriano Cunha - OAB: 91993/RJ). Recorrida: Daniella Monteiro da Silva (Advogado: Rodrigo Burgos de Azevedo Mangabeira - OAB: XXXXX/RJ). Recorrido: Renan Ferreirinha Carneiro (Advogados: Gabriel Gomes Ferreira de Oliveira Lima - OAB: XXXXX/SP e outro). Recorrido: Ministério Público Eleitoral.

    Decisão: O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao recurso ordinário eleitoral, mantendo o indeferimento do pedido de registro de candidatura de Wilson José Witzel ao cargo de governador do Rio de Janeiro nas eleições de 2022, devendo cessar de imediato a prática de atos de campanha, incluído o horário eleitoral gratuito e o recebimento de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, nos termos do voto do relator.

    Acórdão publicado em sessão.

    Composição: Ministros Alexandre de Moraes (presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

    Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Paulo Gustavo Gonet Branco.

    SESSÃO DE 27.9.2022.

    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tse/1651445525/inteiro-teor-1651445529

    Informações relacionadas

    Tribunal Superior Eleitoral
    Jurisprudênciahá 4 anos

    Tribunal Superior Eleitoral TSE - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL: REspEl XXXXX CAJATI - SP

    Tribunal Superior Eleitoral
    Jurisprudênciahá 2 anos

    Tribunal Superior Eleitoral TSE - Recurso Ordinário Eleitoral: RO-El XXXXX-29.2022.6.21.0000 PORTO ALEGRE - RS XXXXX

    Supremo Tribunal Federal
    Jurisprudênciahá 24 anos

    Supremo Tribunal Federal STF - RECURSO EXTRAORDINÁRIO: RE XXXXX DF