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16 de Junho de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

1ª Turma

Publicação

Julgamento

Relator

EDMILSON ANTONIO DE LIMA
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Inteiro Teor

Identificação

PROCESSO nº XXXXX-37.2022.5.09.0245 (RORSum)

RECORRENTE: MAP SISTEMAS DE SERVICOS LTDA

RECORRIDA: JENIFER RODRIGUES SANTOS

RELATOR: EDMILSON ANTONIO DE LIMA

EMENTA

RESCISÃO INDIRETA. ATRASO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS. FALTA GRAVE DO EMPREGADOR CONFIGURADA. O atraso no pagamento dos salários configura falta grave patronal, suficiente para ensejar o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, d, da CLT, uma vez que o empregado, sem a sua principal fonte de renda, fica impossibilitado de arcar com o seu sustento e com o sustento de sua família, bem como de honrar os compromissos financeiros assumidos. Portanto, deve ser mantida a rescisão indireta do contrato de trabalho, com base no art. 483, d da CLT. Recurso da ré ao qual se nega provimento no particular.

RELATÓRIO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de RECURSO ORDINÁRIO - RITO SUMARÍSSIMO, provenientes da MM. VARA DO TRABALHO DE PINHAIS - PR, sendo RECORRENTE MAP SISTEMAS DE SERVIÇOS LTDA e RECORRIDA JENIFER RODRIGUES SANTOS.

RELATÓRIO

Inconformada com a sentença prolatada no dia 28.02.2023, a ré recorre a este Tribunal.

O contrato de trabalho "sub judice" teve inicio no dia 31.08.2022 e permanecia vigente no ajuizamento.

A presente ação foi ajuizada no dia 15.12.2022, sendo atribuído à causa o valor de R$ 24.461,75.

A parte autora é beneficiária da justiça gratuita, conforme decisão proferida pelo Juízo de origem (sentença, fls. 168).

Recurso da parte ré protocolado no dia 14.03.2023.

Depósito recursal substituído por seguro-garantia e comprovado o recolhimento das custas processuais (fls. 182/190).

Contrarrazões da parte autora protocolada no dia 24.03.2023.

No mais, dispensado o relatório, nos termos do artigo 852-I, "caput", da CLT.

FUNDAMENTAÇÃO

ADMISSIBILIDADE

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, CONHEÇO do recurso ordinário interposto, assim como das respectivas contrarrazões.

Preliminar de admissibilidade

Conclusão da admissibilidade

MÉRITO

Recurso Ordinário da Ré

a) Rescisão Indireta/Verbas Rescisórias/Obrigação de Fazer/ Dano Moral (análise conjunta)

A Ré pede que seja afastada da condenação o pagamento de indenização substitutiva pelo período de estabilidade provisória. Sustenta que "se a Reclamante foi contratada no último dia do mês de agosto, comunicou a sua Supervisora Pâmela, somente em Outubro, foi transferida para o setor der cartas, e abandonou as atividades em novembro. Isso nos mostra, que a Reclamada não foi omissa e nem negligenciou a segurança e saúde de sua funcionária, e muito menos, expôs a empregada a perigo manifesto de mal considerável, como disse o magistrado de piso"(fl. 177).

Afirma que a a autora não apresentou os requisitos autorizadores que lhe dessem direito a estabilidade, haja vista que não houve dispensa dos seus serviços. (fl. 178).

A Recorrente pede também que seja afastada da condenação o pagamento de indenização por danos morais. Afirma que comprovou que efetuou todos os pagamentos e fornecimentos de vales transportes, e se caso houve atraso, não foram reiterados e que "Quanto a modificação da função da gestante, como foi dito acima, a própria testemunha da Reclamante, comprovou que houve modificação de sua função. Além de que, comprovamos que o atestado médico que solicita a recolocação da funcionária, só foi expedido no dia 08/12/2022, data na qual a funcionária NÃO MAIS APARECEU PARA REALIZAR SUAS ATIVIDADES!!! Portanto, documento esse, nem foi entregue a Empresa."(fl. 180)

Destaca-se da r.sentença:

"2. Compensação por dano moral

Para a caracterização do dano moral capaz de ensejar indenização, necessário verificar se dos atos imputados ao empregador resultaram lesões a direitos de personalidade do trabalhador. Afinal, o dano moral define-se pela ofensa aos denominados bens imateriais, ou seja, aqueles inerentes à honra, à intimidade, à vida privada, à integridade corporal, assegurada sua compensação, inclusive, por força de norma constitucional ( Constituição Federal/CF, art. , inc. V e X).

A reclamante elenca, como fatos causadores de dano moral:" 1. descontos indevidos - vale transporte, vale alimentação, inss e faltas que não ocorreram; 2. salários em atraso; 3. não alteração na função da reclamante, devido ao risco de sua gestação "(fl. 10).

Indagada, disse que: a) afastou-se do trabalho em novembro de 2022; b) trabalhava como auxiliar operacional," fazia expedição de carga "; c) comunicou a gravidez ao supervisor em outubro," no momento eles tinham lá um setor onde ficavam as grávidas no local (...), elas ficavam só expedindo cartas (...), no momento que (...) estava grávida, eu fiquei um mês fazendo a minha função normal e assim que falaram que eu ia para o outro setor das cartas eles tiraram o setor das cartas "; d) as demais grávidas passaram a expedir cargas na ocasião," voltaram para o setor, cada um voltou para o teu supervisor "; e) a expedição de cargas exigia movimentação de pesos," tinha que ficar abaixando, levantando e (...) erguendo caixa "; f) informou à supervisora Pâmela a gravidez de risco, embora não se recorde da data; g) o risco de" descolamento de placenta "foi indicado no atestado médico; e h) movimentava caixas de 2 (dois) ou 3 (três) quilogramas.

A preposta narrou que: a) a autora trabalhava como auxiliar operacional; b) a ré foi comunicada da gravidez logo na contratação; c) as gestantes são direcionadas ao setor de recondicionamento," fechando embalagens, cargas menores "; d) o direcionamento da gestante àquele setor depende da apresentação de recomendação médica,"porque até o serviço não é pesado, não precisaria assim numa gravidez normal ser realocado de função"; e) a requerente não informou qualquer limitação ao trabalho; f) a autora não teve suas funções alteradas; g) os auxiliares operacionais lidam com itens de tamanhos variados; h) não houve apresentação de atestado médico relativo a desconforto; e i) a reclamante não solicitou modificação de suas funções, até porque" não foi entregue nenhum documento ".

A testemunha Antônia Fabíola dos Santos descreveu que: a) trabalhou para a requerida entre 29.7.2022 e fevereiro de 2023; b) laborou com a reclamante até novembro ou dezembro de 2022; c) fazia expedições de cargas, tal qual a autora; d) com maior proximidade, no mesmo" layout ", trabalhou pelos 3 (três) meses iniciais com a reclamante; e) Pâmela era a líder, inclusive da autora; f) todos os empregados sabiam que a requerente estava grávida, que inclusive" pediu para ser tirada de onde ela estava porque ela estava com sangramento "; g) viu a autora solicitar a alteração de função a Pâmela," e a Pâmela também comentou com a gente "; h) o trabalho envolve a movimentação de encomendas; i) mais recentemente as grávidas passaram a realizar trabalho apenas consultivo; j) a reclamante chegou a trabalhar com as"cartinhas, que é ficar sentado ali mexendo nas cartas, aí eles tiraram porque acho que não tinha mais espaço para colocar os outros CDL e voltaram ela de novo para as expedições"; k) a requerente não trabalhou nem 1 (um) mês com as cartas; e l) os vales-transportes foram pagos em atraso.

Inicialmente, lícitos os descontos lançados nos contracheques pelas faltas injustificadas a partir da primeira semana de dezembro de 2022, haja vista o incontroverso fato de que a empregada deixou de trabalhar (fl. 127).

Em segundo lugar, quanto aos salários, o artigo 464 da CLT estabelece que a prova do pagamento se dá por meio de recibo devidamente assinado pelo empregado, ou comprovante de depósito em conta bancária, sendo do empregador o ônus de demonstrar a regularidade do adimplemento, por se tratar de fato extintivo do direito do trabalhador. Na hipótese dos autos, há prova da mora salarial, por exemplo quanto ao pagamento do salário de setembro, quitado apenas em 10.10.2022 (fls. 114/115), ou o de outubro, pago em 7 e 9.11.2022 (fls. 112/113). Houve, ainda, pagamento de forma parcelada do salário devido em dezembro de 2022 (fls. 109/111).

Diante do atraso reiterado no pagamento dos salários, aplicável o entendimento firmado pelo egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9ª) na Súmula nº 33, item I, de seguinte sentido:" O atraso reiterado ou o não pagamento de salários caracteriza, por si, dano moral, por se tratar de dano in re ipsa ". Ainda que assim não fosse, a testemunha confirmou que também havia atraso no fornecimento do vale-transporte. Nesse sentido, foram apresentados apenas comprovantes de pagamento para setembro de 2022 (fls. 136/137), sendo presumida a mora nas demais ocasiões ( CLT, art. 818, inc. II).

E, em terceiro lugar, quanto à necessidade de modificação das funções da autora durante a gravidez, Antônia confirmou que a empresa fora cientificada, na pessoa da líder Pâmela, da recomendação médica para que a requerente não mais carregasse peso (fls. 28).

Conquanto a empregadora mantivesse setor de" recondicionamento ", voltado à lotação de gestantes com gravidez de risco, tal qual admitiu a preposta, é incontroverso o fato de que a autora não teve suas funções alteradas. E, no exercício de suas atribuições, demonstrou-se que o trabalho envolvia o deslocamento de peso, daí porque desatendida a recomendação médica dirigida particularmente à autora. Não há dúvidas de que o descaso da empregadora motivou lesão de ordem extrapatrimonial, haja vista a angústia que a requerente experimentou ao perpetuar a atividade profissional em condições tais que os riscos da gravidez foram ainda mais acentuados.

O dano moral é evidente e deve ser compensado.

Sobre o valor a ser fixado, a compensação na esfera extrapatrimonial deve proporcionar um lenitivo para suplantar a dor moral sofrida e traduzir também caráter pedagógico que desestimule a prática de ulterior ato lesivo. Leva-se em conta, ainda, o grau de culpa, o dano em si e suas consequências e as circunstâncias do caso concreto, de sorte a não se estabelecer um valor que seja tão ínfimo que não desestimule a prática de novo ato ilícito, nem tão substancial que propicie enriquecimento sem causa ( CLT, art. 223-G).

Sopesando-se todos esses critérios, reputo razoável a fixação do quantum em R$ 4.000,00 (quatro mil reais) para compensar o dano moral.

Correção monetária na forma da Súmula nº 439 do colendo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

3. Rescisão indireta. Verbas rescisórias. Garantia provisória no emprego. Fornecimento de guias

A parte autora postula o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho celebrado com a ré e a condenação dela ao pagamento das verbas rescisórias decorrentes desta modalidade de extinção contratual, além de outras verbas, sob a alegação de que:

"(...)...está grávida e vem sofrendo descontos indevidos, salários em atraso e outras irregularidades cometidas pela reclamada. Ademais, a obreira encontra-se com gestação de risco, não podendo realizar atividades que envolvam esforço físico. Mesmo comunicando a reclamada seu estado de saúde, e pedindo para ser trocada para uma função que pudesse exercer sentada, nada foi feito pela reclamada"(fls. 7/8).

Como visto, a requerida não vem cumprindo com as obrigações contratuais mais básicas, consistentes na contraprestação tempestiva pelo trabalho efetuado ( CLT, art. 464), além de expor a empregada a perigo manifesto de mal considerável, o que autoriza a rescisão do contrato por falta grave do empregador ( CLT, art. 483, alín. c e d).

Portanto, declaro resolvido o contrato de trabalho em 7.12.2022, data a partir da qual não mais houve trabalho (fls. 85 e 127).

Consequentemente, condeno a parte reclamada ao pagamento de:

a) saldo de salário de 7 (sete) dias de dezembro de 2022;

b) aviso prévio indenizado de 30 (trinta) dias;

c) 4/12 (quatro doze avos) de férias proporcionais, acrescidas de 1/3 (um terço), já se considerando a projeção do aviso prévio;

d) 4/12 (quatro doze avos) de 13º (décimo terceiro) salário proporcional, igualmente considerado o período de aviso prévio.

Exceto férias indenizadas, sobre as demais parcelas incidem os depósitos ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) de 11,2% (onze inteiros e dois décimos por cento). Sobre os valores existentes na conta vinculada, devido o acréscimo de 40% (quarenta por cento).

Ao tempo da rescisão contratual, a autora encontrava-se gestante, com parto previsto para 17.5.2023 (fl. 29).

Com base no artigo 10, inciso II, alínea b do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da CF, a reclamante tem direito à garantia provisória no emprego até 17.10.2023.

Logo, faz jus ao pagamento de indenização substitutiva, equivalente a salários, apenas (fl. 10), relativos ao período de 8.12.2022 e 17.10.2023.

Para fins de liquidação das parcelas acima deferidas, considere-se o salário de R$ 1.446,90 (mil, quatrocentos e quarenta e quatro reais e noventa centavos) - fl. 122.

Condeno a requerida a fornecer à requerente, no prazo de 5 (cinco) dias, Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho (TRCT) com código de saque 01 e guias para habilitação no seguro-desemprego, sob pena de aplicação de multa de R$ 1.000,00 (mil reais), de uma só vez e não reversível à parte reclamante, bem como expedição das guias pela Secretaria do Juízo, com base no que dispõem os artigos 297, 498 e 537 do Código de Processo Civil ( CPC) e 769 da CLT.

Com isso, poderá a autora postular o benefício do seguro-desemprego, após o trânsito em julgado, diretamente junto à Caixa Econômica Federal (CEF), nos termos do que dispõe o artigo 4º (quarto), inciso IV, da Resolução nº 467/2005 do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT), quando, então, deverá comprovar, junto àquele órgão, o preenchimento dos demais requisitos legais. Não há falar em indenização equivalente, à medida que o direito ao seguro-desemprego depende do atendimento das condições definidas pela lei, o que é analisado pelo órgão executivo.

O cumprimento da obrigação de fazer dependerá de prévia intimação da reclamada, depois do trânsito em julgado.)."(fls. 162/166).

Analiso.

a) Rescisão Indireta/ Estabilidade

Na inicial, a autora relatou que "a reclamante está grávida e vem sofrendo descontos indevidos, salários em atraso e outras irregularidades cometidas pela reclamada (...) a obreira encontra-se com gestação de risco, não podendo realizar atividades que envolvam esforço físico. Mesmo comunicando a reclamada seu estado de saúde, e pedindo para ser trocada para uma função que pudesse exercer sentada, nada foi feito pela reclamada, a qual deixou claro que não há outra vaga para a reclamante exercer, e se faltar ao emprego será dispensada POR JUSTA CAUSA. Portanto, diante das inúmeras irregularidades no contrato de trabalho, apresenta-se a presente reclamatória trabalhista com pedido de Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho, por culpa da reclamada."(fl. 8) e que a ré não vem realizando os recolhimentos ao INSS, realizou descontos indevidos em relação faltas injustificadas que não ocorreram e, ainda, que, de forma habitual, a ré realizou o pagamento dos salários em atraso

Por sua vez, a ré defendeu que "A suposta falta de recolhimento do INSS é de facil comprovação, bastava a obreira apresentar um extrato pessoal do"MEU INSS"demonstrando o quanto alegado, e no que se refere a suposta gravidez de risco, a vindicante se esquivou de comprovar que noticiou a reclamada sobre a sua alegada situação de risco, nem mesmo uma cópia do suposto laudo médico, com um recebido do setor competente, foi apresentado. Pelo contrário, nem mesmo no caderno processual foi acostado o laudo médico, foi anexado um fragmento de um documento que a mesma afirma ser um laudo médico, bem como um fragmento de atestado médico, dos quais não é possível extrair nenhuma informação concreta. A vindicante afirma que os descontos realizados em seu holerite, foram indevidos, haja vista que todas as faltas foram justificadas. Porém, a mesma nunca apresentou os supostos documentos a reclamada. Em verdade, excelência, a obreira de maneira reiterada faltou aos serviços, conforme comprovam os registros de jornadas."(fl. 70).

A chamada rescisão indireta pressupõe a vigência do contrato de trabalho, podendo ser decretada a rescisão contratual por decisão da Justiça do Trabalho, diante da constatação das hipóteses previstas no art. 483 da CLT. O art. 483 da CLT estabelece um rol taxativo de motivos que possibilitam ao empregado pleitear a rescisão indireta do contrato de trabalho e a respectiva indenização.

Discorrendo sobre o tema, Ísis de Almeida observa que certas faltas cometidas pelo empregador só autorizam a rescisão indireta quando "é repetida ou dolosa, ou se agrava, de qualquer forma, para tornar insuportável a manutenção do vínculo empregatício". (In: Manual de direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 1988. p. 321).

Com efeito, não só o entendimento doutrinário, mas também o jurisprudencial consideram que o descumprimento de obrigações contratuais por parte do empregador que enseja a rescisão indireta precisa ser grave e prejudicial à subsistência do trabalhador, tornando inviável a manutenção da relação de emprego, porque este consiste, quase sempre, no único meio de sua subsistência.

Ou seja, a rescisão indireta do contrato de trabalho cabe apenas nos casos em que ficar comprovada a culpa do empregador, de sorte a tornar insuportável a continuidade do pacto laboral. Sob essa ótica, é indispensável então que o empregado deixe claro haver um motivo para a sua atitude - dentre os relacionados no art. 483 da CLT -, motivo este que, caso confirmado em Juízo, ensejará a condenação do empregador nas verbas decorrentes do fato. Assim, somente pode-se concluir pela rescisão indireta se as razões mencionadas na petição inicial tiverem sido determinantes do ato do empregado.

Primeiro, cabia à ré comprovar a correta e tempestiva quitação das verbas salariais nos termos do art. 464 da CLT.

No entanto, como bem destacado pelo juízo de origem "há prova da mora salarial, por exemplo quanto ao pagamento do salário de setembro, quitado apenas em 10.10.2022 (fls. 114/115), ou o de outubro, pago em 7 e 9.11.2022 (fls. 112/113). Houve, ainda, pagamento de forma parcelada do salário devido em dezembro de 2022 (fls. 109/111)"(fl. 163).

Destaca-se que se trata de atraso salarial de pelo menos 03 (três) meses

A ausência no pagamento de salários, na forma como verificada no caso "sub judice", configura falta grave patronal, suficiente para ensejar o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, d, da CLT, uma vez que o empregado, sem a sua principal fonte de renda, fica impossibilitado de arcar com o seu sustento e com o sustento de sua família, bem como de honrar os compromissos financeiros assumidos.

Nesse sentido o julgamento do RO XXXXX-94.2014.5.09.0002, publicado em 16/10/2018, no qual atuei como relator e teve como revisor o Exmo. Desembargador Eliázer Antonio Medeiros.

Neste sentido, também, os seguintes precedentes do TST:

RESCISÃO INDIRETA. MORA SALARIAL. CONFIGURAÇÃO. O Decreto-lei n.º 368/1968 apenas repercute nas esferas administrativa, penal e fiscal, e não na trabalhista em sentido estrito. Assim, no âmbito do Direito do Trabalho, a mora contumaz ali albergada somente tem importância para a área da fiscalização a cargo dos órgãos de inspeção do trabalho, não incidindo no campo do direito individual, para fins de caracterização do ato faltoso do empregador. Até porque o prazo previsto no § 1º do artigo 2º do referido diploma legal - três meses - é extremamente longo para ter aplicação no domínio contratual, mormente considerando-se a natureza alimentar do crédito devido ao obreiro. Não é crível que um empregado tenha que aguardar pacificamente mais de noventa dias para receber a contraprestação pecuniária pelo trabalho já realizado. Dessa forma, o atraso no pagamento dos salários, independentemente de configurar a mora contumaz nos moldes do artigo , § 1º, do Decreto-lei n.º 368/1968 e desde que não seja meramente eventual, caracteriza inadimplemento das obrigações contratuais por parte do empregador, ensejando a resolução do contrato por ato culposo da reclamada, na forma do artigo 483, d, da Consolidação das Leis do Trabalho, que dispõe: -o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando (...) não cumprir o empregador as obrigações do contrato-. Lembre-se que o salário é a principal obrigação do empregador no âmbito do contrato de trabalho. Agravo de instrumento a que se nega provimento. ( AIRR - XXXXX-73.2005.5.01.0030 Data de Julgamento: 19/10/2011, Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 28/10/2011).

RECURSO DE REVISTA. 1. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. MORA NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS. O contumaz atraso no pagamento de salários enseja a rescisão indireta do contrato individual de trabalho ( CLT, art. 483, d). Não há que se cogitar, na hipótese, de chancela do trabalhador (pela sua inércia) ou de ausência de imediatidade, de vez que o comportamento faltoso patronal se configure pela reiteração. Recurso de revista conhecido e desprovido. (Processo: RR - XXXXX-19.2009.5.09.0562 Data de Julgamento: 29/9/2010, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 8/10/2010)

Portanto, deve ser mantida a rescisão indireta do contrato de trabalho, com base no art. 483, d da CLT

Não fosse isso, a Autora anexou atestado médico datado de 08.12.2022 (fl. 28) afirmando a necessidade de adequação das atividades da autora. Logo, cabia à ré comprovar que buscou a realocação da autora de função.

A autora afirmou que deu ciência a empresa em outubro/2022 (Pje Mídias 02min12seg)

A única testemunha ouvida, a Sra. Antonia Fabíola, informou que: a) trabalhou para a requerida entre 29.7.2022 e fevereiro de 2023; b) laborou com a reclamante até novembro ou dezembro de 2022; c) fazia expedições de cargas, tal qual a autora; d) com maior proximidade, no mesmo "layout", trabalhou pelos 3 (três) meses iniciais com a reclamante; e) Pâmela era a líder, inclusive da autora; f) todos os empregados sabiam que a requerente estava grávida, que inclusive "pediu para ser tirada de onde ela estava porque ela estava com sangramento"; g) viu a autora solicitar a alteração de função a Pâmela, "e a Pâmela também comentou com a gente"; h) o trabalho envolve a movimentação de encomendas; i) mais recentemente as grávidas passaram a realizar trabalho apenas consultivo; j) a reclamante chegou a trabalhar com as "cartinhas, que é ficar sentado ali mexendo nas cartas, aí eles tiraram porque acho que não tinha mais espaço para colocar os outros CDL e voltaram ela de novo para as expedições"; k) a requerente não trabalhou nem 1 (um) mês com as cartas; e l) os vales-transportes foram pagos em atraso. (Pje Mídias a partir de 05 seg).

Veja que o depoimento da referida testemunha mostra-se em perfeita harmonia com o depoimento da autora e a tese inicial apresentada.

Por outro lado, a preposta afirmou declarou que a) a autora trabalhava como auxiliar operacional; b) a ré foi comunicada da gravidez logo na contratação; c) as gestantes são direcionadas ao setor de recondicionamento, "fechando embalagens, cargas menores"; d) o direcionamento da gestante àquele setor depende da apresentação de recomendação médica, "porque até o serviço não é pesado, não precisaria assim numa gravidez normal ser realocado de função"; e) a requerente não informou qualquer limitação ao trabalho; f) a autora não teve suas funções alteradas; g) os auxiliares operacionais lidam com itens de tamanhos variados; h) não houve apresentação de atestado médico relativo a desconforto; e i) a reclamante não solicitou modificação de suas funções, até porque "não foi entregue nenhum documento" (Pje Mídias 03min53seg).

Em que pese as insurgências recursais, o conjunto probatório favorece a tese inicial de que a ré não ajustou a função da autora mesmo após recomendação médica, o depoimento da Sra. Antonia inclusive destaca que era de conhecimento de todos os empregados que a autora estava grávida e que presenciou a a autora pedindo para ser tirada de onde ela estava porque ela estava com sangramento.

Já a preposta confessou que era de conhecimento da empresa a gravidez e que a autora não foi colocada em outra função. A partir de tal omissão, a parte ré sujeitou a autora a perigo manifesto de mal considerável, enquadrando perfeitamente no art. 483, c da CLT

Assim, correta a r.sentença ao reconhecer a rescisão indireta.

Por fim, considerado que a garantia provisória no emprego decorre de apenas um fato: a gravidez no curso do contrato de trabalho, a garantia provisória no emprego é oferecida sob uma perspectiva objetiva, de sorte que, existindo a gravidez, subsiste a estabilidade da gestante, independentemente, inclusive, do conhecimento do fato pelo empregador. Sendo, a finalidade da norma constitucional é proteger o nascituro e a mãe trabalhadora, em respeito à dignidade de ambos.

Ante o exposto, mantenho.

b) Indenização por danos morais.

O dano moral, na concepção de José Affonso Dallegrave Neto, "se caracteriza pela simples violação de um direito geral de personalidade" (Responsabilidade civil no direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 159).

Para Maurício Godinho Delgado, o "dano moral corresponde a toda dor psicológica ou física injustamente provocada em uma pessoa humana." (Curso de direito do trabalho. 17. ed. rev. atual. e ampl.. São Paulo : LTr, 2018. p. 733).

Os principais bens dessa natureza são aqueles tutelados pela Constituição, em seu art. , X, como a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem, além da incolumidade física e psíquica da pessoa, sendo que o dever de reparação do dano, ainda que puramente moral, encontra-se consolidado no inciso V do art. da Constituição da República, bem como nos arts. 187 e 927, ambos do Código Civil.

Nessa linha de raciocínio, o simples fato de haver ocorrido perturbação decorrente do ato ilícito nas relações psíquicas, na tranquilidade, nos sentimentos, nos afetos de uma pessoa, já é motivo suficiente para se caracterizar o dano moral.

Entretanto, não se pode esquecer que o instituto da indenização por danos morais não pode ser banalizado, nem a Justiça do Trabalho se transformar em instrumento da indústria de indenizações. Cada caso deve ser analisado cuidadosamente, evitando-se exageros e injustiças, e também que qualquer aborrecimento ou descontentamento se transforme em indenização, mesmo porque o fato a ensejar dano à honra ou à dignidade do trabalhador deve ser relevante e devidamente comprovado.

Assim, a condenação decorrente do dano moral só se justifica nos casos em que o ato imputado como causador seja ilícito e de tal modo lesivo que venha a deixar profundas cicatrizes no âmbito psicológico e emocional da pessoa.

O ordenamento jurídico vigente adota, em regra, a teoria da responsabilidade subjetiva, como se extrai do art. 186 do Código Civil, sendo imprescindível, portanto, à reparação do dano moral, a comprovação de três elementos inseparáveis: o ato ilícito, comissivo ou omissivo; o dano efetivo e o nexo de causalidade, sendo que o ônus da prova pertence à parte autora, que deve demonstrar de forma inequívoca a ofensa injusta, a lesão à honra e à dignidade para fazer jus à indenização, pois se trata de fato constitutivo de seu direito (art. 818 da CLT e art. 373, I, do CPC/2015).

No caso em tela, entendo que ficou demonstrado a ré era contumaz no pagamento atrasado dos salários.

Assim, segundo entendimento previsto na Súmula nº 33, deste e. Regional, o atraso reiterado ou o não pagamento de salários caracteriza, por si, dano moral, por se tratar de dano "in re ipsa", que prescinde de prova, diante da presunção de que, em tais situações, o empregado se encontra privado de sua fonte de sustento básica.

Assim dispõe a Súmula 33, deste e. Regional, "in verbis":

"ATRASO REITERADO OU NÃO PAGAMENTO DE SALÁRIOS OU DE VERBAS RESCISÓRIAS. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO.

I - O atraso reiterado ou o não pagamento de salários caracteriza, por si, dano moral, por se tratar de dano in re ipsa;

II - O atraso ou o não pagamento das verbas rescisórias devidas não caracteriza, por si, dano moral, sendo necessária a prova de circunstâncias objetivas ensejadoras do dano".

No que se refere ao valor da indenização, o art. 223-G, da CLT, dispõe que:

Art. 223-G. Ao apreciar o pedido, o juízo considerará:

I - a natureza do bem jurídico tutelado;

II - a intensidade do sofrimento ou da humilhação;

III - a possibilidade de superação física ou psicológica;

IV - os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão;

V - a extensão e a duração dos efeitos da ofensa;

VI - as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral;

VII - o grau de dolo ou culpa;

VIII - a ocorrência de retratação espontânea;

IX - o esforço efetivo para minimizar a ofensa;

X - o perdão, tácito ou expresso;

XI - a situação social e econômica das partes envolvidas;

XII - o grau de publicidade da ofensa."

No caso, considerando os fatores acima, tais como o período de violação do direito, os reflexos sociais e pessoais na vida do empregado, bem como a última remuneração da autora no valor de R$ 1.631,31 (fl. 122), entendo que o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) fixado pelo juízo de origem é adequado a compensar o dano moral sofrida pela autora.

Portanto, mantenho.

b) Honorários Advocatícios

Confiante na reforma, a ré pede a condenação da parte autora ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais. Explica que a regra aplicada é o CPC, art. 98, § 3º, pois a decisão do STF não revogou o artigo 791-A da CLT na sua integralidade, mantendo a previsão de condenação das partes em honorários sucumbências. Portanto, configurado a hipótese de inexistência de suspensão de exigibilidade, deverá a autora ser condenada nos honorários em relação à sua parte sucumbente.(fls. 180/181).

O Juízo de origem fixou:

"7. Honorários advocatícios

Levando-se em consideração a existência de acolhimento das pretensões formuladas, bem como sopesados o grau de complexidade da demanda e a atuação do advogado na causa, condeno a parte passiva ao pagamento de honorários advocatícios em favor do procurador da parte reclamante no importe de 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação a ser apurado em sede de liquidação.

Como não houve pedidos integralmente rejeitados, não há falar em honorários de sucumbência ao procurador da reclamada.

Na forma da decisão proferida pelo excelso STF, em 20.10.2021, por ocasião do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.766, relatada pelo Excelentíssimo Ministro Alexandre de Moraes, sendo a parte bene ficiária da justiça gratuita, não há falar na compensação do valor dos honorários a que foi condenada com os créditos a serem apurados em liquidação de sentença. Observe-se, nesse caso, a suspensão da exigibilidade prevista no artigo 791-A, parágrafo 4º, da CLT, em função do deferimento dos benefícios da justiça gratuita à parte reclamante.

Os honorários advocatícios incidirão sobre o valor líquido da condenação, devidamente apurado em fase de liquidação, depois de deduzidos os descontos fiscais e previdenciários, não obstante a inteligência da OJ nº 348 da SBDI-1 do colendo TST, porque, ao fim e ao cabo, o proveito do empregado não alcança os tributos.

A correção monetária sobre os honorários ora deferidos deverá ser calculada a partir da presente decisão, observados os juros a contar do ajuizamento da demanda porque não foram fixados em quantia certa, mas dependente de liquidação."(fl. 168).

Analiso.

Considerando que se trata de ação que corre sob o rito sumaríssimo, o entendimento deste Colegiado é no sentido de que somente incidirá sobre os pedidos que forem julgados totalmente improcedentes. Em relação aos pedidos julgados parcialmente procedentes, os honorários advocatícios sucumbenciais sobre os valores de tais pedidos ficarão a cargo da parte ré. Estando a sentença nestes termos, nada há a ser deferido.

A ré permanece totalmente sucumbente no feito, uma vez que não há pedidos julgados totalmente improcedentes

Assim, incabível a condenação da parte autora ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais.

Rejeito.

Conclusão do recurso

CONCLUSÃO

Cabeçalho do acórdão

Conclusão

Em Sessão Virtual realizada nesta data, sob a Presidência do Excelentíssimo Desembargador Edmilson Antonio de Lima; presente o Excelentíssimo Procurador Jose Cardoso Teixeira Junior, representante do Ministério Público do Trabalho; computados os votos dos Excelentíssimos Desembargadores Edmilson Antonio de Lima, Neide Alves dos Santos e Nair Maria Lunardelli Ramos; em férias o Exmo. Desembargador Eliazer Antonio Medeiros;

ACORDAM os Desembargadores da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, por unanimidade de votos, CONHECER DO RECURSO ORDINÁRIO EM PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO DA RÉ, assim como das respectivas contrarrazões e, no mérito, por igual votação, NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos da fundamentação.

Custas inalteradas.

Intimem-se.

Curitiba, 16 de maio de 2023.

Assinatura

EDMILSON ANTONIO DE LIMA

Desembargador Relator

vsp 05.04.2022

VOTOS

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