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16 de Junho de 2024
  • 1º Grau
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TJSP • PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL • XXXXX-95.2022.8.26.0562 • 9 do Tribunal de Justiça de São Paulo - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de São Paulo
ano passado

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

9

Juiz

Rodrigo Garcia Martinez

Partes

Documentos anexos

Inteiro Teor0dc07e0331530f1b2498e3fa46ba43be.pdf
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Sentença - Banco - Cartão de crédito consignado - RMC

Processo nº: XXXXX-95.2022.8.26.0562

Classe - Assunto Procedimento Comum Cível - Empréstimo consignado

[Parte Ativa]: Renata de Oliveira

[Parte Passiva]: Banco Inter

R$ 31.000,00

Juiz (a) de Direito: Dr (a). Rodrigo Garcia Martinez

Vistos etc.

I Relatório.

Renata de Oliveira move ação, contra Banco Inter , visando a declaração de inexigibilidade de cartão de cartão de crédito vinculado a contrato de empréstimo cosignado, para afastar a cobrança da reserva de margem consignável de cartão de crédito. Disse, em resumo, que pretendera simples crédito consignado, mas se viu inserido em contrato diverso, relacionado a cartão de crédito. Requereu a declaração de inexistência e a reparação por dano moral, no valor de R$ 10.000,00. Houve pedido de tutela de urgência ee do trâmite prioritário.

Foi deferida a tutela de urgência, bem como o benefício do trâmite prioritário.

A Instituição Financeira apresentou reposta aduzindo, como prejudicais de mérito, a decadência e a prescrição. No mérito alegou, em síntese, que: a) as cobranças estão devidamente discriminadas; b) não houve qualquer vício de consentimento apto a macular a avença; c) deve ser reconhecida a força vinculante dos contratos. Em suma: a parte autora não tem o direito invocado na inicial. Pediu, ao fim, a rejeição do pedido.

Houve réplica.

II FUNDAMENTAÇÃO.

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O pedido é procedente, em parte. Não há necessidade da produção de outras provas, o feito comporta o julgamento antecipado da lide (art. 355, inciso I, do Novo Código de Processo Civil).

As partes são legítimas: o polo ativo da demanda alega a existência de pretensão resistida, justamente do polo passivo. Concorre o interesse processual, tanto no aspecto necessidade, como no concernente à adequação.

Estão presentes, pois, os pressupostos processuais e as condições de ação, assim entendidos como direito abstrato. Se a parte demandante tem razão, ou não, a matéria é de mérito.

Rejeito também as teses de decadência e prescrição, em virtude da natureza do tipo de ação: declaratória de nulidade. Com relação ao pedido condenatório (compensação por danos morais), ele se fundamenta em uma relação contínua (cobranças ilegais em virtude de suposto contrato inexistente), que ainda permanece entre as partes.

Mérito.

No concernente ao mérito, o pedido é procedente, em parte. Este é mais um dos casos, que vêm se multiplicando nos

últimos tempos, referente ao RMC no qual o consumidor se vê vinculado a um contrato de financiamento com o enxerto de contrato de cartão de crédito (este não desejado).

De fato, no caso em tela, a parte autora nega a intenção de contratar cartão de crédito. Pretendia, na realidade, a celebração de empréstimo consignado. E tal fato é evidente, o que pode ser observado nas faturas juntadas com a defesa (fls.345/484), visto que somente são cobradas nas referidas faturas as parcelas do empréstimo que deveria ser na modalidade consignada. Não constam das faturas qualquer compra!

A demais a utilização do termo "consignado" tem potencial enorme para confundir, e induzir o consumidor em erro. Aliás, não será por outro motivo a constatação de que, na quase na totalidade dos contratos atrelados ao cartão de crédito, os consumidores (vítimas) são pessoas vulneráveis, humildes, com baixo padrão de escolaridade e/ou idosos.

Por quais cargas d'água o consumidor iria preferir um contrato "consignado" com cartão, com juros mais elevados, e parcelas mal definidas (por vezes impagáveis), se existe outra modalidade (cosignado propriamente dito), com juros menores e parcelas bem definidas quanto aos valores e o prazo?

Na espécie, a evidência do dano ao consumidor (e da sua causa) é de tal ordem, que a coisa fala por si (the thing speaks for itself ) - res ipsa loquitur.

É nítida a abusividade do banco, que lança a parte consumidora em posição de desvantagem exagerada, relacionando o empréstimo consignado à contratação de cartão de crédito, impondo, contra os interesses do consumidor, uma vantagem manifestamente excessiva, nos termos do art. 39, I, IV e V, do CDC.

O contrato encerra proposição que também viola frontalmente o dispositivo do art. 51, inc. IV, do Código de Defesa do Consumidor:

"Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que :

(...)

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade ;"

Basta examinar o instrumento do contrato, para se constatar que sequer são reveladas quantas as parcelas deverão ser pagas, nem o respectivo termo final. Com efeito, há flagrante violação ao dever de informar que emana do Código de Defesa do Consumidor. A oferta estampada no instrumento do contrato é deficiente no tocante à

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informação 1 . Como é cediço, nos contratos que envolvam a outorga de crédito, dentre outros requisitos, deve ser informada previamente: a) o número e periodicidade das prestações ( CDC, art. 52, inc. IV); b) a soma do total a pagar, com e sem financiamento ( CDC, art. 52, inc. V).

Antes disso, o contrato incide em flagrante vício do consentimento por erro, comparável ao que se costuma denominar, popularmente, de "venda de gato por lebre".

No vício de consentimento caracterizado pelo dolo, uma parte lança mão de artifícios sutis para, intencionalmente, induzir em erro, e levar a contraparte a formulação de declaração de vontade, que não lançaria, caso não fosse enganada. "O dolo, enquanto vício do consentimento, consiste em manobras ou maquinações feitas com o propósito de obter uma declaração de vontade que não seria emitida se o declarante não fosse enganado. É o erro intencionalmente provocado, instigado pela intenção de enganar; pois o autor mune-se da vontade de induzir o outro ao erro, usando de artifícios não grosseiros ou perceptíveis prima facie." [ AgInt no REsp XXXXX/CE , Rel. p/ Ac. Min. Luis Felipe Salomão (www.stj.jus.br )].

É relevante a lição do saudoso Sílvio Rodrigues, quanto ao dolo:

"DO DOLO

104. O dolo, sua distinção do erro Dolo é o artifício ou expediente astucioso, empregado para induzir alguém à prática de um ato, que o prejudica e aproveita ao autor do dolo ou terceiro.

O dolo em muito se avizinha do erro, e, se representa uma limitação à eficácia do ato jurídico, isso ocorre porque a vontade que o constituiu manifestou-se enganada. Entretanto, enquanto no erro o engano é espontâneo, no dolo é provocado. Ele advém do embuste do outro contratante, de sua malícia, de sua manha no sentido de ludibriar a vítima.

Daí alguns escritores assimilarem esses dois defeitos, por entenderem que a causa da anulabilidade do ato jurídico é sempre o erro, quer espontâneo, quer provocado, isto é, o dolo.

Planiol, que reconhece a semelhança entre os dois vícios, aponta, contudo, a utilidade de distingui-los:

a) Casos há em que a mera alegação do erro bastaria para

conduzir o julgador a decretar a anulação do ato. Mas a prova do erro não é fácil, de modo que a vítima poderá caracterizá-lo mostrando o artifício doloso a que o outro contratante recorreu para ludibriá-la. E é menos difícil evidenciar se inspirou num pensamento secreto ou errado.

b) O erro sobre o motivo do ato não defere ação de anulação,

como já foi mostrado (v. 95 supra ). Mas, se tal motivo foi gerado pelo dolo do outro contratante, o negócio é anulável por dolo, embora não o fosse por erro.

105. Dolo principal e dolo acidental Ao definir o dolo acidental ( CC, art. 146), a lei estabelece distinção entre ele e o dolo principal. Se é acidental o dolo quando, a seu despeito, o ato se teria praticado, embora de outro modo, fácil concluir que o legislador entende por dolo principal aquele que se revela a causa determinante do ato.

O dolo principal (dolus dans causam contratui ) constitui vício do consentimento, capaz de anular o ato jurídico; o acidental (dolus accidens ) não passa de um ato ilícito, que gera, para seu agente, uma obrigação de reparar o prejuízo causado à vítima.

Nas duas hipóteses, existe a deliberação de um contratante de iludir o outro. Na primeira, apenas o artifício faz gerar uma anuência que jazia inerte; na segunda, ao contrário, o consentimento viria de qualquer maneira, só que, dada a incidência do dolo, o negócio se faz de maneira mais onerosa para a vítima do engano. Naquela, o vício do querer enseja a

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anulação do negócio; nesta, o ato ilícito defere a oportunidade de pedir a reparação do dano.

Assim, como exemplo de dolo principal, encontramos julgado do Tribunal de Alçada de São Paulo ( RT , 226/395) que anulou ato pelo qual alguém fora dolosamente induzido a vender, por preço baixo, quinhão hereditário relativamente valioso. Proclama o aresto ser evidente o ludíbrio, pois não é admissível que pessoas paupérrimas pudessem despojar-se de" bens que viriam enriquecer seu desfalcado patrimônio ".

Por outro lado, como exemplo de dolo incidente ou acidental, o Supremo Tribunal Federal ( RT , 148/379) entendeu ter havido dolo incidente no comportamento da credora hipotecária de certa massa falida que, mediante promessa de novo negócio, levou o síndico a promover nova avaliação do prédio hipotecado, reduzindo-se, assim, para metade o valor a ele atribuído na avaliação anterior. Como o novo cálculo era inferior ao crédito preferencial, a credora obteve adjudicação do imóvel. O Pretório Excelso reconheceu ser doloso tal comportamento, mas definindo como incidente esse dolo, manteve o negócio, condenando a citada credora apenas ao ressarcimento do dano, ou seja, ao pagamento da diferença entre o preço pelo qual se havia adjudicado o prédio e o seu efetivo valor à época da adjudicação.

(...)

Em nosso sistema, a omissão dolosa de um dos contratantes, silenciando sobre circunstância que, se conhecida de outra parte, a teria dissuadido do negócio, constitui procedimento doloso, capaz de conduzir à anulação do contrato. É a regra do art. 147 do Código Civil.

Examinando-se o texto, fixam-se os seguintes pressupostos, necessários para caracterizar o dolo por omissão:

a) tratar-se de ato bilateral;

b) haver intenção de induzir o outro contratante à prática de um ato que o prejudica e beneficia o autor do dolo;

c) ter o autor do dolo silenciado sobre circunstância relevante,

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quando lhe cumpria revelá-la.

d) ser a omissão causa do consentimento, configurando-se, assim, o dolus causam dans;

e) partir a omissão do outro contratante, pois a lei se refere ao silêncio intencional de uma das partes.

Já se decidiu, com base no art. 147 do Código Civil, ser suscetível de anulação o compromisso de compra e venda em virtude de o alienante ter ocultado a existência de trincas no prédio objeto do contrato, quando lhe competia a obrigação de revelar tal fato ( RT , 187/314). Entendeu-se doloso o silêncio do contratante que adquire quinhão hereditário de outrem, silenciando sobre seu efetivo valor, que, sabe, muito superior ao preço proposto. O Tribunal de São Paulo, em acórdão posteriormente reformado em embargos ( RT , 171/165), proclamou ser dolosa a omissão do vendedor de um pomar de laranjas que oculta estarem os frutos atacados de uma praga denominada leprose ( RT , 168/165). (...)

Diante desse quadro, resta bem confirgurada a conduta dolosa da parte demandada, que induziu a parte demandante em erro na contratação do negócio de forma lesiva ao consumidor.

A demais a utilização do termo" consignado "tem potencial enorme para confundir, e induzir o consumidor em erro. Aliás, não será por outro motivo a constatação de que, na quase na totalidade dos contratos atrelados ao cartão de crédito, os consumidores são pessoas vulneráveis, humildes, e com baixo padrão de escolaridade e/ou idosos.

Como se constata, do instrumento contratual estampou expressamente que, apesar de se tratar de crédito consignado, com todas as garantias a ele inerentes, o banco cobra como custo efetivo total (CET), e é este o que importa, juros elevados de de 47,88% ao ano (fls. 341). Ou seja em dois anos a dívida mais do que dobra.

Pior, não há segurança de um número determinado de prestações.

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Com o sistema de capitalização dos juros (que é permitido, diga-se de passagem), a tendência - sobretudo se houver algum gasto não pago integralmente no cartão -, é de se chegar ao quadro de amortização negativa: vale dizer, apesar de pagar as parcelas, o saldo devedor não reduz mas, ao contrário, se eleva, encerrando autênticos grilhões de ferro que prenderiam a parte demandante praticamente de modo perpétuo à dívida, que favoreceria sobremaneira o fornecedor, em prejuízo do consumidor.

Os grilhões de ferro prendem também a aposentadoria da parte autora, que pela margem consignável, não consegue obter outro financiamento, em condições de juros mais favoráveis, como os dos créditos consignados comuns, onde pode obter juros inferiores aos cobrados pelo réu. E bem melhor, com prestações fixas e parcelas delimitadas no tempo.

Tratando-se de relação de consumo nos termos dos arts. e do Código de Defesa do Consumidor ( CDC), aplica-se a regência desta lei ao presente caso. Na mesma linha, a Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça confirma sua aplicabilidade:

Súmula 297 (STJ):"O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Era exigível da parte requerida uma conduta compatível com os deveres que emanam da cláusula geral da boa-fé objetiva (art. 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor e 422 do Código Civil de 2002), vale dizer, de cumprimento dos deveres acessórios de conduta (do fornecedor): dever de informação; dever de colaboração e cooperação; dever de proteção e cuidado com a pessoa e o patrimônio da contraparte .

É patente a falha do serviço prestado pela parte fornecedora que, à evidência, não tem a segurança esperada. Dessa forma, cabe a ela indenizar, independentemente de culpa (art. 14 e § 1º, do Código de

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Defesa do Consumidor 2 ).

Já se admitiu a nulidade, ao menos parcial, de contratos do gênero.

Neste sentido tem decidido o E. Tribunal de Justiça de São Paulo:

" APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. OPÇÃO DE SAQUE NO CARTÃO DE CRÉDITO COM CONSIGNAÇÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO (RMC).

CONTRATO REDIGIDO SEM A NECESSÁRIA CLAREZA , IMPEDINDO QUE O AUTOR, PARTE VULNERÁVEL NA RELAÇÃO, CONHECESSE O REAL CONTEÚDO DO NEGÓCIO JURÍDICO. PAGAMENTOS QUE NÃO AMORTIZAVAM AS PRESTAÇÕES DO SUPOSTO EMPRÉSTIMO, MAS, ANTES, PERMITIAM APENAS O PAGAMENTO DO VALOR MÍNIMO DO SALDO DEVEDOR DAS FATURAS, AO QUAL SE INCORPOROU O CRÉDITO CONCEDIDO SOB A FORMA DE SAQUE NO CARTÃO. PRORROGAÇÃO DA DÍVIDA POR PRAZO INDETERMINADO. PATENTE VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO E À FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO. INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL QUE IMPÕE A ANULAÇÃO PARCIAL DO AJUSTE, NOS TERMOS DO ART. 138 DO CC, COM RECÁLCULO DA CONTRAPRESTAÇÃO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA, CONVERTENDO-SE AO NEGÓCIO JURÍDICO ADEQUADO À VONTADE DAS PARTES. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONVERTIDA EM DEFINITIVA, NOS MOLDES ORA DETERMINADOS.

DANO MORAL NÃO VERIFICADO , AUSENTE SÉRIA OFENSA AOS DIREITOS DE PERSONALIDADE DO AUTOR OU À SUA DIGNIDADE. - RECURSO PROVIDO EM PARTE, COM DETERMINAÇÃO. "

Apelação Cível XXXXX-61.2020.8.26.0390 , Relator Desembargador Edgard Rosa , 2a Câmara de Direito Privado, v.u., j. em 06/05/2021 (www.tjsp.jus.br).

"APELAÇÃO. Ação declaratória de nulidade de cláusula contratual c.c. repetição de indébito e indenização por danos morais. Contrato de cartão de crédito com autorização para desconto em benefício previdenciário. Sentença de

2 CDC. Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela

reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como

improcedência. Insurgência da parte autora. Acolhimento em parte.

Código de Defesa do Consumidor. Aplicabilidade. Celebração de contrato com intenção de contratação de empréstimo consignado. Abusividade caracterizada em relação ao consumidor, hipossuficiente. Art. 39, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor. Violação do dever de informação e ofensa ao dever de lealdade contratual. Vantagem exagerada do réu. Reconhecimento de nulidade da contratação de cartão de crédito consignado, nos termos do artigo 51, do CDC. Aplicação do princípio da manutenção dos contratos, nos termos do artigo 170, do Código Civil, com a adequação do negócio jurídico firmado entre as partes para empréstimo consignado. Ausência de dano moral, uma vez que a parte autora se beneficiou com a obtenção de crédito, não restando efetivamente comprovado nos autos nenhum dano de caráter extrapatrimonial. Restituição simples dos valores cobrados a maior, admitida compensação. Sentença parcialmente reformada. Recurso de apelação parcialmente provido, com a fixação dos ônus de sucumbência recíproca."[destaquei]

Apelação Cível nº XXXXX-21.2020.8.26.0481, Relator Desembargador Régis Rodrigues Bonvicino , 21a Câmara de Direito Privado, v.u., j. em 06/04/2021 (www.tjsp.jus.br).

"DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C.C. REPETIÇÃO DE INDÉBITO C.C. REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. Saque do crédito rotativo de cartão de crédito. Consumidor que pretendia contratar empréstimo consignado. Cartão de crédito não utilizado. Reserva de Margem Consignável (RMC) que se confunde com o pagamento mínimo da fatura. Tentativa ilícita de aumentar a margem consignável para 35% dos rendimentos do mutuário, conforme autorizado pela Lei n.º 13.172/2015. Prática abusiva. Inteligência do art. 39, I, IV e V, do CDC. Nulidade do contrato de cartão de crédito . Exegese do art. 51, IV, do CDC. Precedentes deste Tribunal. Possibilidade de conversão do negócio jurídico nulo. Inteligência dos arts. 51, § 2º, do CDC, e 170 do Código Civil. Conversão para empréstimo consignado, observada a taxa média de mercado dos juros remuneratórios. Precedente do STJ proferido em caso análogo. Danos morais in re ipsa. Desconto de verba alimentar (benefício previdenciário). Precedentes do STJ. Valor reparatório fixado em R$ 10.000,00. Razoabilidade de proporcionalidade. Sentença reformada"[destaquei].

Apelação nº XXXXX-43.2017.8.26.0097 , 12a Câmara de Direito Privado, Relator Desembargador Tasso Duarte de Melo, v.u, j.

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em 28/02/2018 (www.tjsp.jus.br).

Como houve o deslocamento patrimonial do banco em favor do consumidor, não haveria razoabilidade em se afastar o respectivo pagamento.

Entretanto, considerando que intenção do consumidor era a de contrair o financiamento por meio do crédito consignado, e não fazer contrato de cartão de crédito, o contrato deverá ser adaptado ao referido sistema - conforme as taxas médias do mercado, vigentes ao tempo da contratação para essa modalidade de financiamento, observando como teto de cada parcela o montante estipulado no contrato (como" valor mínimo "que seria o" equivalente "à prestação). O total já pago pela parte demandante, devidamente atualizado (conforme a Tabela Prática TJSP), será abatido do saldo devedor, do montante que se apurar com o nova sistemática de cálculo já sob a roupagem de crédito consignado. Caso a aplicação do sistema de crédito consignado implique na apuração de que a dívida já teria sido paga (conforme o novo método), o total excedente deverá ser restituído à parte consumidora, devidamente atualizado de forma simples, com juros contados da citação. Tudo deverá ser apurado em liquidação de sentença por arbitramento, nos termos do art. 509, inc. I, do CPC.

A eventual restituição, portanto, se dará de forma simples, pois não há razão jurídica para que se defira restituição em dobro. A uma porque não há, no caso, cobrança judicial de dívida já paga (art. 940 do Cód. Civil), e tampouco houve cobrança, ainda que não judicial, de dívida já paga (art. 42 do CDC).

Dano moral.

A jurisprudência do Colendo Tribunal de Justiça é francamente majoritária, quando à incorrência do dano moral em casos do gênero.

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Todavia, no caso em foco, a autora se subemteu durante um bom tempo ao ato ilícito da ré, que onerou desnecessariamente os proventos da autora, os quais são sua única fonte de subsistência. Mesmo tentando administrativamente resolver o problema, foi ignorada pelo demandado, sendo obrigada, assim, a constituir um advogado e buscar a reparação de um direito, que fora deliberadamente violado pelo réu. Logo, de rigor que haja algum tipo de compensação por tal evento.

Assim, considerando a capacidade econômica das partes e a extensão do dano, fixo a compensação em R$ 10.000,00. A correção monetária será calculada pela Tabela Prática do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, que espelha a jurisprudência dominante a contar da publicação da sentença.

Os juros moratórios simples de 1% ao mês são devidos a partir da citação.

Como a parte autora decaiu, em fração do pedido, são distribuídas proporcionalmente as verbas da sucumbência (art. 86, caput , do Código de Processo Civil).

Sem a prova inequívoca do dolo, não se aplicam as sanções por litigância de má-fé (RSTJ 17/363).

III Dispositivo.

Valor da causa - R$ 31.000,00

Diante desse quadro, julgo procedente , em parte, o pedido, extinguindo o processo, com o exame do mérito, ex vi do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Declaro a nulidade da previsão de cobrança de reserva de margem consignável de cartão de crédito contida no contrato apontado na inicial, convertendo ao padrão de mero crédito consignado, adotando-se as taxas médias de juros vigentes ao tempo da contratação, observando como teto de cada prestação o montante estipulado no contrato

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(como" valor mínimo "que seria o" equivalente "à prestação). O total já pago pela parte demandante, devidamente atualizado (conforme a Tabela Prática TJSP), e será abatido do saldo devedor, do montante que se apurar com o novo sistema de cálculo, já sob o padrão de crédito consignado. Caso a aplicação do sistema de crédito consignado resulte na apuração de que a dívida já teria sido paga (pelo novo método), o total excedente deverá ser restituído à parte consumidora, devidamente atualizado de forma simples, com juros simples de 1% ao mês, contados da citação. Tudo deverá ser apurado em liquidação de sentença por arbitramento, nos termos do art. 509, inc. I, do CPC.

Por fim, condeno a ré ao pagamento de R$ 10.000,00. A correção monetária será calculada pela Tabela Prática do

E. Tribunal de Justiça de São Paulo, que espelha a jurisprudência dominante a contar da publicação da sentença.

Os juros moratórios simples de 1% ao mês são devidos a partir da citação.

Condeno a parte demandada no pagamento das custas, despesas processuais e, bem assim, nos honorários advocatícios que arbitro em 10% sobre o valor da condenação, observando as diretrizes do art. 85, § 2º, incisos I, II, III e IV cc §§ 6º e 8º do CPC.

P. I. C.

Santos,18 de janeiro de 2023

Assinatura eletrônica Lei 11.419/2006 (impressão à margem)

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