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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Supremo Tribunal Federal STF - RECLAMAÇÃO: Rcl 40609 SP - SÃO PAULO XXXXX-05.2020.1.00.0000

Supremo Tribunal Federal
há 4 anos

Detalhes

Processo

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

Min. ROSA WEBER
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Ementa

Decisão

RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL. CORONAVÍRUS. COVID-19. ADI Nº 6.341-MC. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 926/2020. PROVIDÊNCIAS NORMATIVAS E ADMINISTRATIVAS. DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIAS ENTRE OS ENTES FEDERADOS. COMPETÊNCIA COMUM. ART. 23, II, DA CF. NÃO AFRONTA. SÚMULA VINCULANTE Nº 38. AUSÊNCIA DE ADERÊNCIA ESTRITA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAR RECLAMAÇÃO COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. RECLAMAÇÃO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. Vistos, etc. 1. Trata-se de reclamação constitucional, com pedido de medida liminar, ajuizada pelo Município de Laranjal Paulista, em face da decisão proferida pela 1º Vara da Fazenda Púbica da Comarca de Laranjal Paulista, nos autos da Ação Civil Pública nº XXXXX-94.2020.8.26.0315, que, ao afastar a aplicabilidade do Decreto Municipal nº 3.828/2020, que "dispõe sobre o início da flexibilização das medidas temporárias e emergenciais para prevenção e contágio pelo COVID-19 (NOVO CORONAVÍRUS) do Município de Laranjal Paulista/SP", teria afrontado o quanto decidido na ADI nº 6.341-MC , bem como a Súmula Vinculante nº 38. 2. O reclamante narra ter editado o Decreto Municipal nº 3.828, de 17 de abril de 2020, que implantou a denominada "flexibilização moderada do isolamento social" na forma de "Distanciamento Social Seletivo" (DSS), e estabeleceu condições para a retomada do funcionamento dos estabelecimentos industriais e da construção civil, assim como os de comércio e prestação de serviços durante o período de crise ocasionada pelo coronavírus (Covid-19). Noticia que Ministério Público estadual propôs a Ação Civil Pública nº XXXXX-94.2020.8.26.0315, com pedido de concessão de medida liminar, a fim de suspender o Decreto nº 3.828/2020, bem como impedir a edição de qualquer outro ato administrativo normativo ou regulamentar que flexibilize ou desconsidere as restrições impostas pelo Governo do Estado nos Decretos Estaduais nº 64.881/2020 e nº 64.946/2020. Aponta deferida a liminar, de maneira a não só suspender o decreto municipal, mas também a determinar a obrigação de fazer, consistente na ordem de cumprimento do Decreto Estadual nº 64.881/2020 enquanto perdurarem seus efeitos, em manifesta invasão e supressão da competência municipal para regular a matéria. Reporta interposto o Agravo de Instrumento nº 2088367- 68.2020.8.26.0000, no qual indeferido o pedido de efeito suspensivo. Argumenta que, ao julgamento da ADI nº 6.341-MC, o Plenário desta Suprema Corte referendou o entendimento de que a implementação de providências administrativas e a edição de medidas legislativas pertinentes à proteção da saúde pública estão inseridas nas competências comum ( CF, art. 23, II) e concorrente ( CF, art. 24, XII) das três esferas de governo, bem como na competência dos municípios para suplementar, no que couber, a legislação federal ou estadual, sempre que se tratar de assuntos de interesse local ( CF, art. 30, II). Sustenta a inexistência de extrapolação dos limites do exercício de sua competência suplementar, uma vez que o decreto em questão se limitou a abrandar a quarentena em sede local. Ressalta ostentar o ato normativo natureza também política, no sentido de buscar equilibrar valores constitucionais: o direito à vida e à saúde da coletividade, de um lado; e as liberdades de trabalhar e empreender e a preservação dos postos de trabalho, do outro. Assevera equivocado o entendimento adotado pelo Juízo reclamado, no sentido de que o decreto municipal ofende as normas gerais editadas pela União Federal e o Decreto Estadual nº 64881/2020, bem como a compreensão de que este último teria permitido, em âmbito estadual, o funcionamento apenas das atividades e serviços classificados como essenciais. Consoante anota, o Decreto Municipal nº 3.828/2020 não procura afastar a quarentena imposta pelo Governo do Estado de São Paulo, uma vez que prorrogou medidas de enfrentamento à propagação do vírus de forma que cada estabelecimento interessado em funcionar deveria cumprir com exigências sanitárias específicas não exaurientes, sob rígida e extremada fiscalização. Ressalta que o Decreto Federal nº 10.329/2020, que altera o Decreto nº 10.282/2020, que regulamenta a Lei Federal nº 13.979/2020 para definir os serviços públicos e as atividades essenciais, reconhece expressamente a competência concorrente de Estados e Municípios, administrativa e normativa, para a tomada de providências em relação a forma de enfrentamento e contenção da pandemia em combate. Deduz, também, vulnerada a Súmula Vinculante nº 38, ao argumento de que retirada atribuição legislativa do Município para regulamentar sobre o comércio local. Em abono de sua tese, elenca elementos e informações com intuito de demonstrar evidências científicas/estatísticas e análises técnicas sobre as informações estratégicas em saúde voltadas ao interesse da municipalidade. 3. Requer, em sede cautelar, a suspensão da eficácia da decisão liminar proferida na Ação Civil Pública nº XXXXX-94.2020.8.26.0315, uma vez que a municipalidade vem sendo impedida a exercer sua competência no exercício das atividades, ao ser colocada em subordinação ao disposto pelo Governo do Estado de São Paulo, que prorrogou a quarentena até dia 31 de maio de 2020 por meio do Decreto Estadual nº 64.967, de 8 de maio de 2020 . No mérito, pugna pela cassação da decisão reclamada, para que seja preservada a competência do ente Municipal de legislar sobre seus interesses locais, em obediência à autoridade da Súmula Vinculante nº 38 e à decisão proferida por esta Corte nos autos da ADI 6.341-MC. 4. Deixo de determinar a intimação da autoridade reclamada para prestar informações, em decorrência da manifesta inviabilidade da presente reclamação. Igualmente, dispenso a intimação do Procurador-Geral da República, em razão do caráter repetitivo do litígio. É o relatório. Decido. 1. A reclamação prevista nos arts. 102, I, l e 103-A, § 3º, ambos da Constituição Federal, é cabível nos casos de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal, desobediência à súmula vinculante ou descumprimento de autoridade de decisão proferida no exercício de controle abstrato de constitucionalidade ou em controle difuso, desde que, neste último caso, se cuide da mesma relação jurídica e das mesmas partes. 2. A questão jurídica controvertida na presente reclamação consiste na alegada afronta (i) à autoridade da decisão proferida na ADI nº 6.341-MC e (ii) à Súmula Vinculante nº 38. 3. Por oportuno, colaciono a decisão reclamada (destaquei): Vistos. Cuida-se de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra a Fazenda Pública do Município de Laranjal Paulista objetivando tutela de urgência para determinar a imediata suspensão do Decreto nº 3820 de 07 de abril de 2020 do Chefe do Poder Executivo de Laranjal Paulista, bem como a proibição de qualquer outro ato administrativo normativo ou regulamentar que flexibilize ou desconsidere as restrições impostas pelo Governo do Estado de São Paulo para o enfrentamento do COVID-19, sob o fundamento de inconstitucionalidade por conflitarem com as disposições do Decreto Estadual nº 64.881 de 22 de março de 2020 e do Decreto Estadual 64.946 de 17 de abril de 2020 que prorrogou para 10 de maio as determinações de afastamento social e restrição no funcionamento de atividades comerciais. É a síntese do necessário. DECIDO Importante já de início consignar, que é possível o reconhecimento incidental de inconstitucionalidade através da ação civil pública, por força do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. , XXXV, CF). O cerne da causa de pedir é a impossibilidade do Município de Laranjal Paulista, na esfera de sua competência constitucional, editar no âmbito local, normas de abrandamento das medidas de quarentena que conflitem com as estabelecidas pelo Governo do Estado de São Paulo no Decreto Estadual nº 64.881/20, prorrogado até 10 de maio pelo Decreto Estadual 64.946/20, porque, segundo o autor, em se tratando de tema de saúde pública a competência legislativa e administrativa do Município é suplementar à do Estado. Dessa feita, a questão é unicamente de legalidade e constitucionalidade diante do confronto de normas e não de análise de discricionariedade de cada ente público estadual ou municipal no estabelecimento de normas de saúde emergenciais. O Supremo Tribunal Federal referendou, no último dia 15 de abril, a liminar do ministro Marco Aurélio, considerando que os governos federal, estadual e municipal tem competência concorrente para estabelecer medidas na área da saúde. O art. 24, XII, da Constituição Federal prevê competência concorrente entre a União, Estados e Distrito Federal para legislar sobre proteção e defesa da saúde; autorizando aos Municípios nos termos do art. 30, II, a possibilidade de suplementar a legislação federal e estadual no que couber, desde que haja interesse local. A averiguação do "interesse local" só se torna possível mediante a investigação de todos elementos que envolvem o caso concreto. Não obstante os motivos apresentados nos "considerandos" do Decreto Municipal, fato é que levantamento realizado pelo Ministério Público constatou que no dia 29/04/2020 (ontem), o Hospital das Clínicas de Botucatu, que atende não somente Laranjal Paulista, mas sim 68 municípios da Região, tinha 07 pessoas internadas em UTI e 33 na Enfermaria, o que significa dizer que se cada município dos 68 necessitar de uma vaga na UTI não haverá vagas para todos. Além disso, também não se sabe ao certo, pelo menos até a data de 10 de maio de 2020, quando o Estado de São Paulo revisará as regras de isolamento e distanciamento social, como ocorrerá a expansão dos casos com a abertura do comércio, da forma como ocorreu no decreto municipal impugnado. Ao contrário do que está ocorrendo em muitas cidades da região, o Município de Laranjal Paulista já conta com 02 óbitos decorrentes do COVID-19 confirmados. Esses dados tornam questionável a existência de interesse local para o abrandamento das medidas restritivas que antes haviam sido determinadas neste Município, e que estavam em compasso com o Decreto Estadual 64.881 de 22 de março de 2020, de maior abrangência. Não havendo interesse local identificável de plano, deve prevalecer o quanto disposto no Decreto Estadual nº 64.881/20, que abarca matéria afeta ao interesse regional - em relação à saúde (art. 24, XII, CF). O mesmo raciocínio, porém, não se aplica ao Decreto Municipal nº 101/20, de caráter programático, a depender, conforme disposto no art. 2º, da evolução dos números de casos da doença. Assim presente a probabilidade do direito e receio de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 300 do Código de Processo Civil), com fulcro no art. , inciso XXXV e art. 24, XII, da Constituição Federal e no princípio da precaução DEFERE-SE a liminar para suspender os efeitos do Decreto Municipal nº 3828/2020 e determinar a obrigação de fazer em cumprir o Decreto Estadual 64.881/2020, com a alteração dos Decretos Estaduais 64.920/2020 e 64.946/2020, bem como, todas as disposições emanadas pelas autoridades sanitárias do Governo do Estado de São Paulo, enquanto perdurar seus efeitos, SUSPENDENDO AS ATIVIDADES DOS ESTABELECIMENTOS PRIVADOS DE SERVIÇOS E ATIVIDADES NÃO ESSENCIAIS, CUJO FUNCIONAMENTO FOI AUTORIZADO PELO DECRETO MUNICIPAL Nº 3.828/2020 e determinando que proceda a orientação à população, fiscalização, execução e cumprimento das determinações legais vigentes no tocante à vigilância epidemiológica, na forma do art. 18, IV, a da Lei 8080/90 da Lei, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00, a ser destinada ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados". 4. Por elucidativo da controvérsia, trago à colação excerto do Decreto Municipal nº 3.828/2020:"[...] Art. 1º Para o enfrentamento da situação de emergência disposta pelo Decreto nº 3.812/2020, ficam estabelecidas as seguintes medidas. Art. 2º Fica determinado até o dia 30 de abril de 2020: I – a suspensão de eventos em geral, especialmente casas noturnas, estabelecimentos congêneres, academias, centros de ginástica, clínicas de estética, clubes, associações, organizações religiosas, e quaisquer outros serviços privados de atendimento ao público, ressalvadas as atividades internas, excetuando-se: a) os hospitais e serviços de saúde, compreendidos nesses, entre outros, os serviços de atendimento ao paciente, laboratórios, clínicas, consultórios e os serviços odontológicos; b) farmácias, drogarias e comércio de produtos para saúde, inclusive óticas; c) estabelecimentos comerciais de venda de produtos alimentícios, ficando vedado o consumo de alimentos nestes locais; d) distribuidoras e revendedoras de gás; postos de combustíveis e derivados; e) estabelecimentos de saúde animal, incluindo pets shops; f) coleta de lixo; serviços de tratamento e abastecimento água e esgoto, e energia elétrica; g) serviços de manutenção e guincho de veículos automotores, motocicletas e bicicletas; h) as atividades cuja natureza não exija atendimento ao público, inclusive escritórios de advocacia, de contabilidade e imobiliárias, com acesso restrito apenas ao cliente; i) a prestação de serviços em sistema de teletrabalho, como telecomunicação, imprensa e call center; j) os velórios, sendo apenas por 4 horas e no máximo 10 pessoas por sala, com rotatividade e sem permanência nos seus espaços de convivência, ficando fechado das 22 às 7 horas; k) bancos e unidades lotéricas; l) empresas de segurança privada; m) serviços de limpeza e lavanderias; n) indústrias e construção civil, incluindo lojas de materiais para construção; o) hotéis; p) transporte de passageiros, sendo que o transporte coletivo deve operar com até 50% (cinquenta por cento) de sua capacidade, adotando-se as medidas de higienização a cada rodada; q) transporte e entregas de carga em geral; r) atividades da administração pública e órgãos que atuam por delegação do Estado; s) estacionamentos, locação de veículos e bancas de jornal; t) cadeia de abastecimento e logística da produção agropecuária; u) os estabelecimentos de assistência técnica de produtos elétricos e eletrônicos; v) estabelecimentos inerentes a profissionais liberais e autônomos; w) estabelecimentos comerciais de peças e acessórios para veículos automotores, motocicletas e bicicletas; x) barbearias e cabelereiros, exclusivamente para atendimento presencial individualizado com agendamento; y) demais atividades essenciais, como as relacionadas no § 1º do artigo do Decreto Federal nº 10.282, de 20 de março de 2020; "5. O Decreto Estadual nº 64.881/2020, a seu turno, dispõe sobre a suspensão de atividades comerciais e de prestação de serviços no âmbito do Estado de São Paulo, ressalvando os serviços essenciais. Cito trecho do normativo:"Artigo 1º - Fica decretada medida de quarentena no Estado de São Paulo, consistente em restrição de atividades de maneira a evitar a possível contaminação ou propagação do coronavírus, nos termos deste decreto. Parágrafo único - A medida a que alude o "caput" deste artigo vigorará de 24 de março a 7 de abril de 2020. Artigo 2º - Para o fim de que cuida o artigo 1º deste decreto, fica suspenso: I - o atendimento presencial ao público em estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços, especialmente em casas noturnas, "shopping centers", galerias e estabelecimentos congêneres, academias e centros de ginástica, ressalvadas as atividades internas; II - o consumo local em bares, restaurantes, padarias e supermercados, sem prejuízo dos serviços de entrega ("delivery") e "drive thru". § 1º - O disposto no "caput" deste artigo não se aplica a estabelecimentos que tenham por objeto atividades essenciais, na seguinte conformidade: 1. saúde: hospitais, clínicas, farmácias, lavanderias e serviços de limpeza e hotéis; 2. alimentação: supermercados e congêneres, bem como os serviços de entrega ("delivery") e "drive thru" de bares, restaurantes e padarias; 3. abastecimento: transportadoras, postos de combustíveis e derivados, armazéns, oficinas de veículos automotores e bancas de jornal; 4. segurança: serviços de segurança privada; 5. comunicação social: meios de comunicação social, inclusive eletrônica, executada por empresas jornalísticas e de radiofusão sonora e de sons e imagens; 6. demais atividades relacionadas no § 1º do artigo do Decreto federal nº 10.282, de 20 de março de 2020. § 2º - O Comitê Administrativo Extraordinário COVID19, instituído pelo Decreto nº 64.864, de 16 de março de 2020, deliberará sobre casos adicionais abrangidos pela medida de quarentena de que trata este decreto. Artigo - A Secretaria da Segurança Pública atentará, em caso de descumprimento deste decreto, ao disposto nos artigos 268 e 330 do Código Penal, se a infração não constituir crime mais grave. Artigo 4º - Fica recomendado que a circulação de pessoas no âmbito do Estado de São Paulo se limite às necessidades imediatas de alimentação, cuidados de saúde e exercício de atividades essenciais. Artigo 5º - Este decreto entra em vigor em 24 de março de 2020, ficando revogadas as disposições em contrário, em especial: I - o inciso II do artigo do Decreto nº 64.862, de 13 de março de 2020; II - o artigo do Decreto nº 64.864, de 16 de março de 2020, salvo na parte em que dá nova redação ao inciso II do artigo do Decreto nº 64.862, de 13 de março de 2020; III - o Decreto nº 64.865, de 18 de março de 2020."(grifei). 6. O Município reclamante alega a infringência aos paradigmas mencionados, à alegação de que autoridade reclamada, ao recusar aplicação ao Decreto Municipal 3.828/2020, não teria reconhecido a competência municipal para determinar a abertura das atividades comerciais no âmbito de seu território. 7. Na ADI nº 6.341, questionou-se a constitucionalidade da Medida Provisória nº 926/2020, que alterou o art. 3º, caput, I, II e VI, e §§ 8º, 9º, 10 e 11, da Lei Federal nº 13.979/2020. A ação direta foi proposta com o fito de averiguar se o Governo Federal, ao promover dita alteração legislativa, teria violado a competência legislativa comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que tange à adoção de medidas de saúde (art. 23, II, da Constituição da Republica), bem como às normas de descentralização do Sistema Único de Saúde (arts. 198, I, e 200, I, do mesmo Diploma) pelos diversos entes federativos. 8. Ao conceder, em parte, a medida cautelar, o Ministro Marco Aurélio, sem declarar a nulidade das normas impugnadas, adstringiu-se" a tornar explícita, no campo pedagógico e na dicção do Supremo, a competência concorrente ". 9. Outrossim, em 15.4.2020, ao referendar a mencionada decisão, o Plenário desta Suprema Corte conferiu"interpretação conforme à Constituição ao § 9º do art. da Lei nº 13.979, a fim de explicitar que, preservada a atribuição de cada esfera de governo, nos termos do inciso I do art. 198 da Constituição, o Presidente da República poderá dispor, mediante decreto, sobre os serviços públicos e atividades essenciais". 10. Consoante emerge da decisão de origem, o Juízo reclamado deferiu a medida liminar para suspender os efeitos do Decreto Municipal nº 3.828/2020 e para determinar obrigação de fazer ao Município para que cumpra o Decreto Estadual 64.881/2020,"bem como todas as disposições emanadas pelas autoridades sanitárias do Governo do Estado de São Paulo, enquanto perdurar seus efeitos". Na fundamentação, apontou-se a ausência de interesse local identificável de plano a justificar o abrandamento das medidas restritivas anteriormente determinadas pelo ente municipal. 11. Da leitura pontual da obrigação de fazer imposta ao Reclamante - para que cumpra o disposto na norma estadual e nas disposições emanadas pelas autoridades sanitárias do Governo do Estado de São Paulo-, poder-se-ia cogitar que o juízo reclamado estaria negando a competência comum administrativa para legislar sobre saúde. 12. Todavia, diante do contexto decisório, os dois comandos da sentença impugnada devem ser lidos conjuntamente. Dessa forma, não há outra conclusão senão a de que a tese da aparente negativa de competência municipal – em razão da obrigação de fazer imposta - cede diante da fundamentação autônoma e suficiente da decisão reclamada, com aptidão de sobejo para a sua manutenção, no sentido da ausência de interesse local identificável de plano para o abrandamento das medidas restritivas, considerado o levantamento realizado pelo Ministério Público no qual constatada a insuficiência de vagas em UTI no Hospital das Clínicas de Botucatu, o qual atende 68 Municípios da Região. Ressalto, ainda, a existência de risco reverso no caso dos autos, que militaria em favor da saúde pública, acaso houvesse eventual permissão de funcionamento de atividades não essenciais. 13. Nestes termos, a autoridade reclamada, a rigor, não negou a competência municipal para dispor sobre medidas em razão da saúde, mas sim realizou controle material do decreto municipal à luz das premissas fáticas de origem, pelo que não se constata afronta ao que decidido na ADI nº 6.341-MC. 14. Torno a salientar decidida, no parâmetro da ADI nº 6.341-MC, a competência comum administrativa entre a União, os Estados e os Municípios para a tomada de medidas normativas e administrativas acerca de" questões envolvendo saúde ". Nesse sentir, pode-se compreender que a norma estadual não necessariamente condiciona a municipal. Entretanto, o Município, em conformidade com seu espaço decisório regulamentar e normativo, haja vista o desenho do pacto federativo na repartição de competências legislativas comum administrativa e concorrente, somente poderia realizar algum ajuste, de acordo com a necessidade de seu território, desde que fosse capaz de justificar, do ponto de vista da saúde, determinada opção como a mais adequada para garantir a saúde pública. E a autoridade reclamada consignou não estar nos autos evidenciada essa justificativa pelo Município. 15. Portanto, afastar tal conclusão da Corte de origem exigiria a reelaboração fática, procedimento inviável em sede de reclamação. Destaco os seguintes jugados:"EMENTA AGRAVO INTERNO. RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL. AVALIAÇÃO DE QUESTÕES EM CONCURSO PÚBLICO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA XXXXX/STF. OBSERVÂNCIA DA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. NÃO CABIMENTO DE RECURSO OU RECLAMAÇÃO PARA O STF. VIOLAÇÃO DA AUTORIDADE DA DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL. NÃO OCORRÊNCIA. UTILIZAÇÃO DA RECLAMAÇÃO COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO. INVIABILIDADE. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Consignada a inexistência da aventada ilegalidade, ausente a afronta à decisão proferida sob a sistemática de repercussão geral no julgamento do RE 632.853 (Tema 485). 2. Inviável o uso da reclamação para reexame de conjunto probatório. Precedentes. 3. A reclamação constitucional é ação vocacionada para a tutela específica da competência e autoridade das decisões proferidas por este Supremo Tribunal Federal, pelo que não se consubstancia como sucedâneo recursal ou ação rescisória. 4. Agravo interno conhecido e não provido, com aplicação da penalidade prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, calculada à razão de 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa, se unânime a votação"( Rcl 35578 AgR, da minha lavra, Primeira Turma, DJe 30.4.2020)."Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. ADC 16. SÚMULA VINCULANTE 10. TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. FALTA DE EFICIENTE FISCALIZAÇÃO. CULPA IN VIGILANDO. AUSÊNCIA DE ARGUMENTOS NECESSÁRIOS PARA MODIFICAR DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I - A responsabilidade subsidiária não decorreu de mera presunção ou transferência automática, tendo sido verificada com base na análise do conjunto fático-probatório dos autos, em especial pela negligência do tomador de serviços que, ao tomar ciência de irregularidades, deixou de adotar medidas para normalização da situação, circunstância que caracterizou a sua culpa in vigilando. II - O ato impugnado no Juízo a quo não contraria a decisão proferida na ADC 16 e nem a Súmula Vinculante 10. Ademais, não cabe reclamação para obter-se o reexame do conjunto fático-probatório dos autos. III - O presente recurso contém apenas a reiteração dos argumentos de defesa anteriormente expostos. IV - Agravo regimental a que se nega provimento"( Rcl 36882 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe 20.4.2020). 16. Por outra dimensão, o problema constitucional em exame comporta soluções jurisdicionais a serem construídas a partir da compatibilidade das medidas restritivas às realidades regional e local de cada unidade federativa, tendo em vista a feição descentralizada que conforma a metodologia de enfrentamento e combate da pandemia da Covid-19 no Estado Federal brasileiro. É o que se denota das decisões proferidas na ADI 6.341-MC, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, e na ADPF 672-MC, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes. 17. Dessa forma, não se excogita afronta ao paradigma da ADI nº 6.341-MC. 18. Com relação ao parâmetro da Súmula Vinculante nº 38, melhor sorte não tem a reclamação. Eis o teor do verbete em apreço:" É competente o Município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial. "19. A Súmula Vinculante nº 38 derivou da jurisprudência desta Casa quanto à competência dos Municípios para disciplinar o horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais localizados em seus respectivos territórios, por se tratar de assunto de interesse local, à luz do art. 30, I, da Constituição Federal. 20. Não é demais realçar que o enunciado em comento não cuida da situação de emergência de saúde pública decorrente do surto do novo coronavírus. O aludido verbete pressupõe situação de normalidade social, com regularidade de funcionamento dos estabelecimentos comerciais, a concretizar a matéria como de interesse exclusivamente local. 21. A esse respeito, trago à colação julgado sobre o tema de relatoria do Ministro Luiz Fux, RCL nº 39.790, DJe de 24.4.2020, cuja motivação adoto como razões de decidir, admitida pela jurisprudência pacífica desta Casa a chamada fundamentação per relationem (grifei):"De fato, a SV 38 se refere expressamente ao horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais, pressupondo, a meu sentir, ainda que implicitamente, situação de normalidade social – inclusive porque pressupõe que os estabelecimentos comerciais estejam abertos e funcionando. É justamente esta situação pressuposta de normalidade social que caracteriza a disciplina do funcionamento de estabelecimentos comerciais como matéria de interesse exclusivamente local. Não é esta a realidade dos correntes dias, nada obstante. Como é sabido, o Brasil e o Mundo enfrentam hoje grave crise, decorrente da pandemia da Covid-19, cujos efeitos, por óbvio, extrapolam as fronteiras dos continentes e países. Numa tal situação, faz-se necessária, mais que nunca, a existência de harmonia e de coordenação entre as ações públicas dos diversos entes federativos, de sorte que as medidas governamentais adotadas para o enfrentamento da aludida pandemia extrapolam em muito o mero interesse local, referido no inciso I do art. 30 da Constituição Federal. [...] Não há, pois, que se falar em existência de mera questão de interesse local na hipótese, de sorte que resta afastada a incidência da Súmula Vinculante 38. Observa-se, nesse sentido, que ao afastar a aplicação da norma municipal no caso concreto, impondo a observância da determinação constante do Decreto Estadual, o juízo reclamado não negou a competência municipal para a matéria, tendo antes se fundamentado na consideração de que as medidas de proteção à saúde pública devem levar em conta a saúde mental dos cidadãos, para o que o bem-estar dos animais de estimação poderia contribuir, sobretudo em um contexto de isolamento social. Neste cenário, ainda segundo o juízo reclamado, não haveria qualquer fundamento que justificasse, a nível municipal, a adoção de postura diversa da orientação estadual."22. Neste tópico, ausente, portanto, similitude entre o conteúdo da Súmula Vinculante nº 38 e a espécie dos autos. 23. Por derradeiro, a jurisprudência desta Casa consolidou-se no sentido de que a reclamação não consubstancia sucedâneo de recurso, de maneira que é inviável o seu manejo como atalho processual. Nesse sentido, colho os seguintes precedentes:"Impende enfatizar, finalmente, considerada a estrita vocação a que se acha constitucionalmente vinculado o instrumento da reclamação (RTJ 134/1033, v.g.), que tal remédio constitucional não pode ser utilizado como um (inadmissível) atalho processual destinado a permitir, por razões de caráter meramente pragmático, a submissão imediata do litígio ao exame direto desta Suprema Corte. Torna-se evidente, pois, presentes tais considerações, a inadequação do meio processual ora utilizado. É que, como referido, a reclamação não se qualifica como sucedâneo recursal nem configura instrumento viabilizador do reexame do conteúdo do ato reclamado, eis que tal finalidade revela-se estranha à destinação constitucional subjacente à instituição dessa medida processual, consoante adverte a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal"( Rcl 4.003, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 04.4.2006)."AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO. ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DO QUE DECIDIDO NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 1.662/DF. 1. Inexistência de identidade material entre a decisão reclamada e o julgado tido como paradigma. 2. Impossibilidade de utilização da reclamação como sucedâneo de recurso. 3. Agravo regimental ao qual se nega provimento"( Rcl 6.025-AgR/SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 26.10.2011)."AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO – CABIMENTO DA AÇÃO CONSTITUCIONAL – AUSÊNCIA DE IDENTIDADE DE TEMAS ENTRE O ATO RECLAMADO E O PARADIGMA DESTA CORTE – RECLAMAÇÃO COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Pressupõe-se a existência de aderência estrita do objeto do ato reclamado ao conteúdo das decisões paradigmáticas do STF para que seja admitido o manejo da reclamatória constitucional. 2. Reclamação não pode se confundir com sucedâneo recursal. 3. Agravo regimental não provido" ( Rcl 4.508-AgR/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 09.11.2011). 24. Ante o exposto, com fundamento no art. 21, § 1º, do RISTF, nego seguimento à presente reclamação, prejudicado o pedido de medida liminar. Publique-se. Brasília, 08 de maio de 2020. Ministra Rosa Weber Relatora
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