Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
29 de Abril de 2024
    Adicione tópicos

    STF 2023 - Roubo - Absolvição - Sentença Anulada por Falta de Fundamentação (Art.93 IX da CF-88)

    há 13 dias

    Inteiro Teor

    RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS 224.840 MARANHÃO

    RELATOR : MIN. EDSON FACHIN

    DECISÃO: Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus (eDOC 33) interposto em face de acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no HC 781313/MA, assim ementado (eDOC 34):

    AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS . CRIME DE ROUBO MAJORADO. PARECER OPINATIVO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO. INDEPENDÊNCIA JUDICIAL. PRECEDENTES DO STJ. CONDENAÇÃO, MANTIDA EM SEDE DE REVISÃO CRIMINAL, LASTREADA EM ELEMENTOS DE CONVICÇÃO PRODUZIDOS DURANTE O INQUÉRITO E EM JUÍZO. OFENSA AO ART. 155 DO CPP NÃO CARACTERIZADA. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. ABSOLVIÇÃO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

    1. A manifestação do Ministério Público Federal pela concessão da ordem, de cunho eminentemente opinativo, embora de inestimável valia, não tem caráter vinculativo para o órgão julgador, sob pena de se negar a independência judicial. Precedentes do STJ: AgRg no AgRg no AREsp n. 2.079.875/PR, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 2/8/2022, DJe de 12/8/2022; AgRg no AREsp n. 1.525.827/SP, relator Ministro Leopoldo de Arruda Raposo (Desembargador Convocado do Tj/pe), Quinta Turma, julgado em 5/11/2019, DJe de 11/11/2019; AgRg nos EDcl no AREsp n. 809.380/AC, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 18/10/2016,

    DJe de 26/10/2016.

    2. Como é de conhecimento, nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, inexiste violação ao art. 155 do Código de Processo Penal quando a condenação, ainda que amparada em provas extrajudiciais, está em harmonia com os demais elementos probatórios obtidos no curso da ação penal.

    3. Na hipótese dos autos, conforme destacado pela Corte local, em sede de Revisão Criminal, não há que se falar em violação ao art. 155 do CPP, visto que a condenação do paciente (ora agravante) ocorreu de forma fundamentada, com base não somente nos elementos colhidos durante a fase investigativa, mas também na prova oral colhida durante a instrução processual, no sentido de que o acusado efetivamente teve participação no assalto à granja na qual trabalhava, eis que, na função de motorista, passou aos corréus informações sobre o itinerário que faria durante o transporte da quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) de propriedade do referido estabelecimento.

    4. Ademais, cumpre ressaltar que vigora no processo penal brasileiro o princípio do livre convencimento motivado, em que o julgador, desde que de forma fundamentada (assim como no caso), pode decidir pela condenação, não se admitindo no âmbito do habeas corpus a reanálise dos motivos pelos quais a instância ordinária formou convicção pela prolação de decisão repressiva em desfavor do acusado, notadamente nos autos de condenação já transitada em julgado e mantida em sede de Revisão Criminal.

    5. Agravo regimental a que se nega provimento.

    Nas razões recursais, sustenta-se que "a sentença condenatória foi prolatada sem tecer nenhuma fundamentação, sem distinguir a autoria delitiva, sem individualizar a conduta, e sem fundamentar em qual prova estaria embasada a condenação do paciente". Acrescenta-se que a decisão primeva foi formulada em termos genéricos, sem a imputação de uma conduta típica ao ora recorrente, bem como que o membro do Parquet que oficia junto ao Superior Tribunal de Justiça opinou pela concessão da ordem.

    À vista do exposto, requer-se a absolvição da parte ora insurgente. A Procuradoria-Geral da República se manifestou pela denegação da

    ordem de habeas corpus (eDOC 56).

    É o relatório. Decido.

    A irresignação merece prosperar.

    De início, esclareço que a análise da questão versada na inicial prescinde de revolvimento da matéria fático-probatória dos autos, providência que seria incompatível com a via eleita. Em verdade, o caso desafia o enfrentamento de questão eminentemente jurídica, relativa à suficiência da fundamentação do vínculo subjetivo do ora recorrente com os fatos criminosos que lhe foram imputados

    Tal proceder está em consonância com a jurisprudência pacífica desta Corte, no sentido de que a "mera revaloração jurídica dos fatos, a partir do acervo colhido nas instâncias ordinárias, distingue-se do revolvimento do conjunto fático e probatório dos autos." ( HC 192.115 ED, Relatora Ministra ROSA WEBER, Primeira Turma, DJe 17.02.2021)

    Uma condenação não prescinde de provas concretas e objetivas de que o agente tenha praticado ou concorrido para o crime.

    Com efeito, o princípio da presunção de inocência, que tem sua origem no direito romano pela regra do in dubio pro reo , foi consagrado no art. , inciso LVII, da Constituição Federal. Trata-se de princípio vetor do processo penal brasileiro, orientado pelo sistema acusatório e que tem, dentre as suas características, o ônus da prova da culpa atribuído à acusação.

    Indissociável dos postulados do contraditório e da ampla defesa, a presunção de inocência impõe tanto um dever de tratamento quanto um dever de julgamento. O dever de tratamento exige que a pessoa acusada seja tratada, durante todo o curso da ação penal, como presumidamente inocente; por outro lado, o dever de julgamento significa que recai exclusivamente sobre o órgão de acusação o ônus de comprovar de maneira inequívoca a materialidade e a autoria do crime narrado na denúncia - e não sobre o acusado o ônus da demonstração de sua inocência -, de sorte que, ao final da instrução processual, a dúvida deve inexoravelmente gerar decisão favorável ao réu.

    Como corolário de tais deveres, também cabe ao magistrado, ao proferir uma sentença condenatória, o ônus argumentativo de demonstrar racionalmente, com base nas provas produzidas nos autos e admitidas pela legislação processual penal pátria, que a acusação se desincumbiu a contento de seu mister acima referido.

    Feitas essas considerações, o Superior Tribunal de Justiça, ao examinar a questão suscitada pelo recorrente, assim rechaçou a alegação de que o édito condenatório não apresentava lastro em provas colhidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa (eDOC 35, pp. 5-8):

    Conforme foi dito na decisão impugnada, o art. 155 do CPP dispõe que: O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

    Em acréscimo, esta Corte Superior possui pacífico entendimento no sentido de que não há violação ao referido dispositivo legal quando a condenação, ainda que amparada em provas extrajudiciais, está em harmonia com os demais elementos probatórios obtidos no curso da ação penal.

    Ao ensejo:

    PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. ABSOLVIÇÃO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. CONDENAÇÃO LASTREADA EM ELEMENTOS DE CONVICÇÃO PRODUZIDOS DURANTE O INQUÉRITO E EM JUÍZO. OFENSA AO ART. 155 DO CPP NÃO CARACTERIZADA. AGRAVO DESPROVIDO.

    1. O habeas corpus não se presta para a apreciação de alegações que buscam a absolvição do paciente, em virtude da necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é inviável na via eleita

    2. Se as instâncias ordinárias, mediante valoração do acervo probatório produzido nos autos, entenderam, de forma fundamentada, ser o réu autor do delito descrito na exordial acusatória, a análise das alegações concernentes ao pleito de absolvição demandaria exame detido de provas, inviável em sede de writ.

    3. Nos termos da jurisprudência desta Corte, "é possível a utilização das provas colhidas durante a fase do inquérito policial - reconhecimento fotográfico - para embasar a condenação, desde que corroboradas por outras provas colhidas em Juízo - depoimentos, nos termos do art. 155 do Código de Processo Penal. Precedentes." (AgRg no HC 537.900/PR, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 18/11/2019, DJe 9/12/2019).

    4. No caso, percebe-se que a condenação do réu está lastreada na prova produzida no curso da persecução penal, sobretudo em prova testemunhal, produzida na fase inquisitorial e em juízo, inexistindo, pois, constrangimento ilegal a ser sanado na via do writ.

    5. Agravo desprovido.

    ( AgRg no HC n. 748.964/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 27/9/2022, DJe de 4/10/2022.) - Negritei.

    Na hipótese dos autos, verifica-se que a Corte local, em sede de Revisão Criminal, afastou a alegada ausência de fundamentação da condenação do ora agravante, bem como afastou a suposta violação ao art. 155 do CPP.

    Confira-se (e-STJ fls. 263/268):

    O ora revisionando argui a nulidade da sentença por ausência de fundamentação, eis que a condenação fora pautada em elementos colhidos em sede inquisitorial, se que fosse produzida prova pericial, em inobservância ao disposto no artigo 158, do Código de Processo Penal.

    Inicialmente, importante consignar que a revisão criminal, ação autônoma impugnativa de sentença condenatória transitada em julgado, desconstitui a coisa julgada, sendo cabível apenas em casos excepcionais, taxativamente elencados pelo legislador.

    Nesse sentido, o legislador previu expressamente, no artigo 621, do Código de Processo Penal, as hipóteses de cabimento da ação revisional, as quais correspondem à possibilidade jurídica de sua causa de pedir, senão vejamos:

    [...]

    Realizadas tais considerações preliminares, passo à análise da alegação de que a sentença padece de ausência de fundamentação, destacando, de logo, que a pretensão do autor não merece amparo. Explico.

    [...]

    É sabido que a fundamentação dos atos decisórios se qualifica como pressuposto constitucional de validade e eficácia das decisões emanadas do Poder Judiciário, constituindo dever do magistrado demonstrar as razões de seu convencimento, sob pena de nulidade absoluta.

    Assim, constitui dever do juiz, sob pena de nulidade da decisão proferida, demonstrar as razões de seu convencimento.

    Analisando a sentença combatida, percebe-se com

    facilidade que inexiste qualquer atecnia ao ter sido elaborada, o que não justifica a insatisfação do ora requerente, não havendo afronta aos princípios constitucionais da motivação das decisões judiciais (art. 93, IX) e o da individualização da pena (art. 5º, XLVI), bem como foi observado o disposto no art. 381, do Código de Processo Penal.

    Ademais, diversamente do afirmado pela defesa, constata- se a existência de provas robustas da participação do ora revisionando na empreitada criminosa, senão vejamos.

    A testemunha Antônio Eriverton Nunes Araújo relatou em juízo (Id. 13284650 - págs. 104-108):

    [...] que o depoente passou a conversar com o acusado Ivan e este confessou que participara do assalto juntamente com o acusado Simeão; que o acusado Ivan disse que o assalto foi tramado elo acusado lderaldo o qual pegou informações do roteiro da secretária da granja com o acusado Zequias que funcionário da referida granja; [...] - grifo nosso

    A testemunha José Adalto Bandeira Sousa relatou em juízo (Id. 13284650 - págs. 108-110):

    [...] que o acusado Fernando a princípio negou qualquer participação no crime, porém, ao saberda prisão do Ivan o mesmo confessou e disse que tinha apenas dois cheques os quais estavam escondidos em balsa atrás do guardaroupa; que posteriormente Fernando disse que ainda tinha R$ 200,00 em sua casa; que o depoente ouviu do acusado Ivan e Simeão que o Antonio Carolino ficou responsável de avisar o momento em que o carro ia passar no quebra mola e que o acusado Ezequias motorista da granja foi quem deu a informação ao Ideraldo de naqueledia seria feito o depósito no banco; [...] que o acusado Zequias negou a sua participação durante as investigações procedidas pelos policiais locais, porém, viu quando o mesmo tiapresença do delegado e do seu advogado em Santa Inês confirmou a sua participação; [...] - grifo nosso

    Por sua vez, a testemunha Núbia XXXXXX disse em juízo (Id. 13284650 - págs. 110-112):

    [...] que a depoente ao sair do quartel ouviu o CapiiãXXXXX dizer para o Luciano que o seu motorista estava envolvido; [...] que as únicas pessoas que sabiam do dinheiro era adepoente, o proprietário da granja e o motorista Zequias; que a depoente ficou decepcionada ao saber que o motorista Zequias participou do assalto pois o mesmo era pessoa de bom caráter. - grifo nosso

    O proprietário da granja, Sr. LuciaXXXXXXXXXXo, relatou em juízo (Id. 13284650 - págs. 112-114):

    [...] que somente o depoente a secretária e o motorista sabiam que o dinheiro seria depositado no banco; [...] que o depoente soube através do capitão que o seu motorista foi envolvido; que o depoente ficou surpreso em saber da participação do seu empregado pois o mesmo era pessoa de sua confiança, vez que sempre fazia as suas cobranças em Bom Jardim e Zé Doca; que o depoente assistiu na delegacia de Santa Inês o seu motorista confirmar asua participação e que receberia R$ 2.0007 00; que o depoente soube que o motorista ficou encarregado de avisar aos assaltantes o local em que iria passar com o dinheiro. - grifo nosso

    Quando de seu interrogatório em juízo, o revisionando negou a autoria delitiva (Id. 13284650 -págs. 100-102):

    [...] que após a prática criminosa o depoente não recebeu qualquer quantia em dinheiro; que não é verdade que o Ideraldo tenha sido o mentor intelectual do crime como também, não é verdade que o depoente tenha passado informações sobre o transporte de dinheiro da granja; [...]

    In casu, extrai-se dos depoimentos colhidos em juízo

    que o revisionando efetivamente teve participação no assalto à granja eis que, na função de motorista, passou aos corréus informações sobre o itinerário que faria durante o transporte da quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) de propriedade do referido estabelecimento.

    Nesse sentido, destaca-se que, diversamente do afirmado pela defesa, o magistrado a quo não se baseou tão somente nos elementos colhidos durante a fase investigativa, mas também na prova oral colhida durante a instrução processual.

    Dessa forma, tem-se que a construção do raciocínio do magistrado de base se deu pela análise conjunta dos depoimentos colhidos perante a autoridade policial e em juízo, motivo pelo qual mantenho a condenação do revisionando pela prática do crime de roubo circunstanciado.

    Ademais, conforme ressaltado pela douta Procuradoria, destaca-se que a revisão criminal não serve como sucedâneo do recurso de apelação criminal, conforme o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça:

    [...]

    Por fim, ressalta-se que, mantida a sentença, não há que se falar em desaparecimento do marco interruptivo da prescrição e, por consequência, em extinção de punibilidade.

    Por todo o exposto, e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, CONHEÇO e julgo IMPROCEDENTE a presente Revisão Criminal, mantendo-se incólume a decisão atacada.

    É como voto. - Negritei.

    Com efeito, não obstante o entendimento da combativa defesa e do nobre representante do Ministério Público Federal, verifica-se que a condenação do paciente (ora agravante) ocorreu de forma fundamentada, com base não somente nos elementos colhidos durante a fase investigativa, mas também na prova oral colhida durante a instrução processual no sentido de que o acusado efetivamente teve participação no assalto à granja na qual trabalhava, eis que, na função de motorista, passou aos corréus informações sobre o itinerário que faria durante o transporte da quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) de propriedade do referido estabelecimento.

    Pode-se observar, desse modo, que o Superior Tribunal de Justiça ratificou a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão em sede de revisão criminal a partir da compreensão, compartilhada por ambas as instâncias, de que a condenação do ora recorrente também tem amparo em prova colhida em Juízo.

    A fragilidade de tal fundamento, contudo, é manifesta.

    Com efeito, embora o TJMA tenha afirmado que "o magistrado a quo não se baseou tão somente nos elementos colhidos durante a fase investigativa, mas também na prova oral colhida durante a instrução processual", fê-lo, em sede de acórdão de revisão criminal, com base não na avaliação dos fundamentos efetivamente empregados pelo juízo singular, mas em amplo reexame dos fatos e das provas constantes dos autos: precedem a assertiva acima citada transcrições de depoimentos de testemunhas ouvidas em juízo, bem como o interrogatório do réu.

    Na realidade, a Corte local, ao decidir a ação revisional, desviou o olhar dos fundamentos empregados pela primeira instância ao proferir a sentença condenatória. Eis o que o exame da sentença primeva revela (eDOC 7, pp. 3-25):

    Trata-se de Ação Penal em que se pretende apurar a responsabilidade criminal atribuída aos acusados pela prática do delito previsto no art. 157, § 20, 1, II e III c/c art. 288, parágrafo único, Código Penal.

    Segundo Nelson Hungria, quadrilha ou bando é a "reunião estável ou permanente (que não significa perpétua), para o fim de perpetração de uma indeterminada série de crimes" (Comentário ao Código Penal). Essa associação, cujas características essenciais são a estabilidade e permanência da aliança é punida independentemente dos crimes ou malefícios que venha a praticar.

    Na verdade, esse acordo de vontades, com um fim comum - cometimento de crimes, reflete apenas um ato preparatório, elevado categoria de crime autônomo, em razão do perigo que representa e do alarma social que provoca.

    Distingue-se da co-participação criminosa, que exige um ocasional e transitório concerto de vontades para determinado crime. Na quadrilha ou banco, esse acordo concerne a uma duradoura atuação em comum, visando a perpetração de crimes da mesma espécie ou não sempre mais ou menos determinados. Assim, a organização, sendo suficiente a rudimentar, e a estabilidade ou permanência é que marcam a societas delinquendi, que não se confunde com o caráter de transitoriedade da co-participação criminosa (societas criminis ou societas in crimine).

    Noutra sorte, o crime de roubo qualificado é aquele tipificado no art. 157, § 2º do Código Penal, a seguir transcrito:

    Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:

    Pena - reclusão, de 4 (quatro) a l0 (dez) anos, e multa.

    § 1º Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.

    § 2º A pena aumenta-se de um terço até metade:

    I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;

    II- se há o concurso de duas ou mais pessoas;

    III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância.

    IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; (Inciso com redação dada pela Lei 9426, de 24.12.1996).

    V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. (Inciso om redação dada pela Lei 9426, de 24.12.1996).

    § 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de 7 (sete) a 15 (quinze) anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, sem prejuízo da multa. (Inciso com redação dada pela Lei 9426, de 24.12.1996).

    Do cotejo de tais capitulações legais (art. 288, parágrafo único, e art. 157, § 2º, CP), poder-se-ia ventilar um possível bis in idem. Todavia, o Pretório Excelso, bem como outros tribunais pátrios, já manifestaram a não ocorrência de bis in idem. Neste sentido:

    DTZ1056284 - ROUBO QUALIFICADO POR CONCURSO DE PESSOAS E USO DE ARMA E FORMAÇÃO DE QUADRILHA ARMADA. INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. FIXAÇÃO DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS PESSOAIS DE CO-RÉUS NÃO APROVEITAM AOS DEMAIS. EXCESSO NA DOSIMETRIA DA PENA. PROGRESSÃO DE REGIME. QUESTÃO NÃO SUBMETIDA ÀS INSTÂNCIAS INFERIORES. PEDIDO DE HABEAS CORPUS

    CONHECIDO EM PARTE E DEFERIDO QUANTO À DOSIMETRIA DA PENA. Entende o Supremo Tribunal Federal que é válida a cumulação dos crimes dos arts. 288, parágrafo único, e 157, § 2º e incisos, do Código Penal (cf. HC 76.213, rei. mm . Sepúlveda Pertence, DJ 14.04.1998). Não há aproveitamento de circunstâncias pessoais de co- réus para dosimetria da pena dos demais acusados. A fixação da pena é individualizada, de acordo com as circunstâncias pessoais de cada acusado. Entretanto, constata-se excesso na estipulação da pena, que foi elevada além dos limites legais. O pedido de progressão de regime não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instâncias, já que não fora apreciado pelas instâncias anteriores. Pedido de habeas corpus conhecido em parte e deferido quanto à fixação da pena, a fim de que se proceda a nova estipulação, dentro dos limites legais. (STF - HC 84669 - SP - 2 T. - Rel. Mm. Joaquim Barbosa - DJU 17.06.2005)

    DTZ1059921 - ROUBO E QUADRILHA - PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA - INADMISSIBILIDADE - APELAÇÃO CRIMINAL - Não há que se falar em participação de menor importância quando a conduta do agente, conhecida como "cobertura", é imprescindível para o sucesso do delito. Roubo qualificado pelo uso de armas. Quadrilha armada. Não configura bis in idem a condenação do réu pelo crime de quadrilha armada e roubo qualificado pelo uso de arma, embora se reconheça ser inadmissível a condenação simultânea por delito de quadrilha e roubo qualificado pelo concurso de pessoas. Reprimenda diminuída pelo afastamento da qualificadora do art. 157, § 2 0 , II. Recurso parcialmente provido. (TJMG - ACrim. 230.694-2/00 - 2a C. Crim. - Rei. Des. Sérgio Resende - DJMG 20.03.2002)

    DTZ1825631 - DIREITO PENAL. CRIMES DE

    ROUBO DUPLAMENTE QUALIFICADO E DE BANDO OU QUADRILHA. AGÊNCIA BANCÁRIA DA CEF. VALORAÇÃO DA PROVA. ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO DA CEF. ARTS. 157, § 20, 1 E II, 288, PARÁGRAFO ÚNICO, CP. DELAÇÃO PREMIADA. PERDÃO JUDICIAL. INOCORRÊNCIA. LEI 9.807m. SISTEMA DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. REDUÇÃO DA PENA PECUNIÁRIA. 1. Trata-se de Apelações Criminais interpostas contra a r. sentença do Juiz Federal Substituto da 2a Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro que julgou procedente a pretensão punitiva estatal, condenando os Apelantes nas sanções do art. 157, § 2º, incisos 1 e II, e do art. 288, parágrafo único, ambos do Código Penal, ou seja, em 7 (sete) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 64 (sessenta e quatro) dias-multa, sendo que o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade será o fechado, relativamente aos Apelantes LEONARDO e MÁRCIO, e em 3 (três) anos e 8 (oito) meses de reclusão e pagamento de 32 (trinta e dois) dias multa, com regime inicial de cumprimento da pena como o aberto relativamente ao Apelante ROLANDE. Não houve substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos diante da ausência das condições subjetivas previstas no art. 44, inciso III, do Código Penal em relação aos dois primeiros Apelantes, tampouco reconhecido o direito dos mesmos de recorrerem em liberdade. Quanto ao Apelante ROLANDE houve a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, tendo sido concedido o direito de recorrer em liberdade. 2. Registre-se que os recursos ora submetidos a julgamento não dizem respeito ao denunciado CRISTIANO em decorrência de decisão que determinou o desmembramento do feito em relação a ele. 3. Destaco que não há razão para negar valor probatório, dentro do sistema de busca da verdade adotado pelo legislador processual penal brasileiro, das provas decorrentes da interceptação telefônica. Afinal, os crimes discutidos nestes autos, pela sua própria natureza, têm como característica básica a clandestinidade no atuar dos agentes, inclusive em relação a preparativos para a prática dos delitos. Neste quadro, o monitoramento assume posição de destaque nas provas colhidas das práticas delituosas perpetradas, pois, do contrário, a impunidade destes agentes seria premiada, acarretando grave descrédito social. 4. Houve análise detalhada e minuciosa acerca dos elementos de prova constantes dos autos pelo magistrado sentenciante, tanto no que tange à materialidade dos crimes de roubo duplamente qualificado por emprego de arma e concurso de agentes, quanto no que se refere ao crime de quadrilha armada. S. Constatou-se a conexão entre o roubo ocorrido na agência Méier da CEF e outras ocorrências relacionadas à prática de crimes de roubo contra agências bancárias no Rio de Janeiro com mesmo ou assemelhado modus operandi, a demonstrar a presença de um grupo de pessoas que se associou para, com características de permanência e estabilidade, perpetrarem crimes contra o patrimônio de instituições financeiras, mediante roubos em agências bancárias. 6. Restou comprovado que as pessoas dos agentes dos crimes, valendo- se de determinadas informações e facilidades para o acesso ao interior da agência bancária mesmo em horário fora do expediente bancário, rendiam alguns vigilantes, funcionários e prestadores de serviço da CEF, procurando localizar as maiores quantidades de dinheiro no interior da agência bancária (inclusive no cofre) para o fim de subtrai-Ias com emprego de arma de fogo e sempre com número razoável de pessoas (no caso em tela, foram quatro os agentes,

    1. Da materialidade delitiva:

    A materialidade do delito capitulado no art. 157, § 2º, 1, II e III c/c art. 288, parágrafo único, do Código Penal está amplamente comprovada, tanto pelos depoimentos dos acusados, testemunhas e demais provas havidas nos autos.

    Neste sentido, disseram os acusados:

    Simeão XXXXXXX, fis. 81:

    (...) QUE em virtude do depoente se encontrar atravessando dificuldades financeiras, foi convidado pelo acusado Ideraldo para praticar o crime contra a Granja Ceará, sabendo no momento, já no local do crime, que o acusado Ivan também seria autor do crime (...) Que há vários dias, antes do crime, o depoente já sabia do plano sobre o roubo do veículo da Granja Ceará, sendo que foi o acusado Ivan quem propôs ao depoente que praticassem junto o referido crime, que para tanto o depoente iria receber R$ 3.000,00 (três mil reais) do próprio Ivan; que o depoente tomou conhecimento através de Ivan, que o mentor intelectual do crime foi Ideraldo (...)

    Ideraldo XXXXXXXXXX:

    (...) que realmente o depoente, no dia seguinte ao crime narrado na denúncia se dirigiu à residência do primo FXXXXXXXXXX com o propósito de efetuar o pagamento de um cavalo comprado de sua propriedade, sendo que no caminho encontrou os acusados Ivan e Simeão e juntos se deslocaram para a residência de Fernando; que ao chegarem na referida residência o depoente efetuou o pagamento de R$ 200,00 (duzentos reais) a Fernando, sendo que após tal pagamento o depeonte se retirou do local onde permaneceram Ivan e Simeão, portando uma bolsa, enrolada em um saco azul (...) Que no dia do crime, por volta das 19 horas, o acusado Ivan se dirigiu à residência do depoente pedindo que ao mesmo que guardasse unia certa quantia em espécie cujo valor não sabe informar, até que posteriormente retornasse para buscar (...) que os policiais em diligência no domicílio do depoente encontraram somente o referido dinheiro (...)

    Fernando XXXXXXXXXXXXX, fis. 77: (...)

    Que durante buscas realizadas em sua residência os policiais apreenderam uma bolsa preta, estilo feminino e a quantia de R$ 200,00 (duzentos reais), guardado no guardaroupa; que o depoente afirma que os R$ 200,00 (duzentos reais) foram recebidos dos acusados lvan e Simeão, no dia do crime, por volta das 15 horas; que os acusados lvan e Simeão chegaram à residência do depoente juntamente com o acusado Ideraldo, que apenas deixou os dois acusados que pretendiam negociar compra e venda de cavalos com o depoente. ( ... )

    Antônio CXXXXXXXXXXXXo, f is 79:

    (...) Que é verdadeira a acusação que lhe está sendo feita, pois participou do roubo do dinheiro pertencente a Granja Ceará, porém não formou quadrilha com os demais acusados (. .) Que por volta das 14 horas do dia 20 de outubro o depoente que é mototaxista recebeu em sua residência a visita dos acusados Simeão e lvan solicitando o frete da motocicleta do depoente ao preço de R$ 1.000,00 (hum mil reais); que o depoente aceitando o serviço, conduziu sua motocicleta com os dois passageiros até o retomo, na entrada da cidade, local onde deixou os passageiros ( ... )

    Simeão SoXXXXXXXXXXXXs, fls.81:

    (...) Que é verdadeira a acusação que lhe está sendo feita, que de fato participou do assalto do dinheiro pertencente a Granja Ceará de propriedade do Sr. Luciano (...) Que em virtude do depoente se encontrar atravessando dificuldades financeiras, foi convidado pelo acusado Ideraldo para praticar o crime contra a Granja Ceará, sabendo no momento, já no local do crime, que o acusado Ivan também iria ser autor do crime. (...) Que há vários dias, antes do crime, o depoente já sabia do plano sobre o roubo do veículo da Granja Ceará, sendo que foi o acusado Ivan quem propôs ao depoente, que praticassem juntos o referido crime, que para tanto o depoente iria receber R$ 3.000,00 (três mil reais) do próprio Ivan; Que o depoente tomou conhecimento através de lvan, que o mentor intelectual do crime foi Ideraldo (...)

    ZequiasXXXXXXXXXa:

    (..) Que não é verdadeira a acusação que lhe está sendo feita em virtude de não ter conhecimento da prática criminosa que estava sendo planejada para subtrair o dinheiro da Granja (...) Que o depoente no momento da abordagem ficou apavorado e em virtude do nervosismo da funcionária Núbia não percebeu se o criminoso estava ou não portando arma. (...)

    Ivan CoXXXXXXXXXXs, fls. 85:

    (...) que é veradeira a acusação que lhe está sendo feita, pois participou do roubo do dinheiro pertencente a Granja Ceará, bem como formou quadrilha Que no dia 20 de outubro, por volta das 14 horas, o depoente se encontrava nas proximidades do Posto aguardando a passagem do acusado Zequias, funcionário da Granja Ceará, que iria proceder ao depósito de certa quantia em dinheiro do referido estabelecimento, na agência do banco do Brasil, desta cidade; que juntamente com o depoente estava o acusado Simeão: que no momento em que o veículo se aproximou de um quebra molas, fizeram a abordagem dos passageiros do veículo, mediante a ameaça com arma de fogo, revólver calibre 38 em poder do depoente.

    Sutil é a análise das provas produzidas nos autos, sobretudo testemunhal, mas pelo seu conjunto não há dúvidas do envolvimento do acusado na prática criminosa.

    2. Da conduta delitiva:

    Conforme se depreende da denúncia de fls. 02 a 04 a tese acusatória é no sentido de que, efetivamente, devem os acusados serem responsabilizados, requerimento ratificado em sede de alegações finais.

    Quanto à tese defensiva, pugna pela absolvição por ausência de provas, com base no art. 386, VI, CPP.

    Destarte, entende este juízo que assiste razão à tese da acusação diante do conjunto probatório apresentado. Adune-se a isso o fato que os acusados IXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXS já foram denunciados pelos crimes de roubo armado a ônibus nas estradas de acesso a este Município (Processo nº 1032000 e 95/2001). Tal fato influência diretamente a convicção do julgador e não pode ser abandonado, sob pena de violação do ideário da Justiça.

    Constata-se ainda que os depoimentos das testemunhas, acompanhados de outros indícios e provas levam à conclusão de que os acusados são, efetivamente, os autores da prática delitiva, agindo com animus livre e dirigido para prática do crime de roubo.

    Fica, portanto, patente a culpabilidade quando incontestáveis as autorias e as materialidades do crime, bem como o dolo dos agentes, que planejaram, reuniram-se e executaram os crimes dos quais são acusados, em face dos elementos probatórios.

    Percebe-se, assim, que houve dolo dos acusados na prática

    da conduta, sendo que tinha consciência que suas ações eram previstas em lei como crime e possui a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento.

    Em assim sendo é de se reconhecer que os acusados realmente praticaram as condutas delitivas a que se reporta a denúncia, qual seja, subtrair coisa alheia móvel mediante violência e com o emprego de arma.

    Convém ressaltar que embora os Acusados não tenham ratificado em juízo os depoimentos prestados em sede policial, não há óbice algum a utilização dos depoimentos prestados na fase inquisitivas, verbis:

    DTZ1136425 - Habeas Corpus. Réus condenados por corrupção passiva. Alegação de ofensa ao devido processo legal, ao fundamento de que a condenação estaria fundamentada exclusivamente em provas do inquérito. Improcedência da alegação. A decisão condenatória fez expressa referência a outros elementos de convicção, inclusive vários depoimentos coligidos em juízo. Não cabe, em habeas corpus, por demandar reexame de provas, decidir se a situação do co-réu absolvido é a mesma dos pacientes no que respeita à prova. Habeas indeferido. (STF - HC 76369-5 - Rei. Mm. Marco Aurélio - DJU 17.03.2006) DTZ1058781 - HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. SENTENÇA CONDENATÓRIA. ALEGAÇÕES DEFENSIVAS DE NULIDADES. FALIBILIDADE DAS PROVAS TESTEMUNHAIS. IMPROPRIEDADE DA VIA MANDAMENTAL. INOBSERVÂNCIA DE PROCEDIMENTO. ART. 406, § 2. O, DO CPP. TESE ESDRÚXULA. NORMA PROCEDIMENTAL PRÓPRIA DOS PROCESSOS DE CRIMES DE COMPETÊNCIA DO JÚRI POPULAR.

    CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL. PROVA ILÍCITA. ALEGAÇÃO INFUNDADA. CONDENAÇÃO LASTREADA EM AMPLO CONJUNTO PROBATÓRIO. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. ORDEM DENEGADA. 1. O habeas corpus não comporta o exame aprofundado de prova, mormente a testemunhal. Impropriedade da via eleita. Precedentes do STJ. 2. O crime pelo qual o paciente foi condenado encontra-se tipificado e regulado por rito procedimental especial estabelecido por lei própria, tendo sido respeitado em todos os seus detalhes pelo juízo sentenciante. Não há que se falar em violação ao procedimento previsto no art. 406 e seguintes, do CPP, pois aquele refere-se tão-somente aos processos de crimes de competência do Tribunal do Júri. 3. A repudiada confissão extrajudicial, referida no decisum hostilizado, trata-se, na verdade, de delação de um dos co-réus em desfavor do paciente, que esclarece a sua ligação com o tráfico ilícito de entorpecentes. £_.A condenação foi lastreada em diversas provas contidas tanto no inquérito policial quanto na instrução criminal (prova testemunhal, documental, inclusive auto de apreensão de substância entorpecente, dentre outras), de forma que o convencimento do julgador formou-se em devida observância ao disposto no art. 197 do Código de Processo Penal. S. Writ denegado. (STJ - HC 26505 - PR - 5 T. - Rei. Min. Laurita Vaz - DJU 16.06.2003)

    DTZ1047422 - PENAL E PROCESSUAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. PROVA INQUISITORIAL. PREVALÊNCIA. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. Não se conhece da argüição de ilegitimidade do Ministério Público para intentar a ação penal em crime de atentado violento ao pudor, porque o tema já foi objeto de julgamento nesta Corte ( HC nº 27.646/RS). Os depoimentos produzidos na fase inquisitorial, ainda que não confirmados em juízo, não induzem à nulidade do feito, sobretudo quando a condenação se funda em outros elementos probatórios. "O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova." (artigo 157 do Código de Processo Penal). Descabe rever convencimento judicial sobre a aptidão da prova, confirmado pelo Tribunal Estadual, porque desborda da via eleita, marcada por rito célere e cognição sumária, infenso à dilação probatória. Ordem parcialmente conhecida e, nesta extensão, denegada. (STJ - HC 30497 - RS - 6 T. - Rei. Mm. Paulo Medina - DJU 06.09.2004)

    O que se extrai dos fundamentos da sentença criminal, para além de longas citações abstratas de cunho legal e doutrinário, bem como de precedentes jurisprudenciais, não é suficiente para se construir uma relação sólida de congruência lógica capaz de sustentar a condenação do ora recorrente, Zequias XXXXXXXXXXX.

    Com efeito, das citações alusivas à prova oral colhida em juízo, verifica-se que há, na sentença, duas alusões ao paciente: a primeira, que diz respeito ao seu interrogatório, no qual negou a imputação, disse não ter conhecimento da trama criminosa e acrescentou ter ficado apavorado no momento dos fatos; a segunda é relativa ao interrogatório do corréu Ivan XXXXX, que confessou a prática do crime e alegou que esperava Zequias passar pelo local dos fatos com o numerário almejado para então fazer a abordagem e efetuar o roubo. As testemunhas mencionadas pelo juízo nada trouxeram a respeito do envolvimento do paciente com o roubo.

    Como se observa sem maiores dificuldades, apenas da leitura da sentença condenatória, nenhuma dessas menções é capaz de estabelecer, para além de qualquer dúvida razoável, o vínculo subjetivo do paciente com os fatos criminosos que lhe foram imputados.

    À míngua da exibição de provas colhidas ao longo da instrução criminal, cautelares, não repetíveis ou antecipadas que evidenciem de modo satisfatório, para além de qualquer dúvida razoável, que o recorrente tenha ao menos concorrido para a prática delituosa imputada pela acusação, impõe-se reconhecer que o juízo de primeiro grau não se desincumbiu de seu ônus argumentativo ao fundamentar a sentença com base no que preconiza o art. 155 do CPP.

    A esse respeito, confiram-se as percucientes ponderações lançadas pelo Ministério Público Federal em parecer oferecido perante o Superior Tribunal de Justiça (eDOC 20, pp. 2-3);

    4. O paciente, por sentença que transitou em julgado para a acusação em 11/11/2009 e para a defesa em 26/10/2009 (fl. 191), restou condenado às penas de 8 anos de reclusão, em regime inicial fechado, e 20 dias-multa pela prática dos crimes definidos no Código Penal no art. 157, § 2º, I e II (roubo majorado pelo emprego de arma e concurso de agentes) e no art. 288, caput (quadrilha ou bando).

    5. Sob a alegação de vício de fundamentação da sentença condenatória e de ausência de prova apta a embasar o decreto condenatório, a defesa do paciente ajuizou pedido de revisão criminal na Corte de origem, que foi julgado improcedente nos termos do acórdão de fls. 258/274.

    6. Porém, assiste razão à defesa do paciente ao pleitear a revisão da sentença condenatória, uma vez que os seus fundamentos não explicitam, de forma minimamente segura, a autoria ou participação do ora paciente nos fatos delituosos que lhe foram imputados na denúncia e pelos quais restou condenado.

    7. O Juiz sentenciante asseverou que "(A) materialidade do delito capitulado no art. 157, § 2º, 1, II e III c/c art. 288, parágrafo único, do Código Penal está amplamente comprovada, tanto pelos depoimentos dos acusados, testemunhas e demais provas havidas nos autos" (fl. 175), transcrevendo em seguir trechos dos depoimentos dos corréus Simeão Sousa, Ideraldo Mousinho, Fernando Mousinho, Antônio Carolino e Ivan Costa.

    8. Contudo, a se ler os trechos transcritos pelo magistrado, pode-se perceber claramente que nenhum dos corréus faz qualquer afirmação da qual se possa concluir, ainda que por dedução ou de forma indireta, a participação do ora paciente nos crimes de roubo e formação de quadrilha. Aliás, cumpre observar que a única menção ao ora paciente foi feita pelo acusado Ivan Costa de Freitas, cujo depoimento foi transcrito na sentença à fl. 179:

    Ivan XXXXXXXXCosta de Freitas, fls. 85:

    ( ... ) que é verdadeira a acusação que lhe está sendo feita, pois participou do roubo do dinheiro pertencente a Granja Ceará, bem como formou quadrilha Que no dia 20 de outubro, por volta das 14 horas, o depoente se encontrava nas proximidades do Posto aguardando a passagem do acusado Zequias, funcionário da Granja Ceará, que iria proceder ao depósito de certa quantia em dinheiro do referido estabelecimento, na agência do banco do Brasil, desta cidade; que juntamente com o depoente estava o acusado Simeão: que no momento em que o veículo se aproximou de um quebra molas, fizeram a abordagem dos passageiros do veículo, mediante a ameaça com arma de fogo, revólver calibre 38 em poder do depoente.

    9. Portanto, o corréu Ivan CXXXXX limita-se a afirmar que "se encontrava nas proximidades do Posto aguardando a passagem do acusado Zequias, funcionário da Granja Ceará, que iria proceder ao depósito de certa quantia em dinheiro do referido estabelecimento, na agência do banco do Brasil, desta cidade." Não há nenhuma menção, seja do acusado Ivan, seja dos demais acusados, no sentido de que o ora paciente (Zequias Oliveira) participou do crime de roubo.

    10. Cumpre observar que nenhum outro elemento de convicção, além dos referidos depoimentos, foi apontado pelo Juiz sentenciante acerca da autoria delitiva dos fatos imputados ao ora paciente, limitando-se a afirmar que "os depoimentos das testemunhas, acompanhados de outros indícios e provas levam à conclusão de que os acusados são, efetivamente, os autores da prática delitiva, agindo com animus livre e dirigido para prática do crime de roubo" (fl. 181), sem explicitar, no entanto, quais testemunhas e provas seriam essas e quais indícios seriam esses. Ora, é dever do juiz não apenas mencionar a existência de prova da autoria e materialidade delitivas, mas também, e principalmente, explicitar quais provas são essas, sob pena nulidade da sentença condenatória por ausência de fundamentação válida, a inviabilizar o exercício da ampla defesa.

    11. O Juiz sentenciante asseverou ainda que, "embora os Acusados não tenham ratificado em juízo os depoimentos prestados em sede policial, não há óbice algum a utilização dos depoimentos prestados na fase inquisitiva, verbis:" (fl. 181), quando tais depoimentos forem corroborados por outras provas produzidas em juízo sob contraditório. Ocorre que o Juiz não indica, sequer implicitamente, quais provas judicializadas corroborariam os depoimentos dos corréus prestados em sede inquisitorial.

    12. Do exposto, é lícito concluir que não foi apontada na sentença condenatória nenhuma prova, judicial ou extrajudicial, capaz de sustentar a condenação do ora paciente pelos crimes que lhe foram imputados, sendo que a procedência do pedido revisional com fundamento no art. 621, I, parte final, do CPP era medida que se impunha para o fim de absolvê-lo com fulcro no art. 386, V, do mesmo diploma processual penal (não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal).

    Logo, está configurada, no caso em exame, a ofensa ao dever de fundamentação das decisões judiciais (art. 93, IX, da CF/1988), havendo, por conseguinte, constrangimento ilegal capaz de ensejar a reforma do acórdão recorrido e a concessão da ordem pleiteada.

    Ante o exposto, nos termos dos arts. 192 e 312 do RISTF, dou provimento ao presente recurso ordinário para conceder a ordem de habeas corpus e absolver o recorrente Zequias XXXXXXXX da imputação constante da ação penal 80/2000, nos termos do art. 386, V, do CPP.

    Comunique-se, com urgência, ao juízo da execução, ao qual incumbirá imediato o implemento da presente decisão.

    Outrossim, comunique-se ao TJMA e ao STJ, para ciência.

    Publique-se.

    Brasília, 19 de dezembro de 2023.

    Ministro EDSON FACHIN

    Relator

    Documento assinado digitalmente

    (STF - RHC: 224840 MA, Relator: EDSON FACHIN, Data de Julgamento: 19/12/2023, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 19/12/2023 PUBLIC 08/01/2024)

    👉👉👉👉 Meu Whatsaap de Jurisprudências, Formulação de HC eREsp - https://chat.whatsapp.com/FlHlXjhZPVP30cY0elYa10

    👉👉👉👉 ME SIGA INSTAGRAM @carlosguilhermepagiola.adv

    • Publicações1079
    • Seguidores99
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações29
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/stf-2023-roubo-absolvicao-sentenca-anulada-por-falta-de-fundamentacao-art93-ix-da-cf-88/2364327852

    Informações relacionadas

    Carlos Guilherme Pagiola , Advogado
    Notíciashá 13 dias

    STF Jan2024 - Porte Ilegal de Arma - Absolvição - Condenação com base em Foto, sem Apreensão da Arma - Ausência de Materialidade

    Carlos Guilherme Pagiola , Advogado
    Notíciashá 14 dias

    STJ 2023 - Advogado que Recebe os Honorários e Não Presta o Serviço não Pratica Apropriação Indébito - Apenas Ilícito Cível

    Carlos Guilherme Pagiola , Advogado
    Notíciashá 13 dias

    STF Jan24 - Execução Penal - Prisão Domiciliar Humanitário - Risco de Morte do Apenado

    Caio Ramos, Advogado
    Notíciashá 13 dias

    Nova lei estadual de São Paulo determina que cartórios devem comunicar à Defensoria nascimento de bebês sem registro do pai

    Ponto Jurídico, Advogado
    Notíciashá 13 dias

    STF proíbe porte de armas para vigilantes

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)