Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
28 de Maio de 2024
  • 2º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Detalhes

Processo

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

ANDRE MENDES DE MOURA

Documentos anexos

Inteiro TeorCARF__16561720079201568_c5a4c.PDF
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Inteiro Teor

Processo nº 16561.720079/2015-68

Recurso Especial do Procurador

Acórdão nº 9101-004.709 - CSRF / 1a Turma

Sessão de 17 de janeiro de 2020

Recorrente FAZENDA NACIONAL

Interessado SSTOWERS PARTICIPACOES S. A.

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ)

Ano-calendário: 2011

REDUÇÃO DE CAPITAL. ENTREGA DE BENS E DIREITOS DO ATIVO AOS ACIONISTAS. VALOR CONTÁBIL. FACULDADE. LEI 9.249/1995, ART. 22. LEGALIDADE.

Os artigos 22 e 23 da Lei nº 9.249, de 1995, adotam o mesmo critério, tanto para integralização de capital social, quanto para devolução deste aos sócios ou acionistas, conferindo coerência ao sistema jurídico.

O artigo 22 prevê que os bens e direitos do ativo da pessoa jurídica, que forem entregues ao titular ou a sócio ou acionista, a título de devolução de sua participação no capital social, poderão ser avaliados pelo valor contábil ou de mercado. É lícita, portanto, a devolução de bens e direitos aos acionistas pelo valor contábil.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

Acordam os membros do colegiado, por voto de qualidade, em conhecer do Recurso Especial, vencidos os conselheiros Edeli Pereira Bessa, Demetrius Nichele Macei, Lívia De Carli Germano e Amélia Wakako Morishita Yamamoto, que não conheceram do recurso. No mérito, por maioria de votos, acordam em negar-lhe provimento, vencidos os conselheiros André Mendes de Moura (relator), Viviane Vidal Wagner e Andrea Duek Simantob, que lhe deram provimento. Votou pelas conclusões a conselheira Edeli Pereira Bessa. Designada para redigir o voto vencedor a conselheira Cristiane Silva Costa. Manifestaram intenção de apresentar declaração de voto as conselheiras Edeli Pereira Bessa e Lívia De Carli Germano.

(documento assinado digitalmente)

Andrea Duek Simantob - Presidente em Exercício

(documento assinado digitalmente)

André Mendes de Moura - Relator

DF CARF MF

Fl. 3802

Fl. 2 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

(documento assinado digitalmente)

Cristiane Silva Costa - Redatora designada

Participaram da sessão de julgamento os conselheiros: André Mendes de Moura, Cristiane Silva Costa, Edeli Pereira Bessa, Lívia de Carli Germano, Viviane Vidal Wagner, Amélia Wakako Morishita Yamamoto, Caio Cesar Nader Quintella (suplente convocado) e Andrea Duek Simantob (Presidente em Exercício).

Relatório

Trata-se de Recurso Especial (e-fls. 3470/3493) interposto pela Procuradoria- Geral da Fazenda Nacional ("PGFN") em face da decisão proferida no Acórdão de Embargos nº 1201-002.149 (e-fls. 3433/3468), pela 1a Turma Ordinária da 2a Câmara da Primeira Seção, na sessão de 15/05/2018, no qual foram acolhidos embargos de declaração com efeitos infringentes para dar provimento ao recurso voluntário.

Assim foi ementada a decisão recorrida:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA IRPJ

Data do fato gerador: 31/03/2011

DEVOLUÇÃO DE PARTICIPAÇÃO NO CAPITAL SOCIETÁRIO. SÓCIO PESSOA

FÍSICA.

Correta a devolução do capital societário, na forma de bens, ao sócio investidor, que se

retira da sociedade e da atividade.

DEVOLUÇÃO DE PARTICIPAÇÃO NO CAPITAL SOCIETÁRIO. BENS.

Os bens e direitos do ativo da pessoa jurídica, que forem entregues ao titular ou a sócio

ou acionista. a título de devolução de sua participação no capital social, poderão ser

avaliados pelo valor contábil ou de mercado.

ASSUNTO: NORMAS DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA

Data do fato gerador: 31/03/2011

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. LAPSO MANIFESTO.

Constatada, mediante embargos de declaração, a ocorrência de obscuridade, omissão,

contradição ou lapso manifesto, deve-se proferir novo Acórdão, para retificar o Acórdão

embargado. Inteligência do art. 66 do Anexo II do

Regimento Interno do CARF, aprovado pela Portaria MF 343, de 2015.

ASSUNTO: NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO

Data do fato gerador: 31/03/2011

SIMULAÇÃO. DESCARACTERIZADA.

E fica descaracterizado que se tratou de simulação, ou operações artificialmente engendradas visando a venda da empresa e de artifício a fim de que a tributação do

DF CARF MF

Fl. 3803

Fl. 3 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

ganho de capital na venda da parcela entregue ao sócio dissidente fosse tributada na pessoa física deste e não pela autuada, se o sócio dissidente se retira da atividade, enquanto o sócio restante continua mantendo a empresa operando na atividade.

VOTO DE QUALIDADE. ART. 112, CTN.

Descabe aplicação do art. 112 do CTN, no caso decisão por voto de qualidade no CARF.

Resumo Processual

A autuação fiscal (e-fls. 904/942), de IRPJ/CSLL, relativa ao ano-calendário de 2011, trata de ganho de capital decorrente da alienação das ações da SITESHARING NE para a AMERICAN TOWER DO BRASIL ("AmericanTower"). Discorre a autoridade fiscal que, para concretizar a venda, a SSTOWERS PARTICIPACOES ("Contribuinte"), detentora das ações, em evento de cisão parcial, transferiu a titularidade do ativo a ser alienado para um dos seus acionistas pessoa física, FLÁVIO OGNIBENE GUIMARÃES ("Flávio"). Na sequência. o sócio pessoa física alienou as ações da SITESHARING para a AmericanTower, operação que possibilitou a apuração de ganho de capital incidente sobre pessoa física (15%) em valor menor do que sobre a pessoa jurídica (34%), que teria ocorrido sem nenhum propósito negocial. Foi lavrado termo de sujeição passiva indireta com base no art. 121, inciso I do CTN, em face de FLÁVIO OGNIBENE GUIMARÃES, SERVISITE ("Servisite") e SESTRI EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES ("Sestri"). Foi qualificada a multa de ofício (150%).

Foram apresentadas impugnações (Contribuinte, e-fls. 1001 e segs; Servisite, e- fls. 1296 e segs; Sestri, e-fls. 1400 e segs; e Flávio, e-fls. 1932 e segs). A primeira instância (DRJ) julgou as impugnações procedentes em parte (e-fls. 2529/2561), para afastar a qualificação da multa de ofício, afastar a responsabilidade tributária e determinar a dedução do IRRF pago pelo sócio pessoa física da exigência fiscal. Em razão do crédito tributário exonerado, foi remetido recurso de ofício.

A Contribuinte interpôs recurso voluntário (e-fls. 2616/2722). Em primeiro julgamento, a segunda instância (turma ordinária do CARF) negou provimento ao recurso voluntário (e-fls. 2957/2989) e deu provimento parcial do recurso de ofício.

Foram opostos embargos de declaração (e-fls. 3014 e segs). Despacho de exame de admissibilidade de embargos (e-fls. 3357/3424) deu seguimento parcial ao recurso da Contribuinte, Flávio e Sestri, e rejeitou seguimento para Servisite.

Acórdão de embargos acolheu os embargos com efeitos infringentes (e-fls. 3433/3468) para dar provimento ao recurso voluntário.

Foi interposto recurso especial pela PGFN (e-fls. 3470/3493), que foi admitido pelo despacho de exame de admissibilidade (e-fls. 3496/3505).

Foram apresentadas contrarrazões pela Contribuinte (e-fls. 3529 e segs.) e pela Sestri (e-fls. 3622 e segs).

A seguir, maiores detalhes sobre a fase contenciosa.

Da Fase Contenciosa.

DF CARF MF

Fl. 3804

Fl. 4 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Foram apresentadas impugnações pela Contribuinte e pelos sujeitos passivos indiretos (Flávio, Servisite e Sestri), que foram julgadas procedentes em parte pela 3a Turma da DRJ/Recife, no Acórdão nº 11-52.661, conforme ementa a seguir.

ASSUNTO: PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL

Ano-calendário: 2011

ARGUIÇÃO DE ILEGALIDADE E INCONSTITUCIONALIDADE. DELEGACIAS

DE JULGAMENTO. INCOMPETÊNCIA. APRECIAÇÃO.

As Delegacias de Julgamento devem observar a legislação tributária vigente no País,

sendo-lhes defeso apreciar arguições de inconstitucionalidade e de ilegalidade de

normas regularmente editadas.

FALTA DE INDICAÇÃO DE LEGISLAÇÃO. CERCEAMENTO DO DIREITO DE

DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA.

A falta de indicação da legislação subsunsora da infração não enseja nulidade do

lançamento quando se verifica o que se apurou foi devidamente descrito nos autos de

infração, bem assim no correspondente Termo de Verificação Fiscal, e resta evidenciada

a perfeita compreensão dos fatos por parte do contribuinte.

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA - IRPJ

Ano-calendário: 2011

REORGANIZAÇÃO SOCIETÁRIA. FALTA DE PROPÓSITO NEGOCIAL.

INEFICÁCIA.

Os efeitos de reorganização societária em que não existe outra motivação senão a de

criação artificial de condições para auferimento de vantagens tributárias não são

oponíveis à Fazenda Pública.

ASSUNTO: NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO

Ano-calendário: 2011

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO. MULTA QUALIFICADA. IMPROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE DOLO

antemão não se confundem com o motivo que enseja a qualificação da multa de ofício, qual seja a intenção de fraudar o fisco nos termos dos art. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502, de 1964; não restando demonstrado dolo específico do contribuinte na prática das condutas previstas nesses artigos, descabe a qualificação.

SUJEIÇÃO PASSIVA SOLIDÁRIA. SÓCIO DE DIREITO. EXCLUSÃO DO POLO PASSIVO.

O sócio de direito não se confunde com a pessoa jurídica de cujo capital participa, de maneira que não há responsabilizá-lo em virtude dessa sua condição.

RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. NÃO CABIMENTO. ADMINISTRADORES. EXCESSO DE PODERES OU VIOLAÇÃO DE LEI, CONTRATO SOCIAL OU ESTATUTO. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO

Não restando demonstrado o administrador agiu com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatuto, nos termos do art. 135 do CTN, descabe a sua responsabilização. A constatação de planejamento tributário abusivo não supre a exigência prevista no dispositivo.

JUROS SOBRE MULTA DE OFÍCIO. MATÉRIA ALHEIA À LIDE.

Dado que não houve lançamento de juros sobre a multa de ofício, não compete a esta instância julgadora, neste momento, manifestar-se sobre o assunto.

TRIBUTAÇÃO REFLEXA. CSLL.

DF CARF MF

Fl. 3805

Fl. 5 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

A decisão prolatada no lançamento matriz estende-se aos lançamentos decorrentes, em razão da íntima relação de causa e efeito que os vincula.

(...)

Acordam os membros da 3a Turma de Julgamento, por unanimidade de votos, rejeitar a preliminar de nulidade e, no mérito, considerar procedente em parte a impugnação, para: a) manter o crédito nos valores principais, que devem ser exigidos com a aplicação de multa, no percentual de 75%, e juros de mora, b) considerar improcedente a imputação de responsabilidade da Servisite Ltda, da Sestri Empreendimentos e Participações Ltda. e do Sr. Flávio Ognibene Guimarães e c) Determinar seja considerado, quando da cobrança do crédito, o valor de IRPF pago pelo Sr. Flávio Ognibene, a título de ganho de capital, pela venda da Sitesharing do Nordeste.

Em razão da exigência tributária exonerada ter ultrapassado o limite de alçada, foi efetuada remessa necessária (recurso de ofício).

Foi interposto recurso voluntário pela Contribuinte. Em julgamento realizado no dia 21/06/2017, a 1a Turma Ordinária da 2a Câmara da Primeira Seção, no Acórdão nº 1201- 001.778, negou provimento ao recurso voluntário e deu provimento parcial ao recurso de ofício, nos termos da ementa:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA IRPJ

Data do fato gerador: 31/03/2011

ALIENAÇÃO. PESSOA FÍSICA. SÓCIO, SIMULAÇÃO.

As transformações societárias realizadas pelas sócias da autuada e que foram o foco da

presente autuação, visaram desmembrar parte do acervo operacional da Autuada

(incluído o atribuído pela sócia que permaneceu), para ser vendida a outra empresa, pela

pessoa física do sócio; o processo de transferência para a pessoa física do sócio

envolveu o valor contábil do acervo e a venda pela pessoa física se deu pelo valor de

mercado, incidindo a tributação à alíquota de 15% , caracterizando que as operações

foram simuladas, dado que o objetivo foi a venda de parte do acervo pela pessoa

jurídica.

ASSUNTO: NORMAS DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA

Data do fato gerador: 31/03/2011

AUTO DE INFRAÇÃO. NULIDADE.

Somente ensejam a nulidade os atos e termos lavrados por pessoa incompetente e os

despachos e decisões proferidos por autoridade incompetente ou com preterição do

direito de defesa.

IR RECOLHIDO. DEDUÇÃO.

Procede o pleito da autuada e da pessoa física que efetuou os recolhimentos, de que os

valores de Imposto de Renda recolhidos pela pessoa física, em relação à mesma

transação autuada na pessoa jurídica, sejam deduzidos dos valores de IRPJ exigidos da

autuação, antes da aplicação da multa de ofício e dos juros de mora, uma vez que aquela

operação foi descaracterizada, porém o imposto foi recolhido espontaneamente.

ASSUNTO: NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO

Data do fato gerador: 31/03/2011

JUROS DE MORA SOBRE MULTA. INCIDÊNCIA.

A multa de ofício é parte integrante da obrigação ou crédito tributário e, quando não extinta na data de seu vencimento, está sujeita à incidência de juros.

DF CARF MF

Fl. 3806

Fl. 6 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 124, I, DO CTN. INTERESSE COMUM. CABIMENTO.

Cabe a imposição de responsabilidade tributária em razão do interesse comum na situação que constitui fato gerador da obrigação principal, nos termos do art. 124, I, do CTN, quando demonstrado que os responsabilizados não apenas ostentavam a condição de sócios de fato da autuada, como foram os responsáveis pelas operações societárias que resultaram na autuação.

VOTO DE QUALIDADE. ART. 112, CTN.

Descabe aplicação do art. 112 do CTN, no caso de empate de votação no CARF.

Foram opostos embargos de declaração. Despacho de exame de admissibilidade de embargos deu seguimento parcial ao recurso da Contribuinte, Flávio e Sestri, e rejeitou seguimento para Servisite.

O Acórdão de Embargos nº 1201-002.149, proferido pela 1a Turma Ordinária da 2a Câmara da Primeira Seção, votou no sentido de dar provimento ao recurso voluntário.

Foi interposto recurso especial pela PGFN, apresentando como paradigmas os acórdãos nº 1301-001.113 e 1401-002.196.

Despacho de exame de admissibilidade deu seguimento ao recurso, para o paradigma nº 1401-002.196.

No mérito, discorre a PGFN que o Fisco poderia desconsiderar os efeitos jurídicos tributários caso esteja demonstrada que a pretensão das partes ao celebrar o negócio jurídico seria exclusivamente fugir da tributação. No caso concreto, teria havido a ausência de propósito negocial na reorganização societária que consumou a alienação do ativo. Contesta as operações ocorridas em momento anterior à celebração do negócio, dentro do grupo econômico. Primeiro, o sacrifício financeiro que Flávio teria suportado para obter as ações da SITESHARING junto à Sestri e Servisite, para, logo em seguida, alienar o investimento para a AmericanTower. Teria restado evidenciado que, a partir do momento em que foi instaurada a negociação para a AmericanTower adquirir as ações da SITESHARING, o grupo SITESHARING teria financiado Flávio, pessoa física, para que ele pudesse adquirir as ações do grupo econômico, que seriam na sequência alienadas para a AmericanTower. Segundo, discorre sobre as circunstâncias em que ocorreram a cisão no qual foram transferidas as ações da SITESHARING para Flávio. Isso porque a AmericanTower teria aprovado, em 30/09/2010 a compra da SITESHARING, e teria elencado a cisão parcial como "condição precedente à formalização" do contrato de alienação. Assim, a aprovação da cisão parcial teria sido determinante para a celebração do contrato de aquisição das ações. Conclui que a intenção seria vender ativos da SITESHARING que sofreriam tributação de pessoa jurídica (34%) caso a alienação ocorresse pela própria SITESHARING, e, para se escapar dos encargos tributários mais onerosos, os sócios da SITESHARING preferiram separar os ativos e transferi-los para a pessoa física Flávio. Assim, a reorganização societária teria se engendrado exclusivamente para realizar o ganho de capital na pessoa física, em vez da pessoa jurídica. Requer pelo conhecimento e provimento do recurso especial.

A Contribuinte apresentou contrarrazões. Protesta pelo não conhecimento do recurso, por entender (1) que o paradigma nº 1401-002.196 trata de situação fática distinta dos autos e (2) que a decisão recorrida apreciou apenas questão fática atinente a prova dos autos, o que não seria passível de devolução em sede de recurso especial, onde não haveria que se falar em rediscussão dos fatos. Sobre o primeiro aspecto, discorre que a transferência das ações em

DF CARF MF

Fl. 3807

Fl. 7 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

favor de Flávio deu-se porque havia uma divergência entre ele e outra acionista da Contribuinte, a empresa Servsite, vez que Flávio (controlador) tinha intenção de sair do negócio, enquanto que a Servsite (minoritário) pretendia continuar com a sua atividade. Por outro lado, no paradigma, havia uma peculiaridade fática ausente nos presentes autos, qual seja, cláusula tag along que teria sido acionada e que, de acordo com a decisão paradigma, beneficiaria apenas a empresa que assinou o acordo de acionistas, ou seja, não seria aplicável a pessoas físicas (no caso, os sócios pessoa física). No paradigma, as ações da Aracruz eram detidas conjuntamente pela Arainvest (família Safra) e pela Lorentzen, e a VCP fez oferta para adquirir as ações junto à Lorentzen. Na negociação, havia no contrato cláusula tag along , no qual se exigia que a VCP também fizesse proposta à Arainvest a compra das ações da Aracruz nas mesmas condições oferecidas à Lorentzen. Então, a família Safra convocou AGE para deliberar sobre devolução de capital na Arainvest, o que consumou na transferência das ações da Aracruz (que seriam alienadas para a VCP) para os sócios pessoa física. Diante da situação, entendeu a decisão paradigma que a cláusula tag along intitularia apenas a Arainvest (pessoa jurídica) a alienar as ações da Aracruz, e, na medida em que houve a transferência das ações aos sócios pessoa física, teria havido um desvirtuamento da cláusula de tag along , vez que se afrontaria o princípio contábil da entidade. Registra ainda que o paradigma teria sido expresso ao consignar que o cerne para a manutenção da autuação não teria sido a devolução de capital às pessoas físicas, o que seria plenamente possível por expressa disposição, mas sim os efeitos da cláusula tag along ao negócio. Por outro lado, nos presentes autos, foi realizada uma cisão parcial da Contribuinte, com efeitos de devolução de capital a Flávio cujo objetivo era separar o patrimônio dos seus sócios, vez que enquanto Flávio queria sair do negócio, a Serviste havia decidiu dar prosseguimento à sociedade. Registra que em sessão posterior, a mesma turma que julgou o paradigma, ao apreciar outra operação tratando de redução de capital (acórdão nº 1401-002.307), no qual não havia a cláusula tag along , decidiu cancelar a autuação fiscal. Assim, não havendo similitude fática, o caso Arainvest não poderia servir como paradigma , razão pela qual não se pode conhecer o recurso especial. Sobre o segundo aspecto, aduz que no julgamento dos embargos de declaração que deu origem ao acórdão recorrido, a apreciação ter-se-ia dado sobre fatos e provas, e, com base na peculiaridade fática e documental, decidiu-se pela incidência no art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995. Assim, sendo, diante da decisão recorrida, que se restringiu à análise de fatos e provas, não haveria em se falar em devolutividade em sede de recurso especial, no qual a rediscussão de provas e fatos não é admitida. Requer, assim, pelo não seguimento do recurso especial. Em relação ao mérito, discorre que, se o objetivo da operação fosse unicamente a redução tributária, não seria necessária a cisão parcial, bastando que Flávio (sócio pessoa física) alienasse diretamente a sua participação. Ocorre que, não existindo mais o affectio societatis entre os acionistas (Flávio e Servsite), nada mais normal seria do que o encerramento da união mediante a cisão com a versão de parte dos ativos detidos à empresa já existente do grupo Sitesharing. Não teria havido comprovação de que o objetivo da operação seria fugir da tributação, pelo contrário, o real motivo teria sido o dissenso entre os sócios, e no decorrer de todo o processo teria restado demonstrado que a operação foi devidamente implementada com substância formal e material, valendo-se de opção legal do art. 22 da Lei nº 6.404, de 1976. A operação teria sido efetuada com base no disposto no artigo 22 da Lei nº 9.249/1995 que, de forma expressa, estabelece a possibilidade de a pessoa jurídica transferir, a título de devolução de capital, bens e diretos aos seus respectivos acionistas avaliados pelo valor contábil ou de mercado. Teria o próprio legislador reconhecido que o disposto no artigo 22 da Lei nº 9.249/95 se trata de uma opção, tanto que intermédio da Medida Provisória nº 692/2015, convertida na Lei nº 13.259/201615, alterou as alíquotas para tributação de ganho de capital na pessoa física. Requer pelo não provimento do recurso especial. Ao final, discorre sobre matérias superadas nos autos, quais

DF CARF MF

Fl. 3808

Fl. 8 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

sejam, aproveitamento dos valores pagos a título de ganho de capital por Flávio na condição de pessoa física, exoneração da multa qualificada e exclusão dos responsáveis tributários Flávio, Servsite e Sestri. Requer pelo não conhecimento do recurso e, caso seja dado seguimento, pelo não provimento.

A Sestri também apresentou contrarrazões. Em relação ao conhecimento, pugna pelo não seguimento do recurso especial, vez que a PGFN teria partido de uma premissa absolutamente equivocada para demonstrar a suposta divergência entre os acórdãos confrontados, o que impediria o conhecimento do recurso. Discorre que em momento algum a turma julgadora teria reconhecido o que planejamento tributário seria lícito mesmo "sem substância econômica", e tampouco que a operação teria sido feita com o objetivo exclusivo reduzir a carga tributária. Bastaria observar que o acórdão recorrido só cancelou o lançamento de ofício pelo fato de ter reconhecido que a cisão parcial da Sitesharing Brasil e a consequente alocação do patrimônio cindido na Sitesharing NE teve um propósito negocial, qual seja a separação dos ativos detidos pelo Sr. Flávio Guimarães dos ativos detidos pela Servsite em razão da quebra da affectio societatis. Ainda, eventual alteração do resultado do julgamento demandaria, necessariamente, a uma revaloração do conjunto fático-probatório, o que é vedado em sede de recurso especial. Aduz que o acórdão paradigma invocado pela PGFN, apesar de interpretar a mesma legislação do acórdão recorrido, possui situação fática diversa, vez que não teria se vislumbrou a presença do propósito negocial, ao passo que, no acórdão recorrido, ele restou caracterizado, o seja, justamente a diferença entre os cenários fáticos dos acórdãos confrontados que levaram a diferentes soluções adotadas, de sorte que não há dissídio jurisprudencial a ser resolvido. Sobre o mérito, discorre que as razões apresentadas pela PGFN teriam se pautado em premissas fáticas equivocadas, que ao contrário que foi alegado pela PGFN, todos os valores estabelecidos contratualmente - tanto com a Sestri quanto com a Servsite - teriam sido efetivamente quitados pelo Sr. Flávio Guimarães (pagamento ou compensação de dividendos); que as parcelas referentes ao preço de aquisição das ações da Sitesharing Brasil pelo Sr. Flávio Guimarães não foram quitadas com os valores de dividendos recebidos dessa mesma sociedade, que não procede a assertiva da PGFN de que "o negócio com a AMERICAN TOWER foi determinante para a aprovação da cisão parcial", pois a cisão ocorreu em 01.09.2010, ao passo que a primeira AGE para autorizar a aquisição da Sitesharing NE só veio a ocorrer em 30.09.2010, quando realizada a primeira negociação com o Sr. Flávio Guimarães, que acabou não se concretizando. Não obstante, o contrato de alienação só foi assinado cinco meses depois, em 17.02.2011, após a realização de uma segunda AGE, tendo em vista a perda de eficácia da primeira e, além disso, o Sr. Flávio Guimarães, posteriormente à operação societária em questão, permaneceu negociando com outros interessados (Grupo TorreSur e Summit Partners) na aquisição da Sitesharing NE. Discorre que não haveria qualquer irregularidade na compra das ações da Servsite (jamais questionada pela fiscalização) ou na transferência dos sites, anteriormente integralizados na Sitesharing Brasil, para a Sitesharing NE, vez que, ao final, no momento da cisão parcial, cabia ao Sr. Flávio Guimarães 80% de todos os ativos detidos pela Sitesharing Brasil, o que teria justificado a transferência para a Sitesharing NE. Entende que a operação societária autuada não poderia ser caracterizada como "planejamento tributário" (ou hipótese de "elisão fiscal"), vez que (a) a cisão seguida da incorporação eram absolutamente desnecessárias para que houvesse a tributação do ganho de capital na pessoa do sócio (pessoa física) pelo IRPF incidente à alíquota de 15%, já que era plenamente possível que o sócio alienasse diretamente as suas ações a terceiros; (b) os resultados econômicos da operação proposta pela fiscalização e da operação autuada são distintos, uma vez que, na primeira hipótese, todo o ganho de capital da operação seria forçosamente alocado no patrimônio da Autuada só dele fazendo jus o Sr. Flávio Guimarães ao percentual de 80%, ao

DF CARF MF

Fl. 3809

Fl. 9 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

passo em que, no segundo caso, todo o ganho de capital (100%) foi alocado no seu patrimônio pessoal; e (c) concretizou-se o exercício da opção fiscal prevista no artigo 22 da Lei nº. 9.249/95, que, por prescrever uma conduta positivamente autorizada pelo ordenamento jurídico, à luz da jurisprudência recente do CARF que indica pela não prática de planejamento tributário. Ademais, teria a operação propósito negocial e outras razões extratributárias que a justificam, quais sejam: (a) a quebra da affectio societatis: o cerne das divergências entre as partes dizia respeito ao interesse quanto à continuidade da exploração da atividade econômica: ao passo em que o Sr. Flávio Guimarães buscava sair do ramo de sites mediante a alienação da sua parcela do negócio a terceiros, sobretudo, em vista da crescente concorrência no mercado brasileiro e do sufocamento exercido por grandes grupos empresariais, a Servsite desejava dar continuidade à exploração da atividade econômica até então desempenhada pela Sitesharing Brasil e Nordeste, situação mantida atualmente; (b) a operação foi realizada entre partes independentes e há significativo lapso temporal (em regra, mais de 1 ano) entre todas as etapas que a caracterizaram. Enfim, aduz que, independentemente do juízo realizado pela CSRF a respeito dos demais pontos das presentes Contrarrazões, deverão ser canceladas, ao menos, a qualificação da multa de ofício e a responsabilização solidária da Recorrida, vez que, tanto no caso do acórdão recorrido quanto no caso do acórdão paradigma, as soluções jurídicas adotadas para o conjunto fático analisado (pretensamente semelhante entre os casos) seguiram no sentido de cancelar essas exigências das respectivas autuações analisadas. E, ainda que se negasse provimento a todos os argumentos até agora ventilados nas presentes Contrarrazões, impõe-se o provimento do Recurso Especial nos exatos termos do quanto pedido pela PGFN, restabelecendo-se integralmente a decisão proferida pela DRJ em primeira instância, no qual se manteve o afastamento da multa de ofício qualificada e a exclusão do vínculo de solidariedade imputado. Ao final, requer que todas as intimações e notificações a serem feites sejam encaminhadas aos procuradores bem como sejam enviadas à recorrida.

É o relatório.

Voto Vencido

Conselheiro André Mendes de Moura, Relator.

A matéria devolvida diz respeito a ganho de capital (exigência fiscal relativa ao principal de IRPJ e CSLL, acompanhado de multa proporcional de 75% e juros de mora) apurado a partir de reorganizações societárias empreendidas pela Contribuinte para alienar ativo, e consiste dizer se as operações teriam amparo em face ao disposto no art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, o que poderia ensejar a transferência da tributação da pessoa jurídica (Contribuinte, alíquota de IRPJ e CSLL perfazendo 34%) para o sócio pessoa física (IRPF de 15%).

Despacho de exame de admissibilidade deu seguimento ao recurso especial da PGFN com base no paradigma nº 1401-002.196.

Inicio o exame de admissibilidade.

Nas duas contrarrazões apresentadas (Contribuinte e Sestri), contesta-se a admissibilidade do recurso especial da PGFN. Protesta-se sobre suposta premissa adotada pela PGFN de que a reorganização teria sido um planejamento tributário sem substância econômica com o objetivo exclusivo de buscar redução da carga tributária, que o paradigma nº 1401-

DF CARF MF

Fl. 3810

Fl. 10 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

002.196, tendo se amparado em cláusula específica de tag along presente na negociação que tratou da alienação do investimento, trataria de situação fática dessemelhante com as dos presentes autos, e que o presente momento processual, ao tratar de recurso especial, não comporta reanálise fática-probatória.

Transcrevo a ementa do acórdão paradigma, na parte que interessa aos presentes autos:

GANHO DE CAPITAL. TRIBUTAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROPÓSITO NEGOCIAL. REDUÇÃO DE CAPITAL E TRANSFERÊNCIA DAS COTAS AOS ANTIGOS SÓCIOS. IMPOSSIBILIDADE. CASO ESPECÍFICO. Inaceitável quanto aos efeitos fiscais a operação de redução de capital e devolução da participação acionária aos sócios pessoas físicas, para posterior alienação com pagamento do ganho em alíquota inferior.

Impossibilidade de realização da operação diante da existência de cláusula negocial em favor da empresa detentora das cotas no momento da oferta. Caracterização de planejamento fiscal abusivo.

A princípio, em leitura preliminar e sumária, a alusão a "CASO ESPECÍFICO" colocada no título da ementa poderia induzir que as razões de decidir aplicar-se-iam exclusivamente à situação fática tratada pelos autos do paradigma.

Contudo, não basta a mera leitura da ementa. Há que se apreciar o conteúdo da decisão.

No paradigma, o investimento a ser alienado, ações da Aracruz, era detido conjuntamente pela Arainvest (família Safra) e pela Lorentzen. O comprador, VCP, fez oferta para adquirir as ações junto à Lorentzen. E, na celebração do negócio, havia cláusula tag along , no qual se exigia que a VCP também fizesse proposta à Arainvest a compra das ações da Aracruz nas mesmas condições oferecidas à Lorentzen. Cientificada do negócio, a Arainvest procedeu a redução de capital com base no art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, e transferiu as ações do investimento Aracruz para dois sócios pessoa física (com tributação de 15%, mais favorecida do que a imponível à pessoa jurídica, de 34%).

Diante dos fatos, manifesta-se a decisão paradigma:

O cerne da questão a ser decidida reside então no fato de o recorrente (ARAINVEST) ao conhecer da proposta de aquisição da participação detida na ARACRUZ poder realizar um rearranjo societário com vistas , única e exclusivamente, a transferir a propriedade das ações aos seus sócios majoritários fazendo com que a tributação sobre o ganho de capital na venda se deslocasse da pessoa jurídica para as pessoas físicas. (Grifei)

Ou seja, a decisão paradigma partiu da premissa de que, tendo a pessoa jurídica o conhecimento prévio de que o seu investimento seria objeto de proposta para alienação, poder- se-ia realizar um planejamento tributário visando transferir a propriedade das ações aos seus sócios, fazendo com que a tributação sobre o ganho de capital na venda se deslocasse da pessoa jurídica para as pessoas físicas .

DF CARF MF

Fl. 3811

Fl. 11 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

No caso dos autos paradigma, o conhecimento prévio deu-se em razão da existência da cláusula de tag along.

Assim manifestou-se a decisão paradigma:

Na verdade o patrimônio da empresa (ARAINVEST) não pode ser confundido com o patrimônio dos seus sócios. Consoante o princípio da Entidade e as normas do direito civil o patrimônio da empresa é vinculado a suas operações. Foi nesta condição de pertencerem ao patrimônio da ARAINVEST que as ações representativas da participação acionária na ARACRUZ possibilitaram à ARAINVEST a celebração de um acordo de acionistas com o grupo LORENTZEN para prevenir a venda para terceiros unilateralmente e, assim, proteger a sua participação.

(...)

O que não é possível se admitir, pelo menos no humilde entendimento deste relator, é que diante de uma situação, qual seja, a oferta do VCP de aquisição da participação da empresa na ARACRUZ, esta realize um planejamento tributário para modificar a titularidade da participação, sem qualquer propósito econômico ou comercial, única e exclusivamente para não submeter os ganhos da operação à tributação que lhe seria típica no caso.

(...)

O problema, rapidamente verificado pelos acionistas desta é que esta operação implicaria numa solução bem mais onerosa do que a decorrente da alienação acaso realizada diretamente pelos sócios da ARINVEST. Assim é que se decidiu, à guisa da inexistência de qualquer outro motivo econômico ou comercial, realizar toda a operação de redução de capital, transferência das ações e posterior alienação para garantir uma redução da imposição tributária.

Na fundamentação da decisão, o paradigma recorre à jurisprudência do CARF:

INCORPORAÇÃO DE EMPRESA. AMORTIZAÇÃO DE ÁGIO INTERNO. NECESSIDADE DE PROPÓSITO NEGOCIAL . Inadmissível a formação de ágio por meio de operações internas, sem a intervenção de partes independentes e sem o pagamento de preço a terceiros. Não produz o efeito tributário almejado pelo sujeito passivo a sucessão de operações societárias sem qualquer finalidade negocial que resulte em incorporação de pessoa jurídica de mesmo grupo, com utilização de empresa veículo, unicamente para criar de modo artificial as condições para aproveitamento da amortização do ágio como dedução na apuração do lucro real e da contribuição social. Acórdão nº 1301-002.019, de 04/05/2016

GANHO DE CAPITAL. TRIBUTAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROPÓSITO NEGOCIAL.

Inaceitável quanto aos efeitos fiscais a cessão de quotas à empresa alienígena para posterior alienação com tributação favorecida, sem demonstração de razão negocial que não a mera redução tributária. Acórdão nº 1402-002.882, de 17/10/2017.

GANHOS DE CAPITAL. OMISSÃO DE RECEITAS. ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL. AUSÊNCIA DE PROPÓSITO NEGOCIAL. PLANEJAMENTO FISCAL ABUSIVO

Comprovado nos autos que há ausência de propósito negocial na operação de alienação de bens imóveis realizada pelo contribuinte, merece prosperar a glosa fiscal, pois mesmo que tal ato seja lícito, rechaça-se seus efeitos diante do planejamento fiscal abusivo perpetrado pelo contribuinte. Acórdão nº 1402-002.720, de 15/08/2017.

DF CARF MF

Fl. 3812

Fl. 12 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

ALIENAÇÃO DE IMÓVEIS-PERMUTA VIA OPERAÇÃO SOCIETÁRIA "CASA-E-SEPARA" SIMULAÇÃO.

Não há "propósito negocial" na integralização de capital social, por meio de imóveis, em empresa integrante do mesmo grupo econômico, tributada pelo lucro presumido, em sucessivas operações cujo único fim foi a redução da carga tributária incidente sobre operações imobiliárias. Acórdão nº 1402-002.685, de 26/07/2017. (Grifei)

Registre-se que nenhum dos precedentes mencionados apresenta caso no qual se discute a existência da cláusula tag along.

Isso porque o que se deve analisar não é a mera existência da cláusula, mas sim as suas consequências para a celebração do negócio. E, no caso, o que se mostra relevante é que a pessoa jurídica, detentora do investimento, tem o conhecimento prévio de que receberá proposta para alienar o ativo. A pessoa jurídica detentora do investimento dispõe da informação de que receberá proposta para vender o seu ativo.

E, para ilustrar o questionamento que se coloca, diante de tal situação, transcrevo novamente a decisão paradigma:

O cerne da questão a ser decidida reside então no fato de o recorrente (ARAINVEST) ao conhecer da proposta de aquisição da participação detida na ARACRUZ poder realizar um rearranjo societário com vistas , única e exclusivamente, a transferir a propriedade das ações aos seus sócios majoritários fazendo com que a tributação sobre o ganho de capital na venda se deslocasse da pessoa jurídica para as pessoas físicas. (Grifei)

A decisão paradigma, diante dos fatos postos nos autos, tomou como referência a cláusula tag along , para dizer que era a pessoa jurídica, e não os seus sócios pessoa física, os detentores, de fato e de direito, para alienar as ações:

Desta forma, entende este relator que na situação em que a cláusula Tag Along foi acionada, o único sujeito passivo com possibilidade de dela usufruir era a Arainvest e não os seus sócios, haja vista que a Arainvest era a detentora, de fato e de direito das ações e direitos de acionista, sendo, desta forma a obrigada/beneficiária da cláusula Tag Along, razão pela qual a realização das diversas operações organizadas com vistas a retirar estas ações da propriedade da Arainvest a fim de possibilitar a venda por parte das pessoas físicas anteriores proprietárias destas, implica na realização de negócio sem qualquer propósito econômico com vistas, unicamente, a reduzir a imposição tributária.

Por sua vez, nos presentes autos, ocorre a mesma situação de conhecimento prévio, por parte da pessoa jurídica detentora do investimento, de que ativo de sua propriedade seria objeto de oferta de alienação.

Nos presentes autos, as ações da SITESHARING NE, de posse da Contribuinte, seriam alienadas para a AmericanTower. A Contribuinte detinha 99,99% do investimento a ser alienado. A Contribuinte tinha como acionistas a Servsite (pessoa jurídica), Sestri (pessoa jurídica), Flávio (pessoa física) e Luigi (pessoa física). A partir do presente cenário, procederam- se reorganizações, primeiro com Flávio adquirindo as participações da SITESHARING NE junto

DF CARF MF

Fl. 3813

Fl. 13 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

à Sestri e a Servisite. Na sequência, deu-se a cisão parcial a Contribuinte mediante versão da titularidade do ativo a ser alienado (ações da SITESHARING NE) para Flávio. Em seguida, Flávio alienou as ações da SITESHARING NE para a AmericanTower.

Sobre a cronologia dos eventos, relata a PGFN, no recurso especial:

O problema é que havia um fator de enorme relevância que sequer foi abordado pela contribuinte, em suas respostas à Fiscalização, qual seja: a negociação que estava em curso com a AMERICAN TOWER LTDA., para a compra de ativos do GRUPO SITESHARING. Em tópicos anteriores destas CONTRARRAZÕES, restou evidenciado que a AMERICAN TOWER aprovou, em 30/09/2010, a compra da SITESHARING NE. Além disso, o próprio contrato de compra e venda, firmado entre a AMERICAN TOWER LTDA. e o Sr. FLAVIO GUIMARÃES (fls. 434-477), elenca a cisão parcial da SITESHARING BRASIL como "condição precedente à formalização" do contrato. Apenas para reforçar esse ponto, vejamos outro trecho do contrato estabelecido entre a AMERICAN TOWER LTDA. e o Sr. FLAVIO GUIMARÃES, para a compra da SITESHARING NE (fl. 460).

(...)

Não se pode deixar da constatar que, em 01/09/2010, a Contribuinte aprovou a cisão parcial que transferiu a totalidade das ações da SITESHARING NE para Flávio, e, em 30/09/2010, concretizou-se a compra do investimento pela AmericanTower. Ora, uma negociação de tal porte não se consumaria antes de inúmeras tratativas, de demandam tempo substancial. Se em 30/09/2010 deu-se a celebração do negócio, mostra-se mais do que razoável inferir que o detentor original do ativo (Contribuinte) e o adquirente estivessem conversando anteriormente, e que, dada a complexidade, tais tratativas teriam se iniciado em momento anterior a 01/09/2010, quando ocorreu a cisão parcial precisamente do ativo a ser alienado em favor de Flávio. E é exatamente o que atestam os autos , como se pode observar no contrato entre AmericanTower e Flávio (e-fl. 460):

Mostram-se precisas, portanto, as constatações da recorrente:

DF CARF MF

Fl. 3814

Fl. 14 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

A alínea e acima transcrita comprova que a negociação já estava sendo discutida e em estágio avançado, em 31/08/2010 , pois essa foi a data limite escolhida pela adquirente, AMERICAN TOWER LTDA., para realizar auditoria e averiguar as condições da SITESHARING BRASIL e da SITESHARING NE. Todos esses fatos são indícios muito claros de que o negócio com a AMERICAN TOWER foi determinante para a aprovação da cisão parcial. (Grifei)

Ou seja, já havia conhecimento prévio , por parte do detentor originário do investimento (Contribuinte), de que receberia proposta para vender as ações.

O conhecimento prévio revela-se também pela interveniência assumida pela Contribuinte na celebração da venda das ações de Flávio para a AmericanTower.

Transcrevo excertos do Termo de Verificação Fiscal:

81. Para esclarecimento sobre o motivo porque a empresa fiscalizada constava do item 5.1 da Ata de Reunião dos Sócios do contribuinte AMERICAN TOWER DO BRASIL CESSÃO DE INFRA ESTRUTURAS LTDA. (REG JUCESP 377.546/100), de 30/09/2010, como interveniente na aquisição, por aquela sociedade, de 100% (cem por cento) do capital social total e votante da Sitesharing NE S.A. ("Sitesharing Nordeste"), a empresa American Tower foi regularmente intimada (diligência 08.1.85.002014002522, TERMO DE INÍCIO DE DILIGÊNCIA E DE INTIMAÇÃO

001) a:

1) Consta do item 5.1 da Ata de Reunião dos Sócios do contribuinte AMERICAN TOWER DO BRASIL CESSÃO DE INFRA ESTRUTURAS LTDA. (REG JUCESP 377.546/100), de 30/09/2010, autorização para aquisição de 100% do capital social da Sitesharing NE S.A., mediante a celebração de Contrato de Compra e Venda de Ações e Outras Avenças, entre aquela empresa, na qualidade de compradora, o Sr. Flávio Ognibene Guimarães, como vendedor, e a Sitesharing do Brasil, na qualidade de interveniente.

Esclarecer em que consistiu a interveniência da empresa Sitesharing do Brasil, CNPJ: 05.637.153/000168 (atual SSTOWERS PARTICIPAÇÕES S/A.) na negociação acima referida, apresentando documentação comprobatória.

82. Em 06/11/2014, a American Tower protocolizou resposta esclarecendo que "a interveniência da Sitesharing Brasil S.A. (atual SSTOWERS PARTICIPAÇÕES S.A. CNPJ/MF nº 05.637.153/000168) no Contrato de Compra e Venda de Ações e Outras Avenças (Doc. 02) celebrado entre a ora INTIMADA, como compradora, e o Senhor Flávio Ognibene Guimarães, como vendedor, tendo como objeto as ações de emissão da Sitesharing NE S.A., decorreu do acordo para que aquela, isto é, a Sitesharing Brasil S.A., assumisse, conjunta e solidariamente com o vendedor, a obrigação de indenização por perdas materializadas nos termos da cláusula 53 do referido contrato." (Grifei)

Não poderia ser mais esclarecedora a resposta da AmericanTower: seria para que a Contribuinte assumisse, conjunta e solidariamente com o vendedor, a obrigação de indenização por perdas materializadas (...) .

Tanto nos presentes autos, quanto nos autos do paradigma, a pessoa jurídica que tinha a propriedade do investimento sabia, com antecedência, que receberia oferta da alienação. No paradigma, a informação foi extraída por meio de cláusula contratual de tag along , e nos presentes autos deu-se pela comprovação de que as tratativas entre comprador e vendedor já aconteciam antes dos eventos de reorganização societária que transferiram o ativo a ser alienado para o sócio pessoa física.

DF CARF MF

Fl. 3815

Fl. 15 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

E, fazendo-se um teste de aderência, resta evidente que, caso o Colegiado que apreciou o paradigma, detivesse-se diante dos presentes autos, reformaria a decisão recorrida. Transcrevo novamente o que entendeu o paradigma ser o cerne da questão para suas razões de decidir:

O cerne da questão a ser decidida reside então no fato de o recorrente (ARAINVEST) ao conhecer da proposta de aquisição da participação detida na ARACRUZ poder realizar um rearranjo societário com vistas , única e exclusivamente, a transferir a propriedade das ações aos seus sócios majoritários fazendo com que a tributação sobre o ganho de capital na venda se deslocasse da pessoa jurídica para as pessoas físicas. (Grifei)

Aplicando-se o racional do paradigma aos presentes autos, o cerne da questão a ser decidida reside no fato de a Contribuinte, ao conhecer da proposta de aquisição da participação detida na SITESHARING NE, poder realizar um rearranjo societário com vistas, única e exclusivamente, a transferir a propriedade das ações aos seus sócios majoritários fazendo com que a tributação sobre o ganho de capital na venda se deslocasse da pessoa jurídica para as pessoas físicas.

Não há que se falar, nesse contexto, em premissa "equivocada" da recorrente, de que a reorganização teria sido um planejamento tributário sem substância econômica com o objetivo exclusivo de buscar redução da carga tributária, vez que o paradigma aborda tais questões em suas razões de decidir, inclusive apresentado jurisprudência sobre o assunto.

Nesse sentido, o paradigma nº 1401-002.196 mostra-se apto para demonstrar a divergência na interpretação da legislação tributária, atendendo requisito específico de admissibilidade de recurso especial previsto no art. 67, Anexo II do RICARF (Portaria MF nº 343, de 2015).

Afasta-se, também, preliminar discutindo potencial reexame de fatos e provas em sede de recurso especial.

Não é o que ocorre nos presentes autos.

Vale transcrever a norma que dispõe sobre o requisito específico de admissibilidade previsto no art. 67, Anexo II do RICARF:

Art. 67. Compete à CSRF, por suas turmas, julgar recurso especial interposto contra decisão que der à legislação tributária interpretação divergente da que lhe tenha dado outra câmara, turma de câmara, turma especial ou a própria CSRF.

§ 1º Não será conhecido o recurso que não demonstrar a legislação tributária interpretada de forma divergente. (Redação dada pela Portaria MF nº 39, de 2016)

Como se pode observar, pretende-se discutir, na interposição do recurso especial, a norma tributária estabelecida pelo art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995.

E, para se discutir sua incidência, inevitavelmente há que se fazer uma visita aos fatos da decisão paradigma e da decisão recorrida, para se constatar se, diante de situações que guardam convergência, a norma tributária foi interpretada de maneira divergente.

Não se fala em reexame dos fatos, mas sim se, diante de fatos convergentes, operou-se uma interpretação distinta da incidência da norma tributária.

DF CARF MF

Fl. 3816

Fl. 16 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

E a leitura dos eventos em diferentes autos, mas que guardem similitude, pode receber diferentes conotações, e, por consequência, desencadear operações de silogismo divergentes. A operação de interpretação passa tanto pela "qualificação" do fato, operação concretizada na premissa menor, quanto pela consequente identificação da norma jurídica decorrente do fato interpretado, procedimento no escopo da premissa maior, nos termos da construção proposta por KARL ENGISCH 1 .

A tarefa de qualificar um fato não é um reexame de fatos e provas. Os fatos não mudam , o que se mostra passível de alteração é a qualificação jurídica dos fatos, que tem como desdobramento determinada consequência jurídica, que pode ser, por exemplo, a aplicação da norma A, ou a aplicação da norma B, ou a aplicação de nenhuma norma, a depender do intérprete. O que se verifica é se o fato juridicamente qualificado poderá se enquadrar na moldura colocada pela legislação.

A operação de interpretação envolve tanto a qualificação jurídica do fato, quanto a subsunção à norma. No caso, não há nenhuma manipulação dos fatos, que são incontroversos .

Nos presentes autos, consta contrato de compra e venda celebrado entre a AmericanTower e Flávio no qual dispõe, literalmente, que antes de 01/09/2010 já haviam tratativas para a negociação. Consta cisão parcial do investimento a ser alienado para ser transferido a Flávio em 01/09/2010, e concretização da alienação do investimento em 30/09/2010. No paradigma, consta cláusula de tag along vigente antes da concretização da alienação do investimento.

Diante dos fatos em estado bruto, em ambos os casos, qualificando-se o fato, extrai-se a informação de que as partes já tinham conhecimento prévio da transação quando decidiram transferir os ativos objeto de alienação para o sócio pessoa física. A partir daí, cabe ao julgador decidir a consequência jurídica aplicável, no caso, incidência ou não do permissivo disposto no art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995.

1 No modelo previsto por KARL ENGISCH (Introdução ao Pensamento Jurídico. Calouste Gulbenkian: Lisboa,

2001), a operação de subsunção compreende a apreciação da premissa menor, que consiste no fato a ser qualificado, e da premissa maior, que é a norma jurídica, sobre as quais se aplica o direito e concretiza-se a decisão, para discorrer sobre o processo de fundamentação.

E, em se tratando da premissa menor, aponta KARL LARENZ (Metodologia da Ciência do Direito. Calouste Gulbenkian: Lisboa, 1997) que a situação ocorrida no mundo dos fatos e objeto do litígio não é acessível diretamente ao julgador, razão pela qual tem que ser conformada. Parte-se de uma "situação de fato em bruto" , apresentada em forma de relatos informados pelas partes, que podem estar carregados de parcialidade no sentido de justificar a pretensão requerida.

E, ainda que o fato possa ser imparcial, pode carregar um componente de incerteza, quando se busca a adequação a um fato jurídico predicado pela lei. LARENZ cita um exemplo, a partir de dispositivo no BGB, que dispõe que, quem por meio de elaboração ou transformação de um ou vários materiais, fabrica uma coisa móvel nova , adquire a propriedade de uma coisa nova sempre que o valor da elaboração ou transformação não seja manifestamente inferior ao valor dos materiais . A discussão reside no que se entende por coisa nova, e o autor dá dois exemplos. No primeiro, a pessoa constrói, em processo de carpintaria, uma caixa a partir de um insumo (tábua de madeira). No segundo, a pessoa parte de uma caixa construída de maneira precária, refaz o trabalho utilizando-se dos mesmos insumos, e confere à caixa uma aparência e qualidade completamente diferentes da versão original. No segundo caso, poder-se-ia qualificar a caixa como uma coisa nova, na mesma medida que no primeiro?

DF CARF MF

Fl. 3817

Fl. 17 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Não há que se falar, portanto, em reexame fático-probatório. Os presentes autos não tratam de uma nova interpretação ao conteúdo de um laudo de avaliação econômica, por exemplo. Toma-se como referência a informação em estado original. Não há reexame.

Afasto, portanto, as preliminares arguidas em contrarrazões.

Diante do exposto, voto no sentido de conhecer do recurso especial da PGFN . Passo ao exame do mérito.

Vale discorrer brevemente sobre histórico a respeito do art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, em debate.

Antes da Lei nº 9.249, de 1995, qualquer negociação envolvendo bens de pessoa jurídica com pessoa ligada (dentre os quais sócios pessoa jurídica ou pessoa física) só poderia efetivar-se com base no valor do mercado do ativo. Caso contrário, poder-se-ia qualificar o fato como distribuição disfarçada de lucros, nos termos do art. 60 do Decreto-lei nº 1.598, de 1977:

Art 60 - Presume-se distribuição disfarçada de lucros no negócio pelo qual a pessoa jurídica:

I - aliena, por valor notoriamente inferior ao de mercado, bem do seu ativo a pessoa ligada;

(...)

VII - realiza com pessoa ligada qualquer outro negócio em condições de favorecimento, assim entendidas condições mais vantajosas para a pessoa ligada do que as que prevaleçam no mercado ou em que a pessoa jurídica contrataria com terceiros; (Redação dada pelo Decreto-lei nº 2.065, de 1983)

(...)

§ 3º Considera-se pessoa ligada à pessoa jurídica: (Redação dada pelo Decreto-lei nº 2.065, de 1983)

a) o sócio desta, mesmo quando outra pessoa jurídica; (Redação dada pelo Decreto-lei nº 2.065, de 1983)

(...)

§ 4º - Valor de mercado é a importância em dinheiro que o vendedor pode obter mediante negociação do bem no mercado.

O contexto jurídico sofreu alterações com a edição da Lei nº 9.249, de 1995, com a intenção de propiciar um ambiente tributário mais propício para fomentar o crescimento e desenvolvimento da economia, mediante medidas descritas na Exposição de Motivos:

2. A reforma objetiva simplificar a apuração do imposto, reduzindo as vias de planejamento fiscal , uniformizar o tratamento tributário dos diversos tipos de renda, integrando a tributação das pessoas e jurídicas, ampliar o campo de incidência do tributo, com vistas a alcançar os rendimentos auferidos no exterior por contribuintes estabelecidos no País e, finalmente, articular a tributação das empresas com o Plano de Estabilização Econômica. (Grifei)

DF CARF MF

Fl. 3818

Fl. 18 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Descreve a exposição de motivos sobre as medidas postas no texto da lei no sentido de ajustar as alíquotas do imposto de renda da pessoa jurídica, extinguir a correção monetária do balanço no contexto da desregulamentação da indexação da economia, vedar despesas passíveis de manipulação, introduzir mecanismo de incentivo de investimento em empresas com a introdução dos juros sobre capital próprio cujo pagamento seria dedutível, dispor sobre tributação de lucros no exterior, dispor sobre incorporação, fusão e cisão de sociedades, sobre omissões de receita e sobre a tributação de ganhos de capital e a avaliação de bens entregues a sócio ou acionista como devolução de participação no capital societário , tendo como diretriz a redução do planejamento fiscal de caráter abusivo.

Transcrevo a norma em debate, o art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995:

Art. 22. Os bens e direitos do ativo da pessoa jurídica, que forem entregues ao titular ou a sócio ou acionista. a título de devolução de sua participação no capital social, poderão ser avaliados pelo valor contábil ou de mercado.

§ 1º No caso de a devolução realizar-se pelo valor de mercado, a diferença entre este e o valor contábil dos bens ou direitos entregues será considerada ganho de capital, que será computado nos resultados da pessoa jurídica tributada com base no lucro real ou na base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido devidos pela pessoa jurídica tributada com base no lucro presumido ou arbitrado.

§ 2º Para o titular, sócio ou acionista, pessoa jurídica, os bens ou direitos recebidos em devolução de sua participação no capital serão registrados pelo valor contábil da participação ou pelo valor de mercado, conforme avaliado pela pessoa jurídica que esteja devolvendo capital.

§ 3º Para o titular, sócio ou acionista, pessoa física, os bens ou direitos recebidos em devolução de sua participação no capital serão informados, na declaração de bens correspondente à declaração de rendimentos do respectivo ano-base, pelo valor contábil ou de mercado, conforme avaliado pela pessoa jurídica.

§ 4º A diferença entre o valor de mercado e o valor constante da declaração de bens, no caso de pessoa física, ou o valor contábil, no caso de pessoa jurídica, não será computada, pelo titular, sócio ou acionista, na base de cálculo do imposto de renda ou da contribuição social sobre o lucro líquido.

Como se pode observar, passou-se a autorizar a transferência de bens e ativo da pessoa jurídica para o seu sócio, mediante avaliação não somente apenas a valor de mercado (como era antes de edição da Lei nº 9.249, de 1995), mas também a valor contábil, desde que a título de devolução de sua participação no capital social.

No caso, uma vez transferido o ativo a valor de mercado para o sócio, a tributação do ganho de capital recai sobre a pessoa jurídica que detinha o investimento (§ 1º). Caso o ativo seja transferido a valor contábil (o presente voto não trata de eventuais ajustes decorrentes de avaliação a valor justo, previstos a partir da Lei nº 11.638, de 2007), não se fala em tributação da pessoa jurídica que detinha o investimento. Para o sócio que recebe o bem ou ativo, cabe informar na declaração de bens correspondente o valor do investimento que passou a deter pelo preço que lhe foi repassado pela pessoa jurídica, a valor de mercado ou valor contábil.

Observe-se que, caso tenha sido repassado a valor contábil, opera-se um diferimento da tributação do ganho de capital, que somente será apurado se e quando o sócio que recebeu o investimento promover sua realização.

DF CARF MF

Fl. 3819

Fl. 19 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

E a transferência de bens ao sócio não se pode dar por mera liberalidade . Pelo contrário, apenas na condição de devolução de participação no capital societário. Transcrevo novamente o caput do art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995:

Art. 22. Os bens e direitos do ativo da pessoa jurídica, que forem entregues ao titular ou a sócio ou acionista. a título de devolução de sua participação no capital social, poderão ser avaliados pelo valor contábil ou de mercado. (Grifei)

A condição, a título de devolução de sua participação no capital social, não foi posta por acaso.

A devolução de participação no capital societário opera-se em situações específicas , no contexto da redução do capital social prevista nos arts. 1082 e 1084 do Código Civil:

Art. 1.082. Pode a sociedade reduzir o capital, mediante a correspondente modificação do contrato:

I - depois de integralizado, se houver perdas irreparáveis;

II - se excessivo em relação ao objeto da sociedade.

Art. 1.083. No caso do inciso I do artigo antecedente, a redução do capital será realizada com a diminuição proporcional do valor nominal das quotas, tornando-se efetiva a partir da averbação, no Registro Público de Empresas Mercantis, da ata da assembleia que a tenha aprovado.

Art. 1.084. No caso do inciso II do art. 1.082, a redução do capital será feita restituindo- se parte do valor das quotas aos sócios, ou dispensando-se as prestações ainda devidas, com diminuição proporcional, em ambos os casos, do valor nominal das quotas.

§ 1º No prazo de noventa dias, contado da data da publicação da ata da assembleia que aprovar a redução, o credor quirografário, por título líquido anterior a essa data, poderá opor-se ao deliberado.

§ 2 º A redução somente se tornará eficaz se, no prazo estabelecido no parágrafo antecedente, não for impugnada, ou se provado o pagamento da dívida ou o depósito judicial do respectivo valor.

§ 3º Satisfeitas as condições estabelecidas no parágrafo antecedente, proceder-se-á à averbação, no Registro Público de Empresas Mercantis, da ata que tenha aprovado a redução.

Ou seja, a redução do capital somente pode ocorrer caso, depois de integralizado,

(1) se houver perdas irreparáveis, ou (2) se demonstrar que se encontra excessivo em relação ao objeto da sociedade .

Isso porque o capital social deve refletir a universalidade, em termos financeiros, que os sócios julgam necessária para a consecução dos objetivos da sociedade empresária. Não pode ser objeto de alteração sem qualquer critério ; não por acaso, dispõe a legislação sobre condições de ordem material e formal para motivar a modificação. Não se trata de um valor qualquer, de uma mera formalidade , mas sim de uma materialidade em consonância com os projetos que a sociedade empresária pretende concretizar, visando sua sobrevivência, desenvolvimento, eventual expansão e retorno do investimento aos sócios.

DF CARF MF

Fl. 3820

Fl. 20 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Discorre Carvalhosa 2 sobre o artigo:

A preservação da integridade do capital representa, de um lado, forma de manter a estabilidade da sociedade e, de outro, a garantia dos credores relativamente ao cumprimento das obrigações assumidas.

Obviamente que a expectativa, submetida ao teste da realidade, pode não corresponder ao ajustado originariamente. Precisamente para remediar a situação existe a previsão de redução do capital, que, contudo, deve ser motivada, inclusive mediante validação de maioria dos sócios e registro.

Sobre o assunto, dispõe Mamede 3 :

O capital social, viu-se, é definido por um ajuste plurilateral firmado pelos sócios que têm o poder de especificar o quantum que julgam necessário para a realização dos fins sociais, quero dizer, o montante suficiente do patrimônio a ser empregado para a concretização das atividades negociais e, via de consequência, a produção de sobrevalor, de superávit apropriável pela distribuição periódica de lucros. Justamente por isso, é juridicamente possível estipular-se um montante menor como suficiente, ou seja, descapitalizar a sociedade, passando o valor correspondente para outras rubricas de sua escrituração, inclusive os lucros a serem distribuídos para os sócios. Esse entendimento está positivado no artigo 1.082 do Código Civil, que afirma a possibilidade da redução do capital social se excessivo em relação ao objeto da sociedade. A essa hipótese o dispositivo soma uma outra: a verificação de perdas irreparáveis, a permitir a redução do capital, desde que esteja ele totalmente integralizado. São hipóteses distintas, na forma e no conteúdo, merecendo estudo em apartado; mas, em ambos os casos, contudo, faz-se indispensável uma correspondente modificação do contrato, a exigir a aprovação de sócios que titularizem ao menos 75% do capital social (artigo 1076, I, cominado com os artigos 1.071, V, e 997, III, todos do Código Civil), sendo devidamente levada ao Registro correspondente.

Vale dizer que os critérios postos no Código Civil, ao dispor sobre a redução do capital, restringindo-se às situações em que, uma vez integralizado, só poderia ocorrer quando

(1) houver perdas irreparáveis, ou que se (2) encontra excessivo em relação ao objeto da sociedade , não foram postas ao acaso, emanando da fonte posta no art. 173 3 da Lei nº 6.404 4, de 1976:

Art. 173. A assembléia-geral poderá deliberar a redução do capital social se houver perda, até o montante dos prejuízos acumulados, ou se julgá-lo excessivo.

§ 1º A proposta de redução do capital social, quando de iniciativa dos administradores, não poderá ser submetida à deliberação da assembléia-geral sem o parecer do conselho fiscal, se em funcionamento.

2 CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil : parte especial : do direito de empresa (artigos 1.052 a

1.195). v. 13. 2. ed. São Paulo : Saraiva : 2005, p. 293.

DF CARF MF

Fl. 3821

Fl. 21 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

§ 2º A partir da deliberação de redução ficarão suspensos os direitos correspondentes às ações cujos certificados tenham sido emitidos, até que sejam apresentados à companhia para substituição. (Grifei)

E, sobre a norma, Carvalhosa 4 discorre:

PRINCÍPIO DA IMUTABILIDADE DO CAPITAL SOCIAL

A norma ora comentada e a seguinte procuram assegurar a integridade do capital social, dentro dessa relatividade da sua expressão patrimonial. Sendo a redução do capital uma das formas de sua modificação que mais pode afetar os direitos dos credores, estabeleceu a lei que tal diminuição será da competência exclusiva e indelegável da assembleia geral, restringindo as hipóteses em que poderá o conclave deliberar a respeito.

É ainda dentro dessa relatividade que se deve entender o capital social como cifra imutável e permanente, modificável apenas se cumpridas rigorosamente as formalidades legais prescritas.

O capital social não é formado por uma massa separada do patrimônio ou por uma parte do ativo da sociedade, mas configura-se como um débito diante dos acionistas, razão pela qual consta do passivo no balanço, ainda que não exigível. Por outro lado, o capital é um fictio juris estabelecida para a salvaguarda dos credores da companhia.

Tendo que permanecer sem mudança, a não ser que seja reduzido ou aumentado na forma devida, os lucros e os prejuízos do exercício não devem ser creditados ou diminuídos da conta do capital, mas colocados em posição especial no balanço.

É dessa forma que a integralidade do capital social representa garantia de estabilidade e possibilidade de cumprimento das obrigações assumidas pela companhia.

A mudança, pela sua redução, dentro dos estritos limites da lei, não derroga o princípio da imutabilidade . Não obstante, tendo em vista a função que tradicionalmente possuía nas legislações do direito continental - instrumento absoluto de equilíbrio entre os interesses dos credores e dos acionistas -, a redução do capital social somente penetrou nas legislações do século XIX, porque até então se considerava a sua diminuição como derrogação do princípio da imutabilidade. [destaques não constam do original]

EQUILÍBRIO ENTRE CAPITAL E PATRIMÔNIO

Da mesma forma que o aumento, a redução, muitas vezes, impõe-se, para manter o equilíbrio entre o capital e o patrimônio , quando este é insuficiente para cobrir aquele. Até mesmo se recomenda a medida, quando se rompe a relação entre o capital nominal e o patrimônio real de companhia.

Valverde considera a hipótese como "saneamento financeiro, uma operação contábil pela qual a redução do capital se positiva com certa elegância. No mesmo sentido, Batalha:" A redução do capital decorrente de prejuízos constitui medida saneadora, pondo em correlação a cifra lançada no passivo a esse título com os contravalores do ativo ". (Grifei)

Como se pode observar, a redução do capital social não se constitui em uma liberalidade a ser tomada em qualquer situação . As hipóteses colocadas pela norma são de

DF CARF MF

Fl. 3822

Fl. 22 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

caráter especial, (perdas irreparáveis ou excessivo capital em relação ao objeto da sociedade), e vem tutelar o equilíbrio entre o capital e o patrimônio. Eventual redução deve refletir de fato a realidade econômica e financeira , em medida de transparência tanto para os acionistas, quanto os credores e para a coletividade.

Assim, a devolução do capital social predicada pelo art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, a valor contábil ou de mercado, passa inevitavelmente pela devida motivação da redução do capital social da pessoa jurídica. E, demonstrados os reais motivos da alteração do capital social, a devolução pode ser dar inclusive a valor contábil, possibilitando um diferimento na tributação do ganho de capital por parte do sócio retirante e que foi beneficiado pelo recebimento do investimento. Buscou-se não impor um ônus tributário em uma situação específica, sensível, no qual se depara a pessoa jurídica com a necessidade de promover uma diminuição no seu capital social. O diferimento do ganho de capital vem retirar um peso e auxiliar a preservação da pessoa jurídica.

Contudo, não há que se desvirtuar o diferimento da tributação do ganho de capital como se fosse um incentivo para deslocar a sujeição passiva para uma outra pessoa (física ou jurídica) que teria um menor ônus no pagamento do tributo.

Buscou o legislador tutelar pela sobrevivência da pessoa jurídica, retirando-se o encargo de um eventual recolhimento de tributo em uma situação em que se faz efetivamente necessária uma redução do capital social. Contudo, inferir-se que, a partir de tal permissivo, haveria um fomento para qualquer espécie de liberalidade, no sentido de incentivar operações societárias para viabilizar a transferência da sujeição passiva de ganho de capital a ser auferido mediante a realização do ativo que foi transferido para recolher um valor menor ou se esquivar da obrigação tributária, é interpretação que não encontra sustentação no ordenamento jurídico.

O artigo 22 da Lei nº 9.249, de 1995, não proporcionou um"caminho"para buscar uma menor incidência tributária na consecução de um negócio de alienação de um investimento. Permite-se a incidência da norma apenas se atendida condição específica relativa a redução do capital social, que deve estar devidamente motivada e demonstrada.

Estabelecidas as premissas, passo ao exame do caso em tela.

As ações da SITESHARING NE, de posse da Contribuinte, seriam alienadas para a AmericanTower. A Contribuinte detinha 99,99% do investimento a ser alienado. Por sua vez, a Contribuinte tinha como acionistas a Servsite (pessoa jurídica) e a Sestri (pessoa jurídica).

A partir do presente cenário, iniciaram-se as reorganizações visando preparar a concretização do negócio.

Primeiro, Flávio (pessoa física) procedeu com a aquisição das ações da Contribuinte junto à Sestri e a Servsite. A tabela elaborada pela autoridade fiscal apresenta a mudança societária entre os anos-calendário de 2008 e 2009:

DF CARF MF

Fl. 3823

Fl. 23 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Precisamente a parcela de 80% que Flávio passou a deter no ano-calendário de 2009, corresponde às ações da SITESHARING NE, investimento detido pela Contribuinte, que seria objeto de alienação para a AmericanTower.

E foi aprovada cisão parcial em Assembléia Geral Extraordinária realizada em 01/09/2010, no qual se deliberou sobre a cisão parcial da Contribuinte e a redução do capital social de R$ 38.150.414,00 (trinta e oito milhões, cento e cinquenta mil, quatrocentos e quatorze reais) para R$7.630.082,00 (sete milhões, seiscentos e trinta mil, oitenta e dois reais), mediante o cancelamento de 30.520.332 (trinta milhões, quinhentas e vinte mil, trezentas e trinta e duas) ações ordinárias nominativas, no valor nominal de R$ 1,00 (um real) cada uma, transferindo-se as ações da SITESHARING NE para Flávio (pessoa física). Ou seja, tornou-se o único acionista da SITESHARING NE.

No mesmo mês, ainda em setembro, no dia 30/09/2010, a AmericanTower promoveu a aquisição de 100% da SITESHARING NE.

Com clareza nuclear, restou demonstrada movimentação societária, primeiro, para deslocar as ações que seriam objeto de alienação para o sócio pessoa física Flávio. As ações da SITESHARING NE eram detidas, originalmente, pela Contribuinte, que era controlada pelas pessoas jurídicas Servisite e Sestri.

Na sequência, Flávio passou a ser acionista da Contribuinte, na condição de pessoa física.

E em seguida, buscando-se permissivo no art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, ocorreu a redução de capital, evento no qual as ações da SITESHARING NE foram transferidas para Flávio

Enfim, ocorreu a alienação das ações da SITESHARING NE para a AmericanTower, sendo oferecida à tributação de ganho de capital na alíquota de 15%, vez que Flávio era pessoa física.

Como se pode observar, as operações societárias foram no sentido de, deliberadamente, buscar a transferência artificial da pessoa jurídica para a pessoa física do ganho de capital.

Verifica-se que a incidência ao art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, não se deu por conta da ocorrência de uma efetiva necessidade de redução do capital social da Contribuinte . Pelo contrário, ocorreu para se transferir a propriedade do ativo a ser alienado nas mãos de uma pessoa física. E, em razão de tal interpretação, promoveu-se uma redução de capital sem nenhum lastro, não demonstrando a concretização de nenhuma das hipóteses do art. 1082 do Código Civil.

Foi desvirtuada por completo a finalidade da lei, que permite que a devolução do capital do sócio possa ser realizada transferindo-se o ativo a valor contábil e, por consequência, proporcionando um diferimento do ganho de capital, que é concedido em situação especial, devidamente delineada pela norma, quando a redução de capital da pessoa jurídica mostre-se necessária e esteja comprovada nos autos. Ou seja, o diferimento do ganho de capital vem no contexto de um auxílio dado à pessoa jurídica que, diante de uma real necessidade de redução de capital, podendo ser feito mediante entrega de bem ou ativo ao sócio retirante a valor contábil (reforçando que, anteriormente, a transferência do ativo ou bem só poderia ser efetivada a valor

DF CARF MF

Fl. 3824

Fl. 24 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

de mercado, o que resultava em ganho de capital, ou seja, um ônus a mais para a pessoa jurídica que se via diante da necessidade de reduzir seu capital social para manter suas operações).

A Contribuinte busca uma incidência na norma sem nenhum critério, sem demonstrar que a redução de capital era premente e vital para a manutenção da pessoa jurídica.

Assim sendo, diante dos argumentos até o momento expostos, firmo convicção plena no sentido de dar provimento ao recurso especial da PGFN.

Vale, ainda, registrar outros aspectos dos presentes autos, na condição de razões de decidir de natureza subsidiária.

Isso porque a situação posta nos autos tem agravantes.

Primeiro, ainda no primeiro momento das reorganizações societárias, em que Flávio promoveu a aquisição das participações que a Sestri e a Servsite detinha junto à Contribuinte. Foram constatadas irregularidades na lavratura das transferências das ações:

92. Constatei a irregularidade da lavratura das transferências das referidas ações no Livro de Registro de Transferência de Ações Nominativas nos dias 31/07/2009 e 03/08/2009, datas muito posteriores ao Termo de Encerramento do livro em questão, que fora lavrado em 05/12/2003, servindo unicamente de prova contra a fiscalizada. (vide parágrafos 70 a 72 e Termo de Constatação 001 SSTOWERS)

Segundo, aspecto já abordado no exame de admissibilidade do presente voto, qual seja, mesmo antes da cisão parcial no qual foram transferidas as ações da SITESHARING NE em favor de Flávio, já se tinha conhecimento prévio de que a American Tower iria proceder com a aquisição do investimento. Consta no contrato entre AmericanTower e Flávio (e-fl. 460):

As ações que foram transferidas a Flávio (pessoa física) por meio da cisão parcial (01/09/2010) já estavam sendo negociadas para serem adquiridas pela AmericanTower (como atesta a auditoria do investimento que deveria ser concluída até 31/08/2010).

DF CARF MF

Fl. 3825

Fl. 25 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Terceiro, a interveniência assumida pela Contribuinte na celebração da venda das ações de Flávio para a AmericanTower.

Transcrevo excertos do Termo de Verificação Fiscal:

81. Para esclarecimento sobre o motivo porque a empresa fiscalizada constava do item 5.1 da Ata de Reunião dos Sócios do contribuinte AMERICAN TOWER DO BRASIL CESSÃO DE INFRA ESTRUTURAS LTDA. (REG JUCESP 377.546/100), de 30/09/2010, como interveniente na aquisição, por aquela sociedade, de 100% (cem por cento) do capital social total e votante da Sitesharing NE S.A. (" Sitesharing Nordeste "), a empresa American Tower foi regularmente intimada (diligência 08.1.85.002014002522, TERMO DE INÍCIO DE DILIGÊNCIA E DE INTIMAÇÃO

001) a:

1) Consta do item 5.1 da Ata de Reunião dos Sócios do contribuinte AMERICAN TOWER DO BRASIL CESSÃO DE INFRA ESTRUTURAS LTDA. (REG JUCESP 377.546/100), de 30/09/2010, autorização para aquisição de 100% do capital social da Sitesharing NE S.A., mediante a celebração de Contrato de Compra e Venda de Ações e Outras Avenças, entre aquela empresa, na qualidade de compradora, o Sr. Flávio Ognibene Guimarães, como vendedor, e a Sitesharing do Brasil, na qualidade de interveniente.

Esclarecer em que consistiu a interveniência da empresa Sitesharing do Brasil, CNPJ: 05.637.153/000168 (atual SSTOWERS PARTICIPAÇÕES S/A.) na negociação acima referida, apresentando documentação comprobatória.

82. Em 06/11/2014, a American Tower protocolizou resposta esclarecendo que" a interveniência da Sitesharing Brasil S.A. (atual SSTOWERS PARTICIPAÇÕES S.A. CNPJ/MF nº 05.637.153/000168) no Contrato de Compra e Venda de Ações e Outras Avenças (Doc. 02) celebrado entre a ora INTIMADA, como compradora, e o Senhor Flávio Ognibene Guimarães, como vendedor, tendo como objeto as ações de emissão da Sitesharing NE S.A., decorreu do acordo para que aquela, isto é, a Sitesharing Brasil S.A., assumisse, conjunta e solidariamente com o vendedor, a obrigação de indenização por perdas materializadas nos termos da cláusula 53 do referido contrato. "(Grifei)

Não poderia ser mais esclarecedora a resposta da AmericanTower: seria para que a Contribuinte assumisse, conjunta e solidariamente com o vendedor, a obrigação de indenização por perdas materializadas (...) .

Ora, se o alienante foi Flávio (pessoa física), porque o comprador exigiu a interveniência da Contribuinte para a celebração do negócio?

Resposta: exatamente porque o efetivo alienante não foi Flávio (pessoa física), mas sim a Contribuinte (pessoa jurídica).

Constata-se, portanto, que a incidência ao art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, foi construída artificialmente. E, sendo a Contribuinte a real alienante, submete-se à tributação do ganho de capital incidente sobre a pessoa jurídica.

Outro aspecto a ser registrado diz respeito ao fato de que o racional adotado visando a diminuição/extinção do ganho de capital buscando-se uma incidência artificial no art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, guarda grande similitude com uma outra operação clássica, o"casa- separa".

No" casa-separa ", também havia um ativo que seria objeto de alienação. E, em vez de o alienante transferir diretamente o ativo para o adquirente, valia-se de outra empresa, no

DF CARF MF

Fl. 3826

Fl. 26 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

qual se tornavam sócios precisamente adquirente e alienante. O alienante integralizava na nova sociedade exatamente o ativo que pretendia alienar, e o adquirente integralizava na nova sociedade exatamente o valor em espécie que iria pagar a aquisição do ativo. Era o" casamento "perfeito. Posteriormente, ocorria a" separação ". A alienante retirava-se da nova sociedade e, em contrapartida à integralização, recebia exatamente o valor em espécie que tinha sido integralizado pela adquirente. Ou seja, entrava na nova sociedade com o ativo que queria alienar, e retirava-se da nova sociedade com o valor que receberia se tivesse alienado o ativo. Enquanto isso, a adquirente também se retirava da nova sociedade, recebendo como contrapartida da integralização o ativo que pretendia adquirir. Era o" casa-separa ", construção artificial para se buscar a fuga do pagamento do ganho de capital do ativo alienado 5 .

No caso em tela, a operação pode ser qualificada como o" separa-sem-separar ". Isso porque o ativo objeto de alienação da pessoa jurídica é transferido para o sócio retirante (ou seja, há uma separação entre o ativo e a pessoa jurídica). Na sequência, precisamente esse ativo, objeto de separação da pessoa jurídica, é alienado para o adquirente pelo sócio retirante, que tem uma tributação mais favorável do que a pessoa jurídica antes detentora do ativo. Como se pode perceber, na realidade, o ativo nunca se" separou "da pessoa jurídica. Foi transferido artificialmente para que pudesse ser alienado por um sujeito passivo com tributação mais favorável. Ou seja, na verdade, nunca se separou da pessoa jurídica de fato. Separou-se da pessoa jurídica sem ter efetivamente se separado, porque a transação se deu, efetivamente, entre a pessoa jurídica que originariamente detinha o ativo e o adquirente, e não entre o sócio retirante e o adquirente. É o" separa-sem-separar ".

Enfim, vale dizer que tais operações, como o" casa-separa "e o" separa-sem- separar ", vem agravar a regressividade do sistema tributário. Isso porque os contribuintes que engendram tais operações aportam, em termos proporcionais, um valor menor de impostos e contribuições do que o cidadão comum, submetido à tributação indireta que consome parcela substancial dos seus rendimentos. Para se esquivar da tributação de ganho de capital, são construídas reorganizações societárias cuja realidade não faz parte da maior parte da sociedade, que, quando tem que alienar o ativo, executa a operação diretamente, ou seja, a pessoa física A vende o ativo para a pessoa física B, sem nenhum intermediário, e apura o ganho de capital.

Tenho convicção de que, caso a materialidade ganho de capital estivesse submetido a uma tributação exclusiva, com uma mesma alíquota oponível a todas as pessoas, independente de serem pessoas físicas ou jurídicas, independente do regime de tributação, independente de terem sede ou não no Brasil, não haveriam tantas autuações fiscais tratando do assunto.

No que concerne a respeito do pedido em contrarrazões para que as intimações sejam efetuadas aos patronos, trata-se de medida que não tem previsão no processo administrativo fiscal (PAF, Decreto nº 70.235, de 1972, art. 23), que predica que as intimações devem ser realizadas ao sujeito passivo. O assunto foi objeto da Súmula CARF nº 110:

No processo administrativo fiscal, é incabível a intimação dirigida ao endereço de advogado do sujeito passivo. (Vinculante, conforme Portaria ME nº 129 de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019).

DF CARF MF

Fl. 3827

Fl. 27 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Enfim, cabem considerações sobre a devolutividade do recurso especial, objeto manifestação em contrarrazões da Contribuinte.

Transcrever o pedido do recurso especial da PGFN:

V - DO PEDIDO

Diante do exposto, a UNIÃO (FAZENDA NACIONAL) requer seja admitido e provido o presente recurso especial, para reformar o acórdão atacado e restabelecer a decisão da DRJ.

Requer-se o restabelecimento da decisão da DRJ. Transcrevo dispositivo da decisão:

Acordam os membros da 3a Turma de Julgamento, por unanimidade de votos, rejeitar a preliminar de nulidade e, no mérito, considerar procedente em parte a impugnação, para: a) manter o crédito nos valores principais, que devem ser exigidos com a aplicação de multa, no percentual de 75%, e juros de mora, b) considerar improcedente a imputação de responsabilidade da Servisite Ltda, da Sestri Empreendimentos e Participações Ltda. e do Sr. Flávio Ognibene Guimarães e c) Determinar seja considerado, quando da cobrança do crédito, o valor de IRPF pago pelo Sr. Flávio Ognibene, a título de ganho de capital, pela venda da Sitesharing do Nordeste.

Como se pode observar, reforço o que já dito no início do voto: foi devolvida a matéria relativa ao art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, que consiste no lançamento do principal de IRPJ e CSLL, acompanhado de multa proporcional de 75% e juros de mora. Outras matérias tratadas em instâncias anteriores (qualificação da multa, responsabilidade tributária e aproveitamento do imposto de renda pessoa física) não foram objeto de devolução, vez que excluídas ao pedido do recurso especial, e, por consequência, encontram-se preclusas.

E, tendo o presente voto restabelecido, nos termos do dispositivo da decisão da DRJ, o crédito nos valores principais, que devem ser exigidos com a aplicação de multa, no percentual de 75%, e juros de mora , constata-se que o pedido do recurso especial foi provido.

Diante do exposto, voto no sentido de conhecer e dar provimento ao recurso especial da PGFN.

(documento assinado digitalmente)

André Mendes de Moura

DF CARF MF

Fl. 3828

Fl. 28 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Voto Vencedor

Conselheira Cristiane Silva Costa, Redatora designada

Com a devida vênia ao entendimento do D. Relator, por quem nutro sincera estima e admiração, voto por negar provimento ao recurso especial, tendo sido nomeada para redigir o voto vencedor.

Com efeito, o artigo 22, caput, da Lei nº 9.249/1995 prevê a possibilidade de devolução de capital social, facultando a avaliação pelo valor contábil ou de mercado:

Art. 22. Os bens e direitos do ativo da pessoa jurídica, que forem entregues ao titular ou a sócio ou acionista. a título de devolução de sua participação no capital social, poderão ser avaliados pelo valor contábil ou de mercado.

§ 1º No caso de a devolução realizar-se pelo valor de mercado, a diferença entre este e o valor contábil dos bens ou direitos entregues será considerada ganho de capital, que será computado nos resultados da pessoa jurídica tributada com base no lucro real ou na base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido devidos pela pessoa jurídica tributada com base no lucro presumido ou arbitrado.

§ 2º Para o titular, sócio ou acionista, pessoa jurídica, os bens ou direitos recebidos em devolução de sua participação no capital serão registrados pelo valor contábil da participação ou pelo valor de mercado, conforme avaliado pela pessoa jurídica que esteja devolvendo capital.

§ 3º Para o titular, sócio ou acionista, pessoa física, os bens ou direitos recebidos em devolução de sua participação no capital serão informados, na declaração de bens correspondente à declaração de rendimentos do respectivo ano-base, pelo valor contábil ou de mercado, conforme avaliado pela pessoa jurídica.

§ 4º A diferença entre o valor de mercado e o valor constante da declaração de bens, no caso de pessoa física, ou o valor contábil, no caso de pessoa jurídica, não será computada, pelo titular, sócio ou acionista, na base de cálculo do imposto de renda ou da contribuição social sobre o lucro líquido.

O mesmo critério foi adotado pelo artigo 23, da Lei nº 9.249/1995, ao dispor:

Art. 23. As pessoas físicas poderão transferir a pessoas jurídicas, a título de integralização de capital, bens e direitos pelo valor constante da respectiva declaração de bens ou pelo valor de mercado.

§ 1º Se a entrega for feita pelo valor constante da declaração de bens, as pessoas físicas deverão lançar nesta declaração as ações ou quotas subscritas pelo mesmo valor dos bens ou direitos transferidos, não se aplicando o disposto no art. 60 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977, e no art. 20, II, do Decreto-Lei nº 2.065, de 26 de outubro de 1983.

§ 2º Se a transferência não se fizer pelo valor constante da declaração de bens, a diferença a maior será tributável como ganho de capital.

A redução de capital é prevista também na Lei das S.As. (Lei nº 6.404/1976)

Art. 173. A assembléia-geral poderá deliberar a redução do capital social se houver perda, até o montante dos prejuízos acumulados, ou se julgá-lo excessivo.

§ 1º A proposta de redução do capital social, quando de iniciativa dos administradores, não poderá ser submetida à deliberação da assembléia-geral sem o parecer do conselho fiscal, se em funcionamento.

DF CARF MF

Fl. 3829

Fl. 29 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

§ 2º A partir da deliberação de redução ficarão suspensos os direitos correspondentes às ações cujos certificados tenham sido emitidos, até que sejam apresentados à companhia para substituição.

Percebe-se que a redução de capital, a priori, não pode ser tida como ilegítima, seja a valor contábil, seja a valor de mercado. A redução de capital, com a negociação dos ativos pelo acionista - em momento posterior - não tem qualquer impedimento legal. Pelo contrário, a norma legal induziu o comportamento de redução de capital a valor contábil, indução que é determinante para se vislumbrar a legalidade da conduta do contribuinte no caso destes autos .

O voto do ex-Conselheiro Paulo Jakson da Silva Lucas, acolhido à unanimidade pela 1a Turma Ordinária da 3a Câmara (1301-001.302) , é bastante elucidativo nesse mesmo sentido, reconhecendo a faculdade conferida pela legislação para a redução do capital. Colaciono trecho a seguir:

É certo que, no caso em exame, somente os sócios ou acionistas, que assumem os riscos do negócio, têm legitimidade para definir o montante necessário para continuar as atividades de uma empresa. A hipótese em que a redução do capital social pode ser questionada por terceiros está prevista no artigo 173, § 1º, da Lei das S/A e ocorre quando a redução do capital resulte na impossibilidade de pagamento dos credores. Assim o é porque, em regra, o capital social e demais ativos da empresa representa garantia de pagamento. Não se tem notícias e sequer é causa da autuação, que a redução do capital social tenha resultado no inadimplemento de obrigações assumidas pela empresa autuada. (...)

No caso, entendo, da análise dos autos que a causa da redução do capital social está no fato de que os acionistas majoritários tinham interesse em se retirar da sociedade, alienando suas participações e com a finalidade, é certo, de adequar a alienação das ações para a Petrobrás nos termos exigidos por esta. Para tal, em vez da empresa fazer a venda das ações e entregar os recursos aos acionistas, como sugerido pela autoridade fiscal, o procedimento adotado foi a redução do capital social entregando aos acionistas, a título de devolução de suas participações, ações avaliados pelo valor contábil.

O artigo 22 da Lei nº 9.249, de 1995, confere coerência ao sistema tributário e em nada afronta as disposições do artigo 60, I, VII, do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977 (que trata da distribuição disfarçada de lucros). São normas que devem ser interpretadas de forma harmônicas. No momento em que a legislação dispõe que as pessoas físicas poderão transferir a pessoas jurídicas, a título de integralização de capital, bens e direitos pelo valor constante da respectiva declaração ou pelo valor de mercado, devendo tributar a diferença nos casos em que a transferência não se fizer pelo valor constante da declaração, nada mais coerente que, na hipótese de devolução do capital social integralizado, isto também possa ocorrer pelo valor contábil ou valor de mercado

Ou seja, é juridicamente protegido o procedimento levado a efeito pelas Companhias e seus acionistas por meio do qual se devolve a estes, pelo valor contábil, bens e direitos do ativo da pessoa jurídica (art. 22, caput, da Lei nº 9.249, de 1995). (...)

Portanto, não havendo nenhuma ilicitude no procedimento realizado pelos acionistas não há que se exigir IRPJ e CSLL da empresa SUZANO HOLDING S/A, quando esta sequer recebeu qualquer importância relacionada à venda que os acionistas fizeram à PETROBRÁS.

Colaciono voto do Conselheiro Caio Cesar Nader Quintella, manifestado no acórdão XXXXX-004.126, que também adoto como razões de decidir:

Em relação ao mérito, no que tange às operações societárias colhidas, entende-se terem sido plenamente lícitos os modelos e as manobras adotados e procedidas, inclusive a redução de capital promovida pela Companhia em favor de seus sócios, que posteriormente alienaram as ações, objeto dessa devolução de bens, a qual está totalmente albergada na opção fiscal contida no art. 22 da Lei nº 9.249/95. (...)

DF CARF MF

Fl. 3830

Fl. 30 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Como se observa, o cerne e a premissa da hipótese lá prevista é a devolução de bens e direitos aos sócios ou acionistas, correspondentes a sua participação no capital das empresas. Assim, cabe agora analisar o tratamento legal e mecanismos previstos para a execução de tal manobra de devolução.

O tema é regido pelos art. 173 da Lei das S/A e pelo art. 1.082 do Código Civil de 2002: (...)

Fica claro que ambos os comandos legais autorizam, como hipótese autônoma e incondicionada, a redução do capital social, seja das Sociedades Anônimas ou das Sociedades Limitadas, quando se entender que, em um dado momento, existe capital social excessivo.

Posto isso, poder-se-ia indagar a quem cabe, então, decidir se há excesso ou não?

A resposta é simples: nas Sociedades Anônimas, à figura da Assembleia-Geral (Legislador emprega o termo julgá-lo) e nas Sociedades Limitadas, aos participantes do contrato social- ou seja, os titulares da empresa (Legislador emprega a expressão mediante a correspondente modificação do contrato).

Não existe nas normas competentes outro requisito legal ou qualquer limitação à manobra de redução de capital dessas sociedades, em razão de seu excesso, que não o julgamento da Assembleia ou a avença contratual dos quotistas. Apenas determina-se a publicidade de tais atos, em proteção da universalidade dos acionistas e dos credores quirografários (vide art. 1.084 do CC/02). Verifica-se, assim, que a matéria é puramente de Direito Privado, encampada pelos corolários da autonomia privada, livre iniciativa e liberdade contratual, sem qualquer remissão a garantias da tributação ou prerrogativas das Autoridades Fiscais.

Dessa forma, já se pode aqui, com muita segurança, afirmar que não cabe à Fazenda Pública fazer qualquer julgamento de ocorrência ou não de excesso de capital social das companhias e, tampouco, opor-se ou invalidar tal manobra societária, justificada por tal circunstância.

E não é sem razão que a decisão sobre a monta de capital social das companhias e sociedades é exclusivamente dos seus titulares. Em breve resumo, a figura do capital social no Direito Comercial remonta ao Século XV, com a justificativa primordial histórica de segregar o patrimônio das pessoas físicas e das entidades (ou mesmo empreitadas comercias determinadas), limitando a responsabilidade dos seus titulares. Atualmente, e dentro de um enfoque pragmático, tal figura presta-se para exprimir quanto investimento a entidade percebeu diretamente de seus sócios, exteriorizando parte de sua capacidade econômica, bem como dando um senso de garantia a credores e funcionários.

Com raras exceções de natureza puramente regulatória ou relacionada à fruição de regimes especiais e benesses legais (que não ocorre no presente caso), não existe exigência de valores mínimos ou máximos para a monta do capital social e, muito menos, qualquer vinculação proporcional deste com as somas e fluxos financeiros percebidos nas atividades/transações praticadas pelas empresas.

Em suma, o capital social se traduz em mera relação de investimento, absolutamente livre, entre as companhias e os seus titulares.

Assim, reforça-se a situação de que não há base legal para a Autoridade Fazendária fazer a ponderação e o juízo da existência de excesso ou não de capital social, de modo a condicionar a validade da redução de capital ao seu próprio juízo ou, ainda, exigir outro motivo/razão, além do julgamento e da avença das Assembleias e dos Sócios das empresas.

Mais do que isso: retornando às disposições da Lei nº 9.249/95, temos que parte das suas disposições foram inseridas em frontal alteração do arcabouço normativo do combate às práticas de distribuição disfarçada de lucros (DDL), como tratado no art. 60 do Decreto-Lei nº 1.598/77 (vide art. 464 do RIR/99, aplicável à presente contenda).

DF CARF MF

Fl. 3831

Fl. 31 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Era comum o Fisco, com base em tal dispositivo de combate à DDL, no momento da redução do capital social das empresas, inclusive nas devoluções de bens e direitos em razão de liquidação da sociedade, exigir a adoção do valor de mercado, tributando-se o ganho de capital percebido nessa manobra. Houve forte debate no Poder Judiciário. Contudo, veio a Lei nº 9.249/95, que, como consta da sua Exposição de Motivos, visava simplificar a apuração do imposto, reduzindo as vias de planejamento fiscal, uniformizar o tratamento tributário dos diversos tipos de renda, integrando a tributação das pessoas [físicas] e jurídicas, inclusive tratando sobre a tributação de ganhos de capital e a avaliação de bens entregues a sócio ou acionista como devolução de participação no capital societário.

A nova Lei, no contexto do chamado"Pacote FHC", trouxe muitos mecanismos de incentivo à iniciativa privada e incremento ao investimento empresarial, valendo-se de institutos fiscais para tanto, como a figura dos Juros sobre o Capital Próprio e a medida de desoneração total dos dividendos (arts. 9 e 10 da mesma Lei nº 9.249/95).

E nessa esteira, dentro da mencionada decisão política, foram inseridos os arts. 22 e 23 na Lei nº 9.249/958 que, de forma clara e manifesta, criaram um mecanismo legal precisamente simétrico de total neutralidade tributária do ganho de capital no trânsito de bens e direitos entre capital social das pessoas jurídicas e o patrimônio de seus titulares. Garantindo que poderiam ser os bens e direitos integralizados no capital social ou dele reduzidos em favor dos titulares avaliados pelo valor contábil/constante da declaração de bens da pessoa física ou pelo valor de mercado, o Legislador tributário de 1995 institui expressamente a faculdade dos contribuintes escolherem o momento e a pessoa que reconhecerá e tributará o ganho de capital eventualmente ocorrido.

Como se verifica na redação dos dispositivos em questão, a eventual existência de tributos e alíquotas diversas, destinadas à tributação dos sujeitos passivos possíveis (incluindo pessoas jurídicas ou pessoas físicas), em nada se relaciona ao livre exercício tal faculdade. Afinal, tipos tributários e alíquotas diversas também exprimem outra vontade do Legislador, dentro de uma política tributária adotada.

Trata-se, então, de legítima opção fiscal prevista na norma tributária vigente, cujo o gozo pelos contribuintes é certo e objetivo. (...)

Sendo livre e fiscalmente neutro, para fins de ganho de capital, o trânsito de bens e direitos entre os patrimônios dos titulares e da empresa, nos termos da simétrica dinâmica dos arts. 22 e 23 da Lei nº 9.249/95, não há óbice ou ilícito fiscal por parte do contribuinte que resgata determinado bem, antes investido no capital social, visando justamente a sua alienação.

Essa é a precisa intenção do Legislador, no entender desse Conselheiro, dentro de uma política de fomento ao investimento nas empreitadas empresariais brasileiras, que pretendeu mitigar ou mesmo afastar qualquer desvantagem em se aportar um bem ou direito no capital social de uma empresa brasileira. (...)

Havendo a opção legal no sistema, não é impositiva ao contribuinte a adoção da conduta que implica na maior carga tributária. Da mesma forma, não cabe a exigência de outras razões e motivos para validar postura ou manobra arrimada em tal faculdade objetiva da Lei.

Finalmente, destaco as pertinentes as observações do Conselheiro Fernando Brasil de Oliveira Pinto, no acórdão XXXXX-001.477 , merecendo destaque o enfrentamento como opção legal conferida aos contribuintes pelo legislador com o artigo 22, da Lei nº 9.249:

Particularmente, possuo entendimento deveras restritivo aos planejamentos tributários abusivos, calcados em atos artificiais e sem propósito negocial.

Contudo, entendo não ser este o caso dos autos.

Trata-se, em última análise, de possibilidade legal posta à disposição dos contribuintes pelo art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995. O próprio legislador possibilitou que as pessoas jurídicas, ao entregar bens ao titular ou a sócio ou acionista, a título de devolução de sua

DF CARF MF

Fl. 3832

Fl. 32 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

participação no capital social, poderiam ser avaliar tais bens pelo valor contábil ou de mercado.

Não vejo diferença na utilização entre tais opções do contribuinte e as que comumente se permitem, como as opções pela forma de tributação: não havendo vedações, pode a pessoa jurídica optar pelo lucro presumido ou pelo Simples Nacional em detrimento à regra geral do lucro real. Ou, em relação aos optantes pelo lucro real, optar pela apuração trimestral ou anual. No que tange às pessoas físicas, como regra, é oferecida a opção pelo desconto simplificado em detrimento à utilização das deduções permitidas pela legislação tributária.

Aliás, a opção de POLPAR em transferir aos seus acionistas ações de SZPQ a valor contábil, deveria ser a regra, e não opção. Imaginemos situação absolutamente inversa: se POLPAR possuísse grandes prejuízos, e seus sócios, pretendessem extingui-la para, em futuro próximo, alienar as ações de SZPQ, a legislação permitiria que POLPAR já transferisse aos seus acionistas as ações a valor de mercado, o que implicaria carga tributária zero não só no momento de tal transferência dos bens aos sócios, mas também na futura alienação de ações por parte dos acionistas. E ainda assim não haveria infração, pois se trata de mera opção da pessoa jurídica.

Veja-se que, se fossem os acionistas que integralizassem capital na pessoa jurídica, também poderiam optar por transferir as ações a valor constante em suas declarações de renda ou a valor de mercado. Optando pelo valor de mercado, deveriam oferecer à tributação, nas próprias físicas, o ganho de capital correspondente. Mas não seriam obrigadas a assim agirem. No caso concreto, a autoridade fiscal parece querer impor ao contribuinte a opção mais onerosa. Ora, se o próprio legislador quis deixar ao talante das pessoas jurídicas a escolha de uma entre duas opções, não cabe ao Fisco questionar tal escolha, a não ser que vislumbre alguma patologia no caso concreto, tal qual uma fraude ou simulação.

Embora entenda que a livre iniciativa possui limites diante da solidariedade a todos imposta pelo art. da Constituição Federal, no presente caso, estamos diante de normas que permitem ao contribuinte optar pelo caminho a percorrer, não merecendo prosperar a exigência.

Em respeito à defesa oferecida pela Fazenda Nacional, cumpre-me discorrer sobre alguns pontos específicos.

Em relação à suposta simulação perpetrada pela Recorrente, como afirmou a Fazenda Nacional em sustentação oral, não vislumbro sua ocorrência. O negócio realizado foi formalizado incluindo-se cláusulas com condições suspensivas, como bem ficou demonstrado nos contratos entabulados. Trata-se de exemplo clássico do próprio conceito de condição suspensiva.

Ademais, o fato de a negociação ter sido realizada pelos acionistas controladores de POLPAR, e não por esta, respalda-se no disposto no art. 254-A da Lei das S/A, que trata da alienação, direta ou indireta, do controle de companhia aberta. Ora, o que viria a ser a alienação indireta do controle de companhia senão àquela em que se constata na operação em análise? Frise-se que POLPAR é um holding cujo era uma holding destinada somente a viabilizar o exercício do poder de controle. Quem detinha o controle direto de POLPAR eram os acionistas ora arrolados como responsáveis pelo crédito tributário em discussão. Tais acionistas possuíam ações de SZPQ. POLPAR possuía ações de SZPQ (e também outras holdings envolvidas na negociação). Logo, os acionistas de POLPAR, detinham controle indireto de SZPQ e tal controle indireto é que foi alvo de negociação com PETROBRÁS, e não mera venda de ações.

Se a operação realizada fosse aquela defendida pela autoridade fiscal, qual seja, a venda de ações de SZPQ por POLPAR, os acionistas minoritários desta poderiam ser prejudicados, uma vez que envolvidos em operação que talvez não desejassem participar. Se ainda assim o negócio fosse realizado, parte dos ganhos seria dos minoritários, o que demonstra, de fato, que a operação realizada seria outra, e não as de fato perpetradas.

DF CARF MF

Fl. 3833

Fl. 33 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Vê-se, assim, que não houve contorno de norma imperativa. Alienou-se o controle indireto de SZPQ e quem detinha tal controle eram as pessoas físicas acionistas de POLPAR. Para tanto, reduziu-se seu capital nos termos previstos em lei, realizando-se a operação de alienação diretamente pelos acionistas, recolhendo-se o imposto de renda sobre os ganhos de capital correspondentes. Não vejo artificialidade, muito menos simulação, na operação.

No que tange à redução de capital, corroborando a posição doutrinária de relevo trazida pela Recorrente, nas pesquisas em que realizei constatei que compete exclusivamente à Assembléia Geral decidir sobre tanto. Não havendo prejuízo a credores, não há o que se questionar.

Ademais, ao contrário de outras operações já analisadas por esta Turma, como, por exemplo, no acórdão nº 1402-001.251 (caso" TPS "), nos autos não consta que momentos após a redução de capital reverteu-se tal situação, denotando operação para se posicionar artificialmente perante a norma. De se salientar, ainda, que naquele caso, embora o contribuinte tenha novamente aumentado o capital após a devolução de bens aos sócios, ainda assim foi dado provimento ao recurso, por maioria. Acrescente-se ainda que, nada mais natural haver a redução de capital de POLPAR se não mais seus acionistas pretendiam atuar no ramo de papel e celulose.

Já tive oportunidade de relatar casos, ainda no âmbito das Delegacias de Julgamento, em que não era possível reduzir capital em razão dos vultosos valores dos bens a alienar (no caso, terrenos, e imóveis já depreciados). A pessoa jurídica em questão era tributada com base no lucro real. A operação artificial foi a criação de empresa, tributada com base no lucro presumido, com versão dos bens que se desejava alienar. Tal empresa jamais existiu de fato, sua operação restringiu-se à venda de tais imóveis e terrenos, e, como houvera sido em seu objetivo social a compra e venda de imóveis, tributou os ganhos nas alienações em análise utilizando-se do coeficiente de presunção de lucro de 8%. Mantida a operação na pessoa jurídica tributada com base no lucro real, 100% da receita seria considerada lucro. A artificialidade era latente.

Conforme explanado, tais fatos não se repetem no presente processo.

Em conclusão, não se vislumbrando irregularidade na conduta do contribuinte, não se sustenta o lançamento tributário, devendo ser reconhecida a legitimidade de redução de capital analisada neste processo.

Por tais razões, voto por negar provimento ao recurso especial da Procuradoria.

(documento assinado digitalmente)

Cristiane Silva Costa

DF CARF MF

Fl. 3834

Fl. 34 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Declaração de Voto

Conselheira Edeli Pereira Bessa

A PGFN assim argumenta para afirmar que há divergência jurisprudencial entre os casos comparados:

Diante do confronto dos julgados, conclui-se que, diante de casos análogos, os acórdãos paradigmas adotaram entendimento divergente da decisão guerreada.

Os acórdãos confrontados discutiam se a sequência de operações societárias que resultaram na entrega de ativos à sua sócia ou controladora, avaliados por valor contábil, tratar-se-ia de planejamento tributário lícito ou uma articulação artificial, sem propósito negocial, simulada de atos com o escopo de reduzir ilicitamente a tributação devida.

O acórdão recorrido entendeu que as alterações societárias efetuadas mediante devolução de ativos pelo valor contábil são legais. O fato de os acionistas planejarem as alterações visando fim diverso (alienação de suas ações a terceiros ou outros objetivos negociais), de forma a reduzir a carga tributária, não caracteriza simulação ou planejamento ilícito.

Os acórdãos paradigmas adotaram posicionamento diverso. Segundo os precedentes, a mera regularidade formal das operações societárias não lhes confere validade para obstar uma incidência tributária, quando a formalidade jurídica não reflete expressão fidedigna da realidade. No segundo paradigma, conclui que" Assim é que se decidiu, à guisa da inexistência de qualquer outro motivo econômico ou comercial, realizar toda a operação de redução de capital, transferência das ações e posterior alienação para garantir uma redução da imposição tributária. ".

Noutros termos, segundo os paradigmas, cabe ao Fisco averiguar se as operações realizadas não foram artificiais, simuladas, se possuíam propósito e substância negocial. Rechaçou a possibilidade de concatenar operações em sequência, visando apenas a redução da carga tributária. O precedente não admite a redução de capital mediante devolução aos sócios da participação societária pelo valor contábil, nos termos do art. 22 da Lei n. 9.249/95, quando careça de substância e seja realizada apenas com o fim de reduzir tributos.

Portanto, pode o fisco perquirir e lavrar auto de infração, sendo legítimo lançamento quando identificado o real propósito e real alienante das participações societárias.

No presente caso, a cronologia dos fatos não deixa dúvidas de que as operações carecem de propósito negocial e substância, consistindo em atos artificiais e simulados com o único fim de reduzir a carga tributária. Como ressalta a PGFN em suas contrarrazões ao recurso voluntário:

[...]

Ou seja, os acórdãos confrontados trataram situações semelhantes de forma distinta. Enquanto a decisão recorrida mesmo diante de operações societárias sem substância econômica, considerou que se tratava de operação e planejamento lícito. Em sentido diverso, os paradigmas consideraram que se tratava de operação artificial, simulada, pois o objetivo era subtrair-se da tributação devida, dando aparência de legalidade a planejamento tributário. Planejamento tributário ilícito, portanto, sob a ótica do paradigma diante do descompasso entre a realidade (objetivo visado) e o mero formalismo jurídico dos atos, desprovidos de substância, de propósito negocial.

DF CARF MF

Fl. 3835

Fl. 35 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

A existência de negociação para aquisição de participação societária anterior as alterações societárias - considerada relevante no acórdão paradigma nº 1401-002.196, também ocorreu na operação aqui tratada, e não foi considerada relevante pela decisão a quo.

Nesses termos, resta devidamente demonstrada a divergência jurisprudencial em relação ao disposto no artigo 22 da Lei n. 9.249/95; arts. 173 e 174 da Lei n. 6.404/76; artigos 167, 462 e 463 do Código Civil; art. 109 do Código Tributário Nacional.

Fica claro, portanto, que diante da mesma situação fática discutida no acórdão recorrido e no (s) paradigma (s) foi dada solução jurídica diversa pelos órgãos julgadores.

Pelo exposto, afiguram-se presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso especial segundo as disposições do art. 67 do Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais.

A recorrente, portanto, no suposto de que nestes autos estar-se-ia diante de operações societárias sem substância econômica , afirma a divergência porque consignado, no acórdão recorrido, que se tratava de operação e planejamento lícito, ao passo que os paradigmas consideraram que se tratava de operação artificial, simulada, pois o objetivo era subtrair-se da tributação devida, dando aparência de legalidade a planejamento tributário , assim caracterizando planejamento tributário ilícito frente ao descompasso entre a realidade (objetivo visado) e o mero formalismo jurídico dos atos, desprovidos de substância, de propósito negocial .

No exame de admissibilidade foi dado seguimento ao recurso especial em face, apenas, do segundo paradigma (Acórdão nº 1401-002.196), asseverando-se que:

Da situação fática assemelhada

Tanto o recorrido quanto este paradigma discutiram uma sequência de operações societárias semelhantes que por meio de diversas alterações/transformações societárias terminaram por reduzir/devolver capital, entregando-se ativos ao sócio dissidente avaliados por valor contábil para em curto espaço de tempo, para daí proceder com a alienação desses mesmos ativos não na pessoa jurídica, mas na física, redundando em uma economia tributária por conta da taxação a menor na pessoa física.

Há que considerar também o que pontuou a PFN a esse respeito:

A existência de negociação para aquisição de participação societária anterior as alterações societárias - considerada relevante no acórdão paradigma nº 1401-002.196, também ocorreu na operação aqui tratada, e não foi considerada relevante pela decisão a quo.

Da Divergência

A situação é assemelhada no relevante e a Recorrente logrou êxito na demonstração da divergência:

Em situação bastante assemelhada, o recorrido entendeu que aquelas mesmas transformações societárias realizadas pelos sócios eram perfeitamente legais, na forma que se deram, ou seja, através de devolução de capital a valor contábil, visando a desmembrar parte do acervo operacional da empresa, que logo em sequência é vendido a outra empresa pela própria pessoa física do sócio dissidente. Dessa forma, o recorrido abraçou o entendimento que havia plena conformação dessas operações aos termos do art. 22 da Lei nº 9.249/95, e isso não caracterizaria planejamento ilícito ou abusivo, mesmo visando a fim diverso (alienação de suas ações a terceiros ou outros objetivos negociais), de forma apenas a reduzir a carga tributária.

De outra banda, o referido acórdãos paradigma, em semelhantes circunstâncias, concluíu que a mera regularidade formal das operações societárias não lhes conferia validade suficiente para impedir a incidência tributária, sendo caso de se caracterizar tais operações artificiais e abusivas e assim não oponíveis ao fisco, dado que o objetivo

DF CARF MF

Fl. 3836

Fl. 36 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

de utilização da norma do art. 22 da Lei n; 9.249/95 foi desvirtuado, na medida em que em tais situações a formalidade jurídica não refletiria a expressão fidedigna da realidade. Nas palavras deste segundo paradigma:" Assim é que se decidiu, à guisa da inexistência de qualquer outro motivo econômico ou comercial, realizar toda a operação de redução de capital, transferência das ações e posterior alienação para garantir uma redução da imposição tributária ".

O I. Relator, frente à alegação de que o paradigma admitido trataria de situação fática dessemelhante, cuidou de avaliar as operações societárias ali examinadas para identificar se havia similitude suficiente para a caracterização do dissídio jurisprudencial.

Discordo, porém, da premissa identificada pelo I. Relator como determinante para alinhamento dos casos comparados. Entendo que o paradigma não se pautou no conhecimento prévio pela pessoa jurídica de que seu investimento" seria objeto "de proposta para alienação, mas sim no efetivo conhecimento da proposta de alienação que foi apresentada por VCP a ARAINVEST, em observância à cláusula tag along . Assim afirmo por observar que o voto condutor do paradigma prende-se, apenas, à discussão acerca da possibilidade de a pessoa jurídica, titular do direito de exercício do tag along , restituir as ações aos sócios pessoas físicas para que estes promovessem a alienação, sem a necessidade de adentrar à definição do momento em que a proposta de alienação se efetivou. Os seguintes excertos do voto condutor do paradigma, aliás, denotam que outra poderia ser a decisão caso houvesse, apenas, a possibilidade de alienação:

Veja-se, diante da eminência de uma operação é perfeitamente facultado ao contribuinte realizar a operação da forma menos onerosa fiscalmente falando . O que não é possível se admitir, pelo menos no humilde entendimento deste relator, é que diante de uma situação, qual seja, a oferta do VCP de aquisição da participação da empresa na ARACRUZ, esta realize um planejamento tributário para modificar a titularidade da participação, sem qualquer propósito econômico ou comercial, única e exclusivamente para não submeter os ganhos da operação à tributação que lhe seria típica no caso.

[...]

Qual o motivo econômico deste ato? Não nos resta nenhuma outra alternativa do que a pura e simples economia tributária. Assim, o ato realizado pela ARAINVEST não implica apenas em uma simples operação econômica, mas sim a alteração indevida do sujeito passivo de uma operação iminente.

Este comportamento fugidio é que não pode ser imposto contra o fisco. A operação, assim como ocorrida em relação ao demais sócios ARAPAR e LORENTZEN EMPREENDIMENTOS deveria ter ocorrido pelo sujeito passivo ARAINVEST, vez que este é que estava protegido pelos direitos estabelecidos no acordo de acionistas. A ARAINVEST, e não seus acionistas, é quem detinha o direito de exercer o Tag Along . [...]

Desta forma, entende este relator que na situação em que a cláusula Tag Along foi acionada, o único sujeito passivo com possibilidade de dela usufruir era a Arainvest e não os seus sócios, haja vista que a Arainvest era a detentora, de fato e de direito das ações e direitos de acionista, sendo, desta forma a obrigada/beneficiária da cláusula Tag Along , razão pela qual a realização das diversas operações organizadas com vistas a retirar estas ações da propriedade da Arainvest a fim de possibilitar a venda por parte das pessoas físicas anteriores proprietárias destas, implica na realização de negócio sem qualquer propósito econômico com vistas, unicamente, a reduzir a imposição tributária. (destaquei)

No presente caso, as evidências de que a pessoa jurídica autuada, originalmente detentora do investimento, tinha conhecimento prévio de que ativo de sua propriedade seria

DF CARF MF

Fl. 3837

Fl. 37 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

objeto de oferta de alienação, decorreriam, como indicado pela recorrente, do fato de a cisão parcial ter ocorrido em 01/09/2010 e a compra do investimento já estar concretizada em data próxima (30/09/2010), inclusive com fixação de 31/08/2010 como termo final para auditoria pela adquirente na adquirida, além de constar da acusação fiscal que a autuada figurou como interveniente no Contrato de Compra e Venda de Ações e Outras Avenças firmado entre a adquirente e Flávio Ognibene Guimarães.

Ocorre que o acórdão recorrido extraiu outra interpretação destes fatos presentes no processo, consoante expresso no julgamento dos embargos opostos pelos sujeitos passivos (Acórdão nº 1201-002.149), nos quais foram apontadas, dentre outros vícios, as seguintes premissas fáticas equivocadamente adotadas no julgamento dos recursos de ofício e voluntário:

Assim, é necessário que os Srs. Julgadores corrijam os erros de fato apontados e levem em consideração os fatos efetivamente ocorridos, superando, portanto, as premissas fáticas equivocadas que fundamentaram o acórdão embargado.

Logo, tem-se que: (i) o Sr. FLÁVIO GUIMARÃES não participou da constituição da SITESHARING BRASIL, eis que não era sócio da SESTRI à época; (ii) as 132 torres, que posteriormente compuseram o patrimônio cindido, foram integralizadas pela SERVSITE por seu valor contábil, embora a contribuição efetiva tenha sido menor em razão dos passivos que também foram transferidos à SITESHARING BRASIL; (iii) as 190 torres integralizadas pela SITESHARING BRASIL na SITESHARING NE, em 2009, são diferentes das 132 torres originárias da SERVSITE; (iv) não é correto dizer que a cisão parcial"esvaziou"a SITESHARING BRASIL e a impossibilitou de desenvolver as suas atividades, pois o que realmente gera receitas são contratos similares ao built to suit , firmados com empresas do setor de telecomunicações; (v) o contrato de compra e venda foi firmado pelo Sr. FLÁVIO GUIMARÃES com a AMERICAN TOWER em 17.02.2011, e não em 17.02.2010; e (vi) no momento da cisão parcial, o comprador ainda era incerto, visto que o Sr. FLÁVIO GUIMARÃES negociava a venda da SITESHARING NE com outras empresas interessadas (a exemplo do GRUPO TORRESUR e da SUMMIT PARTNERS, conforme e-mails das folhas nºs. 1.872 a 1.887 do e-processo).

Reconhecendo a procedência de tais alegações, a Conselheira Relatora do acórdão recorrido constatou que 30/09/2010 foi a data em que realizada Assembleia Geral Extraordinária por American Tower (adquirente), para autorizar a aquisição de Sitesharing NE, seguindo-se o Contrato de Compra e Venda de Ações e Outras Avenças, datado de 17/02/2011, momento no qual ela reconheceu haver outros grupos interessados, porém com negociações menos avançadas com Flávio Ognibene Guimarães, então sócio da autuada. Neste cenário, a Conselheira Relatora concluiu que:

87. Somente em 25/02/2011 o sr. Flávio se desligou do processo decisório da Autuada, destacando-se que assumiu a Sitesharing NE em 01/09/2010, e fechou a venda em 02/03/2011, cuja negociação, obviamente foi anterior a essa data, tendo sido a AGE de aprovação da compra pela American Tower em 30/09/2010, depois de efetuadas auditorias tanto na Autuada como na Sitesharing NE.

Além disso, a Conselheira Relatora destacou que, diversamente da interpretação dos fatos veiculada no acórdão embargado, a empresa remanescente da cisão manteve contratos relevantes com companhias telefônicas clientes, sob o comando do outro sócio (Luigi Consenza), associando-se à BR Towers em 2013, para somente em 2014 verificar-se a aquisição de BR Towers por American Towers. Em consequência, assim expôs:

10. Verifica-se que o noticiário foi mal compreendido pela relatora em relação ao sócio que permaneceu, sr. Luigi:

a. eis que a notícia:" GP INVESTMENTS ANUNCIA QUE BR TOWERS CONCLUIU OPERAÇÃO DE ASSOCIAÇÃO COM A SITESHARING, EMPRESA PIONEIRA NO

DF CARF MF

Fl. 3838

Fl. 38 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

MERCADO DE TORRES NO BRASIL", de 04 de fevereiro de 2013, significou que a empresa da qual o sr. Luigi restou detentor, associou-se à BR Towers, passando a deter 15% do capital desta, ou seja, a empresa não foi vendida, mas continuou na atividade em associação com a GP Investments; assim, não era correta a notícia" BR Towers compra empresa de torres de telefonia Sitesharing ", de mesma data.

b. Quanto ao evento posterior em 16 de junho de 2014:" GP vende BR Towers por R$ 2,18 bilhões ", consta que" Os demais acionistas são um coinvestidor da GP, dono de 18,5%, cujo nome não foi divulgado, um fundo de private equity do Bradesco e os antigos donos da Sitesharing, empresa do setor comprada em fevereiro de 2013 pela BR Towers. As fatias do Bradesco e da Sitesharing não foram reveladas. ", ou seja, o sócio que restava remanescente, sr. Luigi, continuou titular da Sitesharing como sócio, na atividade.

c. Haja vista que a premissa para manter a autuação foi que a autuada acabou sendo vendida à mesma compradora do acervo cindido em favor do sr. Flávio, e revela-se que foi infundada, cabe alterar a conclusão que foi extraída.

Ao final, a Conselheira Relatora conclui que:

11. Em síntese, o conjunto de eventos analisados aponta que a situação se amolda ao art. 22 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, consolidado no art. 238 do Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto nº 3.000/99 RIR/ 99: os bens e direitos do ativo da pessoa jurídica, que forem entregues ao titular ou a sócio ou acionista, a título de devolução de sua participação no capital social, poderão ser avaliados pelo valor contábil ou de mercado.

12. E fica descaracterizado que se tratou de simulação visando a venda da empresa e artifício a fim de que a tributação do ganho de capital na venda da parcela entregue ao sócio dissidente fosse tributada na pessoa física deste e não pela autuada.

Dessa forma, elementos suscitados no acórdão recorrido se opõem à afirmação de que, neste caso, a autuada já teria conhecimento prévio de oferta de alienação de ativo de sua propriedade. É razoável concluir, sim, como defende o I. Relator, que a pessoa jurídica autuada já sabia que" receberia oferta "de alienação, inclusive porque a própria Conselheira Relatora reconhece que a negociação, obviamente foi anterior a essa data, tendo sido a AGE de aprovação da compra pela American Tower em 30/09/2010, depois de efetuadas auditorias tanto na Autuada como na Sitesharing NE. . Contudo, diversamente do paradigma, não há indicação, quer pela acusação, quer pela recorrente, e nem mesmo está consignado no acórdão recorrido, que a oferta foi materializada antes da transferência da participação societária a ser alienada ao sócio pessoa física. Há, apenas, evidências de ser a alienação eminente, mas esta hipótese foi expressamente ressalvada no paradigma como indutora de conclusão distinta da adotada naquele julgado. Logo, na medida em que a materialização da oferta foi o fator determinante para a decisão proferida no paradigma, como antes demonstrado, não vislumbro aqui similitude fática suficiente para caracterização do dissídio jurisprudencial.

De fato, para que o recurso especial não se preste, apenas, ao reexame de fatos e provas, é essencial que os casos comparados decorram de circunstâncias fáticas semelhantes. No caso, como bem observado pelo I. Relator, o recurso especial busca definir se as operações teriam amparo em face ao disposto no art. 22 da Lei nº 9.249, de 1995, o que poderia ensejar a transferência da tributação da pessoa jurídica (Contribuinte, alíquota de IRPJ e CSLL perfazendo 34%) para o sócio pessoa física (IRPF de 15%). Logo, é essencial que as operações realizadas sejam semelhantes, sob pena de a decisão a ser aqui proferida se prestar, apenas, a definir, no caso concreto, o alcance das normas tributárias.

Não basta, assim, que os acórdãos comparados discutam, na dicção da recorrente, uma sequência de operações societárias que, por meio de diversas alterações/transformações

DF CARF MF

Fl. 3839

Fl. 39 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

societárias, terminaram por reduzir/devolver capital, entregando-se ativos ao sócio dissidente avaliados por valor contábil para em curto espaço de tempo, para daí proceder com a alienação desses mesmos ativos não na pessoa jurídica, mas na física. Se o paradigma afirmou a invalidade das operações em razão do momento em que foram realizadas, é essencial que o acórdão recorrido apresente ocorrências distribuídas de forma semelhante na linha do tempo.

Por tais razões, considerando que paradigma não se pautou, apenas, na existência de negociação para aquisição de participação societária anterior às alterações societárias , mas sim na existência de efetiva oferta à pessoa jurídica que transferiu os ativos aos seus sócios pessoa física, não vislumbro aqui o necessário alinhamento fático para caracterização do dissídio jurisprudencial, razão pela qual voto por NEGAR CONHECIMENTO ao recurso especial da PGFN.

Vencida no conhecimento, constato, no mérito, que a forma como se processou a operação em questão deixa patente que havia dissídio entre os sócios da autuada, e apenas Flávio Ognibene Guimarães pretendia negociar sua participação societária. Esta a razão para a constituição da Sitesharing NE, com a alocação de parte dos ativos da autuada, que assim passaram a representar a participação daquele sócio na autuada. As notícias trazidas por ocasião do julgamento do recurso voluntário evidenciaram que o sócio remanescente, Luigi Consenza, manteve atividades no mesmo ramo, associando-se a concorrente da adquirente American Tower e que esta, apenas em 2014, logrou adquirir a parcela remanescente da autuada.

No Acórdão nº 9101-004.506 acompanhei o I. Relator em seu entendimento contrário à redução de capital dissociada da motivação prevista na legislação civil. Naquele caso, o I. Relator consignou que não havia uma palavra sobre os motivos pelo qual se deu a redução de capital da pessoa jurídica. Foi efetuada a operação simplesmente porque era a maneira de se transferir os ativos objeto de alienação da pessoa jurídica para a pessoa física, e, com a alienação do ativo, buscar a tributação em face da pessoa física, com alíquota menor.

Aqui, porém, a cisão se justificaria frente aos diferentes objetivos dos sócios, pois apenas o sócio remanescente tinha interesse em manter empenhado seu investimento nas atividades exercidas pela pessoa jurídica.

De outro lado, se a alienação fosse possível sem a cisão, há que se considerar que Flávio Orgnibene Guimarães era titular de 80% do capital social da fiscalizada, o que motiva a alegação de que a tributação do ganho de capital se verificaria, da mesma forma, no âmbito do IRPF por ele devido. Significa dizer que, sem a cisão, Flávio Orgnibene Guimarães alienaria à American Towers sua participação na autuada, de modo que American Towers passaria a deter 80% do capital da Contribuinte e a exercer, conjuntamente com o sócio remanescente, as atividades da autuada. Neste sentido são as alegações veiculadas em impugnação, resumidas no voto condutor da decisão de 1a instância mas, na sequência, rechaçadas pela autoridade julgadora:

43. A fiscalização teria ignorado o fato de que caso os sócios"estivessem alinhados sobre a venda da companhia como um todo (por meio da alienação das ações da própria Sitesharing do Brasil), o Sr. Flávio também iria tributar o seu ganho de capital sob alíquota de 15% de segregação dos ativos detidos pelo Sr. Flávio e os ativos detidos pelos demais sócios da Sitesharing do Brasil. Não fosse "o desentendimento das partes pela venda ou continuidade da sociedade empresária, o Sr. Flávio sempre pagaria o seu ganho de capital no percentual de 15% e jamais percentual de 34%".

44. Ou seja, na hipótese em que os sócios estivessem de acordo quanto à venda da Sistesharing Brasil, o Sr. Flávio, "por possuir participação direta na empresa a ser

DF CARF MF

Fl. 3840

Fl. 40 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

negociada, continuaria a calcular o ganho de capital pela alíquota de 15%, na forma dos artigos 138 e 142 do RIR/99".

45. Portanto, não haveria falar em planejamento tributário, uma vez que antes mesmo da cisão parcial e dos atos posteriores a sua implementação, eventual alienação da Sitesharing Brasil já teria como efeito a tributação pela pessoa física do Sr. Flávio.

46. Não existindo mais o affectio societatis entre os acionistas da Sitesharing Brasil17, nada mais usual e normal do que o desfazimento dessa união, por meio da cisão com a versão de parte dos ativos detidos à empresa já existente no grupo, ou seja, a Sitesharing do Nordeste (fl. 1045). De modo que não haveria falar em falta de comprovação do motivo, finalidade e congruência, ou da inserção da operação (cisão) no perfil do empreendimento.

47. Ademais, a impugnante não teria se beneficiado da alienação da Sitesharing do Nordeste; muito pelo contrário, teria passado a atuar como concorrente da América Towers. Malgrado o seu nome constar no respectivo contrato de compra e venda, a sua figuração como responsável solidária teria se dado por força do art. 233 da Lei nº 6.404, de 1976, "tendo em vista a realização da cisão parcial de seus ativos".

[...]

77. No caso em questão, é indiscutível a cisão promovida pela Sitesharing do Brasil, com a posterior incorporação da parte cindida pela Sitesharing do Nordeste, não teve outro propósito a não ser o de propiciar uma tributação menos gravosa na pessoa física do Sr. Flávio Ognibene.

78. Não é crível a cisão tenha ocorrido em face de divergências entre os sócios ou que a intenção deles teria sido "otimizar a administração dos seus bens e separar os negócios realizados pela CINDIDA e por sua controlada", como se afirmou, dado que logo após a incorporação da parte cindida (cerca de um mês), houve a venda da Sitesharing do Nordeste, inclusive com a intermediação da Sitesharing do Brasil, o que evidencia a não segregação dos negócios.

79. Não se enxerga com efeito congruência entre a justificação apresentada, malgrado o cumprimento de todas as formalidades legais, para o negócio jurídico e a sua finalidade, como afirmado no termo de verificação.

80. O fato de o ativo cindido ter sido transferido pelo seu valor contábil e, de consequente, não ter havido ganho na operação, em nada altera a constatação do planejamento perpetrado para escapar-se da tributação na pessoa jurídica.

81. O argumento de que a venda integral das ações da Sitesharing Brasil equivaleria, em termos tributários, à alienação da Sitesharing do Nordeste pelo Sr. Flávio, também em nada influencia a constatação de que não houve propósito extra tributário na cisão promovida, pois que, como dito no Termo de Verificação e confirmado nas próprias alegações de defesa, a Sitesharing tinha interesse em continuar com sua atividade econômica.

Ressalte-se que não houve ressalva à constituição de Sitesharing NE, que se prestou a converter bens da autuada em participação societária posteriormente destinada exclusivamente ao sócio Flávio Ognibene Guimarães para alienação. É certo que a autoridade fiscal questionou a titularidade, por este, de 80% do capital social da autuada, registrando as seguintes constatações no Termo de Verificação de e-fls. 904/943:

4.1 Das constatações acerca da venda de 80% das ações da fiscalizada para o Sr. Flávio Ognibene Guimarães no AC de 2009

88. Constatei as seguintes irregularidades acerca da aquisição das ações correspondentes a 80% do capital social da fiscalizada, e também correspondentes a 100% da participação societária na Sitesharing NE, pelo acionista Flávio Ognibene Guimarães, CPF XXXXX-80:

DF CARF MF

Fl. 3841

Fl. 41 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

89. O Sr. Flávio Ognibene Guimarães adquiriu estas ações da Sitesharing Brasil no AC de 2009, no valor total de R$32.953.754,00, contraindo dívidas para com as acionistas SESTRI EMPREENDIMENTOS E PART. LTDA. (R$25.453.754,00 por meio de 100 parcelas mensais, iguais e consecutivas, no valor de R$ 254.537,54 cada uma, vencendo-se a primeira em 01 de janeiro de 2010) e SERVSITE LTDA. (R$7.500.000,00 por meio de 5 parcelas mensais, iguais e consecutivas, no valor de R$ 1.500.000,00 vencendo-se a primeira em 01 de maio de 2010), e também em 2010 fez jus a dividendos no valor de R$32.295.093,48 da Sitesharing Brasil. (vide parágrafos 11 a 14)

90. Do valor total devido à Sestri (R$25.453.754,00), o Sr. Flávio apresentou apenas comprovação de pagamento das parcelas referentes às cópias dos cheques de R$2.036.300,32 e R$1.018.150,16, totalizando R$3.054.450,48, ou seja, 12% do total. (vide parágrafos 51 a 69)

91. Do valor total devido à Servsite (R$7.500.000,00), o Sr Flávio apresentou um comprovante de transferência eletrônica para a empresa MCC Estruturas Metálicas Ltda., no valor de R$1.500.000,00, como comprovação do pagamento da parcela de referente referente à data de 20/09/2010. Comprovou o pagamento do valor restante através de TED à Servsite. (vide parágrafos 51 a 67)

92. Constatei a irregularidade da lavratura das transferências das referidas ações no Livro de Registro de Transferência de Ações Nominativas nos dias 31/07/2009 e 03/08/2009, datas muito posteriores ao Termo de Encerramento do livro em questão, que fora lavrado em 05/12/2003, servindo unicamente de prova contra a fiscalizada. (vide parágrafos 70 a 72 e Termo de Constatação 001 SSTOWERS)

93. Constatei a irregularidade de que a participação societária na empresa SITESHARING DO NORDESTE não foi declarada na DIPJ 2010 ( AC 2009) da fiscalizada, a qual justificou esta não declaração como um mero erro no preenchimento da informação da DIPJ 2010 ( AC 2009). (vide parágrafos 9, 79 e 79)

94. Estes fatos, analisados em conjunto, confirmam que as sócias da fiscalizada (SERVSITE e SESTRI) financiaram a venda das próprias ações correspondentes a 80% do seu capital social para o Sr. Flávio. Esta parcela era exatamente correspondente à parte que viria a ser cindida da Sitesharing Brasil no ano-calendário de 2010.

95. Esta conduta da fiscalizada, juntamente com TODOS os seus acionistas, foi a de criar uma pseudosituação que desenquadrasse a Sitesharing do Brasil do quadro de acionista da Sitesharing NE, buscando desta forma evitar a subsunção do negócio praticado ao fato imponível, objetivando reduzir o pagamento devido do IRPJ e da CSLL.

Em verdade, Flávio Ognibene Guimarães participava da fiscalizada por meio de SESTRI, como se vê no seu ingresso na sociedade às e-fls. 136/155, de modo que as operações em referência se prestaram a substituir SESTRI por Flávio Ognibene Guimarães no quadro social da autuada, e também ao ajustamento do valor de sua participação, que até então era de 66,72%, consoante quadro antes reproduzido pelo I. Relator.

Contudo, os indícios reunidos pela autoridade fiscal para infirmar a titularidade de 80% das ações da autuada por Flávio Ognibene Guimarães permitiriam, apenas, restabelecer a titularidade de SESTRI, sociedade constituída por Flávio Ognibene Guimarães. Subsistiria,

DF CARF MF

Fl. 3842

Fl. 42 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

assim, o interesse isolado deste, ainda que por meio daquela pessoa jurídica, alienar sua participação na autuada.

E este é o ponto que, no presente caso, dificulta a manutenção da exigência: afirmar que a alienação foi promovida pela autuada, apesar da evidente discordância entre seus sócios, sendo a alienação de interesse, apenas, de Flávio Orgnibene Guimarães.

Veja-se que, para além das operações que colocaram Flávio Orgnibene Guimarães como sócio de Sitesharing NE, nada foi trazido no lançamento acerca de negociações desenvolvidas pela pessoa jurídica autuada para alienação desta participação societária. O único indício apontado na acusação fiscal para afirmar que a cisão teve por objetivo deslocar a tributação da pessoa jurídica para esse sócio foi a constatação de que os sócios de American Tower autorizaram a aquisição de Sitesharing NE em 30/09/2010, ao passo que a cisão parcial foi aprovada em 01/09/2010:

4.2 Das constatações acerca da operação de cisão da fiscalizada seguida pela incorporação da parcela cindida pela Sitesharing Nordeste S.A. no AC de 2010

96. Com base nos fatos apurados e relatados no item 2, e com base nas informações coletadas através dos procedimentos fiscais detalhados no item 3, esta fiscalização chegou às seguintes conclusões acerca das irregularidades praticadas pela fiscalizada e pelos responsáveis solidários através da operação de cisão seguida pela incorporação da parcela cindida pela Sitesharing Nordeste S.A. no AC de 2010:

97. A justificativa para a operação de cisão, segundo o Instrumento Particular de Protocolo e Justificação de Cisão Parcial e Seletiva foi a "necessidade de reestruturação patrimonial e dos negócios da CINDIDA, em decorrência da intenção dos sócios otimizar a administração dos seus bens e separar os negócios realizados pela CINDIDA e por sua controlada, a INCORPORADORA, separando, inclusive, a titulação de cada uma das empresas entre os seus acionistas" (vide parágrafo 19)

98. A fiscalizada detalhou esta justificativa afirmando que "a deliberação de concretizar a Cisão da SSTowers Participações S.A. resultou da intenção dos sócios de separar os negócios da Companhia, uma vez que passaram a ter opiniões diferentes acerca da condução dos negócios sociais e dos investimentos futuros da companhia, de forma que cada um deles pudesse seguir seu caminho da maneira como consideravam mais adequada", e que "com a Cisão da Companhia, os sócios dividiram ativos e passivos, na proporção das respectivas participações, de maneira que o Sr. Flávio Ognibene Guimarães passou a conduzir a Sitesharing NE S.A., enquanto a Servsite Ltda., permaneceu no controle da Sitesharing Brasil S.A. (antiga denominação da SSTowers Participações S.A.). Assim, sem discordância quanto à condução dos negócios cada um, isoladamente, pode exercer o comando sobre a administração dos seus ativos e passivos" (vide parágrafo 75 a 77)

99. Ora, se o motivo da cisão era a intenção dos sócios de separar os negócios da Companhia para que cada sócio, isoladamente, pudesse exercer o comando sobre a administração dos seus ativos e passivos, pergunta-se: "por que a fiscalizada exerceu o papel de interveniente na celebração do Contrato de Compra e Venda da Sitesharing NE S.A. para a empresa AMERICAN TOWER DO BRASIL CESSÃO DE INFRA ESTRUTURAS LTDA., após a cisão, quando não mais figurava no quadro acionário da incorporadora"? (vide parágrafo 26).

100. A compradora, American Tower, afirmou que a interveniência da fiscalizada no Contrato de Compra e Venda de Ações e Outras Avenças celebrado entre ela e o Senhor Flávio Ognibene Guimarães, como vendedor, tendo como objeto as ações de emissão da Sitesharing NE S.A., decorreu do acordo para que aquela, isto é, a Sitesharing Brasil S.A., assumisse, conjunta e solidariamente com o vendedor, a obrigação de indenização

DF CARF MF

Fl. 3843

Fl. 43 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma Processo nº 16561.720079/2015-68

por perdas materializadas nos termos da cláusula 53 do referido contrato. (vide parágrafo 81 e 82)

101. Logo, trata-se de uma falácia a justificativa "de separar os negócios da fiscalizada para que cada sócio, isoladamente, pudesse exercer o comando sobre a administração dos seus ativos e passivos", para realizar a cisão parcial seguida de incorporação, que resultou na transferência das ações da Sitesharing do Brasil (atual SSTowers) para a pessoa física acionista do Senhor Flávio Ognibene Guimarães.

102. Os negócios da fiscalizada, após a cisão e incorporação da parcela cindida, não foram separados. Apenas as ações da parcela cindida passaram totalmente de mãos, ou seja, da Sitesharing do Brasil para o seu acionista pessoa física.

103. Na verdade, a intenção sempre foi a de passar as ações para a pessoa física para não pagar o IRPJ e a CSLL sobre o ganho de capital na pessoa jurídica da fiscalizada.

104. A Assembleia Geral Extraordinária da fiscalizada realizada em 01/09/2010, que aprovou a cisão parcial e seletiva da Companhia, cancelou 30.520.332 ações ordinárias nominativas, todas de titularidade do acionista FLÁVIO OGNIBENE GUIMARÃES, único beneficiário da cisão, preparando o terreno para que a venda desta parcela (Sitesharing NE), negociada em menos de um mês, fosse realizada por uma pessoa física.

105. De novo, o verdadeiro motivo para a cisão em tela foi não pagar o IRPJ e a CSLL incidentes sobre o ganho de capital no momento da alienação da Sitesharing NE.

4.3 Das constatações acerca da alienação da Sitesharing Nordeste S.A.

106. Em 30/09/2010, em conformidade com a Ata de Reunião dos Sócios da American Tower (REG JUCESP 377.546/100), ocorreu a autorização da aquisição por esta Sociedade de 100% (cem por cento) do capital social total e votante da Sitesharing NE S.A., mediante a celebração do Contrato de Compra e Venda de Ações entre a American Tower, na qualidade de compradora, e o Sr. Flávio Ognibene Guimarães, CPF 056.139.79880, como vendedor. Naquele mesmo mês, em 01/09/2010, a empresa fiscalizada, que detinha 100% do capital social da Sitesharing NE, aprovara a cisão parcial em que transferiu a totalidade das ações da sua controlada Sitesharing NE S.A. para um de seus acionistas, Flávio Ognibene Guimarães, CPF 056.139.79880.

107. Logo, conclui-se que estas operações, cisão, incorporação e alienação da parcela cindida foram realizadas de uma forma conjunta para que a empresa fiscalizada obtivesse o benefício de não pagamento IRPJ e a CSLL incidentes sobre o ganho de capital no momento da alienação da Sitesharing NE que recairia sobre si a uma alíquota total de 34%. Em vez disso, organizou um planejamento tributário abusivo, do qual participaram todos os os seus sócios, para que um dos seus sócios, pessoa física, pagasse apenas o imposto de renda incidente sobre o ganho de capital a uma alíquota de 15%, sem nenhum outro propósito negocial.

108. Ainda com relação à alienação merece destacar o fato de que a American Tower adquiriu as ações da Sitesharing NE por R$941.043.291,56 , pagando em 11 diferentes datas (07 distintos meses), conforme a Tabela 15. (vide parágrafo85 a 87)

[...] 5.1 Falta de pagamento de IRPJ/CSLL sobre ganho de capital através de utilização de fraude (planejamento tributário abusivo)

116. Conforme exposto detalhadamente nos itens anteriores, a fiscalizada, em conluio com seus sócios Sestri, Sevsite e Flávio Ognibene Guimarães, realizou transferência das ações referentes à sua participação na empresa Sitesharing Nordeste S.A. para a pessoa física do Sr. Flávio Ognibene Guimarães, numa clara manobra de excluí-la do ônus do pagamento do IRPJ/CSLL.

117. Por intermédio de uma cisão parcial, o referido controle acionário da Sitesharing Nordeste S.A., avaliado em R$44.382.330,00 por ocasião deste evento, foi transferido para um de seus acionistas (Flávio Ognibene Guimarães) que a alienou à empresa

DF CARF MF

Fl. 3844

Fl. 44 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

AMERICAN TOWER DO BRASIL CESSÃO DE INFRAESTRUTURAS LTDA., CNPJ 04.052.108/000189.

118. Agindo dessa maneira, transferindo a titularidade das ações da Sitesharing NE S.A. para a pessoa física de um dos acionistas da cindida, a carga tributária sobre o ganho de capital passou para 15% ao invés de 34%.

119. A transferência das ações da empresa Sitesharing do Nordeste S.A para o seu acionista Flávio Ognibene Guimarães restou comprovadamente fraudulenta, quando analisada no contexto geral das operações que a seguiram, e no resultado obtido, redução da tributação, comprovação esta obtida através dos procedimentos realizados por esta fiscalização.

120. Comprovou-se que esta transferência era apenas um cenário inicial para não pagamento dos tributos (IRPJ/CSLL) incidentes sobre a verdadeira operação, que foi a alienação da empresa Sitesharing do Nordeste S.A. pela fiscalizada, diretamente para a sua compradora American Tower.

121. Vale frisar que convenções particulares não podem ser opostas à Fazenda Pública, conforme previsto no artigo 123 do Código Tributário Nacional:

"Art. 123. Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes."

122. A cisão em tela se tratou de mera transferência de ações da fiscalizada para o seu acionista pessoa física, não gerando nenhum benefício negocial na fiscalizada.

123. Contudo, para a Fazenda Pública o efeito foi danoso, pois essa conduta gerou um rombo aos cofres públicos no valor aproximado de R$185 milhões (em moeda da época), uma vez que o ganho de capital obtido pela fiscalizada foi camuflado pela conduta das partes envolvidas.

124. Diante do exposto, conclui-se que a cisão da Sitesharing do Brasil seguida de incorporação pela Sitesharing NE teve o objetivo único e exclusivo a redução do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido sobre o ganho de capital ocorrido quando da posterior alienação da Sitesharing NE.

125. Pretendeu a fiscalizada, por meio de um planejamento tributário abusivo, realizar uma cisão seguida de incorporação, como medida preparatória para realizar a alienação de sua participação de 99,99% na Sitesharing NE sem o pagamento dos tributos devidos.

Nestes termos, negou-se a intenção de "separar os negócios da fiscalizada para que cada sócio, isoladamente, pudesse exercer o comando sobre a administração dos seus ativos e passivos" porque, ao final, os negócios da fiscalizada não teriam sido separados, mas sim "as ações da parcela cindida passaram totalmente de mãos, ou seja, da Sitesharing do Brasil para o seu acionista pessoa física". Contudo, assim se deu porque o sócio Flávio Ognibene Guimarães, diversamente do sócio remanescente Luigi Cosenza, não mais tinha interesse em manter seu investimento na autuada, alienando-o a terceiro. Logo, houve separação dos negócios da fiscalizada, e parte deles passaram a ser exercidos por outra pessoa jurídica sem vínculo com a autuada.

Concluo, do exposto, que as operações realizadas foram consideradas inválidas porque teve como resultado final a tributação do ganho de capital auferido na alienação no âmbito do imposto de renda devido pelo sócio Flávio Ognibene Guimarães. Contudo, não foram reunidas evidências no sentido de que a pessoa jurídica autuada, e não referido sócio, teria iniciado negociações para esta alienação, de modo a indicar a sua pretensão de alterar a sujeição

DF CARF MF

Fl. 3845

Fl. 45 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

passiva da incidência daí decorrente. E, existindo a faculdade expressa no art. 22 da Lei nº 9.249/95 seu exercício não pode ser tomado por abusivo se há um motivo para a realização das operações questionadas, consistente no dissídio entre os sócios da fiscalizada quanto à manutenção do investimento para a execução de suas atividades.

Assim, concluo que a acusação fiscal não reúne evidências suficientes para desconstituir as operações realizadas e alterar a incidência tributária delas decorrentes.

Por tais razões, vencida no conhecimento, voto por NEGAR PROVIMENTO ao recurso especial da PGFN.

(documento assinado digitalmente)

EDELI PEREIRA BESSA - Conselheira

DF CARF MF

Fl. 3846

Fl. 46 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Declaração de Voto

Conselheira Livia De Carli Germano

No presente caso optei por apresentar a presente declaração de voto para esclarecer as razões pelas quais, com o devido respeito ao substancioso voto do i. Relator, dele divergi quanto ao conhecimento do recurso especial e também no mérito.

Nesse ponto, observo que a Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) é instância especial de julgamento com a finalidade de proceder à uniformização da jurisprudência do CARF. Desse modo, a admissibilidade do recurso especial está condicionada ao atendimento das condições previstas no art. 67 do Anexo II do Regimento Interno do CARF - RICARF, aprovado pela Portaria MF 343/2015, dentre as quais se encontra a demonstração da divergência jurisprudencial:

Art. 67. Compete à CSRF, por suas turmas, julgar recurso especial interposto contra decisão que der à legislação tributária interpretação divergente da que lhe tenha dado outra câmara, turma de câmara, turma especial ou a própria CSRF.

§ 1º Não será conhecido o recurso que não demonstrar a legislação tributária interpretada de forma divergente.

(...)

§ 8º A divergência prevista no caput deverá ser demonstrada analiticamente com a indicação dos pontos nos paradigmas colacionados que divirjam de pontos específicos no acórdão recorrido.

Destaca-se que o alegado dissenso jurisprudencial se estabelece em relação à interpretação das normas, devendo, pois, a divergência, se dar em relação a questões de direito, tratando-se da mesma legislação aplicada a um contexto fático semelhante.

Assim, se os acórdãos confrontados examinaram normas jurídicas distintas, ainda que os fatos sejam semelhantes, não há que se falar em divergência de julgados, uma vez que a discrepância a ser configurada diz respeito à interpretação da mesma norma jurídica.

Por outro lado, quanto ao contexto fático, não é imperativo que os acórdãos paradigma e recorrido tratem exatamente dos mesmos fatos, mas apenas que o contexto seja de tal forma semelhante que lhe possa (hipoteticamente) ser aplicada a mesma legislação. Assim, um exercício válido para verificar se se está diante de genuína divergência jurisprudencial é buscar saber, com base no raciocínio exposto no paradigma, o que aquele colegiado decidiria no caso dos autos.

Da contraposição dos fundamentos expressos nas ementas e nos votos condutores dos acórdãos, compreendo que a Recorrente não logrou êxito em comprovar a ocorrência do alegado dissenso jurisprudencial.

Isso porque, no caso indicado como paradigma, foi decisivo para o voto condutor daquele acórdão o conhecimento da proposta de aquisição obrigatória para a adquirente, isto é, o fato de que a adquirente estava obrigada a comprar os ativos naquelas condições especificas de preço e quantidade. É a isso que ele se refere ao tratar de "conhecimento prévio".

No caso dos autos não se verifica o "conhecimento prévio" em tais termos, já que, muito embora se afirme que a negociação estava sendo discutida, é certo que ela não estava

DF CARF MF

Fl. 3847

Fl. 47 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

fechada, é dizer, as ações não estavam de forma alguma vinculadas a serem negociadas entre as partes por determinados preço e condições.

Afirma o relator no presente caso:

Tanto nos presentes autos, quanto nos autos do paradigma, a pessoa jurídica que tinha a propriedade do investimento sabia, com antecedência, que receberia oferta da alienação. No paradigma, a informação foi extraída por meio de cláusula contratual de tag along, e nos presentes autos deu-se pela comprovação de que as tratativas entre comprador e vendedor já aconteciam antes dos eventos de reorganização societária que transferiram o ativo a ser alienado para o sócio pessoa física.

Com a devida vênia, compreendo a situação de forma diversa. No caso analisado pelo acórdão indicado como paradigma, a pessoa jurídica autuada já tinha recebido a oferta para a compra de determinada quantidade de ações por determinado preço, situação diferente do caso dos autos em que, no máximo, se tinha conhecimento da possibilidade de a adquirente vir a querer negociar os ativos (ou seja, havia uma expectativa de negócio, que, vale observar, nem expectativa de direito o é).

É dizer, a cláusula de tag along analisada no acórdão indicado como paradigma consubstancia uma proposta de aquisição obrigatória para a adquirente: significa que ela estava a comprar aqueles ativos daquela pessoa por determinado valor. Esta situação é bem diversa da versada nestes autos em que, no máximo, os vendedores tinham conhecimento do interesse de um terceiro em adquirir os ativos, fato este que poderia se materializar ou não, e por valor e em condições ainda não acordados.

A decisão a que chegou o acórdão paradigma foi no sentido de que, havendo proposta de compra irretratável dos ativos, não é legítima a reorganização societária para transferência de sua propriedade a outra pessoa para que esta, na alienação destes mesmos ativos, apure tributação menor do que a que seria devida se a venda tivesse sido realizada pela pessoa jurídica.

Nesse ponto, a conclusão a que chegou o voto condutor do paradigma até converge com a do acórdão recorrido eis que aquele, se aplicado ao caso dos autos, concluiria igualmente que, como aqui não havia proposta de compra irretratável (mas apenas potencial interesse de um comprador) é legítima a reorganização societária.

De se ressaltar que a circunstância de o acórdão paradigma ter mencionado em sua ementa o fato de o caso ali decidido ser específico ocorreu porque, realmente, a decisão ali era circunstancial e não deveria servir de precedente para qualquer autuação relativa à redução de capital seguida de venda dos ativos pelos sócios.

Tanto é assim que, no mês seguinte à sessão em que se decidiu o acórdão paradigma, a mesma turma 1401, em acórdão do mesmo relator, validou uma operação de redução de capital seguida de venda, pelo sócio, do ativo recebido em devolução em caso em que "A operação foi realizada, desde o início, pelos sócios pessoas físicas da empresa.".

Naquela decisão (acórdão XXXXX-002.307, de 15 de março de 2018), o Relator foi cauteloso em fazer referência ao caso julgado no mês anterior e afirmar que não estava mudando de posicionamento, tendo concluído pela legitimidade da reorganização societária, conforme se lê de seu voto condutor:

Em recente julgado, de situação semelhante, entendi que o planejamento fiscal foi abusivo em razão de um empecilho contratual, representado por um acordo entre os acionistas controladores da participação nos quais o direito conferido pela cláusula de tag along fora estabelecido apenas ao controlador pessoa jurídica. Já naquele julgado

DF CARF MF

Fl. 3848

Fl. 48 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

me pronunciei no sentido de que não considerava ilegal a realização da redução de capital e devolução das ações aos sócios.

Por isso, neste caso mantenho o posicionamento de que a redução de capital e devolução das ações antes integralizadas aos sócios não pode ser considerado ato ilegal, posto que submetido ao exercício do direito de propriedade dos titulares do direito que ainda o possuíam, mesmo que de forma indireta.

(...)

Neste ponto cabe ressaltar que ao permitir a possibilidade de redução de capital pelo valor contábil sem a apuração de ganho do sócio, a lei atribuiu ao sócio acionista a opção de escolher dentre as alternativas possíveis, a mais benéfica aos seus interesses. Como já dito no item 1, quem pode o mais pode o menos. Se os acionistas podem dispor de seu patrimônio entregando-o a uma sociedade, também pode deliberar em sentido contrário, recebendo de volta estas mesmas ações quando necessário. Assim, a opção de tributação é facultada pelas normas, como mais abaixo iremos detalhar.

Para melhor reforçar o argumento devemos considerar que o acionista controlador, caso queira, pode até determinar o encerramento das atividades da empresa que seria o pior cenário, quanto mais reduzir seu capital.

...

Veja-se que o conteúdo contratual foi assumido, desde o início pelas pessoas físicas que indiretamente detinham o controle acionário das companhias de interesse da Petrobrás. Por isso, diferentemente de outro caso analisado em que fui reator nesta Turma, entendo que os sócios pessoas físicas, nesta hipótese, detinham o pleno direito de alienação de suas ações, mesmo que utilizadas, por estes, em integralização de capital

Em síntese, portanto, compreendo que não há divergência jurisprudencial entre os acórdãos recorrido e o precedente indicado como paradigma. Na verdade, as circunstâncias acima ressaltadas permitem inclusive o exercício hipotético de se concluir que, se a mesma turma que decidiu o acórdão indicado como paradigma estivesse decidindo o caso dos autos, a conclusão seria convergente com a que chegou o acórdão recorrido - isto é, no mesmo sentido da proferida no caso XXXXX-002.307.

Não menos importante é o fato de que os acórdãos paradigma e recorrido analisaram legislações diversas, eis que a reorganização societária também foi diferente.

No paradigma ocorreu uma redução de capital (realizada com base no artigo 22 da lei 9.249/1996) e, no recorrido, cisão a valor contábil (art. 21 da Lei 9.249/1996)-- cisão ocorrida quase um ano antes da venda). Bases legais diferentes, com incidências tributárias independentes, veja-se:

Art. 21. A pessoa jurídica que tiver parte ou todo o seu patrimônio absorvido em virtude de incorporação, fusão ou cisão deverá levantar balanço específico para esse fim, no qual os bens e direitos serão avaliados pelo valor contábil ou de mercado.

...

Art. 22. Os bens e direitos do ativo da pessoa jurídica, que forem entregues ao titular ou a sócio ou acionista. a título de devolução de sua participação no capital social, poderão ser avaliados pelo valor contábil ou de mercado.

...

Daí porque, concessa venia , compreendo que de qualquer forma o recurso especial em questão sequer poderia ter sido conhecido, eis que os casos examinaram normas jurídicas distintas.

DF CARF MF

Fl. 3849

Fl. 49 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

No mérito, por sua vez, igualmente peço licença ao i. Relator por entender que o recurso também não merece acolhida.

Os aspectos tributários da operação de redução de capital de pessoa jurídica com entrega de bens aos sócios estão expressamente regulados no artigo 22 da Lei 9.249/1995. Tal dispositivo estabelece que o negócio pode ser realizado por valor contábil ou de mercado, e somente neste último caso é que haverá tributação da pessoa jurídica que tem o capital reduzido.

Trata-se de nítida hipótese de opção fiscal, em especial quando se observa o contexto legislativo em que está inserido tal dispositivo.

De fato, muito antes da vigência da Lei 9.249/1995, a redução de capital de pessoa jurídica mediante entrega de bens avaliados a valor contábil, quando este era notoriamente inferior ao de mercado, autorizava a presunção de distribuição disfarçada de lucros (DDL) nos termos do artigo 60 do Decreto-Lei 1.598/1977. Operando-se tal presunção, a tributação ocorre tal como se o negócio tivesse sido realizado a valor de mercado, já que a legislação determina a adição ao lucro líquido da diferença entre o valor de mercado e o de alienação.

De se notar, portando, que a transmissão de bens pela pessoa jurídica a valor contábil, mesmo em sendo este notoriamente inferior ao e mercado, não gera presunção de DDL especificamente em razão da regra do artigo 22 da Lei 9.249/1995. Disso ninguém discorda.

Na verdade, quando se trata de opções fiscais, as discussões se centram não mais no tipo de negócio celebrado, mas nos resultados obtidos, sendo especialmente importante avaliar se o negócio foi realizado no efetivo e legítimo exercício de tal opção (ou seja, se foram obtidos todos os efeitos que lhe são próprios - presença de "causa", e/ou ausência de "artificialidade"/ "simulação" / que tais) e sem que o resultado se revele um contorno a regra que proíba ou obrigue conduta diversa (ausência de "abuso" 6).

No caso, fazendo tal análise, entendo que o negócio deve permanecer na esfera da lícita e legítima economia de tributos, já que não há, na acusação fiscal, a descrição de circunstâncias suficientes que permitam concluir, quer que houve artificialidade, quer que a operação se tratou de um contorno a uma regra cujo resultado se revelou, em seus efeitos, contrário ao ordenamento.

De fato, para que pudéssemos concluir que a operação praticada foi "artificial"/ "simulada", a fiscalização deveria ter reunido indícios convergentes de que, por exemplo, o negócio foi primeiramente pactuado pela pessoa jurídica (partes, preço e quantidade), para só então ter havido a redução de capital e entrega da participação societária para a pessoa física. Não há qualquer início de prova efetuada pela autoridade lançadora neste sentido.

6 Em geral preferimos evitar a utilização do termo "abuso" eis que este não está previsto em nosso ordenamento e

costuma trazer mais discussões que respostas. De qualquer forma, referimo-nos aqui ao que muitos denominam abuso de direito, ausência de substância, falta de propósito negocial, fraude à lei intrínseca ou mesmo elusão fiscal. Juridicamente, trata-se de uma espécie de ilícito atípico, ou seja, um negócio que, de maneira geral, não é proibido pelo ordenamento (pelo contrário, é permitido, portanto a princípio lícito) mas que, no caso concreto, especificamente em razão do resultado atingido, torna-se vedado e/ou merece ter determinados efeitos desconsiderados para garantia de equilíbrio do próprio ordenamento (por ter se tornado ilegítimo). Fizemos uma análise mais detalhada de tais conceitos em nosso "Planejamento Tributário e Limites para a Desconsideração de Negócios Jurídicos". São Paulo: Saraiva, 2013, p. 81 e segs.

DF CARF MF

Fl. 3850

Fl. 50 do Acórdão n.º 9101-004.709 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720079/2015-68

Na verdade, a autoridade lançadora parece pretender invalidar as operações realizadas exclusivamente em virtude do resultado final obtido, isto é, em razão de que, após uma reestruturação societária, quem realizou a venda e apurou o ganho de capital foi a pessoa física e não a pessoa jurídica antes detentora dos ativos. Mas estruturar negócios visando a economizar tributos não é, de forma alguma, por si só, um ilícito.

Hipoteticamente, o meio empregado pode, sim, acabar se revelando ilícito, por exemplo quando o resultado economia de tributos é obtido mediante contorno a norma imperativa (isto é, obrigatória ou proibitiva de uma conduta). Mas, novamente, também aqui não há qualquer acusação neste sentido.

E é por não identificar, na presente autuação, qualquer circunstância que permita dar aos negócios jurídicos praticados qualificação diversa da que lhe foi originalmente conferida, que orientei meu voto para, uma vez vencida quanto à admissibilidade do recurso especial, negar-lhe provimento.

(documento assinado digitalmente)

Livia De Carli Germano

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/carf/1633416111/inteiro-teor-1633416112

Informações relacionadas

Tribunal Regional Federal da 4ª Região
Jurisprudênciahá 3 anos

Tribunal Regional Federal da 4ª Região TRF-4 - APELAÇÃO CIVEL: AC XXXXX-17.2014.4.04.7000 PR XXXXX-17.2014.4.04.7000

Conselho de Administração de Recursos Fiscais CARF: XXXXX20028201851 1302-005.708

Tribunal Regional Federal da 3ª Região
Jurisprudênciahá 8 meses

Tribunal Regional Federal da 3ª Região TRF-3 - APELAÇÃO CÍVEL: ApCiv XXXXX-27.2021.4.03.6143 SP

Leroy & Miranda, Advogado
Artigoshá 3 anos

Tributação na venda de imóveis realizada por Holding Imobiliária

Superior Tribunal de Justiça
Jurisprudênciahá 9 anos

Superior Tribunal de Justiça STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL: AgRg no AREsp XXXXX ES XXXX/XXXXX-0