Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
25 de Maio de 2024
  • 2º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO NO HABEAS CORPUS: RHC XXXXX - Inteiro Teor

Superior Tribunal de Justiça
há 6 anos

Detalhes

Processo

Publicação

Relator

ANTONIO SALDANHA PALHEIRO

Documentos anexos

Inteiro TeorSTJ_RHC_069736_8d8a3.pdf
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Inteiro Teor

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 69.736 - RO (2016/XXXXX-4)

RELATOR : MINISTRO ANTONIO SALDANHA PALHEIRO

RECORRENTE : CRISTIAN THOMAS VIEIRA (PRESO)

ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

DECISÃO

Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus , interposto por CRISTIAN THOMAS VIEIRA contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 1a Região (HC n. XXXXX-33.2015.4.01.0000/RO).

Colhe-se dos autos que a Defensoria Pública da União, em primeira instância, impetrou habeas corpus perante o Juízo da 3a Vara da Seção Judiciária do Estado de Rondônia, pugnando pelo reconhecimento da nulidade do procedimento de apuração de falta grave realizado pelo Diretor do estabelecimento prisional em que se encontrava o ora recorrente, no qual "o Diretor da Penitenciária Federal de Porto Velho/RO condenou o reeducando pela prática de falta disciplinar de natureza grave, nos termos do artigo 45, inciso V, do Decreto nº 6.049/2007, e o puniu com sanção de isolamento por 05 (cinco) dias, nos termos do artigo 46, inciso IV, do mesmo decreto" (e-STJ fl. 100).

O habeas corpus foi julgado sem resolução do mérito, ante o superveniente cumprimento da sanção de isolamento em função da falta grave, recomendando o Juízo de piso, "ao Senhor Diretor da Penitenciária Federal em Porto Velho que observe, na aplicação da sanção de isolamento preventivo, o dever de motivação e, ainda, registre, no Processo Administrativo Disciplinar, a data do início e do fim do cumprimento da sanção" (e-STJ fls. 100/107).

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (e-STJ fls. 119/120).

Irresignada, a defesa impetrou prévio writ perante o Tribunal a quo , pugnando pelo reconhecimento da ausência de legitimidade do Diretor da Penitenciária Federal de Porto Velho para aplicar sanção referente à falta grave, que o procedimento

Superior Tribunal de Justiça

administrativo de interno deveria ser anulado por seu caráter inquisitivo e que, para a caracterização da infração grave, o reeducando teria que descumprir uma ordem, o que não ocorrera. Asseverou, ainda, a inexistência de dolo na conduta, requerendo a aplicação do princípio da insignificância, ou a aplicação de sanção proporcional, nos termos do art. 43, VIII, do Decreto 6.049/2007.

A ordem foi denegada, em acórdão cuja ementa foi assim definida (e-STJ fl. 154):

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. SANÇÃO DE ISOLAMENTO PELA PRÁTICA DE FALTA GRAVE POR DETENTO DE PENITENCIÁRIA FEDERAL. ART. 49 DO DECRETO 6.049/2007. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE ÁUDIO E VÍDEO SOLICITADOS. NULIDADES NÃO CONFIGURADAS. ORDEM DENEGADA.

1. A presente ordem de habeas corpus foi impetrada contra sentença do Juízo Federal da 3a. Vara da Seção Judiciária de Rondônia, que não conheceu de habeas corpus contra decisão do Diretor da Penitenciária Federal em Porto Velho/RO que, em sede de procedimento disciplinar de interno, impôs sanção de isolamento pela prática de falta grave ao ora paciente.

2. Descabe falar em nulidade na decisão emanada por diretor de presídio que, em decorrência de falta disciplinar grave, apurada administrativamente, aplicou ao detento a sanção de isolamento por falta disciplinar grave.

3. É conferido à autoridade administrativa a que sujeito o condenado, poder disciplinar sobre os internos"(TRF1, Numeração Única: HC XXXXX-76.2015.4.01.0000/RO; Quarta Turma, Rel. Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado (convocado), e-DJF1 de 21/09/2015, p. 448).

4. Ordem de habeas corpus denegada.

No presente recurso, a Defensoria Pública da União repisa os argumentos lançados no writ originário, aduzindo, inicialmente, que,"Segundo o Decreto

n. 6.049/2007, o cometimento da falta grave deve ser apurado mediante processo

judicial e não de forma administrativa. Desse modo, a sanção disciplinar não pode ser aplicada pelo diretor do presídio "(e-STJ fl. 169).

Sustenta, ademais, a nulidade do procedimento por cerceamento de defesa, pela" realização de interrogatório sem que o interno e seu defensor tivessem

Superior Tribunal de Justiça

prévio acesso às provas orais e documentais produzidas nos autos [ou pela] ausência de disponibilização das imagens gravadas requerido pela defesa "(e-STJ fl. 170).

Pugna, ainda, pela descaracterização da conduta imputada ao recorrente, afirmando que" a punição aplicada ao reeducando, além de ter sido totalmente desproporcional e desarrazoada, não condiz com o fato narrado "(e-STJ fl. 172), e que" a suposta falta disciplinar praticada pelo reeducando se amoldaria, com maior razoabilidade, dentre as de natureza leve, ou, no máximo, de natureza média "(e-STJ fl. 173).

Requer, assim, o provimento do recurso a fim de afastar a falta disciplinar de natureza grave aplicada ao recorrente, excluindo-se eventuais registros desfavoráveis de seu prontuário. Requer, subsidiariamente, a desclassificação da falta para de natureza leve ou média.

O Ministério Público Federal, às e-STJ fls. 197/201, manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

Solicitadas informações complementares, foram prestadas às e-STJ fls. 213/214, dando conta de que o" apenado CRISTHIAN THOMAS VIEIRA permaneceu na Penitenciária Federal em Porto Velho/RO no período de 20/01/2014 à 22/05/2015, sendo transferido para a Penitenciária Federal em Mossoró/RN e retornando, posteriormente, ao Sistema Penitenciário Estadual do Mato Grosso do Sul, onde permanece custodiado até o presente momento ".

É o relatório.

O Magistrado de piso, ao proferir decisão não conhecendo do habeas corpus impetrado na origem, manifestou-se nos seguintes termos (e-STJ fls. 101/106, grifei):

[...]

A presente ação de habeas corpus tem como escopo analisar a punição imposta a reeducando pelo cometimento de falta grave. Quando se tratar apenas dos efeitos da falta grave sobre o cumprimento da pena, o juiz deverá apreciar a legalidade da apuração e declarar a sua ocorrência, nos termos do parágrafo único do art. 48 da Lei nº 7.210/84. Importante elencar os efeitos

Superior Tribunal de Justiça

do reconhecimento da falta grave: regressão de regime, com reinício da contagem do prazo para progressão (artigo 118, inciso I, da Lei nº 7.210/84); perda parcial do tempo remido (artigo 127 da Lei nº 7.210/84); revogação de saída temporária (artigo 125 da Lei nº 7.210/84); conversão da pena restritiva de direito em privativa de liberdade (artigo 181 da Lei nº 7.210/84); não concessão do livramento condicional em virtude do mau comportamento carcerário ( CP, inciso III do art. 83); não progressão de regime em razão do mau comportamento carcerário (art. 112 da Lei nº 7.210/84).

Ainda que o artigo 82, § 2º, do Decreto nº 6.049/2007 proíba o Diretor de expedir atestado de conduta carcerária enquanto tramitar procedimento disciplinar em desfavor do reeducando, o fato é que apenas o atestado que certifique comportamento não satisfatório, e não a mera negativa em expedi-lo, é que poderá trazer prejuízo ao preso. Ademais, o atestado que certifique comportamento não satisfatório em decorrência de falta grave somente poderá ser expedido no caso de haver pronunciamento judicial endossando a decisão do Diretor.

Da mesma forma que o parágrafo único do art. 48 da Lei 7.210/84, o artigo 72 do Decreto nº 6.049/2007 traz regra que impõe ao Diretor do estabelecimento penal federal, ao decidir sobre a falta grave, o dever de remeter o procedimento disciplinar ao juízo da execução para apreciação, senão vejamos:

Art. 72. Na decisão do Diretor do estabelecimento penal federal a respeito de qualquer infração disciplinar, deverão constar as seguintes providências:

IV - remessa do procedimento ao juízo competente, nos casos de isolamento preventivo e falta grave;(...)

Desse modo, quando a questão jurídica trazida à apreciação deste juízo versar sobre os EFEITOS da falta grave não será cabível o manuseio do remédio constitucional, na medida em que não haveria, sem decisão judicial, nem agravamento do cumprimento da pena tampouco risco real ou iminente ao direito de locomoção do reeducando.

Contudo, em relação à sanção de isolamento, entendo cabível o habeas corpus por agravar o cumprimento de pena. Não obstante a medida deve ser cominada pelo Diretor da Penitenciária, cabe ao Poder Judiciário verificar a proporcionalidade de sua aplicação diante das circunstâncias do caso concreto .

No entanto, o reeducando já a cumpriu, conforme se observa da informação de fl. 52.

3 DA ATRIBUIÇÃO PARA IMPOSIÇÃO DA SANÇÃO DE ISOLAMENTO

Superior Tribunal de Justiça

Reiteradamente a Defensoria Pública sustenta a nulidade da aplicação dessa sanção pelo Diretor da Penitenciária.

Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre direito penitenciário ( CP, art. 24, inciso I). As matérias sujeitas à competência concorrente se submetem ao princípio da reserva legal, razão pela qual apenas lei na sua concepção formal e estrita, aprovada pelo Poder Legislativo, obedecido o devido processo legislativo, será o instrumento competente para tratar de direito penitenciário.

Em cumprimento à regra do art. 24, inciso I, da CF, a Lei de Execução Penal deu especial atenção ao regramento da falta grave e dás respectivas sanções, dentre estas a de isolamento, senão vejamos:

[...]

Note-se, a partir da leitura desses artigos, que o Diretor da Penitenciária é quem detém a atribuição de aplicar a sanção de isolamento. É de outro modo não poderia ser, porquanto o Diretor necessita de instrumentos que viabilizem o controle da disciplina nas atividades diárias do estabelecimento penal.

Não obstante a necessidade de a legislação munir o Diretor de poderes adequados para manter a disciplina, o Poder Legislativo pode criar exceções, como, por exemplo, é o caso do Regime Dis- ciplinar Diferenciado - RDD. Em relação ao RDD, compete ao juiz da execução penal aplicá-lo (Lei nº. 7.210/87, art. 53, inciso V).

Apesar de a Lei de Execução Penal ter definido a atribuição do Diretor para aplicar a sanção de isolamento, o Regulamento Penitenciario Federal atribuiu à autoridade judiciária tal função, senão vejamos:

[...]

Portanto, compete ao Diretor da Penitenciária aplicar a sanção de isolamento. Todavia, para a imposição dessa sanção, devem ser observados os preceitos legais e constitucionais, notadamente o princípio do devido processo legal .

Primeiramente, há de se fazer a distinção entre o isolamento sanção e o isolamento preventivo. O isolamento como sanção é aplicável sempre após a conclusão do Processo Administrativo Disciplinar, enquanto o preventivo é aplicável quando as circunstâncias do caso exigem resposta imediata e enérgica.

No isolamento preventivo, o direito ao contraditório e à ampla defesa é diferido, tendo em vista que, a depender das circunstâncias do caso concreto, o Diretor deverá ter instrumentos adequados para controlar situações graves de indisciplina, que coloquem em risco a ordem e a segurança do estabelecimento prisional. Por ser uma medida irreversível, o isolamento preventivo deve ser aplicado apenas excepcionalmente, quando, pelas

Superior Tribunal de Justiça

circunstâncias do caso concreto, for recomendável, em um juízo de ponderação, não aguardar a conclusão do Processo Administrativo Disciplinar Interno.

O parágrafo único do artigo 58 da LEP determina, inclusive, a comunicação do isolamento, sanção ou preventivo, ao juízo da execução justamente para que os fundamentos fáticos e jurídicos sejam apreciados.

Não se pode olvidar, também, que a sanção de isolamento é ato administrativo e, portanto, deve ser motivada, notadamente em relação ao preventivo, por diferir o exercício do direito ao contraditório ( Lei de Execução Penal, artigo 54). O Regulamento Penitenciario Federal, no artigo 52, também expressou o dever de motivação do ato sancionatório. E de forma geral, o legislador elevou a motivação do ato administrativo à categoria de princípio expresso (artigo 50, inciso II, da Lei nº 9.784/99).

Sendo assim, a decisão de isolamento preventivo, devidamente motivada com a exposição dos fundamentos fáticos e jurídicos, deverá ser encaminhada ao juízo da execução. Outrossim, essa decisão deverá constar no Processo Administrativo Disciplinar. Além disso, nesse Processo Administrativo Disciplinar deverá ser certificado a data do início e do fim do cumprimento da sanção.

4 DISPOSITIVO

NESTAS CONDIÇÕES, à vista da fundamentação expendida, não conheço da presente ação de habeas corpus em favor de CRISTHIAN THOMAS VIEIRA, e extingo a ação sem resolução do mérito pela perda do objeto.

Recomendo ao Senhor Diretor da Penitenciária Federal em Porto Velho que observe, na aplicação da sanção de isolamento preventivo, o dever de motivação e, ainda, registre, no Processo Administrativo Disciplinar, a data do início e do fim do cumprimento da sanção.

Encaminhe-se cópia da presente decisão ao Senhor Diretor da Penitenciária Federal em Porto Velho.

O Tribunal de origem, ao denegar a ordem no habeas corpus originário, fê-lo mediante a seguinte fundamentação (e-STJ fls. 148/152, grifei):

Inicialmente, faz-se necessário frisar que o habeas corpus é remédio processual destinado precipuamente a proteger a liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.

Com efeito, ainda que a sanção já tenha sido aplicada e cumprida, os efeitos da condenação disciplinar por falta grave implicam recrudescimento ou diferem a progressão do regime de cumprimento de pena, em evidente prejuízo à liberdade de

Superior Tribunal de Justiça

locomoção do réu, razão pela qual conhece-se de habeas corpus contra os efeitos da condenação administrativa disciplinar por falta grave de interno.

Todavia, no mérito propriamente dito não assiste razão ao impetrante, tendo em vista que não há nulidade na decisão do Diretor da Penitenciária Federal de Porto Velho/RO, que aplicou ao ora paciente sanção de isolamento por falta disciplinar grave.

Ao diretor do estabelecimento prisional, autoridade administrativa a que sujeito o condenado, é conferido poder disciplinar sobre os internos. Atribuição essa que inclui a aplicação e execução das sanções por faltas disciplinares dos internos, conforme estatui o art. 54 da Lei 7.210/84 - Lei de Execucoes Penais, in vertis:

"As sanções dos inciso I a IV do art. 53 serão aplicadas por ato motivado do direto do estabelecimento e a do inciso V, por prévio e fundamentado despacho do juiz competente".

Em igual sentindo, também, os artigos 47, caput, e 48, parágrafo único, do referido diploma normativo, estatuem cabe ao diretor do estabelecimento prisional condenar e aplicar pena também pela falta disciplinar grave, quando deverá representar ao juízo da execução, a quem incumbirá apenas realizar o controle de licitude da condenação e aplicar-lhe os efeitos. Confiram-se:

"Art. 47. O poder disciplinar, na execução da pena privativa de liberdade, será exercido pela autoridade administrativa conforme as disposições regulamentares.

Art. 48. Na execução das penas restritivas de direitos, o poder disciplinar será exercido pela autoridade administrativa a que estiver sujeito o condenado.

Parágrafo único. Nas faltas graves, a autoridade representará ao Juiz da execução para os fins dos artigos 118, inciso I, 125, 127, 181, §§ 1º, letra d, e 2º desta Lei.

A atuação do diretor de estabelecimento prisional já restou confirmada pelo STJ, em seu verbete sumular n. 533 que derivou, entre outros, do seguinte julgado, litteris:

[...]

Anoto, ainda, que não há que se falar em vício no procedimento disciplinar de interno quanto à não juntada aos autos de registro videográfico pugnado pela defesa no Juízo de origem e repisado aqui nesse writ, uma vez que tais procedimentos administrativos devem se pautar pelo devido processo legal e pela razoável duração do processo, conforme determina o art. , LIV e LXXVIII, da Constituição.

Nesse diapasão, para se evitar dilações desnecessárias, é desprezível a produção de elementos de convencimento impertinentes ou inúteis, aplicando-se por analogia o disposto no art. 130 do CPC. Embora se trate de orientação processual

Superior Tribunal de Justiça

civil também é aplicado ao processo penal, em razão do previsto no art. 3º do CPP e por derivar dos deveres de prezar pela normalidade do devido processo legal e conferir razoável duração aos procedimentos, aplicável aos feitos civis, penais e administrativos .

Lado outro, ainda que existam vícios, não se há de decretar nulidade se não houver também, prejuízo, segundo informa o princípio da instrumentalidade das formas e o disposto no art. 563 do CPP.

Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.

Pois bem. Inicialmente, no que diz respeito à alegada nulidade da aplicação de sanção disciplinar de falta grave pelo Diretor do estabelecimento prisional, ao argumento de que a sanção deve decorrer de processo judicial e não administrativo, não há nenhuma flagrante ilegalidade a ser reconhecida.

De fato, prevê o art. 49 do Decreto 6.049/2007 que "Compete ao diretor do estabelecimento penal federal a aplicação das sanções disciplinares referentes às faltas médias e leves, ouvido o Conselho Disciplinar, e à autoridade judicial, as referentes às faltas graves" (grifei).

No entanto, tem-se que o artigo 57, parágrafo único, c/c os artigos 53, inciso IV, 54 e 58, da Lei de Execução Penal, expressamente autoriza o Diretor do estabelecimento prisional a aplicar a sanção de isolamento, com prazo máximo de 30 dias, em caso de cometimento da falta grave, ressalvada apenas a necessidade de motivação, com individualização da conduta e proporcionalidade da sanção aplicada à infração cometida, sendo assegurados o contraditório e ampla defesa do interno.

Parece-me, portanto, que o Decreto 6.049/2007, ao dispor que caberia tão somente à autoridade judicial a aplicação das sanções disciplinares referentes às faltas graves, extrapolou seu poder regulamentador, indo de encontro às disposições da Lei de Execução Penal quanto ao tema.

A Terceira Seção desta Corte Superior, quando do julgamento do REsp XXXXX/RS, sob o rito dos recursos repetitivos, apreciou a irresignação ora trazida pelo recorrente. Na oportunidade, o voto condutor do referido acórdão esclareceu que:

Superior Tribunal de Justiça

legislativo, que trata 'Da Disciplina', verifica-se que a Lei de Execução Penal estabelece em ordem cronológica: 1) a atribuição para o exercício do poder disciplinar (arts. 44 a 48); 2) a classificação das faltas disciplinares, bem como a "tipificação" das condutas correspondentes à falta de natureza grave (arts. 49 a 52); 3) as sanções respectivas (arts. 53 a 58); e 4) o procedimento que deverá ser adotado para apuração da falta disciplinar (arts. 59 a 60).

Nas disposições gerais da referida seção (Subseção I), os arts. 47 e 48 estabelecem que o poder disciplinar, na execução da pena privativa de liberdade, bem como na restritiva de direitos, será exercido pela autoridade administrativa a que estiver sujeito o condenado.

Assim, no âmbito da execução penal, a atribuição de apurar a conduta faltosa do detento, assim como realizar a subsunção do fato à norma legal, ou seja, verificar se a conduta corresponde à uma falta leve, média ou grave, é do diretor do presídio, em razão de ser o detentor do poder disciplinar, conforme disposto nos aludidos dispositivos legais.

Logo, a aplicação de eventual sanção disciplinar também será da atribuição do diretor do estabelecimento prisional , o qual deverá observar a regra do art. 57, caput, da LEP, corolário do princípio constitucional da individualização da pena, que dispõe: 'Na aplicação das sanções disciplinares, levar-se-ão em conta a natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão'.

(...)

Corroborando esse entendimento, o art. 54 da LEP é claro ao estabelecer que as sanções dos incisos I a IV do art 53 , quais sejam, advertência verbal, repreensão, suspensão ou restrição de direitos e isolamento na própria cela, ou em local adequado, serão aplicadas por ato motivado do diretor do estabelecimento.

Saliente-se que, embora a decisão acerca da inclusão em regime disciplinar diferenciado - RDD seja jurisdicional ( LEP, art. 53, inciso V), inserindo-se na competência do juiz da execução, o parágrafo único do art. 54 estabelece que a autorização de inclusão do preso nesse regime dependerá de requerimento circunstanciado elaborado pelo diretor do estabelecimento ou outra autoridade administrativa.

O parágrafo único do art. 57, por sua vez, dispõe que 'nas faltas graves, aplicam-se as sanções previstas nos incisos III a V do art. 53 desta Lei", sendo que os incisos III (suspensão ou restrição de direitos) e IV (isolamento na própria cela), como visto, são de atribuição exclusiva do diretor do presídio.

Não se olvida que, em razão do cometimento de falta de natureza

Superior Tribunal de Justiça

grave, determinadas consequências e sanções disciplinares são de competência do juiz da execução penal, quais sejam, a regressão de regime (art. 118, I), a revogação de saída temporária (art. 125), a perda dos dias remidos (art. 127) e a conversão de pena restritiva de direitos em privativa de liberdade (art. 181, § 1º, d, e § 2º).

Todavia, a regra geral estabelecida na Lei de Execução Penal é que a sanção disciplinar seja aplicada pelo diretor do estabelecimento prisional , ficando a cargo do juiz da execução apenas algumas medidas, conforme se depreende do parágrafo único do art. 48:

Parágrafo único. Nas faltas graves, a autoridade representará ao Juiz da execução para os fins dos artigos 118, inciso I, 125, 127, 181, §§ 1º, letra d, e 2º desta Lei." (Grifou-se.)

Dessarte, a apuração da prática de falta grave e a aplicação da sanção disciplinar respectiva, inclusive o isolamento celular, são providências da competência do diretor do estabelecimento prisional a que está submetido o apenado, sendo que, como se observa no voto condutor do REsp XXXXX/RS, após o reconhecimento da ocorrência de infração disciplinar grave pela autoridade penitenciária, competirá ao juízo das execuções penais tomar as medidas pertinentes, aplicando os consectários legais referentes à falta grave, como a regressão de regime e a perda dos dias remidos.

Lado outro, não merece prosperar a tese de nulidade por ofensa aos princípios da ampla defesa e contraditório.

Com efeito, na hipótese, como bem asseverado pelo Ministério Público Federal no parecer de e-STJ fls. 197/201, "o Diretor do Presídio em Porto velho, devidamente legitimado, instaurou o procedimento administrativo disciplinar para apuração da falta grave praticada por Cristian Thomas Vieira e fixou a sanção de isolamento por cinco dias, garantindo a oitiva do reeducando - que recusou-se a participar da audiência de instrução -, embora assistido por Defensor Público que apresentou contestação (e-fls. 37 e 43-45)" (e-STJ fl. 199).

Ademais, tampouco merece guarida a tese de eventual ofensa à ampla defesa por "ausência de disponibilização das imagens gravadas requerido pela defesa" (e-STJ fl. 170), já que, da análise dos autos, tal prova nem mesmo poderia ser produzida, uma vez que, conforme consta, não fora possível a recuperação das

Superior Tribunal de Justiça

imagens pleiteadas (e-STJ fl. 40).

De qualquer forma, como cediço, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, perfilhada por esta Corte, "o princípio do pas de nullité sans grief exige, em regra, a demonstração de prejuízo concreto à parte que suscita o vício , independentemente da sanção prevista para o ato, podendo ser ela tanto a de nulidade absoluta quanto a relativa, pois não se decreta nulidade processual por mera presunção" (RHC n. 123.890 AgR/SP, Rel. Ministra CÁRMEN LÚCIA, SEGUNDA TURMA, julgado em 5/5/2015, DJe 15/5/2015), providência, entretanto, da qual não se desincumbiu o recorrente.

Por fim, deve-se asseverar que a discussão sobre a configuração da infração disciplinar ou até mesmo a sua desclassificação para falta de natureza média ou leve demandaria o reexame de matéria fático-probatória, inadmissível na via estreita do habeas corpus, como se extrai dos seguintes julgados:

HABEAS CORPUS . SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESVIRTUAMENTO. EXECUÇÃO PENAL. FALTA GRAVE. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

1. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Corte Suprema, também passou a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus , não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso ou ação cabível, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade do (a) paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus.

2. A via eleita não comporta dilação probatória necessária para desconstituir decisão judicial que reconheceu o cometimento de falta grave apurada em procedimento administrativo disciplinar .

3. A configuração de falta disciplinar de natureza grave resulta em novo marco interruptivo para concessão de novos benefícios, exceto indulto, comutação e livramento condicional, conforme entendimento sedimentado pela 3a Seção desta Corte, ao julgar os Embargos de Divergência no Recurso Especial n.º 1.176.486/SP.

4. Habeas Corpus não conhecido. Concessão da ordem, de ofício, apenas para afastar a interrupção da contagem do lapso temporal para o livramento condicional, o indulto e a comutação de pena, salvo disposição expressa em contrário no decreto presidencial (HC XXXXX/MG, relator o Ministro Rogerio Schietti Cruz, DJe de

Superior Tribunal de Justiça

10/3/2014, grifei).

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO-CABIMENTO. RESSALVA DO ENTENDIMENTO PESSOAL DA RELATORA. EXECUÇÃO PENAL. FALTA GRAVE. TESE DE NÃO-CONFIGURAÇÃO DA FALTA GRAVE. REVISÃO. VIA IMPRÓPRIA. ORDEM DE HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDA.

1. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal e ambas as Turmas desta Corte, após evolução jurisprudencial, passaram a não mais admitir a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário, nas hipóteses em que esse último é cabível, em razão da competência do Pretório Excelso e deste Superior Tribunal tratar-se de matéria de direito estrito, prevista taxativamente na Constituição da Republica.

2. Esse entendimento tem sido adotado pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, com a ressalva da posição pessoal desta Relatora, também nos casos de utilização do habeas corpus em substituição ao recurso especial, sem prejuízo de, eventualmente, se for o caso, deferir-se a ordem de ofício, em caso de flagrante ilegalidade.

3. Na espécie, verifica-se que a aplicação da falta grave deu-se mediante regular apuração na esfera administrativa, sendo reconhecida a sua prática fundamentadamente, conforme entendeu a Corte de origem.

4. A análise da tese de não-configuração da falta grave, ou de desclassificação para falta de natureza média, não se coaduna com a via estreita do habeas corpus , dada a necessidade, no caso, de incursão na seara fático-probatória, incabível nesta sede . Precedentes.

5. Ordem de habeas corpus não conhecida (HC XXXXX/SP, relatora a Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe de 07/03/2014, grifei).

Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 21 de agosto de 2018.

Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO

Relator

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/1919519641/inteiro-teor-1919519649