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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Contas da União
há 2 anos

Detalhes

Processo

Partes

Julgamento

Relator

AROLDO CEDRAZ

Documentos anexos

Inteiro TeorTCU__31762021_59b0e.pdf
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Inteiro Teor

Inicio este Relatório transcrevendo, com alguns ajustes de forma e fundamentado no inciso Ido § 3º do art. 1º da Lei 8.443, de 16/7/1992, parte do parecer técnico elaborado no âmbito da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura de Energia Elétrica (SeinfraElétrica) e autuado como peça 234:

"INTRODUÇÃO

1. Trata-se de processo de desestatização, com o objetivo de acompanhar a privatização da Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras) , seus impactos setoriais, para o consumidor e para a União.

2. A presente instrução, em atenção a despacho do Ministro-Relator Aroldo Cedraz de 1º/7/2021 (peça 97) , contempla análise das ações coordenadas pelo Ministério de Minas Energia (MME) para a definição das premissas utilizadas nos estudos e na modelagem econômico-financeira desenvolvidas para a definição do valor adicionado dos novos contratos de concessão de energia elétrica das usinas hidrelétricas, definidas no art. 2º da Lei 14.182/2021, a serem celebrados entre a União e a Eletrobras.

3. Assim, o escopo dessa fase do trabalho de acompanhamento do processo de desestatização da Eletrobras é a análise da precificação do valor adicionado desses contratos, que serviu de base para a definição dos pagamentos que a empresa fará a título de bônus de outorga e para depósito na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) .

4. As questões referentes à reestruturação societária, ao modelo de exercício de controle, prescritos pela Lei 14.182/2021, e à definição do preço mínimo das ações da Eletrobras, exigido pela Lei 9.471/1997, serão objeto de análise em instrução específica posterior.

HISTÓRICO

5. A discussão sobre a privatização da Eletrobras ocorre formalmente desde o ano de 2017, com a edição da Medida Provisória (MPV) 814/2017, que incluiu a empresa no Programa Nacional de Desestatizacao ( PND)- estabelecido nos termos da Lei 9.491/1997 -, mas perdeu a vigência por decurso de prazo.

6. Posteriormente, a discussão foi retomada por meio do Projeto de Lei 9.463/2018, o qual foi substituído pelo PL 5.877/2019, com o mesmo objetivo de desestatizar a Eletrobras. Ambos, porém, também não tiveram encaminhamento no Congresso Nacional.

7. As peças 1 a 59 do presente processo tratam de trâmites processuais relativos a tais iniciativas frustradas de privatização, que estão resumidas na instrução contida à peça 92 destes autos.

8. Ressalta-se que, tendo em vista as tentativas frustradas e a relevância da matéria relacionada à privatização da Eletrobras, realizou-se, então, fiscalização na modalidade levantamento, para diagnosticar a situação econômico-financeira da empresa e identificar riscos associados ao desempenho de suas operações, considerando o cenário de não-privatização da estatal (TC Processo XXXXX/2018-3, que resultou no Acórdão 2.691/2019, também da relatoria do Ministro Aroldo Cedraz) .

9. Isso posto, por iniciativa do Ministro-Relator (peça 60) , inicia-se, neste momento processual, nova análise no contexto da publicação da MPV 1.031/2021, de 23/2/2021, que reinaugurou o processo de desestatização da companhia, por meio do estabelecimento, entre outras providências, da forma e das condições para a privatização.

10. A partir de 19/5/2021, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) - designado, por meio do art. , § 3º, da MPV 1.031/2021, como responsável pela execução e acompanhamento do processo de desestatização da Eletrobras - passou a dar notícias das ações adotadas no âmbito das contratações dos serviços técnicos especializados previstos no art. 30 do Decreto 2.594/1998, que regulamenta a Lei 9.491/1997 (peças 64 a 90; peças 110 a 120; e peças 123 a 132) .

11. No dia 2/6/2021, o Ministério de Minas e Energia (MME) encaminhou, por intermédio do Ofício 85/2021/SE-MME (peça 63) , o extrato de planejamento da desestatização da Eletrobras, em conformidade ao art. 2º, § 2º, da Instrução Normativa TCU 81/2018, que dispõe sobre a fiscalização dos processos de desestatização.

12. Tendo em vista a relevância da matéria tratada na referida medida provisória, elaborou-se, em 16/6/2021, a instrução, à peça 92, contendo mapeamento dos principais tópicos a respeito da privatização da Eletrobras e a proposição da ação de controle sobre o tema propriamente dita. Na ocasião, elencaram-se os pontos de controle a serem adotados no âmbito deste processo de acompanhamento, por serem considerados de alta prioridade, bem como os pontos de controle a serem adotados em processos específicos da SeinfraElétrica, se for o caso, dado que não são questões que devem ser necessariamente avaliadas antes da privatização.

13. Em despacho de 1º/7/2021 (peça 97) , o Ministro-Relator ratificou as proposições desta Unidade Técnica registradas na instrução contida à peça 92, inclusive no tocante à estratégia de análise do processo de capitalização, a qual será realizada em, pelo menos, dois momentos distintos:

a) no primeiro momento, para a avaliação do cálculo do valor adicionado com os novos contratos de geração de energia elétrica a que alude a MPV 1.031/2021, em seu art. , inciso II, e a consequente definição do valor do bônus de outorga; e

b) no segundo, para a apreciação das demais premissas e procedimentos necessários para a conclusão da capitalização da Eletrobras, em especial no que tange à avaliação da empresa.

14. Outrossim, o Ministro-Relator autorizou a SeinfraElétrica a promover, caso entendesse necessário, a alteração dos pontos de controle por ele ratificados, à luz das modificações promovidas pelo Congresso Nacional no texto original da MPV 1.031/2021 que culminou com a promulgação da Lei 14.182, em 12/7/2021.

15. Essa lei estabeleceu, em termos gerais, uma série de medidas basilares, gerais e condicionantes dispostas no texto original da MPV para o prosseguimento da desestatização da companhia, acrescido de emendas que, em seus pontos principais, tratam da oferta da expansão da matriz elétrica mediante a instalação de térmicas a gás natural em montantes e localidades pré-estabelecidos, bem como de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) , e a prorrogação de contratos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) , com prováveis impactos na tarifa de energia elétrica.

16. Na sequência, a SeinfraElétrica designou a equipe de fiscalização responsável pelo acompanhamento do processo de desestatização da Eletrobras por meio da Portaria de Fiscalização 465/2021 (peça 135) , bem como o respectivo cronograma de trabalho voltado à análise do cálculo do valor adicionado dos novos contratos de geração de energia elétrica das usinas da Eletrobras resultantes do processo de desestatização e as suas questões relacionadas.

17. Conforme estabelecido no art. 4º, incisos I e II, c/c o art. 5º da Lei 14.182/2021, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) publicou, em 31/8/2021, a Resolução CNPE 15/2021 (peça 166) , fixando, entre outras disposições, os montantes relativos: (i) ao valor adicionado pelos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica da Eletrobras; (ii) ao valor a ser pago pela Eletrobras à União como bonificação pela outorga desses contratos; e (iii) ao valor a ser pago pela Eletrobras à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) .

18. Sendo assim, em atendimento à IN-TCU 81/2018, o MME encaminhou, em 1º/9/2021, o Ofício 358/2021/SE-MME, com as informações iniciais que subsidiaram a publicação da referida resolução (peças 140 a 147) .

19. Tendo em vista a incompletude das informações encaminhadas, em 3/9/2021, a equipe de fiscalização encaminhou o Ofício 104/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 151) , solicitando 'especificação do atendimento (ou justificativa para sua ausência) , por meio da documentação já encaminhada ao TCU em anexo ao Ofício 358/2021/SE-MME, para cada um dos itens previstos nos artigos 3º e 4º da IN-TCU 81/2018'.

20. Em resposta, o MME encaminhou o Ofício 406/2021/SE-MME e anexos (peça 178 a 186) .

21. O referido expediente foi complementado pelo Ofício 421/2021/SE-MME (peça 188) , em que o MME correlaciona as mesmas peças encaminhadas no bojo do Ofício 406/2021/SE-MME (peças 179 a 186 e peças 189 a 196) a apenas alguns incisos dos arts. 3º e 4º da IN-TCU 81/2018, sem, contudo, dar notícia quanto à documentação que deveria ser encaminhada com vistas a dar atendimento aos demais dispositivos não mencionados ou as justificativas para o não atendimento.

22. Não obstante a documentação encaminhada pela via oficial, tendo em vista a importância da análise e a necessidade da obtenção de informações tempestivas de forma a permitir um acompanhamento célere e completo a respeito do tema, foram realizadas reuniões semanais com representantes do MME e foi concedido acesso integral, por meio do Sistema Eletrônico de Informações (SEI) , aos processos correlatos na pasta ministerial (SEI 48300.000099/2021-10, 48300.000243/2021-22, 48300.000563/2021-82 e 48300.000862/2021-17) , permitindo à equipe de fiscalização iniciar as suas análises antes mesmo do recebimento formal da documentação devida.

Disposições basilares da Lei 14.182/2021 (conversão da MPV 1.031/2021), acerca do processo de capitalização

23. O art. , caput, da Lei 14.182/2021 estabeleceu que a desestatização ocorrerá sob égide da Lei 9.491/1997 e que a sua concretização depende da outorga de novas concessões de geração de energia elétrica para os Contratos de Concessão 4/2004-Aneel-Furnas e 7/2004-Aneel-Eletronorte, relativos às Usinas Hidrelétricas (UHEs) Mascarenhas de Moraes e Tucuruí, respectivamente.

24. Também foi definido que a desestatização será executada na modalidade de aumento do capital social, por meio de subscrição de ações ordinárias, com a renúncia do direito de subscrição pela União, sendo que esta poderá realizar oferta pública secundária de suas ações detidas direta ou indiretamente (art. 1º, §§ 1º e 2º) .

25. Adicionalmente, o art. 2º da Lei estabelece que, para a desestatização, fica a União autorizada a outorgar novas concessões de geração de energia elétrica para, além das usinas especificadas no art. , as usinas da Eletrobras que tenham sido prorrogadas sob o regime de cotas previsto na Lei 12.783/2013 e as UHEs Sobradinho e Itumbiara, prorrogadas respectivamente sob os regimes previstos nas Leis 11.943/2009 e 13.182/2015.

26. O art. 4º da Lei 14.182/2021, por sua vez, dispõe sobre a forma de cálculo e as destinações do valor adicionado às concessões:

Lei 14.182/2021:

Art. 4º São condições para as novas outorgas de concessão de geração de energia elétrica de que trata o art. 2º desta Lei:

I - o pagamento pela Eletrobras ou por suas subsidiárias, na forma definida pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) , à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) , de que trata a Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002, correspondente a 50% (cinquenta por cento) do valor adicionado à concessão pelos novos contratos;

II - o pagamento pela Eletrobras ou por suas subsidiárias de bonificação pela outorga de novos contratos de concessão de geração de energia elétrica correspondente a 50% (cinquenta por cento) do valor adicionado à concessão pelos novos contratos abatidos das seguintes parcelas:

a) despesas relacionadas à revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, nos termos da alínea a do inciso V do caput do art. 3º desta Lei;

b) despesas relacionadas ao desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal com vistas a reduzir estruturalmente os custos de geração de energia e para a navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins, de acordo com o disposto na alínea b do inciso V do caput do art. 3º desta Lei;

c) despesas relacionadas aos projetos na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas, cujos contratos de concessão sejam afetados por esta Lei, nos termos da alínea c do inciso V do caput do art. 3º desta Lei; e

d) despesas para ressarcir o valor econômico do fornecimento de energia elétrica para o Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) , conforme tratado no § 6º do art. 6º desta Lei;

27. Ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) , em linha com o disposto na Lei 9.491/1997 e no Decreto 2.594/1998, foi atribuída a responsabilidade pela execução e o acompanhamento de todo o processo de desestatização. O BNDES ficou, ainda, autorizado a contratar serviços técnicos especializados necessários ao processo de desestatização da Eletrobras (art. 1º, §§ 3º e 4º) .

28. A Lei 14.182/2021 também autorizou o Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República (CPPI) a estabelecer condições para aprovação pela assembleia geral da Eletrobras adicionais àquelas contidas no seu art. (art. 1º, § 5º) .

29. Por fim, o referido diploma legal estabeleceu condições específicas para a privatização da Eletrobras, tratadas nos seus artigos 3º a 8º, com autorizações operacionais para a consecução das condições específicas nos seus artigos 9º a 11.

30. Algumas dessas condições, conforme proposto pela Unidade Técnica (peça 92) e ratificado pelo Ministro-Relator (peça 97) , por serem prementes e necessárias, deverão ser objeto de controle imediato pelo Tribunal enquanto outras deverão ser acompanhadas em momento subsequente, porque demandam desdobramentos regulamentares e operacionais que somente se concretizarão em exercícios futuros.

Organização do exame técnico

31. Conforme despacho do Ministro-Relator, a presente instrução trata da avaliação do cálculo do valor adicionado com os novos contratos de geração de energia elétrica a que alude a Lei 14.182/2021, em seu art. , inciso II, e a consequente definição do valor do bônus de outorga.

32. Nesse contexto, apresentam-se a seguir os seguintes tópicos, no âmbito do exame técnico:

I - Análise formal da documentação encaminhada para dar cumprimento aos arts. 3º e 4º da IN-TCU 81/2018;

II - Escopo da análise de mérito acerca do objeto examinado;

III - Características gerais das usinas com novas concessões autorizadas pela Lei 14.182/2021;

IV - Características das novas concessões a serem outorgadas;

V - Valor de outorga das novas concessões;

VI - Necessidade de ajustes na modelagem econômico-financeira adotada para o cálculo do valor de outorga;

VII - Impactos tarifários resultantes da nova outorga;

VIII - Utilização de recursos resultantes da nova outorga em políticas públicas, na forma de contrapartidas contratuais, sem trânsito no Orçamento Geral da União.

EXAME TÉCNICO

I. Análise formal da documentação encaminhada

33. O processo de desestatização da Eletrobras - inicialmente apresentado à SeinfraElétrica em reunião realizada no dia 26/4/2021, com representantes do MME, Ministério da Economia (ME) , BNDES e Eletrobras (peça 92, anexo A) - compreende, além dos procedimentos normalmente previstos em processos de concessões de serviços públicos, as etapas necessárias para a conclusão da privatização de uma empresa estatal.

34. Nesse contexto, no que tange à documentação exigida pela IN-TCU 81/2018, o Poder Concedente apresentou inicialmente o Ofício 358/2021/SE-MME (peça 140) , contendo as informações constantes das peças 141 a 147.

35. Tendo em vista lacuna nas informações encaminhadas, a equipe de fiscalização enviou o Ofício 104/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 151) , solicitando 'especificação do atendimento (ou justificativa para sua ausência) , por meio da documentação já encaminhada ao TCU em anexo ao Ofício 358/2021/SE-MME, para cada um dos itens previstos nos artigos 3º e 4º da IN-TCU 81/2018'.

36. Em complementação, o MME encaminhou o Ofício 406/2021/SE-MME (peça 178) , juntamente aos seus anexos (peças 179 a 186) , também complementado pelo Ofício 421/2021/SE-MME (peça 188) e seus anexos (peças 189 a 196) .

37. Inicialmente, verifica-se que, apesar de a equipe de fiscalização ter provocado o MME duas vezes a apresentar a documentação exigida nos arts. 3º e 4º da IN-TCU 81/2018 (a primeira mediante o Ofício 104/2021-TCU/SeinfraElétrica e a segunda por meio de comunicação oral durante reuniões de nivelamento sobre andamento do processo), o Ofício 421/2021/SE-MME não fez menção à integralidade da documentação, como é o caso, por exemplo, daquelas relacionadas no art. 3º, incisos I a XIII.

38. Desse modo, tendo em vista a precariedade da documentação apresentada para permitir uma análise conclusiva sobre a desestatização em todos os seus aspectos, cabe registrar que não corre o prazo normativo previsto no art. 9º da IN 81/2018, por força do § 1º do mesmo artigo.

39. Não obstante, considerando as etapas envolvidas na aludida desestatização, foram estabelecidas pelo Ministro-Relator (peça 92) ao menos duas análises em momentos distintos, como mencionado no parágrafo 13 desta instrução. A análise empreendida neste momento refere-se à avaliação do cálculo do valor adicionado com os novos contratos de geração de energia elétrica a que alude a Lei 14.182/2021.

40. Nesse sentido, é cabível o entendimento quanto à necessidade de atendimento apenas do art. 3º da IN 81/2018 nesta primeira análise, o qual trata das informações gerais exigidas para o acompanhamento dos processos de desestatização.

41. A análise formal sob o prisma da privatização da Eletrobras ocorrerá oportunamente, tão logo recebida a integralidade da documentação exigida para a espécie de desestatização em questão, estabelecida no art. 4º da IN-TCU 81/2018, quando, a partir de então, inicia-se o prazo previsto no art. 9º do mesmo normativo.

42. No que se refere à documentação exigida no art. 3º, embora não tenham sido mencionadas no âmbito do Ofício 421/2021/SE-MME, foram encaminhadas incialmente pelo MME, por meio do Ofício 358/2021/SE-MME, outras informações em atendimento ao comando normativo. Ao final da análise formal, verifica-se a seguinte situação a respeito das informações apresentadas:

Tabela 1 - Documentação encaminhada pelo MME em atendimento à IN 81/2018

Dispositivo

Informação exigida

Documento encaminhado

Justificativa em caso de não cumprimento

Art. 3º, caput

Estudos de viabilidade e as minutas do instrumento convocatório

Ofício AED 88/2021 (peças 181 e 191)

O BNDES afirma que a exigência de instrumento convocatório não se aplica ao caso concreto, em que a desestatização da Eletrobras se dará através do não exercício do direito de preferência pela União do aumento de capital que será realizado pela Companhia. No entanto, informa que a minuta do Prospecto da Oferta ainda será encaminhada ao TCU tão logo esteja disponível.

Minuta contratual e caderno de encargos, já consolidados com os resultados decorrentes de eventuais consultas e audiências públicas realizadas

Ofício 255/2021-DR/ANEEL (peças 182 e 192)

A Aneel informa que a minuta do contrato de concessão encontra-se em fase de contribuições por meio da Consulta Pública 48/2021 e ainda seguirá para aprovação da Diretoria.

Art. 3º, inciso I

Deliberação competente para abertura de procedimento licitatório

Embora não haja menção explícita do MME quanto ao atendimento deste dispositivo, a justificativa do BNDES acima é válida, cabendo citar a própria autorização legislativa conferida pela Lei 14.182/2021.

Art. 3º, inciso II

Objeto, área de exploração e prazo do contrato ou do ato administrativo

Embora não haja menção explícita do MME quanto ao atendimento deste dispositivo, tais informações constam da minuta contratual encaminhada (peça 146) .

Art. 3º, inciso III

Documentos e planilhas eletrônicas desenvolvidos para avaliação econômico-financeira do empreendimento, inclusive em meio magnético, com fórmulas discriminadas, sem a exigência de senhas de acesso ou qualquer forma de bloqueio aos cálculos, e, quando for o caso, descrição do inter-relacionamento das planilhas apresentadas

Embora não haja menção explícita do MME quanto ao atendimento deste dispositivo, tais informações constam da Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144) e da peça 143.

Art. 3º, inciso IV

Relação de estudos, investigações, levantamentos, projetos, obras e despesas ou investimentos já efetuados, vinculados ao objeto a ser licitado, quando houver, com a discriminação dos custos correspondentes

Embora não haja menção explícita do MME quanto ao atendimento deste dispositivo, tais informações constam apenas para a UHE Tucuruí, no bojo do Relatório EPE-DEE-RE-080/2021-R0 (peça 142) .

Art. 3º, incisos V a XIII

Várias

O MME não fez menção a nenhum documento e não justificou a ausência.

Art. 3º, inciso XIV

Definição da metodologia a ser utilizada para a aferição do equilíbrio econômico-financeiro no primeiro ciclo de revisão do contrato de concessão ou permissão e sua forma de atualização, bem como justificativa para a sua adoção

Ofício 255/2021-DR/ANEEL (peças 182 e 192)

A Aneel informa que a minuta do contrato de concessão encontra-se em fase de contribuições por meio da Consulta Pública 48/2021 e ainda seguirá para aprovação da Diretoria. A minuta contratual encaminhada (peça 146) não contém as informações exigidas neste dispositivo.

Art. 3º, incisos XV a XIX

Várias

O MME não fez menção a nenhum documento e não justificou a ausência.

Art. 3º, inciso XX

Relatório com manifestação do órgão gestor acerca das questões suscitadas durante a audiência pública sobre os estudos de viabilidade, caso ocorra, e sobre a minuta do instrumento convocatório e anexos

Ofício AED 88/2021 (peças 181 e 191) e Ofício 255/2021-DR/ANEEL (peças 182 e 192)

Os documentos não fazem menção aos estudos de viabilidade, mas no tocante à minuta do instrumento convocatório repete-se a justificativa aduzida pela Aneel quanto ao não cumprimento.

Art. 3º, inciso XXI

Estudo contendo descrição exaustiva de todos os elementos que compõem a matriz de repartição de riscos do empreendimento, fundamentando a alocação de cada risco mapeado para cada uma das partes envolvidas no contrato a ser firmado

O MME não fez menção a nenhum documento e não justificou a ausência.

Fonte: Elaboração própria.

43. Verifica-se, a partir da análise exposta na Tabela 1 acima, que subsistem lacunas em relação a uma série de informações, tais como a metodologia para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro da concessão ou aquelas relacionadas à licença ambiental dos empreendimentos e as suas respectivas condicionantes.

44. Em face das falhas formais identificadas, propõe-se dar ciência ao MME quanto à ausência de informações exigidas normativamente no âmbito do processo de privatização da Eletrobras, cuja análise formal requer a classificação, por parte dos órgãos gestores, das informações encaminhadas em cumprimento às disposições da IN-TCU 81/2018 pelo tipo de informação exigida nos arts. 3º, 4º e 5º, conforme o caso, com a justificativa quanto ao não atendimento de algum dos dispositivos mencionados.

45. Contudo, visando a um formalismo moderado e considerando o escopo do presente trabalho, a documentação encaminhada atende, de uma forma geral, às exigências específicas para a análise da matéria, não havendo prejuízo ao prosseguimento do feito.

II. Escopo da análise de mérito sobre o objeto examinado

46. A definição do escopo de análise desta Unidade Técnica sobre o cálculo do valor adicionado com os novos contratos de geração de energia elétrica a que alude a Lei 14.182/2021 (VAC) partiu do mapeamento elaborado na instrução anterior (peça 92) , ratificado pelo Ministro-Relator (peça 97) , em que foram consideradas de alta prioridade, para fins do presente acompanhamento, as premissas adotadas pelo CNPE para fundamentar o referido cálculo, incluindo os seguintes aspectos do objeto fiscalizado:

a) o recálculo das garantias físicas no contexto da capitalização;

b) a fundamentação para a fixação dos valores a serem pagos à CDE;

c) a consistência jurídica e operacionalização da solução proposta em relação às despesas previstas no art. , inciso II, da Lei 14.182/2021; e

d) os impactos tarifários da descotização, que é a condição estabelecida pelo art. , inciso III, da Lei 14.182/2021, com o objetivo de alterar o regime de exploração das usinas compreendidas nos incisos I a III do art. da Lei 14.182/2021.

47. Necessário salientar, em relação ao subitem 'a', que a análise buscou tão somente identificar as premissas adotadas pelo Poder Concedente com o objetivo de tornar as garantias físicas do parque hidrelétrico brasileiro mais realistas, apontando eventuais riscos em caso de necessidade. Ou seja, não fez parte do escopo desta instrução a análise dos cálculos efetivamente realizados, bem como de normas e regulamentos do setor elétrico que não tenham sido elaborados diretamente para a privatização da Eletrobras, como a Portaria MME 101/2016, que institui a metodologia de cálculo de garantias físicas, norma balizadora do referido recálculo.

48. Com relação ao subitem 'd', a despeito da autorização registrada em despacho do Ministro-Relator para incluir nos pontos de controle deste processo as alterações promovidas no texto original da MPV 1.031/2021 (peça 97) , a análise não compreendeu os impactos tarifários gerados por outras previsões legais estabelecidas na Lei 14.182/2021, tais como as estabelecidas no art. , § 1º, do referido diploma legal (contratação de térmicas a gás natural, de PCHs e a prorrogação de contratos do Proinfa) . Isso porque a descotização era a única disposição constante do texto original da MPV 1.031/2021 e cujos impactos são resultantes diretamente das novas outorgas a serem concedidas. Vale dizer, sem prejuízo de que sejam objeto de análise em outros processos desta Secretaria, as demais previsões legais apontadas foram instituídas mediante emendas parlamentares e são comandos legais paralelos ao da desestatização da Eletrobras, que não possuem relação com as novas outorgas.

49. Por fim, também não faz parte do escopo desta instrução a apreciação das demais premissas e procedimentos necessários para a conclusão da capitalização da Eletrobras, em especial no que tange à avaliação da empresa, que serão avaliados ainda neste processo, mas em um segundo momento, seguindo o despacho do Ministro-Relator de 1º/7/2021 (peça 97) .

50. Na seguinte fase do processo, serão avaliados o modelo de privatização da Eletrobras, via aumento de capital, e a restruturação societária da empresa, por meio de alterações do seu estatuto social, com vistas a induzir o seu controle pulverizado.

51. Especificamente, serão analisados e demonstrados os riscos de diluição de valor das ações remanescentes do capital social da empresa de propriedade da União caso as ações ofertadas ao público tenham referência de preço inequivocamente inferior ao seu valor justo, intrínseco, aferido por meio de rigorosa avaliação econômico-financeira, conforme prevê a Lei 9.471/1997.

52. O processo de indução do controle pulverizado da companhia, por meio de alteração do seu estatuto social, também será analisado sob a ótica dos benefícios e dos riscos que imporá e o processo de governança que será necessário ser implantado para mitigar esses riscos e colher os benefícios do modelo de controle preconizado pela Lei 14.182/2021.

53. O processo de decisão e motivação da quantidade de ações a serem lançadas por meio da oferta pública para aumento de capital da empresa também será analisado e avaliado quanto a sua consistência e adequação para promover a transferência do controle acionário da empresa para a iniciativa privada e prover estabilidade à gestão da companhia.

54. É importante ressaltar que, como o valor adicionado dos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica das usinas hidrelétricas, especificadas pelo art. 2º da Lei 14.182/2021, serão inteiramente pagos pela Eletrobras sob a forma de depósitos na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e de bônus de outorga, serão os demais ativos da companhia que praticamente responderão pelo valor das ações a ser definido pela avaliação econômico-financeira derivada dos serviços de consultoria contratados pelo BNDES.

55. As premissas da modelagem econômico-financeira serão testadas quanto à consistência das projeções de tarifas, de energia gerada e de crescimento do mercado e de investimentos da empresa para manter ou aumentar sua participação tanto no mercado de geração quanto de transmissão de energia, à definição da taxa de retorno requerida e ao tratamento das participações remanescentes da empresa em Sociedades de Propósito Específico, inclusive quanto à metodologia de avaliação econômico-financeira dessas participações, entre outros temas.

56. Ademais, os testes e avaliações sobre as premissas de modelagem econômico-financeira incluirão os ajustes, resultantes dos trabalhos de due diligence a serem apresentados pelos consultores, que serão implementados no balanço patrimonial de partida das projeções de demonstrações financeiras da Eletrobras como, por exemplo, o tratamento das contingências cíveis, principalmente as referentes ao Empréstimo Compulsório devido a sua alta materialidade, além das trabalhistas e das tributárias.

57. Por fim, conforme proposto na instrução submetida ao relator (peça 92) para definição do escopo dos trabalhos de acompanhamento da desestatização da Eletrobras, importa informar que o Decreto 10.791, de 10 de setembro de 2021, criou a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional S.A. (ENBpar) .

58. A ENBpar terá por finalidade manter sob o controle da União a operação de usinas nucleares, a titularidade do capital social e a aquisição dos serviços de eletricidade de Itaipu Binacional, gerir contratos de financiamento que utilizem recursos da Reserva Global de Reversão (RGR) , administrar os bens da União sob a administração da Eletrobras, administrar a conta-corrente do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel) e gerir os contratos de comercialização da energia gerada pelos empreendimentos contratados no âmbito do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) .

59. Assim, a nova empresa ficará encarregada da continuidade e do desenvolvimento das atividades de caráter público hoje empreendidas pela Eletrobras, que serão tratadas em ações de controle externo a serem realizadas após a assunção dessas atividades pela ENBpar, prevista para ocorrer em até doze meses após a capitalização da Eletrobras.

III. Características gerais das usinas com novas concessões autorizadas pela Lei 14.182/2021

60. Entre as premissas para a capitalização da Eletrobras, constava do texto original da MPV 1.031/2021 a celebração de novos contratos de concessão das usinas hidrelétricas da Companhia alcançadas pelo regime de cotas criado pela Lei 12.783/2013, alterando o regime dessas usinas para o regime de Produção Independente de Energia (PIE) , bem como a prorrogação da concessão da hidrelétrica de Tucuruí, atualmente sob o regime de serviço público, modalidade em que, assim como ocorre com o regime de cotas, a outorga se vincula à entrega da energia elétrica gerada pelas usinas às distribuidoras de energia elétrica.

61. Com a aprovação do texto final da lei de conversão (Lei 14.182/2021), deixou-se expresso que o novo contrato para substituir o Contrato de Concessão 7/2004-Aneel-Eletronorte também incluirá a UHE Curuá-Una, bem como adicionou-se a autorização para a celebração de novo contrato da concessão da UHE Mascarenhas de Moraes, de titularidade de Furnas.

62. A relação das 22 usinas hidrelétricas da Eletrobras compreendidas no art. 2º da Lei 14.182/2021, com novos contratos de concessão autorizados, é apresentada na Tabela 2.

Tabela 2 - Informações básicas relativas às usinas compreendidas no art. 2º da Lei 14.182/2021

Usina

Subsidiária

Regime de exploração

Termo final da concessão vigente

Potência instalada (MW)

Boa Esperança

Chesf

Serviço público (cotas)

31/12/2042

237,3

Apolônio Sales (Moxotó)

31/12/2042

4.279,6

Paulo Afonso I

31/12/2042

Paulo Afonso II

31/12/2042

Paulo Afonso III

31/12/2042

Paulo Afonso IV

31/12/2042

Luiz Gonzaga (Itaparica)

31/12/2042

1.479,6

Xingó

31/12/2042

3.162,0

Funil

31/12/2042

30,0

Pedra

31/12/2042

20,0

Sobradinho

Serviço público (regime especial)

09/02/2052

1.050,3

Coaracy Nunes

Eletronorte

Serviço público (cotas)

31/12/2042

78,0

Tucuruí

Serviço público

30/08/2024

8.535,0

Curuá-Una

08/05/2038

42,8

Corumbá I

Furnas

Serviço público (cotas)

31/12/2042

375,0

Estreito (Luís Carlos B. de Carvalho)

31/12/2042

1.050,0

Funil - RJ

31/12/2042

216,0

Furnas

31/12/2042

1.216,0

Marimbondo

31/12/2042

1.440,0

Porto Colômbia

31/12/2042

320,0

Itumbiara

Serviço público (regime especial)

26/02/2020

2.082,0

Mascarenhas de Moraes (Peixoto)

Serviço público

29/01/2024

476,0

Total

26.089,6

Fonte: Elaboração própria, com base nas informações da Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144) .

63. Conforme previsto no art. 36 da Lei 8.987/1995 ( Lei de Concessoes), é devido às concessionárias de serviço público, no advento do termo contratual, indenização das parcelas dos investimentos vinculados a bens reversíveis, ainda não amortizados ou depreciados, que tenham sido realizados com o objetivo de garantir a continuidade e atualidade do serviço concedido.

64. A metodologia estabelecida para o cálculo desse montante é a do Valor Novo de Reposição (VNR) , prevista no art. 15, § 1º, da Lei 12.783/2013 e na Resolução Normativa Aneel 596/2013 (peça 166) , que consiste no levantamento do valor do bem novo, idêntico ou similar ao avaliado, obtido a partir do banco de preços da concessionária, ou do banco de preços referenciais, quando homologado, ou do custo contábil atualizado.

65. Nesse sentido, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) inicialmente elaborou o orçamento desses bens reversíveis e subtraiu a depreciação acumulada, conforme as taxas estabelecidas na REN Aneel 731/2016. Assim foi feito para a UHE Tucuruí (peça 142) , que, de acordo com a Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144, p. 16) , possuirá um montante de R$ 5.103.744.550,00 a ser indenizado ao fim da concessão vigente, em agosto de 2024 (R$ 6.617.935.560 na data-base da modelagem econômico-financeira - 1/1/2022) .

66. No caso da UHE Curuá-Una, o MME registra que as informações disponibilizadas pela Eletrobras até o fechamento da modelagem econômico-financeira não eram suficientes para os cálculos do VNR da usina, 'sendo necessário, portanto, haver uma complementação dos dados, por parte da empresa, para dar prosseguimento às avaliações'.

67. As demais usinas, por sua vez, estão com seus ativos totalmente depreciados, de acordo com a Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144, p. 15) . É o caso (i) das concessões renovadas sob o regime de cotas; (ii) das UHEs Itumbiara e Sobradinho, cujas concessões foram renovadas em regimes específicos instituídos pelas Leis 11.943/2009 e 13.182/2015; e (iii) da UHE Mascarenhas de Moraes.

68. Verifica-se, assim, que se trata de ativos antigos do parque hidrelétrico brasileiro, havendo que se registrar os potenciais benefícios relativos à modernização dessas usinas, conforme estudo elaborado pela EPE (Nota Técnica de Repotenciação e Modernização de Usinas Hidrelétricas, Ganhos de Eficiência, Energia e Capacidade Instalada, tratando dos benefícios potenciais com a modernização do parque hidrelétrico brasileiro), disponível em https://www.epe.gov.br/pt /publicacoes-dados-abertos/publicacoes/nota-tecnica-de-repotenciacaoemodernizacao-de-usinas-hidreletricas-ganhos-de-eficiência-energiaecapacidade-instalada.

69. A esse respeito, encaminhou-se à empresa o Ofício 0108/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 176) , questionando-a a respeito da oportunidade e conveniência de exigências para a elaboração de estudos para a definição do aproveitamento ótimo desses empreendimentos nos respectivos contratos de concessão. Ressalta-se que as mesmas exigências foram incluídas nos contratos da UHE Porto Primavera (TC Processo XXXXX/2018-0) e das usinas hidrelétricas da Companhia Estadual de Geração e Transmissão de Energia Elétrica (CEEE-GT) (TC Processo XXXXX/2020-7) .

70. No entanto, em resposta, a EPE informou que 'não há informações suficientes para indicar a viabilidade financeira e técnica sobre o investimento em novos estudos para todas as usinas em questão' e que os 'instrumentos mais eficientes para endereçar esse investimento seriam evoluções regulatórias e de mercado' (peça 202) , na linha do que se discute atualmente no âmbito da modernização do setor elétrico brasileiro, cujos principais pontos são tratados no âmbito do PLS 232/2016 e do PL 414/2021.

71. Em termos de custos, a Resolução Normativa Aneel 934/2021 estabelece os valores para ressarcimento dos estudos de viabilidade econômico-financeira (EVTE) dos aproveitamentos hidrelétricos nos processos de licitação de empreendimentos de geração, conforme apresentado na Tabela 3.

Tabela 3 - Regras de ressarcimento de EVTE da Aneel

Tamanho do empreendimento

Parcela fixa

Parcela variável

Para potências nos EVTE até 360 MW

R$ 3.120.000,00

R$ 68.000/MW de potência no estudo de viabilidade

Para potências nos EVTE acima de 360 MW

R$ 23.280.000,00

R$ 12.000/MW de potência no estudo de viabilidade

Fonte: REN 934/2021.

72. Considerando tais valores como estimativa dos custos que seriam arcados pela Eletrobras na elaboração desses estudos para cada uma das usinas envolvidas na outorga em questão, isso representaria uma despesa total de aproximadamente R$ 727 milhões, como exposto na Tabela 4 abaixo.

Tabela 4 - Custo estimado com novos EVTEs da outorga

Usina

Potência (MW)

Parcela fixa

(mil R$)

Parcela variável (mil R$)

Total

(mil R$)

Apolônio Sales (Antiga Moxotó)

400,00

23.280,00

4.800,00

28.080,00

Boa Esperança (Antiga Castelo Branco)

237,30

3.120,00

16.136,40

19.256,40

Coaracy Nunes

78,00

3.120,00

5.304,00

8.424,00

Corumbá I

375,00

23.280,00

4.500,00

27.780,00

Curuá-Una

42,80

3.120,00

2.910,40

6.030,40

Estreito (Luiz Carlos Barreto de Carvalho)

1.050,00

23.280,00

12.600,00

35.880,00

Funil

30,00

3.120,00

2.040,00

5.160,00

Funil

216,00

3.120,00

14.688,00

17.808,00

Furnas

1.216,00

23.280,00

14.592,00

37.872,00

Itumbiara

2.082,00

23.280,00

24.984,00

48.264,00

Luiz Gonzaga (Itaparica)

1.479,60

23.280,00

17.755,20

41.035,20

Mascarenhas de Moraes (Antiga Peixoto)

476,00

23.280,00

5.712,00

28.992,00

Marimbondo

1.440,00

23.280,00

17.280,00

40.560,00

Paulo Afonso I

180,00

3.120,00

12.240,07

15.360,07

Paulo Afonso II

443,00

23.280,00

5.316,00

28.596,00

Paulo Afonso III

794,20

23.280,00

9.530,40

32.810,40

Paulo Afonso IV

2.462,40

23.280,00

29.548,80

52.828,80

Pedra

20,01

3.120,00

1.360,48

4.480,48

Porto Colômbia

320,00

3.120,00

21.760,00

24.880,00

Sobradinho

1.050,30

23.280,00

12.603,60

35.883,60

Tucuruí

8.535,00

23.280,00

102.420,00

125.700,00

Xingó

3.162,00

23.280,00

37.944,00

61.224,00

Total

350.880,00

376.025,34

726.905,34

Fonte: Elaboração própria.

73. Esse montante representa menos de 1,5% do valor adicionado com os novos contratos de concessão (VAC) , motivo pelo qual não há o que se falar em inviabilidade econômica sobre o investimento em novos estudos para todas as usinas em questão, como alegado pela EPE. Ademais, dadas as incertezas associadas à aprovação ou não do projeto de modernização do setor elétrico brasileiro, cujos aprimoramentos regulatórios seriam suficientes para incentivar a realização desse tipo de investimento, a exigência na realização desses estudos neste momento pode permitir, desde já, a obtenção dos potenciais benefícios deles advindos.

74. Por outro lado, cabe ao Poder Concedente verificar, caso a caso, a viabilidade técnica desses estudos, à luz das conclusões anteriormente expostas pela EPE e tal como possivelmente verificado em casos anteriores como o da UHE Porto Primavera e das usinas da CEEE-GT.

75. Na situação atual, a potência instalada das usinas referidas no art. 2º da Lei 14.182/2021 é de 26.089,6 MW, o que representa 91,67% da potência total instalada de usinas hidrelétricas geridas pelas empresas do Grupo Eletrobras (30.828,15 MW) , segundo o Formulário de Referência 2021, p. 211-213, publicado pela estatal (https://eletrobras.com/pt/ri/DemonstracoesFinanceiras/Formulario%20de%20Referencia%202021.pdf) . Não são abrangidas pela Lei 14.182/2021 as seguintes hidrelétricas concedidas às empresas do Grupo Eletrobras: Anta, Balbina, Barra do Rio Chapéu, Batalha, Curemas, João Borges, Manso, Gov. Jayme Canet Jr. (Mauá) , Passo São João, Samuel, São Domingos, Serra da Mesa e Simplício.

76. A Figura 1 a seguir apresenta as proporções das usinas em questão em relação a outras grandezas do setor elétrico, conforme os dados do Sistema de Informações de Geração da Aneel (Siga) , disponível em https://www.aneel.gov.br/siga.

Figura 1 - Participação da potência instalada das UHEs sob gestão da Eletrobras contempladas na Lei 14.182/2021 (em concessões e em participações em SPEs) em relação a matriz elétrica nacional

Fonte: Sistema de Informações de Geração da Aneel (Siga) , disponível em https://www.aneel.gov.br/siga.

77. Considerando a representatividade das usinas contempladas na Lei 14.182/2021 perante as usinas da Eletrobras e em relação ao sistema elétrico como um todo, constata-se a relevância dos novos contratos a serem celebrados. No que diz respeito ao potencial para a geração de receitas advindas das referidas concessões, a materialidade é corroborada pelas informações contidas nas Demonstrações Financeiras da Eletrobras referentes ao ano de 2020 (https://eletro bras.com/pt/ri/DemonstracoesFinanceiras/DCC%202020%2031-12-2020.pdf) , que registram um ativo imobilizado de R$ 32,6 bilhões (1/3 dos ativos relevantes da empresa) , em que cerca de 90% referem-se às usinas em questão.

78. Verifica-se, portanto, dada a importância do conjunto de usinas envolvido nas novas concessões a serem outorgadas, que eventuais ganhos em termos de potência nesses empreendimentos poderão resultar em benefícios não só de ordem sistêmica, mas para a própria geração de receitas da Eletrobras, motivo pelo qual, inclusive, pode-se aventar interesse residual da concessionária na realização dos estudos em questão.

79. Desse modo, entende-se pertinente recomendar ao MME que avalie - à luz das conclusões anteriormente expostas pela EPE na Nota Técnica de Repotenciação e Modernização de Usinas Hidrelétricas, Ganhos de Eficiência, Energia e Capacidade Instalada (contendo os benefícios potenciais com a modernização do parque hidrelétrico brasileiro) , das incertezas associadas à aprovação ou não do projeto de modernização do setor elétrico e do eventual interesse da Eletrobras na realização desses estudos - a oportunidade e a conveniência de se incluir no instrumento contratual de outorga das referidas usinas cláusula que estabeleça a realização de estudos para a definição dos respectivos aproveitamentos ótimos, fazendo constar os custos associados na modelagem econômico-financeira para o cálculo do valor de outorga, se assim entender necessário.

IV. Características das novas concessões a serem outorgadas

80. Conforme mencionado anteriormente, o arranjo legal instituído para a desestatização da Eletrobras pressupõe a renovação das concessões de 22 usinas hidrelétricas da Eletrobras, desde que os novos contratos sejam celebrados sob o regime de PIE (art. , inciso II, da Lei 14.182/2021), no qual, de acordo com o art. 11 da Lei 9.074/1995, uma pessoa jurídica ou empresas reunidas em consórcio recebem concessão ou autorização do poder concedente, para produzir energia elétrica destinada ao comércio de toda ou parte da energia produzida, por sua conta e risco.

81. Relembre-se que os contratos de concessão renovados sob os auspícios da Lei 12.783/2013 pressupunham a alocação de cotas de garantia física e de potência das usinas hidrelétricas às distribuidoras de energia elétrica. Como contrapartida, as concessionárias de geração fariam jus aos custos de operação e manutenção, bem como encargos e tributos, custos de melhorias e gestão dos ativos, entre outros. Quanto ao risco hidrológico, foi alocado aos consumidores de energia elétrica.

82. Já no contexto do art. , inciso IV, da Lei 14.182/2021 e diferentemente do regime de cotas criado pela Lei 12.783/2013, a concessionária assumirá a gestão do risco hidrológico nesses contratos, que, de forma sintética, consiste nas implicações resultantes de situações em que as usinas hidrelétricas não geram energia suficiente para honrar seus contratos, por fatores fora da esfera de gestão das concessionárias, a exemplo das condições de hidrologia desfavorável. Tal assunto será abordado no tópico V.2.3 desta instrução.

83. Deve-se ressalvar que, por força do art. , § 1º, da Lei 14.182/2021, no caso das UHEs Itumbiara e Sobradinho, os novos contratos de concessão devem preservar a obrigação de serem repassadas ao Fundo de Energia do Nordeste (FEN) e ao Fundo de Energia do Sudeste e Centro-Oeste (FESC) as diferenças entre os preços negociados e a remuneração regulatória para o regime de cotas relativas aos contratos de que tratam o inciso IIdo § 2º do art. 22 da Lei 11.943/2009 e o § 3º do art. 10 da Lei 13.182/2015, respectivamente. Esse ponto é uma das premissas legais existentes, conforme detalhado no tópico V.1 desta instrução.

84. Conforme consta da exposição de motivos da MPV 1.031/2021, a mudança no regime de comercialização de energia elétrica, mesmo considerando os riscos envolvidos, adiciona valor aos contratos de concessão. Isso porque, com essa mudança, a Eletrobras, uma vez privatizada, deixará de auferir uma receita regulatória que visa remunerar apenas os custos de operação e manutenção das usinas envolvidas, para passar a vender a energia por elas gerada a preços de mercado, sabidamente superiores a essa remuneração regulatória atualmente recebida.

85. Por outro lado, nesse mesmo cenário, as distribuidoras, que repassavam na tarifa cobrada dos seus consumidores apenas os custos regulatórios relativos à energia dessas usinas, agora passarão a comprar a totalidade ou parte dessa energia a preços superiores, com acréscimos tarifários.

86. Desse modo, com o objetivo de mitigar o impacto tarifário com a descotização, o art. , inciso I, da Lei 14.182/2021 destina 50% do VAC à CDE, cujas despesas são pagas por todos os agentes que comercializam energia elétrica com o consumidor final (Lei 10.438/2002 e Decreto 9.022/2017), sendo repassado à tarifa na forma de encargo setorial. Assim, ao se realizarem aportes diretos na CDE oriundos do VAC, tem-se uma redução na pressão tarifária sobre o consumidor final resultante do processo de descotização.

87. O art. 4º, § 2º, da referida lei ainda dispensa a obrigação de pagamento pelo uso de bem público prevista no art. 7º da Lei 9.648/1998 e vincula o benefício advindo do repasse de recursos da CDE exclusivamente ao Ambiente de Contratação Regulada (ACR) , no qual se encontram os consumidores cativos das distribuidoras (em que se concentram os consumidores residenciais, por exemplo) .

88. No que se refere ao potencial de gerar receitas, será permitido à Eletrobras, uma vez privatizada, de forma geral, comercializar livremente a energia das usinas cujas concessões serão renovadas até o limite de suas garantias físicas. A garantia física de uma usina, correspondente ao lastro físico que determina o quanto de sua energia é possível de ser comercializada, é resultado do rateio da garantia física de energia do Sistema Interligado Nacional (SIN) , definida na Portaria MME 101/2016 como a quantidade máxima de energia que o sistema pode suprir, dado um critério de garantia de suprimento.

89. Quanto às concessões atualmente em regime especial (UHE Itumbiara e UHE Sobradinho) , em relação à garantia física alocada ao suprimento dos contratos abrangidos pelo art. 3º da Lei 10.604/2002 e art. 10 da Lei 13.182/2015, na medida em que esses ajustes forem se encerrando, a energia deixará de ser alocada ao regime de cotas, tal como atualmente previsto, para ser livremente comercializada pela Eletrobras.

90. Outrossim, após um novo cálculo efetuado pela EPE - detalhado no tópico V.2.1 desta instrução -, haverá uma redução média de 982,2 MW médios (7,34%) na garantia física do rol de usinas com contratos a serem renovados. Ressalta-se que não incidem no caso concreto os limites de redução impostos pelo art. 21 do Decreto 2.655/1998, por se tratar da celebração de novos contratos de concessão.

91. Ressalta-se, por fim, que os novos contratos de concessão trazem previsões relativas aos bens reversíveis e instalações das hidrelétricas (cláusula primeira e nona dos novos contratos de concessão, peça 146) .

92. Todos os bens reversíveis existentes na ocasião da licitação que originou o contrato antigo serão considerados como integralmente amortizados. Inclusive, a concessionária renunciará ao direito de indenização dos investimentos parcialmente amortizados das UHEs Tucuruí e Curuá-Una.

93. Já os novos investimentos realizados ao longo da outorga poderão ser indenizados quanto à parcela ainda não amortizada quando do termo final contratual, desde que devidamente aprovado pelo Poder Concedente.

94. Com o advento do termo final dos novos contratos, os bens reversíveis e instalações vinculados às usinas passarão, em regra, a integrar o patrimônio da União.

V. Do valor de outorga das novas concessões

95. O valor da outorga pelas novas concessões da Eletrobras foi estabelecido por meio da Resolução 15/2021 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) , de 31/8/2021 (peça 166) .

96. Os cálculos, as premissas e os valores detalhados foram apresentados pelo Ministério de Minas e Energia na peça 144 (NT 46/2021/ASSEC) , a qual tem como anexo a planilha com a modelagem econômico-financeira realizada para obtenção do valor adicionado à Eletrobras pelos novos contratos de concessão (peça 146) .

97. A metodologia adotada pelo MME e pelo ME para precificar o valor adicionado das usinas hidrelétricas que terão novas concessões foi o fluxo de caixa descontado, que utilizou valores em moeda constante na data-base de janeiro de 2022, ou seja, os montantes projetados são valores reais e não nominais. O objetivo foi avaliar qual a diferença de valor que seria adicionado ao contrato dessas UHEs sob o regime de PIE em relação às suas concessões atuais, no formato de cotas, diante das vantagens destacadas na seção anterior.

98. Assim, dadas as diversas premissas legais, econômicas e setoriais que serão abordadas nos próximos tópicos, foi estimado o Valor Presente Líquido Incremental das novas concessões frente as antigas e calculado o desembolso à CDE que faria com que esse Valor Presente Líquido Incremental fosse zerado. Isso significa que, dada uma taxa de remuneração regulatória definida em 7,31% (detalhada no tópico V.2.3.1 desta instrução), o valor dos dispêndios previstos na Lei 14.182/2021 se igualaria ao incremento de valor dos novos contratos, sem alterar o equilíbrio financeiro teórico desses contratos da estatal, mas ampliando a liberdade de comercialização da Eletrobras privatizada.

99. A conclusão da Resolução 15/2021-CNPE foi que o valor adicionado pelos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica seria de R$ 62.479.656.370,10. Desse montante, deveria ser deduzido o valor de R$ 2.906.498.547,37 relativo ao reembolso pelas despesas comprovadas com aquisição de combustível (dedução da Conta de Consumo de Combustíveis - CCC) incorridas até 30/6/2017 pelas concessionárias que foram controladas pela Eletrobras e que tenham sido comprovadas, porém não reembolsadas, por força das exigências de eficiência econômica e energética de que trata o § 12 do art. 3º da Lei 12.111/2009.

100. O saldo remanescente (R$ 59.573.157.822,73) , de acordo com a Lei 14.182/2021, deve ser dividido nas seguintes rubricas:

a) de acordo com o inciso I do art. 4º da Lei 14.182/2021, a Eletrobras deve pagar à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) 50% do valor adicionado pelos novos contratos, ou seja, R$ 29.786.478.912,00;

b) despesas previstas nos arts. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021, com: i) Programa de Revitalização dos Recursos Hídricos das Bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba (R$ 350 milhões por ano, ao longo de dez anos) ; ii) desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal para redução estruturante dos custos de geração de energia e para navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins (R$ 295 milhões por ano, ao longo de dez anos) ; e iii) implementação de Programa de Revitalização dos Recursos Hídricos das Bacias Hidrográficas na área de influência das usinas hidrelétricas de Furnas (R$ 230 milhões por ano, ao longo de dez anos) . O valor total dessas despesas, trazidas a valor presente pela taxa de remuneração real de 7,31%, seria de R$ 6.058.526.290;

c) disponibilização, pelas concessionárias de geração localizadas na bacia do Rio São Francisco, do montante anual de 85 MWmed pelo prazo de vinte anos, pelo preço de R$ 80,00/MWh, ao Operador do Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) . Esse fornecimento de energia representaria um custo, trazido a valor presente pela taxa de remuneração real de 7,31%, de R$ 509.563.867,00, representado pela diferença entre os valores de mercado e o valor subsidiado de R$ 80/MWh;

d) o restante, ou seja, R$ 23.218.488.755,00, será pago pela Eletrobras ou suas subsidiárias para o Tesouro Nacional, em razão da bonificação pela outorga de novos contratos de concessão.

101. Analisando a modelagem adotada, verifica-se que o MME utilizou as premissas legais, quando disponíveis, instituídas principalmente na Lei 14.182/2021 ( Lei de privatizacao da Eletrobras) e na Lei 13.182/2015 (que institui o Fundo de Energia do Nordeste e o Fundo de Energia do Sudeste e do Centro-Oeste) . Para os demais critérios necessários a esse cálculo, foram instituídas premissas, apresentadas na Nota Técnica 46/2021/ASSEC-MME (peça 144) .

102. Visando maior clareza, os parâmetros utilizados para o cálculo do valor da outorga serão apresentados em subtópicos específicos a seguir.

V.1. Premissas instituídas pelas Leis 14.182/2021, 14.052/2020 e 13.182/2015

103. A principal premissa legal foi a celebração de novos contratos de concessão, alterando o regime atual de cotas para o regime de exploração para produção independente (PIE) , como previsto no art. , inciso II, da Lei de Privatizacao da Eletrobras, processo chamado de descotização.

104. Essa alteração é muito significativa, pois permite que a energia dessas usinas, que atualmente é vendida diretamente ao mercado regulado por um custo regulatório próximo à soma da operação e manutenção (GAG O&M) com as melhorias e instalações necessárias (GAG Melhorias e CAIMI) , passe a ser comercializado livremente, por valores de mercado, normalmente superiores aos atuais, que buscam remunerar o empreendedor apenas pelos custos.

105. De acordo com o inciso III, art. , da Lei 14.182/2021, esse processo de descotização da energia deveria ocorrer entre cinco e dez anos. Dada a discricionariedade, o MME optou pelo prazo de cinco anos, ao ritmo de 20% ao ano, iniciando-se em 2023.

106. Conforme já mencionado nesta instrução, foi previsto ainda que a Eletrobras privatizada deverá destinar um montante equivalente a 50% do VAC à CDE, como forma de mitigar o impacto tarifário resultante da descotização (art. , inciso I, da Lei 14.182/2021).

107. Ademais, foram previstos na Lei 14.182/2021 gastos que a Eletrobras privatizada deverá honrar e que afetam o cálculo do valor das novas outorgas. Quais sejam:

a) Manutenção do pagamento das contribuições associativas ao Cepel (art. 3º, inciso IV, ao longo de seis anos) ;

b) Programa de Revitalização dos Recursos Hídricos das Bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba (art. 6º, R$ 350 milhões por ano, ao longo de dez anos) ;

c) Desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal para redução estruturante dos custos de geração de energia e para navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins (art. 7º, R$ 295 milhões por ano, ao longo de dez anos) ;

d) Implementação de Programa de Revitalização dos Recursos Hídricos das Bacias Hidrográficas na área de influência das usinas hidrelétricas de Furnas (art. 8º, R$ 230 milhões por ano, ao longo de dez anos) ; e

e) Disponibilização, pelas concessionárias de geração localizadas na bacia do Rio São Francisco, do montante anual de 85 MWmed pelo prazo de vinte anos, pelo preço de R$ 80,00/MW, ao Operador do Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) (art. 6º, § 6º) .

108. A Lei 13.182/2015, por sua vez, alocou as garantias físicas da UHE Sobradinho e da UHE Itumbiara para, respectivamente, o Fundo de Energia do Nordeste (FEN) e o Fundo de Energia do Sudeste e do Centro-Oeste (FESC) .

109. Em relação à UHE Sobradinho, 90% de sua garantia física foi alocada ao FEN até 9/2/2032, a partir de quando as reservas seriam reduzidas uniformemente ao longo de seis anos, ou seja, até 8/2/2037 (art. 5º, §§ 2º e 3º, da Lei 13.182/2015) .

110. Quanto à UHE Itumbiara, a citada lei prevê, em seu art. 8º, § 3º, que, a partir de 2018, 80% da garantia física da usina será contratada com unidades consumidoras localizadas no submercado Sudeste/Centro-Oeste, de classe industrial. A partir de 27/2/2030, os montantes contratados serão reduzidos uniformemente a razão de um sexto por ano, ou seja, até 27/2/2035.

111. O cálculo do valor adicionado aos contratos da UHE Sobradinho e UHE Itumbiara considerou essas premissas legais, que acabam por reduzir o VAC associado a essas usinas.

112. Vale citar também a Lei 14.052/2020 que estabeleceu as condições de repactuação de risco hidrológico. Essa lei definiu que os titulares das usinas hidrelétricas participantes do MRE seriam compensados pelos efeitos causados pelos empreendimentos hidrelétricos com prioridade de licitação e implantação indicados pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) .

113. Visando atender à Lei 14.052/2020, a Aneel editou a Resolução Homologatória 2.919/2021 - Aneel, que homologou o prazo de extensão da outorga das usinas hidrelétricas participantes do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) . Essa resolução afetou principalmente os contratos atuais das UHE Sobradinho e UHE Curuá-Una, estendendo-os em 2.555 dias (7 anos) e 2.313 dias (6,3 anos) , respectivamente. As demais usinas tiveram extensões de menor monta, entre 30 e 120 dias, não impactando significativamente o VAC.

114. Com relação ao modo de apropriação dessas prorrogações nos cálculos em análise, para a UHE Curuá-Una o prazo extra aumentou a duração do contrato atual, valorizando-o. Já para a UHE Sobradinho, como ambos os contratos de concessão, vigente e novo, terminariam sua vigência original na mesma época, o cálculo adotado foi a inserção de sete anos ao final da concessão com valores negativos no fluxo do novo contrato, de modo a reduzir o seu VPL. A princípio, os métodos utilizados para as duas usinas seriam matematicamente equivalentes e corretos.

115. Por fim, em relação aos valores a serem pagos pela Eletrobras privatizada à CDE e no tocante às despesas mencionadas nos itens 'b', 'c' e 'd' do parágrafo 107 acima, o Poder Concedente entendeu que tais montantes não deveriam ser simplesmente calculados por fora do fluxo de caixa e abatidos do VAC após calculado o VPL dos contratos. Em vez disso, por considerar tais despesas como obrigações contratuais previstas na Lei 14.182/2021, entendeu que tais desembolsos deveriam ser considerados dentro do fluxo de caixa da modelagem econômico-financeira.

116. A solução proposta se mostra aderente à contabilidade real da empresa, na medida em que tais desembolsos representarão despesas a serem efetuadas pela Eletrobras e afetarão o seu resultado contábil e a sua tributação.

117. A alocação dos custos dessas obrigações dentro do fluxo de caixa também se mostra mais coerente com a premissa de que eles devem ser pagos pela União e não pelos consumidores. Simulações realizadas com a planilha de modelagem do VAC apontam que aproximadamente 85% desses custos são abatidos diretamente do bônus de outorga, a ser pago à vista pela Eletrobras à União. O restante é arcado pela União com a redução do imposto de renda arrecadado ao longo dos anos das concessões. Inclusive, o abatimento do bônus de outorga somado à redução de tributação ao longo dos anos resulta em um montante superior ao das obrigações. Essa diferença é capturada pelos aportes na CDE, reduzindo a tarifa de energia dos consumidores cativos.

118. Vale dizer, se tais obrigações contratuais não fossem consideradas no fluxo de caixa e abatidas posteriormente do VAC, o benefício tributário em questão seria apropriado pela estatal e não transferido à outorga que o gerou. Adicionalmente, esses custos seriam arcados igualmente pelo bônus de outorga e pelos consumidores, via redução dos aportes na CDE, ao invés de atender à premissa de que deveria ser arcado apenas pela União.

V.2. Premissas adotadas pelo Poder Público

119. A Nota Técnica 46/2021-ASSEC (peça 144, p. 8-9) aponta quais foram as instituições competentes para definição dos parâmetros adotados pelo Poder Público, que não estavam previamente definidos em lei, como trazido na Tabela 5:

Tabela 5 - Competência para definição dos parâmetros

Parâmetro

Responsável

Garantia física de energia (GFE) vigente e GFE ajustada para os novos contratos

MME

Perdas elétricas e hedge (risco hidrológico)

GAG O&M e GAG Melhorias

Aneel

Custo Anual das Instalações Móveis e Imóveis (CAIMI)

Fluxo de pagamento da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD)

Depreciação acumulada das UHEs Tucuruí, Mascarenhas de Moraes e Curuá-Una

Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica (TFSEE) , encargo de pesquisa e desenvolvimento (P&D) , Tarifa Atualizada de Referência (TAR) e Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos (CFURH)

Preço da energia no Ambiente de Contratação Livre (ACL)

EPE

Valor Novo de Reposição (VNR) dos ativos não depreciados e não amortizados das UHEs Tucuruí, Mascarenhas de Moraes e Curuá-Una

WACC (sigla em inglês para o custo médio ponderado de capital)

ME

Fonte: NT 46/2021-ASSEC (peça 144)

120. Alguns desses valores são resultado da aplicação direta de regras normatizadas e não permitem maiores discussões. É o caso da TUST, TUSD, Depreciação, TFSEE, P&D, TAR e CFURH.

121. Esses parâmetros são baseados nos seguintes normativos:

a) TUST: Valores homologados na Resolução Homologatória Aneel 2.748/2020;

b) TUSD: Valores homologados na Resolução Homologatória Aneel 2.756/2020;

c) Depreciação: Resolução Normativa Aneel 731/2016;

d) TFSEE: 0,4% do benefício econômico auferido com a exploração do serviço de geração - § 1º, art. 12 da Lei 9.427/1996;

e) P&D: 1% da receita operacional líquida - art. , Lei 9.991/2000;

f) TAR: R$ 76,00 /MWh - Resolução homologatória 2.827/2020;

g) CFURH: 7% sobre o valor da energia elétrica produzida - art. 17 da Lei 9.648/1998;

122. As demais premissas serão abordadas em subtópicos específicos a seguir, à exceção do VNR, que já foi objeto de menção quando apresentadas as características gerais das usinas com novas concessões autorizadas pela Lei 14.182/2021 (tópico III) .

V.2.1 Das garantias físicas vinculadas às usinas a serem concedidas

123. De acordo com a Portaria MME 101/2016, a garantia física de energia do Sistema Interligado Nacional (SIN) pode ser definida como aquela correspondente à máxima quantidade de energia que este sistema pode suprir a um dado critério de garantia de suprimento. Essa quantidade de energia pode, então, ser rateada entre todos os empreendimentos de geração que constituem o sistema. O valor assim atribuído pelo rateio a cada empreendimento constitui-se em sua garantia física, que é o lastro físico desses empreendimentos com vistas à comercialização de energia.

124. A metodologia de cálculo da garantia física dos empreendimentos de geração que compõem o SIN, em um dado momento (configuração estática de referência) , é definida na Portaria MME 101/2016.

125. No âmbito da privatização da Eletrobras, o MME solicitou à EPE (Ofício 41/2021/DPE/SPE-MME, de 22/3/2021) que realizasse o recálculo da garantia física das usinas hidrelétricas da estatal contempladas pela Lei 14.182/2021.

126. Em resposta, a Empresa de Pesquisa Energética apresentou o estudo EPE-DEE-RE-086/2021-r0 (peça 204) com a metodologia de cálculo e o resultado das novas garantias físicas para as UHEs da Eletrobras que terão um novo contrato de concessão celebrado.

127. O resultado desse estudo é apresentado na Tabela 6.

Tabela 6 - Novas Garantias Físicas das UHEs

Usina

Garantia Física vigente (MWmed)

Garantia Física calculada (MWmed)

Diferença (MWmed)

Diferença (%)

Furnas

582,0

625,0

43,0

7,4%

Mascarenhas de Moraes

289,5

299,8

10,3

3,6%

Estreito (Luiz Carlos Barreto de Carvalho)

495,4

497,2

1,8

0,4%

Porto Colômbia

186,0

205,4

19,4

10,4%

Marimbondo

689,7

688,7

-1,0

-0,1%

Corumbá I

217,4

219,5

2,1

1,0%

Itumbiara

964,3

948,9

-15,4

-1,6%

Funil - RJ

115,0

102,4

-12,6

-11,0%

Sobradinho

504,5

457,5

-47,0

-9,3%

Luiz Gonzaga (Itaparica)

911,1

727,0

-184,1

-20,2%

Complexo Paulo Afonso Moxotó

2.113,8

1.658,8

-455,0

-21,5%

Xingó

2.042,4

1.729,8

-312,6

-15,3%

Boa Esperança (Castelo Branco)

135,9

136,2

0,3

0,2%

Curuá-Una

24,8

25,8

1,0

4,0%

Tucuruí

4.019,1

3.995,5

-23,6

-0,6%

Coaracy Nunes

62,6

62,2

-0,4

-0,6%

Total

13.353,5

12.379,7

-973,8

-7,3%

Fonte: EPE-DEE-RE-086/2021-r0 (peça 204, p. 88)

128. Observa-se uma redução de 973,8 MWmed na garantia física total das usinas hidrelétricas da Eletrobras, ou 7,3% da GFE dessas UHEs que tiveram alteração em suas concessões, resultado, principalmente, das reduções expressivas nas GFE das UHEs Itaparica, Paulo Afonso e Xingó.

129. Analisando a Tabela 6, identifica-se que as usinas de Paulo Afonso, Funil, Sobradinho, Luiz Gonzaga e Xingó apresentaram a necessidade de revisão superior ao permitido pelo Decreto 2.655/1998, que determina que, para as usinas hidrelétricas participantes do MRE, as reduções de garantia física devem ser limitadas em 5% do valor estabelecido na última revisão e, no máximo, em 10% da sua garantia física originalmente estabelecida. No caso concreto, no entanto, como serão assinados novos contratos de concessão no processo de privatização da Eletrobras, essa limitação não se aplica e foi possível adequar as garantias físicas diretamente à realidade fática, mesmo com reduções superiores a 10%.

130. Ressalta-se que já é um problema conhecido do setor elétrico brasileiro que as garantias físicas de muitas hidrelétricas estão superestimadas. Tal problema traz consequências sistêmicas, pois majora indevidamente a capacidade produtiva de energia, trazendo erros aos modelos computacionais de previsão de geração e de necessidade de expansão do parque gerador. Ademais, afeta diretamente as hidrelétricas, ao provocar uma produção média inferior ao esperado e consequente necessidade de compra de energia a PLD, aumentando o risco dos geradores hidráulicos não cotizados.

131. Com a adequação nas GFEs das usinas da Eletrobras, o sistema passará a ter o total de garantia física mais próximo à capacidade de geração real, mitigando os problemas citados.

132. No entanto, com relação à metodologia de cálculo das novas garantias físicas, destaca-se o fato de que não foram revisados parâmetros importantes como (i) série de vazões dos empreendimentos; (ii) usos consuntivos da água; e (iii) parâmetros de aversão a risco dos modelos computacionais de planejamento da operação (CVAR) . Neste último assunto, aversão a risco nos modelos, foram atualizados apenas os níveis de volume mínimo operativo (VminOp) , aprovados pela Comissão Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais do Setor Elétrico (CPAMP) .

133. Os valores desses e outros parâmetros de entrada para cálculo da garantia física das usinas são de responsabilidade da Agência Nacional de Águas (ANA) e não foram disponibilizados a tempo de serem usados pela EPE nos cálculos. A expectativa é de que a ANA forneça esses dados para a revisão ordinária de garantias físicas das usinas hidrelétricas do MRE que ocorrerá em 2022.

134. Disso decorrem dois riscos prováveis: i) a garantia física desses empreendimentos pode estar superdimensionada, o que significa que esses empreendimentos podem não ter a capacidade de geração de energia que foi lhes foi atribuída; ii) revisões de garantia física posteriores serão limitadas pelo Decreto 2.655/1998, dando ensejo a que, no futuro, esses empreendimentos continuem com suas capacidades de geração de energia superestimadas.

135. A despeito dos riscos mencionados, o processo de recálculo de garantias físicas envolve atividades que fogem ao escopo do presente trabalho e que poderiam demandar um prazo incompatível com o cronograma de privatização da Eletrobras, motivo pelo qual se entende pela inviabilidade de providências relacionadas ao assunto.

V.2.2 Preço da energia no Ambiente de Contratação Livre (ACL)

136. De acordo com o item 5.2.7 da Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144) , a projeção dos preços de comercialização de energia elétrica no Ambiente de Contratação Livre (ACL) foi apresentada pela EPE na Nota Técnica EPE-DEE-NT-081/2021-r0 (peça 205) . Essa NT apresentou os valores e as premissas a serem adotados no cálculo do valor adicionado da outorga por conta dos novos contratos de concessão de geração, no regime de PIE.

137. Na construção da curva de preços, a EPE atendeu às seguintes premissas estabelecidas pelo MME no Ofício 316/2021/SE-MME (peça 206) :

a) balanço entre oferta e demanda de energia e de potência para a expansão de referência do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2030;

b) horizonte de projeção considerando dados simulados até o ano de 2033; e

c) utilização da cotação do Índice de Curva Forward da plataforma Dcide mais recente no momento de elaboração da NT da EPE (Boletim Semanal da Curva Forward da Dcide de 4/8/2021) , bem como o Custo Marginal de Expansão de Energia (CME-Energia) .

138. O resultado da projeção da EPE foram os seguintes valores (peça 205, p. 14) :

a) R$ 233,00/MWh entre 2022 e 2025 - preço de referência da Dcide;

b) R$ 207,00/MWh em 2026 - interpolação entre o valor da Dcide e o CME-Energia em dois anos;

c) R$ 181,00/MWh em 2027 - interpolação entre o valor da Dcide e o CME-Energia em dois anos;

d) R$ 155,00/MWh a partir de 2028 - média do CME-Energia do PDE 2030 para o período de XXXXX-2033.

139. No que diz respeito à projeção do preço de energia no curto prazo, foram adotados valores divulgados pela consultoria Dcide, empresa privada dedicada ao desenvolvimento de soluções de informação, processamento e modelagem quantitativa para o setor de energia elétrica.

140. De acordo com a Dcide, os valores de energia projetados por ela são calculados com base nas métricas do pool de preços apurados semanalmente, utilizando as referências da curva forward de energia elétrica dos agentes classificados como comercialmente mais ativos.

141. Mais detalhadamente, geradores, comercializadores e grandes consumidores podem se cadastrar no site da Dcide, pagando uma mensalidade, para ter acesso ao Pool Denergia. Nesse pool, os agentes cadastram, semanalmente, suas referências de preços forwards individuais para o horizonte de até cinco anos (ou seja, suas estimativas de preços para diversos prazos futuros) . O sistema utiliza apenas os agentes considerados mais ativos, além de desconsiderar da amostra valores não representativos. Com a informação depurada, são calculadas métricas que representam a referência agregada para preços de mercado naquele momento (https://www.dcide.com.br/produtos/pool-denergia/) .

142. Como os contratos de comercialização no ambiente livre são sigilosos e apenas as partes envolvidas sabem de fato o preço de venda da energia, as referências de preços inseridas no sistema são meramente declaratórias, sem comprovação efetiva da veracidade dos valores. Assim, a ferramenta depende da utilização de algoritmo para identificar e excluir valores não representativos da condição atual de mercado. Os valores finais para inclusão na amostra são validados, posteriormente, por comitê. Não foi encontrada informação pública da representatividade dos agentes participantes do pool de energia em relação ao total do mercado de energia brasileiro.

143. Apesar das limitações, o MME adotou a Dcide como o melhor parâmetro disponível para previsão do valor da energia no futuro próximo, pois refletiria o preço previsto pelos agentes de mercado, os quais seriam os principais interessados na aquisição das ações da Eletrobras no momento da privatização. Assim, na visão do Ministério, a estimativa de valor de venda da energia no curto prazo seria melhor prevista pela expectativa atual do mercado do que por valores históricos ou projeções matemáticas para valores futuros.

144. Sopesa-se, contudo, alguns riscos na adoção da ferramenta descrita.

145. O valor apontado pela Dcide é fortemente influenciado pela declaração de agentes do setor, a qual não é necessariamente embasada em contratos assinados. O valor apurado na curva forward, portanto, não é obtido diretamente por meio dos fundamentos que influenciam a operação do Sistema e valor da energia, mas sim da expectativa declarada pelos agentes, sem estar associado a quaisquer compromissos de negociação.

146. Outro risco observado no uso da Dcide é a volatilidade de seus valores. Apesar de a volatilidade ser algo inerente aos preços de curto prazo do setor elétrico, no caso concreto visa-se estimar o valor das outorgas de uma quantidade expressiva de usinas hidrelétricas da Eletrobras, cujas concessões serão repassadas à uma empresa privada sem licitação. Vale dizer, o valor apurado na modelagem econômico-financeira será um valor definitivo a ser pago via bônus de outorga.

147. Diante dessa volatilidade, há o risco de serem utilizadas, no cálculo do bônus de outorga, variáveis que não sejam representativas da expectativa média de mercado, que não representem uma linha de tendência no curto prazo. Ou seja, é razoável esperar que o valor dessas outorgas seja baseado em premissas relativamente estáveis, que deem segurança para obtenção de seu valor justo, sem que seja alterado significativamente apenas por conta da semana escolhida para extração dos preços.

148. Como pode ser constatado na Figura 2, o valor da energia no longo prazo (no caso da Dcide, considera-se longo prazo até quatro anos à frente) recuou 20% em uma única semana, sem que tenha havido nenhuma alteração relevante de fatores estruturantes no setor de energia. Como possível explicação para este comportamento, está a queda do valor do CMO/PLD, que são advindos dos modelos matemáticos para planejamento da operação, cuja sensibilidade em relação a precipitações é notória no setor.

Figura 2 - Curva DCIDE Convencional Longo prazo (até 19/9/21)

Fonte: https://www.denergia.com.br/dashboard (acessado em 27/9/2021) .

149. Desse modo, propõe-se recomendar ao MME que futuramente, ao conduzir a celebração de novos contratos de concessão de usinas hidrelétricas, avalie outros referenciais de preços para a venda de energia no ambiente de contratação livre que não sejam voláteis e dependentes das declarações de agentes do setor.

150. Destaca-se que o valor da energia é uma das premissas mais sensíveis do modelo. Pequenas variações podem alterar o VAC dos novos contratos em bilhões de reais.

151. Além disso, especialmente para a privatização da Eletrobras e de outros casos relevantes de avaliação do valor adicionado ao contrato de novas concessões no futuro, entende-se que a escolha de valores não representativos da curva da Dcide, a depender da janela temporal utilizada como referencial de preços, sujeita o VAC a uma instabilidade indesejável no valor de um bem que não passará por licitação.

152. Essa instabilidade pode decorrer apenas das expectativas declaradas dos agentes, sem que tenha havido alteração em qualquer fator estrutural que influencie de forma significativa a linha de tendência dos preços no curto prazo. Ademais, não se pode descartar a possibilidade de comportamento oportunista de alguns agentes, já que ao declarar valores irreais na plataforma, podem se beneficiar em possíveis negócios. Salienta-se que vários desses agentes têm interesse em participar da capitalização da Eletrobras, o que poderia representar um conflito de interesse.

153. No caso em tela, observa-se que os valores da curva Dcide se mantiveram estáveis por vários meses (vide Figura 2) , no patamar de R$ 233,00/MWh. Portanto, refletem, de uma forma mais confiável os fundamentos que determinam os preços de curto prazo, sem a interferência de ruídos especulativos.

154. Como o preço de curto prazo adotado pelo MME foi derivado dessa janela de tempo em que os valores da Dcide se mostraram mais estáveis, foi afastada a instabilidade indesejável a que se sujeita a curva divulgada pela consultoria. Desse modo, entende-se razoável a adoção valor de R$ 233,00/MWh como parâmetro de preço de curto prazo na modelagem econômico-financeira.

155. Por outro lado, não se constata a mesma estabilidade nos valores mais recentes da curva da Dcide, uma vez que no período de junho a setembro de 2021 estavam no patamar de R$ 239,15/MWh e em 5/9/2021 recuou, repentinamente, para R$ 191,46/MWh.

156. Caso tivessem sido utilizados esses valores mais recentes da curva da Dcide, o MME poderia estar considerando preços influenciados pela instabilidade em questão. Para mitigar esse risco no âmbito da precificação de novos contratos de outorga, propõe-se recomendar ao MME que fixe sua referência no valor inicialmente adotado, de R$ 233,00/MWh.

157. Já no tocante aos preços de longo prazo, o MME considerou o custo marginal de expansão (CME) , que é o custo associado ao atendimento de um incremento de demanda de energia para o SIN, permitindo a operação dos recursos já disponíveis e/ou o investimento em novos ativos, visando otimizar a evolução do parque gerador e garantir o atendimento aos critérios de suprimento (peça 205) . Ou seja, o CME representa o valor necessário para incluir o próximo MW no sistema. No longo prazo, em um sistema equilibrado, o valor de venda da energia tende a se igualar ao custo de construção de um novo gerador, motivo pelo qual esse referencial é utilizado para o valor de venda da energia nos anos mais distantes.

158. O CME é composto por dois aspectos relacionados: CME-Energia e CME-Potência. O CME-Energia é resultado da adição de uma unidade de demanda em cada um dos meses de um ano e observação do custo adicional de atendimento dessa unidade, valor que posteriormente é convertido para a unidade de R$/MWh. Já o CME-Potência é o incremento de uma unidade de demanda no atendimento da capacidade máxima do sistema, considerando a reserva operativa. A divisão em dois valores é feita apenas para facilitar a exposição e permitir a identificação do quanto do total do CME se dá pelo aumento da demanda média mensal de energia e quanto se dá pelo aumento da demanda máxima instantânea (peça 207, p. 12) .

159. A EPE, por intermédio do documento EPE-DEE-NT-081/2021-r0 (peça 205) , adotou como valor da energia de longo prazo (a partir de 2028 até o termo final dos novos contratos a serem celebrados) o CME-Energia, desconsiderando a componente do CME-Potência, motivo pelo qual foi questionada quanto a sua escolha por meio de Ofício de Requisição 108/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 176) .

160. Em resposta (peça 202) , a Empresa de Pesquisa defende que o CME-Potência seria uma proxy (ou seja, uma variável que é utilizada para representar outra variável que não é observável ou não pode ser observada diretamente) de eventual mercado futuro de capacidade de potência associado ao mercado de energia vigente. Entretanto, apesar de já existirem estudos e debates sobre o tema, tal mudança ainda não teria sido efetivamente regulada, não havendo previsão de seu início. Ademais, os estudos existentes preveem que todos os contratos firmados até a data de início do novo modelo de comercialização serão respeitados, de modo que os geradores terão que esperar o fim de seus contratos vigentes para a venda dos produtos separados de lastro e energia. Conclui, então, que sem a existência desse mercado não haveria preços nem negociações de lastro de capacidade de potência e, consequentemente, não haveria formação de expectativas de preços futuros.

161. Ou seja, a EPE alega que utilizou apenas a componente do CME-Energia, porque a venda de lastro ainda não está em vigor e, quando estiver, pode demorar anos para refletir na comercialização do gerador, dado que ele precisará cumprir o prazo de seus contratos firmados à época.

162. Com relação à utilização do CME-Energia como referencial de preços para o longo prazo, ao invés do CME, em que são consideradas a energia e a potência, identifica-se inicialmente um risco no referencial adotado.

163. A separação entre CME-Energia e CME-Potência se justifica principalmente pela expectativa do setor da alteração do modelo de comercialização de energia vigente. Planeja-se alterar a venda de energia baseada nas garantias físicas das usinas por um modelo em que seja comercializada tanto a energia efetivamente produzida (MWmed ou MWh) , quanto a capacidade de geração, ou seja, a potência associada ao empreendimento (MW) que agregará segurança energética ao SIN. Ou seja, enquanto atualmente a venda de energia abrange os dois produtos em conjunto, após essa reforma os geradores poderão vender separadamente lastro e energia. O objetivo principal é que a expansão do sistema, com a consequente segurança energética, seja financiada igualmente por todos os consumidores, tanto do mercado livre quanto do mercado regulado. No modelo atual, de negociação apenas da energia (com o lastro implícito no preço) , empreendimentos termelétricos são adquiridos apenas pelo mercado cativo, que acaba ficando com o ônus da segurança energética.

164. Assim, existe uma paridade entre o CME-Energia e o CME-Potência e a venda de energia e capacidade, respectivamente. Tal modelo ainda não foi adotado, mas os novos contratos de comercialização firmados após essa alteração já poderão comercializar os dois produtos separadamente. Logo, para o preço de venda da energia pela Eletrobras no longo prazo, ao se considerar apenas o CME-Energia, desconsidera-se o potencial de arrecadação por meio da venda do seu lastro, de modo que a eventual receita dos novos contratos de concessão no regime PIE pode estar sendo subavaliada.

165. Como argumentado pela EPE (peça 202) , esse novo modelo ainda não está totalmente em vigor. Entretanto, o setor já está em processo de mudança. Evidência disso é o Decreto 10.707/2021, que regulamenta a contratação de reserva de capacidade, na forma de potência. Com base nesse decreto, a Aneel já abriu duas consultas públicas ( CP) sobre o tema. A CP 63/2021 trata da sistemática do Leilão 11/2021, conhecido como Leilão de Reserva de Capacidade. O certame, voltado para a contratação de usinas termelétricas, está previsto para o dia 21/12/2021. Nesse leilão serão negociados, pela primeira vez, dois produtos: energia e potência. Já a CP 61/2021 visa obter subsídios para os futuros contratos de reserva de capacidade.

166. Nada obstante essas mudanças regulatórias, pode-se afirmar com razoável segurança que a Eletrobras venderá, além de energia, lastro de capacidade de potência no âmbito dos novos contratos de concessão das usinas em análise, mesmo que a modernização do setor não ocorra no futuro próximo. Logo, considerando que o objetivo do MME é valorar esses contratos durante os trinta anos de concessão, há o risco de não haver qualquer componente da venda de potência, a qual gerará receita à empresa além da venda de energia, o que aumentaria o valor adicionado aos contratos e, consequentemente, o bônus de outorga.

167. Interessante destacar que a premissa instituída pelo próprio MME no Ofício que determinou à EPE que fizesse as projeções de preços de energia no ACL incluía o fator potência (peça 206) :

Tendo em vista as discussões mantidas entre o MME e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) , solicito a emissão de Nota Técnica contendo as projeções de preço de energia, no ACL, informando a data base do estudo, bem considerando as seguintes premissas:

i) Balanço entre oferta e demanda de energia e de potência para a expansão de referência do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2030, ou seja, aquela que considera o caso de referência para projeção da carga de energia elétrica e o cenário 'verão' para a projeção de micro e minigeração distribuída; (grifos nosso)

168. Para ilustrar a diferença quantitativa entre o CME, que, como dito, expressa as componentes CME-Energia e CME-Potência, e apenas uma de suas componentes, o CME-Energia, pode-se avaliar a Tabela 7. Nota-se que a componente de potência representa um valor agregado significativo no CME, o qual foi todo ignorado pelo Poder Concedente em seus estudos do VAC.

Tabela 7 - Custo Marginal de Expansão

CME (R$/MWh)

Ano

2026

2027

2028

2029

2030

2031¹

2032¹

2033¹

CME-Energia

46,43

61,53

110,33

144,90

165,09

169,50

170,19

172,14

CME

128,35

143,50

192,01

226,67

246,79

Fonte: Peça 205, p. 13 (CME-Energia) e peça 207, p. 14 (CME)

1 Os CME dos anos de 2031, 2032 e 2033 não constam na NT da EPE de cálculo do CME e não foram trazidos no estudo da EPE relativo a essa modelagem.

169. Nesse aspecto, conclui-se que, ao se desconsiderar completamente a componente de potência e seu potencial de receita futura, o VAC das novas concessões pode estar sendo indevidamente subavaliado, mesmo que seja necessária certa ponderação por conta do prazo ainda necessário para essas alterações impactarem de fato o caixa da empresa.

170. Desse modo, propõe-se recomendar ao MME que adote, na estimativa de valor da energia de longo prazo, previsão da componente de valor do lastro de capacidade de energia.

171. Em complemento ao problema previamente exposto, verificou-se que a metodologia de cálculo do valor da energia adotado pela EPE merece outras críticas, independentemente da discussão entre CME e CME-Energia.

172. Para a definição dos valores adicionados aos contratos a EPE utilizou a média do CME-Energia dos anos de 2028 a 2033.

173. O cálculo do CME-Energia utilizou como referência o PDE 2030 (peça 208) , o qual prevê valores entre 2021 e 2030. Entretanto, as simulações energéticas que resultaram nesses valores, provenientes do modelo Newave, se estendem até 2034 (peça 205 p. 13) , possibilitando a obtenção do resultado para os anos de 2031 a 2033. Os valores obtidos estão apresentados na Tabela 7 (os custos de 2034 não foram divulgados) .

174. Relembra-se que a premissa adotada pelo MME foi que o valor da venda da energia no longo prazo tenderia a se igualar ao Custo Marginal de Expansão do sistema. No caso em análise, o longo prazo é definido como os anos de 2029 a 2051.

175. Como se observou na Tabela 7, os valores mais longínquos (a partir de 2030) tendem a se estabilizar por volta dos R$ 170/MWh. E o MME pretende prever a venda de energia até 2051. Logo, é mais razoável a utilização das informações de mais longo prazo (2030 a 2033) do que os anos adotados pelo MME (2028-2033) . Tal inconsistência torna-se mais aguda ao se comparar o valor do CME-Energia de 2028 (R$ 110,033/MWh) com a tendência dos últimos anos (R$ 172/MWh) , o que faz com que os anos de 2028 e 2029 reduzam a média considerada para valoração dos contratos da Eletrobras, diminuindo a receita para todas as usinas durante o período de 2028 a 2051 e, consequentemente, o VAC dessas concessões.

176. Esse aspecto foi questionado junto à EPE por meio de Ofício de Requisição (peça 176) . Em sua resposta (peça 202) , a Empresa de Pesquisa Energética alega que seu racional para escolha dos períodos foi o seguinte: i) nos primeiros quatro anos (2022-2025) a melhor proxy seria a projeção de preços de mercado (Dcide) ; ii) considerando que até 81% dos consumidores livres e especiais estabelecem contratos de até seis anos no ACL, os 5º e 6º anos da projeção (2026 e 2027) tiveram método próprio (acoplamento entre as curvas) ; e iii) após os seis primeiros anos, considerou-se um novo horizonte de seis anos de contrato (2028 a 2033) .

177. Adicionalmente, a EPE afirma que, apesar das simulações utilizadas no PDE 2030 apresentarem valores até 2034, os valores resultantes para o último ano não foram coerentes, de modo que esse ano foi excluído da média. Por fim, defende que a metodologia adotada seguiria as orientações dadas pelo Ofício 316/2021 do MME (peça 206) .

178. Primeiramente, a alegação de que a metodologia adotada pela EPE seguiria as orientações adotadas pelo MME no Ofício 316/2021 é imprecisa, tendo em vista que esse ofício não delimita quais anos deverão compor a média ou mesmo a utilização do CME-Energia ao invés do CME. Ou seja, os pontos de discussão neste tópico não foram decididos no Ofício do MME, mas pela EPE.

179. Verifica-se na resposta da EPE que, além da retirada do ano de 2034, não há indícios de que tenha havido uma avaliação crítica sobre os valores discrepantes do começo da série adotada (2028 e 2029) . Apesar de esses serem os primeiros anos a serem previstos pelo CME-Energia, por definição da EPE, o objetivo da metodologia é estimar o custo da energia até 2051, com base no CME.

180. Ocorre que, por definição, quanto mais distante a projeção do CME realizada, mais os valores projetados tendem a se aproximar do longo prazo. Logo, mostra-se incoerente, sob o ponto de vista metodológico eleito pelo próprio MME, a adoção de valores mais recentes do CME como estimativa de preço de longo prazo, resultando em um preço no patamar de R$ 155,00/MWh. Deveriam ter sido utilizados, por outro lado, os CMEs mais distantes projetados, que se situam no patamar de R$ 172,14/MWh (CME 2033) , ou, ao menos, a média dos anos que apresentam uma tendência de estabilização de valor, ou seja, de 2030 a 2033 (R$ 169,23/MWh) .

181. Para reforçar essa incoerência, realizou-se uma análise multicritério, exposta a seguir, comparando os valores propostos com outras premissas possíveis para a realização de estimativas de preços futuros.

182. Inicialmente, identificou-se que a própria Eletrobras tinha sua metodologia de estimativa dos preços futuros de venda de energia, utilizada para testes de impairment dos seus ativos de geração de energia relativamente às demonstrações financeiras de 31/12/2020. O valor que a empresa prevê para o longuíssimo prazo (horizonte de 2036 a 2050) se distancia substancialmente do CME 2033 e foi considerado na análise (peça 209) .

183. Ressalta-se que, como os testes de impairment são ajustes contábeis para se avaliar um ativo conforme o seu 'valor justo', eles devem ser realizados sob a luz do princípio da prudência, que norteia a atividade de contabilidade, conforme a Resolução do Conselho Federal de Contabilidade 750/1993.

184. Um outro balizador possível seria a utilização dos valores históricos. No caso do setor elétrico, o único valor público de referência é o PLD. Assim, coletou-se a série histórica das médias mensais do PLD desde janeiro/2010, ajustou-se o valor histórico por meio do IPCA para a data base atual (agosto/2021) e calcularam-se as médias dessa grandeza. A média de toda essa série foi R$ 316,11/MWh. Mensurou-se também a série nos últimos três anos (setembro/2018 a agosto/2021) , obtendo-se a média de R$ 236,65/MWh (peça 210) .

185. A Tabela 8 resume os valores considerados.

Tabela 8 - Diferentes referenciais para o valor da energia de longo prazo 1

R$/MWh

EPE (CME - Energia XXXXX-2033)

155,00

CME-Energia 2033

172,17

Média CME-Energia XXXXX-2033

169,23

CME 2030

246,79

PLD desde jan/2010

316,11

PLD últimos 3 anos (setembro/2018 a agosto/2021)

236,65

Fonte: Elaboração própria.

1 O valor adotado pela Eletrobras (peça 209) também foi considerado na análise.

186. Analisando a Tabela 8, verifica-se que o valor adotado pela EPE, de R$ 155,00/MWh, está subestimado em relação a qualquer outro parâmetro apresentado.

187. Conforme já mencionado, da gama de opções plausíveis, somente apresentada de forma ilustrativa na Tabela 8 (podem existir outros parâmetros aceitáveis) , o gestor escolheu o CME-energia, porém o fez de forma inconsistente em relação a sua própria premissa de expressar o longo prazo.

188. Outrossim, relembre-se que o caso concreto trata da estimativa do valor da outorga de uma quantidade expressiva de usinas hidrelétricas da Eletrobras, cujas concessões serão repassadas à uma empresa privada sem licitação, de cujo montante líquido resultará o valor definitivo que será auferido pela União como bônus de outorga.

189. Assim, não se mostra razoável, sob o ponto de vista do resguardo ao erário, a escolha do gestor de um referencial com visão de futuro mais recente. De forma prática, essa escolha, dentre as opções apresentadas na referida tabela, representa a de menor valor para se definir o valor a ser pago como bônus de outorga.

190. Reforça-se que o valor da energia de longo prazo é um dos parâmetros que mais impactam nos cálculos em análise. No caso concreto, ao se adotar o CME-Energia 2033 como referencial (ainda que sem a componente de potência explanada acima) , o VAC seria acrescido de aproximadamente R$ 10,6 bilhões, sendo R$ 5,3 bilhões pagos à União no bônus de outorga e R$ 5,3 bilhões aportados na CDE para redução da tarifa de energia dos consumidores do mercado regulado.

191. Importante ressaltar, ainda, que a adoção de valores do CME estimados para os anteriores a 2030, que se situam em patamares inferiores ao de 2033, representa um erro metodológico, não se confundindo com a utilização de valores desatualizados, como poderia ser aventado.

192. Em outras palavras, trata-se apenas da constatação de que a implementação do ato, a escolha do preço de energia, está em desacordo com a motivação declarada pelo próprio gestor para a sua realização, à qual ele se vincula, de incorporar referencial que capture a estimativa de preço de energia de longo prazo à projeção dos fluxos de caixa dos novos contratos de concessão.

193. Nesse sentido, será proposta determinação para ajuste dessa premissa. Contudo, optou-se por concentrar todas as propostas de encaminhamento que alterem o valor da modelagem em um tópico específico desta instrução (tópico VI) .

V.2.3 WACC e GSF (hedge)

V.2.3.1 Custo médio ponderado de capital (Weighted Average Cost of Capital - WACC)

194. De acordo com o item 5.2.6 da Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144, p. 16) , o MME informou que a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) determinou que os parâmetros para a definição da taxa de desconto considerada no processo de capitalização da Eletrobras deveriam ser os mesmos utilizados no âmbito do processo de privatização da empresa CEEE-G.

195. É que, conforme especificado na Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144, p. 16) , a STN considera que os parâmetros utilizados no âmbito da privatização da CEEE-G poderiam ser ' (...) os parâmetros balizadores de cálculo da taxa de desconto de referência para concessões do setor de geração de energia elétrica de maneira geral, sem considerar os leilões específicos mencionados pela Secretaria Executiva do MME. A referida taxa serve para auxiliar, em conjunto com outras ferramentas, na determinação do preço teto das tarifas ou valor mínimo da outorga de referência a ser paga para o poder concedente nos leilões do setor'.

196. Seguindo a diretriz estabelecida pela STN, o MME iniciou o processo de definição do Custo Médio Ponderado de Capital a partir de três valores, que servem de base para a remuneração do capital que financia as concessões de geração de energia elétrica, a saber (peça 144, p. 16) : 5,44% para o percentil 50 das concessões, 6,38% para o percentil 69 e 7,31% para ao percentil 84.

197. Adicionalmente, o Ministério da Economia (ME) conferiu ao MME o poder para decidir qual dessas taxas seria a mais apropriada para descontar o fluxo de caixa operacional estimado para os novos contratos de concessão de geração de energia elétrica a serem celebrados entre a União e a Eletrobras, observando-se os fatores, inclusive os associados à conjuntura econômica, que exercem influência sobre o nível de incerteza relacionado à privatização.

198. Nessa linha de diretrizes e raciocínio, o MME definiu a taxa de retorno requerida pelo capital que financia a Eletrobras em 7,31% (peça 144, p. 16) .

199. Os motivos expressos pelo MME para justificar sua decisão referem-se, principalmente, ao fato de que os novos contratos incorporarão o risco hidrológico, que será suportado pela Eletrobras, e à constatação de que a Taxa Regulatória de Remuneração do Capital, calculada pela Aneel, nos termos do Submódulo 12.3 do PRORET, é de 6,76% para as usinas cotistas, conforme consta do normativo da Agência.

200. O MME também argumentou que, após a privatização, as usinas descotizadas da Eletrobras ficarão descontratadas e, assim, assumirão a volatilidade dos preços de mercado, tendo em vista que sua energia será vendida por meio de contratos a serem firmados no Ambiente de Contratação Regulado (ACR) ou no Ambiente de Contratação Livre (ACL) , o que não ocorre nos contratos, atualmente vigentes, que asseguram a comercialização de suas cotas de garantia física com as distribuidoras de energia elétrica por preços previamente fixados (peça 144, p. 17) .

201. Por fim, o MME defende a utilização de WACC mais alto para descontar os fluxos de caixa operacionais dos novos contratos com base em alterações estruturais vivenciadas pelo setor elétrico, tais como (peça 144, p. 17) :

a) maior competição entre as diferentes fontes de geração de energia, com a inclusão na matriz energética, por exemplo, de usinas eólicas e de solares fotovoltaicas;

b) redução da capacidade de regularização dos reservatórios das UHEs; e

c) mudanças nas condições hidrológicas do país, que resultam em períodos de escassez hídrica.

202. As notas técnicas e as diretrizes expedidas pela Secretaria do Tesouro Nacional para a definição do Custo Médio Ponderado de Capital a ser utilizado na privatização da Eletrobras basearam-se no documento intitulado Metodologia do Cálculo do WACC (peça 212) , elaborado pelo Ministério da Economia.

203. O documento tem por objetivo delinear diretrizes metodológicas propositivas para estimativas de taxas de desconto a serem utilizadas nos cálculos de valoração do benefício econômico vinculado à concessão de ativos de infraestrutura do governo federal à iniciativa privada, incluindo as concessões de geração de energia elétrica.

204. A metodologia lança mão das melhores práticas de finanças e das definições e conceitos consagrados pelos trabalhos acadêmicos de Miller e Modigliani (1958 e 1963) , Sharpe (1964) e Lintner (1965) .

205. Especificamente, a metodologia estipula que o WACC, nos termos dos trabalhos de Miller e Modigliani, seja determinado pela seguinte expressão (peça 212, p. 6) :

206. Na expressão 1, D é o valor da dívida financeira, E é o valor do capital próprio, é a taxa marginal de imposto, é custo da dívida e é o custo do capital próprio.

207. A expressão 1 busca definir a taxa de retorno requerida para descontar o fluxo de caixa operacional gerado pelos ativos operacionais da firma, tendo em vista a estrutura de financiamento adotada para financiamento desses ativos.

208. A primeira parcela da expressão 1 visa capturar os efeitos da chamada alavancagem da empresa, ou seja, o peso do seu endividamento no montante dos recursos mobilizados, sobre o custo total de capital. Como normalmente o custo da dívida financeira é menor do que o custo de capital próprio, as empresas têm incentivos para se endividar em razão do benefício tributário da dívida, apesar de esse endividamento causar aumento no custo de capital próprio porque os acionistas percebem riscos associados ao endividamento, como os de falência ou concordata.

209. Nesse sentido, os autores Miller e Modigliani concluíram que a vantagem do endividamento fica restrita ao benefício tributário, já que o aumento do endividamento, a custo mais baixo, acaba por incrementar o custo de capital próprio em razão da percepção de aumento de riscos por parte dos acionistas. Nesses termos, o impacto do endividamento no WACC fica limitado ao benefício tributário.

210. A segunda parcela da expressão 1 visa capturar os efeitos do custo de capital próprio sobre o WACC. O modelo mais utilizado na prática para a definição do custo de capital próprio é o Capital Asset Pricing Model (CAPM) , conforme desenvolvido por Sharpe e Lintner. A metodologia desenvolvida pelo Ministério da Economia apresenta a expressão que descreve esse modelo, nos seguintes termos (peça 212, p. 9) :

211. Na expressão 2, é o custo de capital próprio ou retorno esperado da ação, é retorno do ativo livre de risco, é o retorno histórico do ativo livre de risco, é a sensibilidade da ação ou cesta setorial de ações em relação ao mercado de ações, é o retorno esperado para a carteira de mercado e é risco país.

212. O principal mérito do CAPM é o fornecimento de uma ferramenta para analisar a relação entre riscos e taxas de retorno.

213. De forma resumida, o CAPM demonstra que, para migrar de um investimento livre de risco () para investimentos em ações, o investidor exige, cobra, um prêmio acima da taxa de retorno histórica do ativo livre de risco () e assume, suporta, o risco de oscilação do preço da ação em que escolhe investir em relação aos movimentos do mercado como um todo, representado por uma carteira teórica de mercado, como, por exemplo, o Ibovespa, no Brasil, e o S&P500, nos Estados Unidos da América.

214. O modelo, assim, demonstra que o processo de migração de um investimento sem risco para ativos de risco pressupõe a expectativa de auferimento de taxas de retorno superiores.

215. A metodologia desenvolvida pelo Ministério da Economia adotou os títulos de dez anos do Tesouro norte-americano como proxy de um ativo sem risco. Para o cálculo do risco de mercado, a metodologia utilizou a média histórica da diferença entre a taxa de retorno mensal da carteira de ações representadas pelo S&P500 e a taxa livre de risco num período de cinco anos.

216. Para o cálculo da volatilidade da ação ou da cesta de ações setorial em relação ao mercado, o estudo do Ministério da Economia valeu-se da base pública de dados do sítio na Internet do professor Aswath Damodaran sobre diversos setores da economia, como de transporte aéreo, ferrovias, portos, rodovias e energia elétrica. Os betas desses setores são calculados a partir de regressões dos retornos das ações contra o retorno do índice de mercado em que são negociados, utilizando dados semanais, acumulados em períodos de dois a cinco anos. O estudo, assim, adotou uma amostra global de betas.

217. Apesar de a adoção de uma amostra global de betas não representar condenação da metodologia adotada pelo Ministério da Economia, percebe-se que a expressão 2 acima explicitamente demonstra que a volatilidade da ação ou cesta de ações deve ser extraída do mercado de capitais em que a ação ou cesta é negociada. Ao utilizar o S&P500 e os títulos do Tesouro norte-americano para estimar o risco de mercado, o estudo adotou o mercado de capitais norte-americano como parâmetro para o cálculo das volatilidades das ações ou das cestas de ações.

218. Ao incorporar à metodologia uma amostra global de betas, a premissa de que a volatilidade das ações ou cesta de ações seja obtida ou extraída do mesmo mercado em que são negociadas não é observada.

219. Entretanto, o submódulo 12.3 do Proret - Custo de Capital de Geração (peça 213, p. 4) , publicada pela Aneel, adotou, também para o cálculo do beta, empresas de energia negociadas exclusivamente no mercado norte-americano, o que corrige a heterodoxia do procedimento na metodologia desenvolvida pelo Ministério da Economia.

220. De toda forma, como a metodologia visa à obtenção de estimativa de taxas de retornos requeridas e que modelos de precificação de ativos, como o CAPM, não são normativos, podem ser buscadas e observadas balizas para verificar se os números produzidos utilizados na privatização da Eletrobras, aparentemente, são coerentes e razoáveis tendo em vista que a premissa da estrita relação entre o beta () e o risco de mercado foi preservada pela metodologia adotada pela Aneel.

221. Para o cômputo do risco país, a metodologia optou pela utilização do spread, diferencial de rentabilidade, entre o Credit Default Swap (CDS) , derivativos de crédito utilizados no mercado, e uma carteira teórica de títulos em relação ao rendimento dos títulos do Tesouro norte-americano (peça 212, p. 20) .

222. A não adoção do Emerging Markets Bond Index Plus (EMBI+) Brasil para o cálculo estimativo do risco país, segundo a metodologia do Ministério da Economia, deve-se à sua mais baixa liquidez em comparação com o CDS (peça 212, p. 20) .

223. Constata-se, no cálculo do risco país, que o estudo mantém a coerência de comparar rentabilidades de títulos negociados dentro do mercado norte-americano com as rentabilidades dos títulos do Tesouro norte-americano, o que não foi observado nas estimativas dos betas.

224. Por fim, o WACC adotado pela Aneel, a partir da metodologia, com ajustes, desenvolvida pelo Ministério da Economia, é deflacionado pela taxa de inflação média anual dos EUA, obtendo-se uma taxa de desconto real (peça 213, p. 8) .

225. A resumida excursão sobre o modelo CAPM tem o intuito de embasar a razoabilidade da argumentação apresentada no item 5.2.6 da Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144) de que os novos contratos de concessão de energia impõem a assunção de riscos adicionais à Eletrobras, tais como o risco hidrológico e o de comercialização da energia no Ambiente de Comercialização Livre (ACL) e no Ambiente de Comercialização Regulado (ACR) .

226. Em contrapartida, esses mesmos contratos oferecem a oportunidade de a empresa obter preços consideravelmente mais altos do que as tarifas que são praticadas atualmente no regime de cotas, ou seja, possibilitam a obtenção de maiores retornos, conforme a premissa do modelo CAPM de que o investidor requer maiores taxas de retorno para assumir maiores riscos.

227. Considerando que o Proret Submódulo 12.3 fixou a Taxa Regulatória de Remuneração do Capital (Média Ponderada) , depois de impostos, em 6,76% para a geração de energia elétrica, no regime de cotas, é aderente ao modelo CAPM que se estime um WACC superior a esse número para operações de geração de energia elétrica fora do regime de cotas pelas razões acima apresentadas e discutidas.

228. Com o intuito de balizar a estimativa de WACC de 7,31% adotada pelo MME e expressa no item 5.2.6 da Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144) , foi consultado o sítio na Internet do professor Aswath Damodaran que apresenta os Custos Médios Ponderados de Capital de diversos setores da economia.

229. Especificamente, foram consultados aqueles referentes aos setores e empresas que operam em mercados e economias considerados emergentes, como é o caso do Brasil (http://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/New_Home_Page/datafile/wacc.html) .

230. Para o setor de energia (Coal & Related Energy) , o sítio oferece a estimativa de WACC de 8,14% e para todas as indústrias/setores de 9,52%, ambas acima da estimativa de 7,31% proposta pela Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144) .

231. Assim, constata-se que o WACC de 7,31% se encontra dentro de balizas de razoabilidade.

V.2.3.2 GSF - Risco hidrológico (hedge)

232. Conforme visto anteriormente, no âmbito da análise dos preços da energia utilizados na projeção dos fluxos de caixa que serão gerados pelos novos contratos a serem celebrados nos termos do art. 2º da Lei 14.182/2021, um dos fatores que influenciam os preços da energia é o chamado risco hidrológico, que, de forma sintética, consiste nas implicações resultantes de situações em que as usinas hidrelétricas não geram energia suficiente para honrar seus contratos, por fatores fora da esfera de gestão das concessionárias, a exemplo das condições de hidrologia desfavorável.

233. O fator de medição do risco hidrológico se dá por meio do denominado Generation Scaling Factor (GSF) , que representa a relação entre o total gerado pelas usinas hidrelétricas e a garantia física total dessas usinas (o quanto elas são capazes de gerar, dado um critério de suprimento) .

234. A depender da variação na geração de energia hidrelétrica, os geradores podem ficar descobertos em seus contratos de venda de energia, sendo obrigados a comprar energia no Mercado de Curto Prazo (MCP) , no qual são contabilizadas as diferenças entre a energia contratada e o volume que realmente foi gerado ou consumido. Esse déficit ou superávit de geração é valorado ao que se chama de Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) , definido no Glossário de Termos da CCEE [Câmara de Comercialização de Energia Elétrica] (https://www.ccee.org.br/portal/wcm/idc/groups/bibpublic_procedimentos/documents/conteudoccee/ccee_031171.pdf) como o preço calculado antecipadamente, com periodicidade máxima semanal e com base no Custo Marginal de Operação (CMO) , limitado por preços mínimo e máximo, vigente para cada período de apuração e para cada submercado.

235. Como a matriz elétrica brasileira é, em grande parte, formada por geração hidrelétrica, em períodos secos, quando a relação do GSF é menor do que um, a energia se torna escassa no mercado, e o PLD tende a ser mais alto do que os valores efetivamente vendidos por esses geradores, imputando em ônus financeiro. Em sentido oposto, quando o GSF é maior do que 1, as sobras de energia gerada pelas usinas também são liquidadas sob a mesma sistemática, mas em um cenário de abundância, em que o PLD tende a ser mais baixo que os valores efetivamente vendidos por esses geradores.

236. Desse modo, tendo em vista as variações de hidrologia nas diferentes regiões do país onde estão instaladas as usinas hidrelétricas, o que implica riscos representados por GSF menores ou maiores do que 1, a Lei 9.648/1998, regulamentada pelo Decreto 2.655/1998, instituiu o Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) para mitigação do risco hidrológico.

237. O MRE contempla as usinas hidrelétricas que estão sujeitas ao despacho centralizado do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) , mas sua adesão é facultada também às hidrelétricas de menor porte. Atualmente, segundo dados do relatório InfoMercado, publicado pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) , cerca de 98,4% da garantia física total do parque hidrelétrico é de usinas hidrelétricas participantes do MRE (https://www.ccee. org.br/portal/faces/pages_publico/o-que-fazemos/infomercado?_adf.ctrl-state=mbpznkqhx_188&co ntentId%3DCCEE_661206%26=&_afrLoop=XXXXX46286388933#!) .

238. Ocorre que, conforme mencionado na Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144) , mesmo considerando a garantia física total do MRE, o histórico dos resultados da geração desde 2001 registram a ocorrência de GSF menor do que 1 em doze dos vinte anos analisados (60%) , motivo pelo qual normalmente se entende necessária, nas modelagens realizadas para empreendimentos hidrelétricos, a previsão de um hedge relacionado a um percentual da garantia física que possivelmente não será vendido pelas usinas, como mecanismo de proteção das variações hidrológicas.

239. Portanto, na projeção dos fluxos de caixa, o hedge entra como um fator de abatimento da energia assegurada (garantia física após as perdas técnicas) previstas pelos novos contratos, de forma a estimar a energia comercializável líquida anual, que, multiplicada pelo preço de energia estimado para o período, gera a receita bruta anual.

240. Nesse contexto, considerando os recorrentes períodos de hidrologia desfavorável nos últimos anos, e a influência dos preços de curto prazo sobre a metodologia de precificação da energia adotada na modelagem econômico-financeira, o MME optou ainda por não considerar constante o hedge definido pela expressão '1-GSF', principalmente tendo em vista o atual momento de escassez hídrica aguda (peça 144, p. 17-18) .

241. A definição do hedge observou, portanto, para os primeiros quatro anos da modelagem, de 2022 a 2025, a média do fator de risco hidrológico dos quatro últimos anos do histórico, de 2017 a 2020, tendo em vista que se imagina que os preços a serem refletidos nesse período da projeção ainda sofrerão influência do período mais recente de menor disponibilidade de geração hídrica, com um GSF menor.

242. Para o período de projeção entre 2028 e 2051, o MME optou por empregar a média do histórico do risco hidrológico do período de 2001 a 2020 por acreditar, na linha da metodologia aplicada para a elaboração do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) , na tendência de sua estabilização.

243. Para os períodos intermediários das projeções, 2026 e 2027, o MME adotou os pontos médios para os riscos hidrológicos dos períodos de XXXXX-2025 e de XXXXX-2051. Dessa forma, a Tabela 9 resume o hedge a ser adotado, considerando o risco hidrológico (GSF) , utilizado nas projeções dos fluxos de caixa dos novos contratos a serem celebrados sob a égide do art. 2º da Lei 14.182/2021.

Tabela 9 - Hedge (1-GSF) utilizado na modelagem da Eletrobras

Período

Hedge (1 - GSF)

2022 - 2025

19,5%

2026

14,7%

2027

10,0%

2028 - 2051

5,2%

Fonte: Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144, p. 18)

244. Em relação aos valores projetados para risco hidrológico, nota-se inicialmente que o MME pressupõe uma melhora gradual e um ajuste do GSF a valores medianos verificados no passado, como se apresenta na Figura 3 abaixo.

Figura 3 - Risco hidrológico histórico e projetado

Fonte: Elaboração própria a partir das informações contidas na peça 144, p. 18.

245. Considerando as causas conjunturais que influenciam o GSF, é razoável admitir que a curva do risco hidrológico retorne a parâmetros normalizados no longo prazo, não só pela variação hidrológica usual, mas pelo ajuste periódico das garantias físicas das usinas hidrelétricas, com o objetivo de tornar a sua capacidade de suprimento mais aderente à realidade. Ressalta-se que, no presente caso, as garantias físicas das usinas contempladas na Lei 14.182/2021 sofrerão uma redução de 7,3%, conforme exposto na Tabela 6 desta instrução.

246. Todavia, considerando as mudanças estruturais, tais como mudanças climáticas que reduzam de forma irreversível a afluência média nas bacias hidrográficas brasileiras, a inserção de fontes de base na matriz elétrica - capazes de deslocar a curva de geração hídrica - e o aumento gradativo da geração distribuída com a consequente redução de demanda, é possível que haja um aumento do risco hidrológico no longo prazo, o que tende a impactar o potencial gerador de receitas dessas usinas.

247. Uma das consequências de valores reduzidos de GSF, como já mencionado, é a elevação dos preços no MCP, tendo em vista a grande participação de hidrelétricas na matriz elétrica brasileira e a dependência dessa fonte energética para o atendimento do consumo. Na falta de geração hidrelétrica, são despachadas outras fontes mais caras.

248. Não obstante, a projeção de preços de energia elétrica na modelagem econômico-financeira apresentada, conforme tratado no tópico V.2.2 desta instrução, considera o atingimento do equilíbrio estrutural do sistema no longo prazo, em que os preços tendem a se situar mais próximos do custo associado ao despacho da geração hidráulica. Ou seja, em situações em que o GSF se mostra mais próximo de patamares médios.

249. Desse modo, por coerência metodológica, são desnecessários ajustes relacionados ao risco hidrológico adotado na modelagem econômico-financeira apresentada.

V.2.4 GAG O&M, GAG MELHORIAS E CAIMI

250. O Custo da Gestão dos Ativos de Geração (GAG) incorpora os custos de operação manutenção, administração, remuneração e amortização, incluindo custos socioambientais e relativos a demandas da Administração Pública, sendo que, especificamente, a GAG O&M contempla os custos operacionais regulatórios, a GAG Melhorias abrange os custos de capital por investimentos em melhorias e o Custo Anual das Instalações Móveis e Imóveis (CAIMI) comporta o custo anual de instalações móveis e imóveis.

251. Na modelagem proposta pelo MME, o VAC é obtido pela diferença de receita das usinas sob o novo contrato de concessão (na forma de PIE) e sob o modelo vigente (cotas) . Ou seja, a receita auferida pela venda de energia no ambiente de contratação livre (ACL) é abatida da GAG e da CAIMI associada às UHEs no âmbito do fluxo de caixa, de modo a se obter o valor adicionado pelos novos contratos.

252. A metodologia para definição e cálculo do GAG e do CAIMI é apresentada no Módulo 12: Concessionárias de Geração, Submódulo 12.1 - Revisão Periódica da Receita Anual de Geração das Usinas Cotistas, dos Procedimentos de Regulação Tarifária - Proret. Todos os conceitos apresentados nesse subtópico têm origem nesse normativo.

253. Especificamente, melhorias (GAG Melhorias) compreendem a instalação, substituição ou reforma de equipamento em instalação de geração existente, ou a adequação dessa instalação, visando manter a prestação de serviço adequado de geração de energia elétrica, conforme dispõe a Lei 8.987/1995.

254. Para a definição dos custos operacionais regulatórios (GAG O&M) , a metodologia adota como variável de insumo os custos operacionais reais da concessionária obtidos dos seus registros contábeis, que são elaborados de acordo com o que dispõe o Manual de Contabilidade do Setor Elétrico (MCSE) .

255. O elenco de contas para o cálculo desses custos operacionais da geração compreende despesas com pessoal, administradores, materiais, serviços de terceiros, seguros, tributos e outros custos e despesas operacionais.

256. A partir da coleta dessas variáveis de insumo, os custos operacionais regulatórios, relativos a cada usina hidrelétrica, são definidos pela seguinte expressão:

257. Em que DESPACHO representa o valor equivalente a 0,3028 para as usinas que tenham despacho centralizado pelo ONS e valor equivalente a 0 para aquelas que não tenham despacho centralizado pelo ONS; CI equivale à Capacidade Instalada em Operação (MW) ; ÁREA equivale à Área do Reservatório em km2; e UG equivale a Número de Unidade Geradoras.

258. A GAG Melhorias (GAGMelh) , por seu turno, é definida por meio de parametrização de variáveis explicativas da necessidade de investimentos em melhorias durante o período de concessão. São compreendidos, nesse montante, a troca de todos os equipamentos hidro e eletromecânicos, e custos de natureza contábil de investimentos relativos a dispêndios socioambientais e de demandas da Administração Pública até o fim da concessão.

259. Nesse caso, também são utilizados como dados de entrada da parametrização rubricas contábeis que compõem o Manual de Contabilidade do Setor Elétrico (MCSE) , conforme descrito na Tabela 2, na página 10, do Módulo 12: Concessionárias de Geração, Submódulo 12.1 - Revisão Periódica da Receita Anual de Geração das Usinas Cotistas, dos Procedimentos de Regulação Tarifária - Proret (http://www2.aneel.gov.br/cedoc/aren2020882_Proret_Submod_12_1_v2.pdf) .

260. Os custos de capital por investimentos em melhorias para cada usina hidrelétrica são definidos com base na expressão abaixo:

261. O FatorAnualização é o que depende do número de unidades geradoras do período restante do contrato de concessão; CI equivale à Capacidade Instalada em Operação (MW) ; UG equivale ao Número de Unidades Geradoras; e RemuneraçãoAnterior equivale a um quinto da remuneração por investimentos em melhorias recebidas no ciclo anterior de vigência da Receita Anual de Geração (RAG) , corrigido pelo índice de preços IPCA.

262. Os fluxos de investimentos considerados para o cálculo do FatorAnualização são relativos à média dos cenários de máxima antecipação de investimentos e de máxima postergação de investimentos.

263. O CAIMI, por fim, consiste em investimentos de curto período de recuperação e é composto pelos grupamentos de contas do intangível, terrenos, edificações, máquinas e equipamentos, veículos, móveis e utensílios e aluguéis, conforme definido no Módulo 12: Concessionárias de Geração, Submódulo 12.1 - Revisão Periódica da Receita Anual de Geração das Usinas Cotistas, dos Procedimentos de Regulação Tarifária (Proret) . Nesse caso, as rubricas contábeis determinadas pelo Manual de Contabilidade do Setor Elétrico (MCSE) também são utilizadas como variáveis de entrada da expressão abaixo apresentada:

264. Em que BARa é o montante da base de anuidade regulatória referente aos investimentos considerados para infraestrutura de imóveis de uso administrativo; BARv é o montante da base de anuidade regulatória referente aos investimentos em veículos; e BARi é o montante da base de anuidade regulatória referente aos investimentos em sistemas de informática. Os imóveis de uso administrativo têm um peso de 90%, os veículos representam 3% e os sistemas, 7%.

265. Assim, o Custo Anual das Instalações Móveis e Imóveis (CAIMI) refere-se à anualização dos investimentos considerados como BAR, conforme a expressão a seguir apresentada:

266. Em que o CAL é o Custo Anual de Aluguéis; o CAV é o custo anual das Instalações de Veículos; e CAI é o Custo Anual de Sistema de Informática.

267. O CAIMI aplicado às usinas do regime de cotas de garantia física é de R$ 9,749/kW, na data-base de julho de 2017, anualmente atualizado pelo IPCA, limitado em piso de R$ 42.000,00.

268. O MME submeteu à equipe de inspeção do Tribunal as planilhas com os dados utilizados na parametrização acima descrita para a definição da GAG Melhorias, GAG O&M e CAIMI. Não foram detectadas inconsistências nos cálculos contidos nas planilhas eletrônicas (peças 143 e 199) .

269. Assim, o MME, por meio da Nota Técnica 46/2021/ASSEC (peça 144) , item 5.2.6, publicou os valores de GAG e CAIMI utilizados nos fluxos de caixa projetados para a definição do valor adicionado dos novos contratos de que trata o art. 2º da Lei 14.182/2021.

V.2.5 Dos impactos da possível aprovação da reforma tributária sobre o valor do bônus de outorga

270. A reforma tributária atualmente em discussão está consubstanciada no âmbito dos Projetos de Lei 2.337/2021 e 3.887/2020.

271. O Projeto de Lei 2.337/2021, já aprovado pela Câmara dos Deputados, em seu Capítulo III, Seção I, estabelece novas alíquotas para o IRPJ, por meio da alteração da Lei 9.249/1995, nos seguintes termos:

Art. 6º A Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, passa a vigorar com as seguintes alterações, produzindo efeitos a partir da instituição de adicional de 1,5% (um inteiro e cinco décimos por cento) da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) , na forma do § 2º-A do art. da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, incidente sobre as operações relativas a ferro, cobre, bauxita, ouro, manganês, caulim, níquel, nióbio e lítio:

'Art. 3º A alíquota do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza das pessoas jurídicas é de 8% (oito por cento) .

............................................' (NR)

272. Atualmente, a alíquota do IRPJ é de 15%. Assim, caso o Projeto de Lei 2.337/2021 seja aprovado, haverá redução de 7 p.p. na alíquota de IRPJ. Considerando que não há previsão de alteração da alíquota adicional de 10% de IRPJ quando a base de cálculo ultrapassar R$ 20.000,00, a alíquota total de IRPJ, no caso de empresas de grande porte, como a Eletrobras, poderá diminuir de 25% para 18%.

273. O Projeto de Lei 2.337/2021 também prevê alteração nas alíquotas da CSLL, nos seguintes termos:

Art. 7º A Lei nº 7.689, de 15 de dezembro de 1988, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 3º-A, produzindo efeitos a partir da revogação dos benefícios fiscais previstos na Lei nº 10.312, de 27 de novembro de 2001, no § 3º do art. 2º da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, no § 3º do art. 2º da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, e no § 11 do art. da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004, nos termos dos incisos XII e XIII e da alínea a dos incisos XIV e XV do caput do art. 68 desta Lei:

Art. 3º-A As alíquotas previstas nos incisos I, II-A e III do caput do art. 3º desta Lei ficam reduzidas em 0,5% (cinco décimos por cento) .

274. A alíquota total da CSLL, atualmente, é de 9%. Considerando a previsão de decréscimo de 0,5% das duas alíquotas previstas no art. 3º da Lei 7.689/1988, a CSLL poderá ser reduzida para 8%. Portanto, o conjunto de IRPJ e CSLL poderá ter sua alíquota combinada reduzida de 34% para 26%.

275. Já o Projeto de Lei 3.887/2020, ainda pendente de apreciação pela Câmara dos Deputados, prevê que as operações com bens e serviços sejam oneradas pela CBS com a alíquota uniforme de 12%. A CBS irá substituir o PIS/Cofins, cuja alíquota é da ordem 9,25% para empresas do porte da Eletrobras. Embora, aparentemente, a introdução da CBS represente um aumento de tributação, pois haveria acréscimo de 2,75% de alíquota, o fato de a base de cálculo e a forma de cálculo desses tributos ser diferente pode não materializar esse aumento de carga tributária.

276. É que o Projeto de Lei 3.887/2020 prevê que o ICMS e o ISS destacados em nota fiscal não farão parte da base de cálculo da CBS, ao contrário do que ocorre com o PIS/Confins, ou seja, há a eliminação de cálculo de tributos sobre tributos, conforme explicitado na exposição de motivos que acompanhou o projeto:

7. Além do alinhamento da CBS a um tributo sobre valor adicionado de base ampla, a não cumulatividade será plena, garantindo neutralidade da tributação na organização da atividade econômica. Todo e qualquer crédito vinculado à atividade empresarial poderá ser descontado da CBS devida e os créditos acumulados serão devolvidos.

7.1. A implementação inicial do regime de apuração não cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins no começo dos anos 2000 não foi suficiente para evitar a tributação em cascata, pois várias limitações foram impostas e, em razão delas, diversas complexidades surgiram. Dada essa experiência, a CBS terá sua não cumulatividade operacionalizada da forma simples: o tributo incidente nas etapas anteriores e destacado no documento fiscal permitirá o creditamento para abatimento das contribuições incidentes nas etapas posteriores.

277. Independentemente da implementação futura da sistemática de cálculo da CBS, realizaram-se simulações na planilha de cálculo do Valor Adicionado (peças 143 e 199) a respeito dos impactos dos dois projetos de lei na modelagem econômico-financeira adotada para o valor de outorga das novas concessões.

278. Considerando-se apenas a alteração da alíquota conjunta do IRPJ e da CSLL de 34% para 26%, o valor adicionado dos contratos subiria de R$ 62,5 bilhões para R$ 65,5 bilhões, e o bônus de outorga de R$ 23,2 bilhões para R$ 24,7 bilhões, um acréscimo da ordem R$ 1,5 bilhão.

279. Caso se adotasse, concomitantemente com a diminuição nas alíquotas de IRPJ e CSLL, a premissa de que a adoção da CBS em substituição ao PIS/Confins elevaria a carga tributária de 9,25% para 12%, o que não se pode afirmar com certeza tendo em vista as diferentes formas de cálculo das duas contribuições, o valor adicionado dos contratos ainda se elevaria de R$ 62,5 bilhões para R$ 63,9 bilhões, e o bônus de outorga de R$ 23,2 bilhões para R$ 23,9 bilhões, um incremento de R$ 700 milhões.

280. Nessa última simulação, considera-se que a introdução da CBS teria o efeito de aumentar a carga tributária simplesmente pelo fato de a sua alíquota ser superior à do PIS/Cofins, o que pode não ser verdade tendo em vista que a não cumulatividade da CBS pode vir a compensar as diferenças entre as duas alíquotas e anular qualquer acréscimo tributário.

281. Conforme acima explicitado, a modelagem econômico-financeira para a determinação do bônus de outorga das usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021 envolveu 94% da capacidade de criação de receita de geração de energia elétrica da Eletrobras, que será privatizada.

282. Ademais, a privatização da Eletrobras transferirá para a iniciativa privada os demais ativos operacionais da empresa como os de transmissão, que são da ordem de R$ 50 bilhões, e os de investimentos em participações societárias, incluindo aquelas em sociedades de propósito específico (SPEs) , da ordem de R$ 29 bilhões, conforme o balanço patrimonial publicado na data-base de 31/12/2020.

283. Nesses termos, convém que os benefícios financeiros oriundos das reduções de alíquotas dos tributos, no caso de aprovação da reforma tributária antes da realização da oferta pública de ações, sejam capturados pela União, via bônus de outorga, tendo em vista os benefícios fiscais oriundos dos demais ativos da empresa serão capturados pelos preços das ações da Eletrobras.

284. Ainda considerando-se tratar de outorga de contratos de concessão com horizonte de longo prazo (trinta anos) e que há tendência de aprovação da reforma tributária em um horizonte de curto prazo, mesmo que após a realização da oferta pública de ações, pode ser o caso de os contratos de concessão preverem a possibilidade de compartilhamento dos benefícios tributários resultantes.

285. Assim, será proposta recomendação ao MME para que, caso os Projetos de Lei 2.337/2021 e/ou 3.887/2020 sejam sancionados antes da data fixada para a realização da oferta pública de ações da Eletrobras, os benefícios tributários decorrentes da nova legislação sejam incorporados ao valor adicionado dos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021.

286. Também se entende pertinente propor que o MME avalie a conveniência e a oportunidade de incluir, nos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021, cláusula de compartilhamento dos benefícios tributários advindos da sanção da reforma tributária aos seus valores adicionados.

VI. Da necessidade de ajustes na modelagem econômico-financeira adotada para o cálculo do valor de outorga das novas concessões

287. Analisando a planilha de cálculo do VAC (peça 147) , foi identificada a necessidade de ajustes nas fórmulas de algumas células, por não seguirem as premissas adotadas pelo MME.

288. O primeiro se refere ao cálculo do hedge para as empresas Furnas, Eletronorte e Chesf. Como relatado acima, a Nota Técnica 46/2021-ASSEC definiu percentuais decrescentes de GSF, em uma redução escalonada entre 19,5% (2022 a 2025) até 5,2% (a partir de 2028) . Entretanto, para essas três subsidiárias, foi utilizado 5,2% para todos os anos.

289. O segundo se refere ao cálculo da receita de venda de energia no ACL. Como apresentado acima, o custo da energia foi definido como uma curva decrescente entre o valor previsto pela Dcide (R$ 240,07/MWh) e o CME (R$ 159,71/MWh) . Contudo, para os cálculos de receita da Chesf, Sobradinho e Itumbiara, a planilha adota um único valor por todo o período da nova concessão, não seguindo o escalonamento proposto originalmente. No caso da Chesf foi adotado apenas o menor valor, enquanto para as duas UHEs apenas o maior.

290. O terceiro ajuste necessário ocorreu no cálculo da TFSEE da Chesf para o ano de 2023. Essa taxa de fiscalização incide apenas sobre a energia não cotizada. Entretanto, especificamente para esse caso, o MME desconsiderou o percentual de 80% de energia cotizada.

291. O último ajuste, por fim, se refere ao EUSTD Chesf. A Aneel, em seu Ofício 199/2021 determinou valores distintos e crescentes desses encargos ao longo dos anos da nova concessão. Não obstante, o cálculo efetuado para a Chesf não utilizou os valores de XXXXX-2026 em diante, empregando os dados de XXXXX-2025 para todos os anos seguintes.

292. Essas inconsistências foram informadas ao MME, que, após avaliação interna, confirmou que eram, de fato, erros de elaboração da planilha.

293. Por meio do Ofício 424/2021/SE (peça 197) , o MME informou que retificou os erros apontados pela equipe de inspeção. Ademais, o Ministério identificou que, por conta da correção relacionada ao hedge, também foi necessário alterar o impacto advindo da obrigação do PISF. Por fim, informou que corrigiu dois erros nas casas decimais das garantias físicas das UHE Funil e UHE Pedra.

294. Além das correções dos erros, o MME informou que incorporou no modelo a extensão de prazo relacionada à repactuação do risco hidrológico das outorgas das UHEs Tucuruí (518 dias) , Mascarenhas de Moraes (366 dias) e Itumbiara (2.555 dias) , as quais foram homologadas pela Aneel por meio da Resolução 2.932, de 14/9/2021.

295. Em razão da extensão de prazo da UHE Tucuruí, foi necessário recalcular o Valor Novo de Reposição (VNR) dessa usina. Para isso, o MME solicitou à Aneel a estimativa do valor de depreciação acumulada da UHE Tucuruí, mas essa informação ainda não tinha sido disponibilizada ao Ministério na data do Ofício, de modo que o MME aguarda essa informação para atualizar o modelo.

296. A planilha com as correções elencadas acima foi apresentada pelo MME na peça 199, entretanto, não foi encaminhada nova Resolução CNPE com os valores corrigidos.

297. Nesse sentido, seria cabível propor determinação ao MME para que corrigisse os erros apontados. Entretanto, considerando que o Ministério já se comprometeu formalmente a ajustar os valores envolvidos, deixa-se de propor a determinação, em consonância com o art. 16, parágrafo único, inciso I, da Resolução-TCU 315/2020.

298. As alterações promovidas, em especial a extensão de prazo relacionada à repactuação do risco hidrológico, reduziram a estimativa de Valor Adicionado aos Contratos. Como pode-se observar na planilha encaminhada pelo Ministério (peça 199) , os novos valores propostos seriam:

a) VAC: R$ 56.860.677.918,77;

b) CDE: R$ 26.977.089.685,88; e

c) Bônus de outorga: R$ 20.344.200.523,26.

299. Contudo, como detalhado no tópico V.2.2 desta instrução, verificou-se que o valor adotado pela EPE para a venda de energia de longo prazo (R$ 155,00/MWh) é incoerente, pois: i) desconsiderou completamente a componente de potência e seu potencial de receita futura por meio da venda de lastro de capacidade; ii) está subestimado em relação a vários outros parâmetros identificados; iii) não retirou valores discrepantes da média de longo prazo para estimar a premissa. Concluiu-se, assim, pela incoerência e inadequação da premissa proposta pela Empresa de Pesquisa Energética para valoração do VAC dos novos contratos da Eletrobras.

300. Diante do exposto, propõe-se determinar ao MME que reavalie o preço de energia de longo prazo utilizado na metodologia de cálculo do VAC dos novos contratos da Eletrobras, adotando como premissa, no mínimo, o valor de R$ 172,14/MWh, referente ao CME-Energia de projeção mais distante publicado pela EPE na Nota Técnica EPE-DEE-NT-081/2021-r0.

301. Para fins de comparação com os valores ajustados apresentados acima, após a correção da premissa do valor de energia de longo prazo, mesmo que apenas pelo CME-Energia 2033, a nova modelagem implicará nos seguintes montantes, com acréscimos aproximados de R$ 10,6 bilhões no VAC; R$ 5,3 bilhões na CDE; e R$ 5,3 bilhões no bônus de outorga:

a) VAC: R$ 67.449.910.187,62;

b) CDE: R$ 32.271.705.820,31; e

c) Bônus de outorga: R$ 25.638.816.657,68.

VII. Dos impactos tarifários resultantes da nova outorga

302. Como já mencionado nesta instrução, a Lei 14.182/2021 estabeleceu uma série de premissas com o condão de impactar as tarifas de energia elétrica, como é o caso da mudança do regime de exploração das usinas hidrelétricas da Eletrobras (descotização) , prevista no art. 4º, inciso III, bem como das exigências de contratação de térmicas a gás natural, de PCHs e da prorrogação de contratos do Proinfa, previstas no art. 1º, § 1º.

303. A análise abordada nestes autos contempla tão somente os atos do Poder Concedente para estimar os impactos da descotização, uma vez que era a única disposição constante do texto original da MPV 1.031/2021 cujos impactos são resultantes diretamente das novas outorgas a serem concedidas. Vale dizer, as demais previsões legais acima apontadas foram instituídas mediante emendas parlamentares e são comandos legais paralelos ao da desestatização da Eletrobras, que não possuem relação com as novas outorgas.

304. Nesse contexto, buscou-se verificar a consistência da estimativa apresentada pelo Poder Concedente para os impactos resultantes da descotização e da fundamentação para a fixação dos valores a serem pagos à CDE, como medida de mitigação desses impactos.

305. Com relação aos impactos estimados, esta Unidade Técnica encaminhou o Ofício 67/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 95) solicitando ao MME informações e estudos sobre os impactos da descotização no que se refere: (i) ao eventual aumento tarifário pela perda dos contratos em regime de cotas; (ii) à possibilidade de migração de consumidores para o Ambiente de Contratação Livre (ACL) ; e (iii) às premissas para a estimativa do preço da energia, incluindo a precificação da assunção do risco hidrológico no contexto de escassez hídrica. Outrossim, solicitou-se também a fundamentação para a fixação dos valores a serem pagos à CDE.

306. Em resposta, o MME encaminhou a Nota Informativa 13/2021/ASSEC (peça 104) , em que teceu as seguintes considerações:

a) em relação ao eventual aumento tarifário, informou que o consumidor cativo se beneficiará da alteração do regime de exploração, uma vez que deixa de ser o responsável pelo custo do risco hidrológico e se beneficiará do direcionamento de recursos para a CDE;

b) no tocante à possibilidade de migração de consumidores para o ACL, alega que a descotização proporcionará liquidez de mercado e flexibilidade do portfólio das distribuidoras em resposta à ampliação do mercado livre; e

c) as premissas para a estimativa do preço da energia foram norteadas pela abordagem utilizada na modelagem de desestatização da Companhia Estadual de Geração e Transmissão de Energia Elétrica (CEEE-GT) .

307. Não foram apresentadas informações adicionais relativas à fundamentação para a fixação dos valores a serem direcionados à CDE.

308. Verifica-se, pelo teor das respostas apresentadas, que se restringem a alegações, não havendo estudos ou informações mais aprofundados capazes de auxiliar a avaliação da SeinfraElétrica a respeito da projeção de impactos que serão gerados com a descotização das usinas da Eletrobras, considerando ainda os aportes à CDE.

309. Não obstante, em resposta ao Requerimento de Informação 519/2020, proveniente da Câmara dos Deputados, o MME solicitou à Aneel, por meio do Ofício 193/2021/SE-MME (peça 211) , a estimativa de impactos da MPV 1.031/2021, considerando as seguintes premissas:

a) descotização das usinas em cinco anos;

b) estimativas de preços futuros para a energia de R$ 155,00, R$ 167,00 e R$ 200,00;

c) destinação do pagamento à CDE de 50% do VAC, conforme os seguintes fluxos de recebimentos para cada um dos preços mencionados acima, a saber:

Figura 4 - Cenários da curva de aportes à CDE 1

Fonte: peça 211 - Planilha.xlsx.

1 Os aportes projetados são lineares e constantes após o ano de 2029.

d) estimativa de novas garantias físicas com redução de 5,32% a 6,18%;

e) risco hidrológico de R$ 45,68/MWh, referente à média dos valores realizados no período de 2015 a 2020.

310. Em resposta à solicitação do MME, a Aneel encaminhou o Ofício 123/2021-DR/Aneel (peça 214) , em que disponibilizou simulador de impactos conforme as premissas estabelecidas pelo MME no Ofício 193/2021/SE-MME (peça 214, [74]-0528215_Planilha.xlsx) , cujos resultados são apresentados na Nota Informativa 10/2021/ASSEC (peça 215) e ilustrados na Figura 5.

Figura 5 - Cenários de impacto médio na tarifa Brasil

Fonte: Nota Informativa 10/2021/ASSEC (peça 215) .

311. No que tange aos aportes na CDE, a Nota Técnica 46/2021/ASSEC registra preocupação da Aneel quanto à pressão tarifária no ano de 2022, motivada, em suma, pelas seguintes causas de elevação tarifária: crise hídrica, câmbio e Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M) elevado (peça 144) .

312. A Agência informa ter adotado uma série de medidas administrativas, no ano de 2021, que teriam reduzido um aumento tarifário médio no ano, os quais saíram de patamares acima de 20% para valores próximos a 10%.

313. No entanto, a despeito desse esforço, as tarifas para 2022 continuariam pressionadas em virtude das causas mencionadas, motivo pelo que sugere a antecipação de R$ 5 bilhões dos recursos da desestatização da Eletrobras na forma de um aporte inicial no orçamento da CDE, que gerariam uma potencial redução média dos impactos tarifários em 2022 da ordem de 2,45%.

314. Nesse sentido, a Resolução CNPE 15/2021 fixou, em seu Anexo III (peça 166) , o seguinte cronograma de aportes na CDE, apontado na Tabela 10.

Tabela 10 - Cronograma de aportes na CDE

Data

Pagamento à CDE

Até 30 dias contados da assinatura dos novos contratos

R$ 5.000.000.000,00

2023

R$ 526.098.864,13

2024

R$ 1.052.197.728,26

2025

R$ 1.578.296.592,39

2026

R$ 2.104.395.456,52

2027

R$ 2.630.494.320,65

2028 - 2047

R$ 2.630.494.320,65

Fonte: Peça 166, p. 5

315. Pelas informações disponibilizadas pelo MME no bojo do Requerimento de Informação 519/2020, proveniente da Câmara dos Deputados, bem como em face das condições já estabelecidas na Resolução CNPE 15/2021, necessárias as seguintes ponderações a respeito dos impactos tarifários apresentados na Nota Informativa 10/2021/ASSEC (peça 215) :

a) a simulação desenvolvida pela Aneel considerou que o atual nível de sobrecontratação das distribuidoras, da ordem de 109,1% em fevereiro de 2021 (https://www.canal energia.com.br/noticias/53163935/sobrecontratacao-de-distribuidorasede-1091-na-media-aponta-ccee) , será compensado com a redução das garantias físicas das usinas cujas concessões serão renovadas. Ou seja, ao longo da descotização que ocorrerá no ritmo de 20% ao ano, durante cinco anos, a partir de 2023, assumiu-se que as distribuidoras devem recomprar 100% da energia descotizada;

b) a relação entre o risco hidrológico e o impacto tarifário resultante da descotização é inversamente proporcional, haja vista que, com a alteração do regime de exploração das usinas, o ônus passa a ser dos geradores;

c) a estimativa de impacto tarifário foi calculada com base na diferença gasta pelas distribuidoras com compra de energia no cenário de descotização em comparação com o cenário vigente, considerando o benefício anual da CDE e o risco hidrológico, conforme a Figura 6;

Figura 6 - Custo de energia das distribuidoras do Brasil no cenário vigente e descotizado

Fonte: Elaboração própria, com base na peça 214 - Planilha.xlsx.

d) o impacto tarifário resultante da descotização tende a ser neutro, haja vista, principalmente, a pouca representatividade da energia oriunda de usinas cotistas da Eletrobras no portfólio das distribuidoras (cerca de 15%) , de modo que, exclusivamente no presente caso, a tarifa média brasileira é pouco sensível às incertezas associadas ao risco hidrológico, preço de recompra e percentual de recompra;

e) um exemplo dessa pouca sensibilidade é que, mantidas constantes as demais variáveis e desconsiderado o benefício tarifário com os aportes na CDE (da ordem de R$ 2,6 bilhões ao ano) , o impacto tarifário resultante da descotização na tarifa média Brasil seria de 0,93% em vez de -0,25%; e

f) no caso dos preços de recompra da energia descotizada, se por um lado tendem a onerar a distribuidora, por outro, elevam os aportes que beneficiarão o ACR via CDE (a diferença de impacto tarifário entre um preço de recompra de R$ 200,00/MWh e R$ 155,00/MWh é cerca de 1%) .

316. Tecidas as considerações acima, entendem-se razoáveis as premissas adotadas pela Aneel e pelo MME no tocante à estimativa dos impactos tarifários decorrentes da descotização das usinas da Eletrobras. Portanto, uma vez que se espera neutralidade tarifária em razão dessa mudança no regime de exploração, não se verificam incentivos adicionais para a migração de consumidores cativos ao ACL, ao menos no curto prazo.

317. Vale repisar que não foram analisados, neste trabalho, os demais impactos decorrentes da aprovação da Lei 14.182/2021.

318. Por fim, verifica-se que o cronograma de aportes à CDE foi estabelecido com o objetivo de neutralizar os impactos de curto a longo prazo com a alteração do regime de exploração. A exceção foi o adiantamento de R$ 5 bilhões solicitado pela Aneel, cujo objetivo é minimizar os impactos tarifários decorrentes de outras causas (crise hídrica, câmbio e IGP-M elevado) . A adoção de soluções paliativas como a mencionada é objeto do TC Processo XXXXX/2021-6, que versa sobre Auditoria Operacional na Política Tarifária do Setor Elétrico.

VIII. Da utilização de recursos resultantes da nova outorga em políticas públicas, na forma de contrapartidas contratuais, sem trânsito no Orçamento Geral da União

319. Conforme acima já transcrito, o art. 4º condiciona as novas outorgas de concessão de geração de energia elétrica de que trata o art. , ambos da Lei 14.182/2021, ao pagamento pela Eletrobras ou por suas subsidiárias do montante correspondente a 50% do valor adicionado à concessão pelos novos contratos à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) .

320. Ademais, o art. , inciso II, da Lei 14.182/2021 determina que, da bonificação pela outorga dos novos contratos de concessão, sejam abatidas as seguintes parcelas a serem pagas pela Eletrobras ou por suas subsidiárias:

a) despesas relacionadas à revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba;

b) despesas relacionadas ao desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal com vistas a reduzir estruturalmente os custos de geração de energia e para a navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins;

c) despesas relacionadas aos projetos na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas, cujos contratos de concessão sejam afetados pela Lei 14.182/2021; e

d) despesas para ressarcir o valor econômico do fornecimento de energia elétrica para o Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) .

321. Com o objetivo de avaliação da legalidade, sob a óptica orçamentária, do procedimento de abatimento dessas despesas anteriormente ao recolhimento do bônus de outorga aos cofres do Tesouro, foi enviado o Ofício XXXXX-150/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 138) à Secretaria Especial do Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia com o intuito de esclarecer a natureza dessas obrigações, sua relação com a concessão dos serviços de geração de energia elétrica tratados no art. 2º da Lei 14.182/2021, a legalidade do abatimento dessas obrigações do bônus de outorga e a eventual infringência de princípios e normas orçamentárias e de direito financeiro pelo fato de o encargo dessas obrigações transitar fora do Orçamento Geral da União.

322. Por meio da Nota Técnica SEI 43574/2021/ME (peça 216) , a Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais da Secretaria do Tesouro Nacional respondeu aos questionamentos enviados.

323. Em relação ao entendimento quanto à natureza das obrigações constantes do art. , inciso II, da Lei 14.182/2021, a coordenação afirmou que as obrigações correspondem à realização de despesas do setor privado, por parte dos concessionários de usinas hidrelétricas, que necessariamente deverão constar dos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica, tendo em vista que são condicionantes das novas outorgas e condicionantes da desestatização.

324. A Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais concluiu que a natureza dessas obrigações é idêntica àquela prevista no art. , inciso I, da Lei 14.182/2021, de realização de despesas pelas concessionárias para pagamento à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) .

325. Quanto à relação das obrigações contratuais em questão com a concessão do serviço de geração de energia elétrica por meio das usinas especificadas no art. 2º da Lei 14.182/2021, a Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais respondeu que as obrigações contratuais estão relacionadas, nos termos dos arts. , e 8º da Lei 14.182/2021, a projetos na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas concedidas, com foco na recarga das vazões afluentes e aumento da flexibilidade operativa dos reservatórios.

326. Entretanto, a coordenação da STN observou que a avaliação quanto ao mérito dessas obrigações não é de sua competência, mas da pasta ministerial responsável, no caso, o MME.

327. Nesses termos, a STN encaminhou ao MME o Ofício SEI XXXXX/2021/ME (peça 217) para que a pasta ministerial se pronunciasse mais especificamente sobre a relação das obrigações com a concessão de energia das usinas hidrelétricas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021.

328. O MME, por seu turno, respondeu a esse questionamento, por meio da Nota Informativa 19/2021/ASSEC (peça 218) .

329. Inicialmente, o MME contextualizou que os investimentos são discriminados explicitamente no art. , inciso II, da Lei 14.182/2021, conforme acima já explicitado.

330. Para cada uma das obrigações contratuais aqui em discussão, o MME transcreveu trechos das minutas dos contratos (peça 218, p. 2-4) com a finalidade de demonstrar que essas obrigações têm relação direta com a concessão dos serviços de geração de energia elétrica por meio das usinas especificadas no art. 2º da Lei 14.182/2021.

331. Em relação à afronta aos princípios da unidade e da universalidade orçamentária em razão de as obrigações não transitarem pelo Orçamento Geral da União, a coordenação da STN apresentou seu entendimento de que o valor adicionado pelos novos contratos de concessão do serviço de geração de energia elétrica não é definido como receita da União na Lei 14.182/2021, tendo em vista que não há previsão legal de pagamento desse valor, pela Eletrobras ou por suas subsidiárias, para a União, tampouco previsão desse valor como 'bonificação de outorga' (peça 216, p. 1-2) .

332. Já a parcela referente à bonificação de outorga oriunda dos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica a ser paga pela Eletrobras ou por suas subsidiárias, prossegue a coordenação da STN, é definida na Lei 14.182/2021 como receita da União, na forma fixada pelo art. , inciso II, da Lei 14.182/2021 e pela Resolução CNPE 15, de 31 de agosto de 2021, art. 2º, caput, e, assim, será classificada no orçamento como receita corrente patrimonial, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei 4.320/1964, do mesmo modo como são classificadas as demais receitas de concessões da União (peça 216, p. 2) .

333. Em relação à afronta ao artigo 167, inciso I e § 1º, da Constituição, que a destinação de parcelas relativas ao valor adicionado pelos novos contratos de concessão, sem trânsito pelo Orçamento Geral da União, poderia representar, a Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais da STN afirma que a modelagem econômico-financeira dos contratos de concessão de geração de energia elétrica está totalmente consignada na Lei 14.182/2021 (peça 216, p. 2) .

334. Assim, prossegue a coordenação, a Lei 14.182/2021 determina que as obrigações contratuais estabelecidas em seu art. , inciso II, alíneas 'a', 'b', 'c' e 'd', sejam realizadas diretamente pela Eletrobras ou por suas subsidiárias, por meio de aportes em conta específica em instituição financeira autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conforme dispõem seus arts. , e 8º (peça 216, p. 2) .

335. Nesse sentido, a Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais da STN concluiu que, tendo em vista o caráter privado dessa despesa fixada na referida e específica legislação, a análise fica prejudicada quanto à aplicação dos princípios orçamentários e do art. 167, inciso I e § 1º, da Constituição Federal (peça 216, p. 2) .

336. Por fim, nesse quesito, a Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais da STN observou que não cabe a ela a avaliação jurídica quanto à constitucionalidade da Lei 14.182/2021 (peça 216, p. 2) .

337. Tendo em vista o questionamento abordar princípios orçamentários e fazer referência ao Capítulo II, Das Finanças Públicas, Seção II, Dos Orçamentos, da Constituição Federal, a STN solicitou a análise da sua Coordenação-Geral da Receita Pública (peça 216, p. 2) .

338. Outrossim, a STN conferiu à sua Coordenação-Geral da Receita Pública a atribuição de responder ao item 'e' constante do Ofício XXXXX-150/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 138) , que indaga a respeito da importância dos princípios referidos no questionamento anterior para a gestão orçamentária, considerando as atividades de planejamento e coordenação orçamentária e o necessário trâmite legislativo para a aprovação de receitas e despesas públicas.

339. A coordenação da STN ressaltou, inicialmente, que os ingressos de valores na Conta Única do Tesouro Nacional podem representar receitas orçamentárias ou extraorçamentárias. No segundo caso, o registro do ativo tem contrapartida em contas do passivo financeiro, tendo em vista que o ente é mero depositário dos recursos e não depende de autorização legal ou orçamentária para devolvê-los (peça 219, p. 1) .

340. Para os casos em que os recursos, prossegue a coordenação da STN, sequer transitam pela Conta Única, apesar de terem finalidade, por serem arrecadados ou empregados por entidades de direito privado externas ao Orçamento, a situação é diversa. Citou, como exemplo, os recursos movimentados por fundos de incentivos fiscais, conselhos de fiscalização de profissão e empresas públicas ou sociedades de economia mista que recebem recursos da União decorrentes de aumento de participação acionária (peça 219, p. 1) .

341. Seguindo no raciocínio, a Coordenação-Geral da Receita Pública da STN afirmou que, quando o Estado delega a particular, pela primeira vez, a prestação de serviço público precedido ou não de obras públicas, ocorre a migração de uma atividade inserida no orçamento público, com registro de receitas e despesas orçamentárias em valores brutos e totais, para o particular. Dessa forma, o delegatário opera os recursos oriundos da atividade externamente à Conta Única e ao Orçamento (peça 219, p. 1) .

342. Com a finalidade de ilustrar a situação, a coordenação da STN citou o caso de uma concessão especial formalizada mediante Parceria Público-Privada (PPP) do tipo 'patrocinada', nos moldes estabelecidos pela Lei 11.079/2004, em que o fluxo financeiro que ocorre dentro do orçamento do ente público se resume à despesa do 'subsídio' transferido ao particular (peça 219, p. 1-2) .

343. Essa contrapartida estatal, prossegue a coordenação da STN, representa a diferença líquida entre as receitas e despesas da atividade, que, se fosse centralizada, constaria do Orçamento pelos seus valores brutos. Já no caso de concessão comum, regida pela Lei 8.987/1995, o valor que ingressa no orçamento público é um resultado líquido da atividade, após o pagamento dos custos e do lucro do particular (peça 219, p. 1-2) .

344. Sintetizando, a coordenação da STN afirmou que PPP patrocinada é uma concessão por definição deficitária e requer despesa pública para cobrir a diferença ao passo que a concessão comum é geralmente superavitária e possibilita a reversão de eventuais sobras ao Estado. Entretanto, se este optasse por executar diretamente essa atividade, todo o ingresso e toda a despesa constariam do Orçamento e transitariam pela Conta Única (peça 219, p. 1-2) .

345. Nessa linha, prosseguiu a Coordenação-Geral da Receita Pública da STN, o fluxo financeiro dessas atividades não transita completamente pelo Orçamento porque, no caso da delegação, os valores brutos auferidos representam receitas privadas, que se tornam públicas somente após o pagamento da parcela que compete ao poder público, nos termos celebrados no contrato de concessão (peça 219, p. 2) .

346. Portanto, concluiu a coordenação, os princípios que regem a elaboração e aprovação do Orçamento Público não se aplicam ao caso em questão pois é o arranjo institucional que determina o tratamento orçamentário e não o contrário (peça 219, p. 2) .

347. Finalizando, a Coordenação-Geral da Receita Pública da STN afirma que, a partir do arranjo institucional em vigor por força da Lei 14.182/2021, o fluxo financeiro que ocorrerá a cargo da entidade privada não constará do Orçamento e não prejudicará, por consequência, o atendimento aos princípios orçamentários, ou seja, o trânsito externo ao Orçamento será mera consequência desse modelo, sem transgredir norma ou princípio do direito financeiro (peça 219, p. 2) .

348. Sobre o item 'f' do Ofício XXXXX-150/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 138) , a respeito das dificuldades para a programação, a execução e o controle da política fiscal e os seus impactos macroeconômicos em razão da proliferação de autorizações legislativas para a execução de despesas, como as prescritas no art. 4º da Lei 14.182/2021, a Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais da STN afirma que as atividades de programar, executar e controlar a política fiscal são pautadas pelas prescrições da legislação vigente (peça 216, p. 2) .

349. Especificamente, a coordenação da STN asseverou que as obrigações contratuais prescritas pelo art. 4º da Lei 14.182/2021, todo o detalhamento de valores, fórmulas de cálculo e formas de execução pelos concessionários, bem como os demais aspectos da modelagem econômico-financeira dos contratos de concessão de geração de energia elétrica da Eletrobras, foram configurados e ajustados por meio de tramitação e aprovação legislativa (peça 216, p. 2) .

350. Quanto aos seus impactos, a STN avaliou que as chamadas obrigações contratuais, dispostas na Lei 14.182/2021, serão positivas para a política fiscal e para o cenário macroeconômico em decorrência da previsão de ingresso de novas receitas de concessões, estimadas em R$ 23,2 bilhões, a título de bonificação de outorga pelos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica em decorrência da desestatização da Eletrobras (peça 216, p. 2) .

351. O item 'g' do Ofício XXXXX-150/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 138) tratou de indagar se as obrigações contratuais são comportadas pela regra estabelecida pela Emenda Constitucional 95/2016, que instituiu o teto de gastos do governo federal, incluindo as normas gerais, inclusive de âmbito constitucional, que norteiam as finanças públicas.

352. Sobre esse ponto, a Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais da STN reafirmou seu entendimento, expresso na resposta ao item 'd', de que se está neste caso a cuidar de despesa de caráter privado.

353. Como a Lei 14.182/2021, prosseguiu a coordenação da STN, estabeleceu todos os detalhes da modelagem econômico-financeira dos contratos de concessão, com a especificação das usinas hidrelétricas abrangidas, lista de compromissos a serem assumidos pelas concessionárias, e que as obrigações contratuais sejam realizadas pelo Grupo Eletrobras, por meio de aportes em contas específicas em instituição financeira autorizada a funcionar pelo Banco Central, fica prejudicada a análise quanto à aplicação da Emenda Constitucional 95/2016, tendo em vista que essa regra fiscal trata de limite para despesas primárias da União (peça 216, p. 2) .

354. Ademais, quanto à avaliação das obrigações contratuais vis-à-vis às normas gerais, inclusive de âmbito constitucional, que norteiam as finanças públicas, a Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais da STN também afirmou que não cabe a ela avaliação jurídica quanto à constitucionalidade da Lei 14.182/2021 (peça 216, p. 2) .

355. Por fim, foram indagadas, por meio do item 'h' do Ofício XXXXX-150/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 138) , as similaridades e diferenças, sob a óptica dos eventuais riscos para a gestão orçamentária e fiscal, entre as obrigações contratuais aqui discutidas e a inclusão das contrapartidas contratuais estabelecidas no âmbito do Leilão do 5G (Programa Amazônia Integrada e Sustentável - PAIS e rede privativa) , sobre as quais a STN já havia se manifestado, por meio da Nota Técnica SEI 15181/2021/ME e o Ofício SEI 88183/2021/ME.

356. A Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais da STN iniciou a resposta rememorando que, no caso da desestatização da Eletrobras, a modelagem econômico-financeira dos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica foi fixada e detalhada pela Lei 14.182/2021 e que as formas de cumprimento das obrigações contratuais estão disciplinadas pelos seus arts. , e 8º, que, inclusive, preveem o estabelecimento de comitê gestor a ser instituído em regulamento do Poder Executivo (peça 216, p. 2) .

357. Já no caso das obrigações contratuais previstas no âmbito do Leilão do 5G, continua a coordenação da STN, aplica-se a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) , Lei 9.472/1997, que prevê, no seu art. 135, que:

Art. 135. A Agência poderá, excepcionalmente, em face de relevantes razões de caráter coletivo, condicionar a expedição de autorização à aceitação, pelo interessado, de compromissos de interesse da coletividade.

358. A coordenação da STN argumentou que, no âmbito do TC Processo XXXXX/2021-4, no qual o Tribunal apreciou o Leilão 5G, a origem dos questionamentos da unidade técnica sobre a adequação das obrigações do Programa Amazônia Integrada e Sustentável (PAIS) e da rede privativa ao objeto do certame e aos princípios orçamentários estava na suposta ausência de autorização legal para tais obrigações contratuais, especialmente se havia ou não adequação com o disposto no art. 135 da Lei 9.472/1997 acima transcrito (peça 216, p. 2) .

359. Entretanto, prosseguiu a coordenação da STN, esse questionamento foi superado com a prolação do Acórdão 2032/2021-TCU-Plenário, de 25 de agosto de 2021, que não se opôs à inclusão dessas obrigações no edital do 5G (peça 216, p. 3) .

360. A coordenação da STN concluiu que, enquanto no caso do leilão de telecomunicações poderia haver dúvidas em relação ao enquadramento das obrigações contratuais na legislação geral do setor, o que foi superado pela prolação do Acordão 2.032-TCU-Plenário, no caso da desestatização da Eletrobras, as obrigações contratuais estão previstas de forma expressa na Lei 14.182/2021 (peça 216, p. 3) .

361. Isso posto, as obrigações contratuais da Eletrobras, estipuladas no art. 4º da Lei 14.182/2021, foram merecedoras de escrutínio nessa análise em razão de que elas são abatidas da bonificação pela outorga de novos contratos de concessão de geração de energia elétrica.

362. Importa registrar que, no caso da capitalização da Eletrobras, não se aplicam as regras do Decreto 9.271/2018, que regulamenta a outorga de contrato de concessão no setor elétrico associada à privatização de titular de concessão de serviço público de geração de energia elétrica, nos termos da Lei 9.074/1995.

363. É que, apesar de o art. , § 3º, do Decreto 9.271/2018, abaixo transcrito, conter a previsão de que o percentual de ágio sobre o valor mínimo para aquisição das ações a serem alienadas para fins de transferência de controle acionário seja aplicado sobre o valor mínimo de outorga de concessão, não haverá leilão de privatização no caso da capitalização da Eletrobras, condição para a aplicação da norma nos termos dos seus arts. 1º e 3º, abaixo transcritos:

Decreto 9.271/2018

Art. 1º A União poderá outorgar novo contrato de concessão pelo prazo de até trinta anos, contado da data de sua celebração, à empresa resultante do processo licitatório de privatização de concessionária de serviço público de geração de energia elétrica sob controle direto ou indireto da União, de Estado, do Distrito Federal ou de Município, nos termos estabelecidos nos art. 26, art. 27, art. 28 e art. 30, da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995.

(...)

Art. 3º A minuta de contrato de concessão de geração de energia elétrica deverá ser aprovada pela Aneel e integrará o edital do leilão de privatização da pessoa jurídica de que trata o caput do art. 1º.

(...)

§ 3º O percentual de ágio sobre o valor mínimo para aquisição das ações a serem alienadas para fins de transferência de controle societário da empresa objeto da privatização, obtido no Leilão de privatização, deverá ser aplicado sobre o valor mínimo de outorga de concessão de que trata o § 3º do art. 2º para a apuração do valor de outorga. (sublinhou-se)

364. Considerando que o processo de capitalização não ocorrerá por meio de processo licitatório de privatização e que, assim, não se aplica a possibilidade de obtenção de valores adicionais de outorga, o bônus a ser estabelecido pelo CNPE, nos termos do art. 5º da Lei 14.182/2021, será todo o montante a ser obtido pela União pela outorga dos novos contratos de concessão de energia elétrica das usinas referidas no art. 2º dessa lei.

365. A segunda motivação para a requisição endereçada ao MME e à STN refere-se ao questionamento sobre a propriedade de dispositivo legal impor abatimentos ao bônus de outorga a ser auferido dos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica tratados nesses autos, tendo em vista que, em tese, poderiam constituir ofensas a princípios orçamentários e de direito financeiro, prescritos em lei e na Constituição Federal.

366. Em relação à natureza das chamadas obrigações contratuais, a STN manifestou o entendimento de que as despesas expressas no art. , inciso II, da Lei 14.182/2021 têm natureza privada porque é imputada à empresa, que terá característica privada após a sua privatização. Da mesma forma, a secretaria afirmou serem da mesma natureza, privada, as obrigações de pagamento pela Eletrobras ou por suas subsidiárias à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) de que trata o inciso I do próprio art. 4º dessa lei.

367. A caracterização do ME sobre a natureza dessas obrigações baseia-se na definição jurídica da entidade encarregada de sua prestação, e não em discussão sobre a característica intrínseca dos gastos a serem executados nem tampouco sobre o abatimento dessas obrigações do montante a ser pago a título de bônus de outorga.

368. Esse entendimento da STN é compartilhado e corroborado por suas Coordenação-Geral de Planejamento de Operações Fiscais e Coordenação-Geral da Receita Pública como ficará assente nas análises dos próximos questionamentos.

369. Quanto à relação entre as obrigações contratuais com a concessão do serviço de geração de energia elétrica por meio das usinas especificadas no art. 2º da Lei 14.182/2021, a STN afirmou que as obrigações estão relacionadas a projetos nas áreas de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas concedidas, nos termos dos arts. 6º, 7º e 8º dessa lei, sem, entretanto, afirmar peremptoriamente sobre a relação das obrigações com as concessões propriamente ditas.

370. O MME, por seu turno, também se limitou a transcrever trechos dos contratos de concessão de geração de energia elétrica a serem assinados, provavelmente, para demonstrar a relação destes com as obrigações chamadas contratuais. Da mesma forma como a STN, a pasta ministerial também não firmou entendimento sobre a relação das obrigações com a concessão do serviço de energia elétrica.

371. Em outras palavras, os órgãos, implicitamente e valendo-se de tautologia, responderam que há relação das obrigações com as concessões por haver previsão dessas nos arts. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021 e nas minutas dos contratos sem, novamente, adentrarem no mérito dessas despesas.

372. Em relação à possível classificação do valor adicionado pelos contratos de concessão como receitas de capital, item 'c' do ofício de requisição de informações, a STN explicitou que o valor adicionado por si só não constitui receita pelo fato de não haver previsão de entrada no caixa da União, ou seja, como a Lei 14.182/2021 não definiu esse valor como receita da União, não se deve considerar essa hipótese.

373. A STN ainda, por meio da Coordenação-Geral da Receita Pública, afirmou que, na verdade, as concessões são apenas deslocamentos da prestação do serviço público ao setor privado. Considerando que se esses serviços públicos fossem prestados diretamente pelo Estado suas receitas seriam classificadas como correntes, da mesma forma deve-se proceder quanto às receitas de concessões. Nesse sentido, afirmou que é a prática consolidada no orçamento público de classificar essas receitas como correntes.

374. Com relação à inobservância de princípios orçamentários, a STN expressou seu entendimento que, aliás, permeia o raciocínio subjacente de todas as respostas aos questionamentos feitos tanto à Secretaria quanto ao MME, de que é o arranjo institucional que determina o tratamento orçamentário, e não o contrário.

375. Nessa linha de raciocínio, a STN conclui que, a partir do arranjo institucional em vigor, dado pela Lei 14.182/2021, o fluxo financeiro ocorre na esfera privada e não deve, assim, constar do Orçamento. Não constando do Orçamento, não haveria prejuízo nem transgressões a princípios ou normas orçamentárias ou de direito financeiro.

376. Sobre as dificuldades para programar, executar e controlar a política fiscal e os impactos macroeconômicos causados pela proliferação de autorizações legislativas para a execução das despesas, como as prescritas no art. 4º da Lei 14.182/2021, item 'f' do ofício de requisição, a STN valeu-se novamente do argumento do arranjo institucional e do benefício que o recolhimento do bônus de outorga causará ao Erário.

377. Por fim, importa destacar que a argumentação da STN explicita que qualquer discussão sobre as obrigações contratuais, no contexto orçamentário, esbarra no teor do Acórdão 2032/2021-TCU-Plenário.

378. É que, no voto condutor do referido acórdão, o E. relator, Ministro Raimundo Carreiro, deixou de acolher a proposta da SeinfraCOM de considerar ilegal a inclusão no edital de licitação do 5G do compromisso de rede privativa para a administração pública federal sob o argumento de que a escolha do formulador de política pública poderia ser prestigiada ante a zona de incerteza da interpretação do art. 135 da Lei Geral de Telecomunicações.

379. O raciocínio subjacente à posição da SeinfraCOM era a de que as obras de construção (implantação) da rede do PAIS e da rede privativa de comunicação não teriam relação com o objeto da licitação, nem com a prestação dos serviços de telefonia móvel ou qualquer outro serviço de telecomunicações prestado aos usuários em geral pelas empresas do setor.

380. Nesse diapasão, a SeinfraCOM concluiu que a inclusão da rede privativa de comunicação em telefonia 5G e internet fixa da Administração Pública Federal violaria os arts. 2º, incisos I e III, 135, caput e parágrafo único, e 136, § 3º, da LGT.

381. No entendimento do E. relator, entretanto, a discussão deveria se limitar à averiguação da adequação da inclusão da rede privativa como compromisso do edital de licitação do 5G com o disposto no art. 135 da LGT.

382. Especificamente, três condições foram extraídas do art. 135 da LGT para embasar o encaminhamento do E. relator.

383. Em primeiro lugar, a condição de excepcionalidade, conferida pelo dispositivo legal, autorizaria a inclusão da rede privada como compromisso de interesse da coletividade pela própria característica não ordinária ou não corriqueira do empreendimento.

384. Em segundo lugar, a condição de relevância das razões de caráter coletivo do empreendimento foi explicitada em diversos pronunciamentos pelo MPTCU, Ministério das Comunicações e pela própria SeinfraCOM.

385. Ademais, o E. relator argumentou que a condição de interesse da coletividade também estaria atendida, apesar de mais suscetível a múltiplas interpretações, porque a expressão se enquadra no conceito jurídico de conteúdo indeterminado, ou seja, fluído, cuja determinação se dá em cada caso concreto, consideradas as suas circunstâncias, mas advertiu que o conceito de conteúdo indeterminado não comportaria a inclusão de compromissos de qualquer atividade relacionada com a prestação de serviços públicos, mas que deveria observar o conceito de pertinência temática para identificar o limite da norma.

386. Por fim, o E. relator, Ministro Raimundo Carreiro, concluiu que o caso da rede privativa se enquadraria na expressão 'interesse da coletividade', que, por ser um conceito jurídico indeterminado, comportaria zona de incerteza relativamente às suas hipóteses de enquadramento na LGT e seria aceitável.

387. Entretanto, as obrigações contratuais constantes do art. 4º da Lei 14.182/2021, ao contrário da discussão realizada no âmbito do leilão do 5G, representam um conjunto de despesas cujas especificidades são detalhadas na norma.

388. Em relação ao voto revisor do E. Ministro Aroldo Cedraz no bojo do Acórdão 2032/2021-TCU-Plenário, o cerne da sua divergência com o posicionamento expresso pelo E. relator, Ministro Raimundo Carreiro, consistiu na interpretação sobre o atendimento dos projetos constantes da minuta do edital de leilão do 5G aos requisitos da LGT, com a regulamentação dada pelo Decreto 9.612/2018.

389. Cabe, então, pontuar as diferenças entre os compromissos assumidos no âmbito do leilão do 5G e as chamadas obrigações contratuais previstas na Lei 14.182/2021.

390. Nos termos dos conteúdos das manifestações trazidas aos autos pela SeinfraCOM, pelo MPTCU, pelo Ministério das Comunicações, pelo E. relator, Ministro Raimundo Carreiro, e pelo E. revisor, Ministro Aroldo Cedraz, observa-se como denominador comum a todas elas a necessidade do exercício de interpretação dos objetos dos projetos incluídos como compromissos na minuta do leilão do 5G para averiguar as suas adequações aos ditames da LGT e seu regulamento, o Decreto 9.612/2018.

391. A interpretação, nesse caso, é imperiosa para a formulação do juízo de valor sobre o enquadramento dos projetos.

392. No caso das obrigações contratuais que serão exigidas da Eletrobras, a Lei 14.182/2021 condiciona a desestatização da estatal ao desenvolvimento desses projetos, em seu art. , inciso V, condiciona as novas outorgas de concessão de geração de energia elétrica ao abatimento das parcelas das despesas com esses projetos do bônus de outorga, em seu art. , inciso II, e especifica os montantes, a forma dos seus aportes e as entidades incumbidas da gestão dos recursos, em seus arts. , e 8º.

393. Mais importante ainda para caracterizar diferenças entre os compromissos assumidos no âmbito do leilão do 5G e as chamadas obrigações contratuais, os arts. , inciso V, alíneas 'a', 'b' e 'c', 4º, inciso II, alíneas 'a', 'b', 'c' e 'd', 6º, § 1º, 7º, § 1º, e 8º, § 1º, da Lei 14.182/2021 definem precisamente os objetos dos projetos.

394. Portanto, não cabe nem é necessária interpretação, no caso das obrigações contratuais da Eletrobras, para formulação de juízo de valor sobre a adequação dos projetos à Lei 14.182/2021 porque eles são parte integrante da própria norma.

395. Parte dos questionamentos endereçados à STN e ao MME sobre esse tema referiu-se à pertinência temática dos objetos dos projetos à concessão de geração de energia elétrica.

396. As respostas obtidas da STN e do MME concentraram-se, como visto acima, no arranjo institucionalizado pela 14/182/2021 como base para o entendimento de adequação dos projetos.

397. Analisando os artigos da Lei 14.182/2021, acima citados e transcritos ao longo da instrução, é árduo infirmar a pertinência temática dos projetos das chamadas obrigações contratuais cujos objetos relacionam-se com revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, art. , redução estrutural de custos de geração de energia na Amazônia Legal, art. , e revitalização dos recursos hídricos das bacias hidrográficas na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas, art. 8º.

398. Entretanto, apesar da pertinência temática dos projetos das chamadas obrigações contratuais com o setor elétrico, não é possível identificar claramente os benefícios que os usuários e consumidores de energia elétrica poderiam deles usufruir. Assim, a pertinência temática desses projetos não é suficiente para configurá-los como políticas setoriais de energia elétrica.

399. Em relação aos eventuais descumprimentos de regras orçamentárias, não se pode peremptoriamente afirmar que tenham ocorrido, tendo em vista que a Lei 14.182/2021 especificou detalhadamente o objeto e a forma de aplicação das chamadas obrigações contratuais e atribui esse encargo a entidade privada.

400. Assim, considerando as diferenças entre os compromissos incluídos nas minutas de leilão do 5G e as obrigações contratuais constantes, o arranjo institucional detalhado pela Lei 14.182/2021 e o encaminhamento adotado pelo Tribunal, por meio do Acórdão 2032/2021-TCU-Plenário, em que foram debatidos eventuais descumprimentos de regras orçamentárias, não serão propostos encaminhamentos em relação à infringência de princípios orçamentários ou normas de direito financeiro.

401. É importante ressaltar, contudo, que, a despeito de as obrigações serem financiadas com pagamentos a serem efetuados pela Eletrobras, a forma de aplicação desses recursos será estabelecida por comitê gestor, presidido por representantes indicados pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, nos casos do programa de revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Franciso e do Rio Parnaíba e da revitalização dos recursos hídricos das bacias hidrográficas na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas, e pelo Ministério de Minas e Energia, no caso do programa de redução estrutural de custos de geração de energia na Amazônia Legal e de navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins.

402. Havendo sucesso no processo de capitalização da Eletrobras, os comitês gestores desses programas deverão ser constituídos ao longo do ano de 2022 e os aportes de recursos deverão ocorrer a partir de 2023, conforme previsto na planilha de modelagem do valor adicionado dos novos contratos de concessão de energia elétrica das usinas prescritas no art. 2º da Lei 14.182/2021.

403. O texto legal também prevê, em seu art. 24, que os comitês gestores desses programas enviem, semestralmente, ao Tribunal e à Controladoria-Geral da União, relatórios de prestação de contas com informações sobre a destinação dos valores, sobre os critérios utilizados para seleção de projetos e sobre os resultados das ações desses programas.

404. Observa-se que, de fato, a Lei 14.182/2021 delimita e especifica a origem e a destinação das despesas a serem efetuadas pela Eletrobras. Ademais, a lei estabelece rudimentos sobre o processo de governança desses programas com a previsão de criação de comitês gestores, que serão instituídos por meio de regulamento do Poder Executivo, e o envio de prestação de contas aos órgãos de controle externo e interno.

405. Assim, não se pode infirmar a argumentação apresentada pela STN e pelo MME de que o arranjo institucional das chamadas obrigações contratuais tenha sido estabelecido, especificado e delimitado no âmbito de processo legislativo.

406. Embora possa ser questionada a relação direta dessas despesas com o serviço de geração de energia elétrica das usinas, não se pode afastar a pertinência temática dos programas previstos nos arts. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021 tais como a revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, a redução estrutural de custos de energia na Amazônia Legal e a revitalização dos recursos hídricos das bacias hidrográficas na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas frente aos potenciais benefícios que possam ocasionar ao setor elétrico.

407. Contudo, remanesce a previsão legal de projetos a serem aplicados na navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins, que não guardam relação com a temática do setor elétrico.

408. Outrossim, tendo em vista que a Lei 14.182/2021 determina que os pagamentos para cumprimento das chamadas obrigações contratuais sejam depositados em conta específica em instituição financeira autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil, em conjunto com as demais prescrições legais acima discutidas, torna-se aceitável a argumentação da STN de que o arranjo institucional legal inviabiliza o trânsito desses recursos no Orçamento Geral da União e que se possa peremptoriamente aventar o descumprimento de preceitos e princípios orçamentários e de direito financeiro.

409. O arranjo institucional acima descrito, em que pese ter sido fruto de processo legislativo, requer que as instâncias de governança do processo de gestão dos recursos, nomeadamente os comitês gestores dos respectivos programas, funcionem efetivamente e que o processo de prestação de contas aos órgãos de controle sejam instrumentos de demonstração das ações executadas e de accountability dos gestores.

410. Um dos questionamentos endereçados ao Ministério da Economia e ao Ministério de Minas e Energia referiu-se aos riscos potenciais de proliferação dessa prática legislativa de retirar da esfera do Orçamento Público despesas que poderiam ou deveriam ser executadas pelo Estado e transferir a responsabilidade do aporte desses recursos para a esfera privada via depósitos em contas correntes que, na sequência, seriam geridos por prepostos nomeados pelo próprio Estado.

411. É que parte importante da motivação para o estabelecimento de mecanismos de controles fiscais como a Conta Única baseava-se nas dificuldades encontradas pelo Estado para a adequada gestão dos recursos públicos, como a inexistência de mecanismos eficientes para evitar o desvio de recursos públicos e atribuição de responsabilidade aos maus gestores e a necessidade de conferir segurança e agilidade ao processo decisório por meio de sistema que provesse informações gerenciais, confiáveis e precisas para todos os níveis da Administração. Essas considerações constam do sítio da STN (https://www.gov.br/tesouronacional/pt-br/siafi/conheca/historia) .

412. No contexto de gestão, em que os recursos serão transferidos a contas correntes em instituições financeiras, haverá perda de provimento de informações gerenciais sistematizadas, no âmbito do SIAFI, acompanhada de flexibilização dos controles associados conducentes à adequada e regular aplicação desses recursos.

413. Assim, mecanismos de governança eficazes devem permear a normatização do funcionamento dos comitês gestores encarregados da administração desses programas.

414. Outra importante constatação é a de que a iniciativa do arranjo institucional tão repisado na argumentação apresentada pela STN partiu do próprio Governo Federal mediante a edição da Medida Provisória 1.031/2021, a qual já previa que as despesas não tramitassem pelo Orçamento Geral da União, o que contribui para o enfraquecimento dos controles acima descritos.

415. Assim, com o intuito de assegurar instrumentos que mitiguem os riscos derivados do enfraquecimento dos controles sobre recursos que não são geridos sob o rigor dos sistemas informatizados de gestão da administração pública, é oportuno que a União empregue os princípios, as diretrizes e os mecanismos de governança da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, prescritos no Decreto 9.203, de 22 de novembro de 2017.

416. Mais especificamente, mecanismos como os preconizados no art. , parágrafo único, do Decreto 9.203/2017 induzirão os comitês gestores dos programas a alcançarem seus objetivos por meio do acompanhamento de resultados, aprimoramento do seu desempenho e promoção de processo decisório fundamentado em evidências:

Decreto 9.203/2017

Art. 6º Caberá à alta administração dos órgãos e das entidades, observados as normas e os procedimentos específicos aplicáveis, implementar e manter mecanismos, instâncias e práticas de governança em consonância com os princípios e as diretrizes estabelecidos neste Decreto.

Parágrafo único. Os mecanismos, as instâncias e as práticas de governança de que trata o caput incluirão, no mínimo:

I - formas de acompanhamento de resultados;

II - soluções para melhoria do desempenho das organizações; e

III - instrumentos de promoção do processo decisório fundamentado em evidências.

417. A institucionalização de processo decisório fundamentado em evidências é particularmente importante para os órgãos de controle porque permite que o processo decisório dos responsáveis pelas tomadas de decisão sobre as alocações de recursos dos programas seja avaliado objetivamente e auditado com base em documentação.

418. O estabelecimento dessas práticas de governança é atribuído à alta administração dos órgãos e entidades, conforme explicitado no art. 6º do Decreto 9.203/2017. Assim, no caso das obrigações contratuais instituídas pelos art. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021, essas atribuições recaem sobre o Ministério de Minas e Energia e o Ministério do Desenvolvimento Regional.

419. Adicionalmente, os art. 7º-A e 9º-A do Decreto 9.203/2021 instituíram o Comitê Interministerial de Governança (CIG) e definiram suas competências:

Decreto 9.203/2017

Art. 7º-A. O Comitê Interministerial de Governança - CIG tem por finalidade assessorar o Presidente da República na condução da política de governança da administração pública federal.

(...)

Art. 9º-A. Ao CIG compete:

I - propor medidas, mecanismos e práticas organizacionais para o atendimento aos princípios e às diretrizes de governança pública estabelecidos neste Decreto;

II - aprovar manuais e guias com medidas, mecanismos e práticas organizacionais que contribuam para a implementação dos princípios e das diretrizes de governança pública estabelecidos neste Decreto;

III - aprovar recomendações aos colegiados temáticos para garantir a coerência e a coordenação dos programas e das políticas de governança específicos;

IV - incentivar e monitorar a aplicação das melhores práticas de governança no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional; e

V - editar as resoluções necessárias ao exercício de suas competências.

420. Portanto, observa-se que o processo de trabalho para estabelecimento de instrumentos de governança para o bom funcionamento dos comitês gestores dos recursos oriundos das obrigações contratuais deverá contar com a participação adicional do CIG.

421. Assim, será proposta recomendação ao Ministério de Minas e Energia, ao Ministério do Desenvolvimento Regional e ao Comitê Interministerial de Governança para que instituam instrumentos de governança para o funcionamento dos comitês gestores previstos nos arts. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021 a fim de assegurar, no mínimo, formas de acompanhamento de resultados, soluções para melhoria do desempenho das organizações e instrumentos de promoção de processo decisório fundamentado em evidências, nos termos do Decreto 9.203/2017.

422. Adicionalmente, considerando que a proliferação de obrigações contratuais sem vínculos diretos com políticas setoriais ao largo do trânsito pelo Orçamento Geral da União enfraquece os controles conducentes à boa e regular aplicação dos recursos e à integridade na gestão desses ativos, conforme explicitado no sítio da STN anteriormente citado, e que a iniciativa para o desenho do arranjo institucional discutido nos autos foi do Poder Executivo por meio da edição da Medida Provisória 1.031/2021, cabe propor recomendação para evitar a disseminação dessa prática.

423. Tendo em vista que o art. 3º da Lei 13.344/2019 estabelece que à Casa Civil da Presidência compete assistir diretamente o Presidente da República no desempenho de suas atribuições na análise do mérito, da oportunidade e da compatibilidade das propostas, inclusive das matérias em tramitação no Congresso Nacional, com as diretrizes governamentais, e na coordenação e acompanhamento das atividades dos Ministérios e da formulação de projetos e políticas públicas, será proposta recomendação para que a Casa Civil da Presidência da República evite o encaminhamento de proposições legislativas que promovam e permitam a execução de políticas públicas que não transitem pelo Orçamento Geral da União.

CONCLUSÃO

424. O presente processo foi constituído para acompanhamento da desestatização da Eletrobras, sendo que a análise empreendida nesta instrução foi para a avaliação do cálculo do valor adicionado (VAC) com os novos contratos de geração de energia elétrica a que alude a Lei 14.182/2021, em seu art. , inciso II, e a consequente definição do valor do bônus de outorga.

425. De acordo com a Resolucao-CNPE 15/2021, o montante inicial relativo ao VAC seria de R$ 62.479.656.370,10, dos quais serão deduzidos o valor de R$ 2.906.498.547,37, correspondente ao reembolso pelas despesas comprovadas com aquisição de combustível (dedução da Conta de Consumo de Combustíveis - CCC) incorridas até 30/6/2017 pelas concessionárias que foram controladas pela Eletrobras e que tenham sido comprovadas, porém não reembolsadas, por força das exigências de eficiência econômica e energética de que trata o § 12 do art. 3º da Lei 12.111/2009. Como resultado, o montante final associado ao VAC seria de R$ 59.573.157.823,1.

426. O art. , inciso I, da Lei 14.182/2021 ainda estabelece que 50% do montante final correspondente ao VAC (R$ 29.786.578.911,55) será pago diretamente pela Eletrobras à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) , de forma a neutralizar os impactos de curto a longo prazo com a alteração do regime de exploração das usinas da Eletrobras. A parcela restante será paga pela Eletrobras à União como bonificação pela outorga, da qual foram deduzidas as despesas previstas no art. , inciso II, da Lei 14.182/2021, resultando no valor do bônus de outorga de R$ 23.218.488.754,73.

427. A análise do valor adicionado partiu da avaliação empreendida na peça 92 destes autos, que tratou da definição das variáveis de controle que seriam objeto de análise nessa primeira fase do processo de privatização da Eletrobras, cujas conclusões foram ratificadas pelo Ministro-Relator na peça 97, considerando-se de alta prioridade as premissas adotadas pelo CNPE para fundamentar o referido cálculo, incluindo os seguintes aspectos do objeto fiscalizado:

a) o recálculo das garantias físicas no contexto da capitalização;

b) a fundamentação para a fixação dos valores a serem pagos à CDE;

c) a consistência jurídica e operacionalização da solução proposta em relação às despesas previstas no art. , inciso II, da Lei 14.182/2021; e

d) os impactos tarifários da descotização, que é a condição estabelecida pelo art. , inciso III, da Lei 14.182/2021, com o objetivo de alterar o regime de exploração das usinas compreendidas nos incisos I a III do art. da Lei 14.182/2021.

428. Constatou-se, inicialmente, no âmbito da análise formal da documentação apresentada pelo Poder Concedente, a existência de lacunas de informações, as quais não foram devidamente classificadas com base nas exigências da IN-TCU 81/2018. Entretanto, como tais fatos não prejudicaram a análise da equipe de fiscalização e, à luz de um formalismo moderado, entendeu-se suficiente propor ciência ao MME a respeito das falhas formais identificadas.

429. No que diz respeito às premissas adotadas na modelagem econômico-financeira para cálculo do VAC, verificou-se inicialmente que, a despeito de potenciais benefícios vislumbrados pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) na repotenciação de usinas antigas do parque hidrelétrico brasileiro e diversamente do verificado em desestatizações anteriores, não foi prevista a realização de novos estudos para definição do aproveitamento ótimo desses ativos. Desse modo, foi proposta recomendação ao MME, para que avalie a oportunidade e conveniência em estabelecer cláusula contratual no instrumento de outorga para a elaboração dos referidos estudos, fazendo constar os custos associados na modelagem econômico-financeira para o cálculo do valor de outorga, se assim entender necessário.

430. Com relação à garantia física associada às usinas hidrelétricas na nova outorga, verificou-se que o recálculo realizado pela EPE não considerou a atualização de premissas importantes, por indisponibilidade de dados atualizados relacionados a tais variáveis, em especial de dados que devem ser fornecidos pela Agência Nacional de Águas (ANA). Disso decorre o risco de que a garantia física desses empreendimentos possa estar superdimensionada, o que significa que eles podem não ter a capacidade de geração de energia que lhes foi atribuída. Ressalta-se que as revisões de garantia física posteriores serão limitadas pelo Decreto 2.655/1998, dando ensejo a que, no futuro, esses empreendimentos continuem com suas capacidades de geração de energia superestimadas, o que afeta todo o planejamento da operação e segurança energética do País.

431. A despeito dos riscos mencionados, o processo de recálculo de garantias físicas envolve atividades que fogem ao escopo do presente trabalho e que poderiam demandar um prazo incompatível com o cronograma de privatização da Eletrobras, motivo pelo qual se entendeu pela inviabilidade de providências relacionadas ao assunto.

432. Outra variável associada à modelagem econômico-financeira refere-se ao preço da energia no Ambiente de Contratação Livre (ACL) , a respeito da qual se registrou primeiramente a existência de risco relacionado à volatilidade e à dependência de declarações de agentes do setor no referencial de preço de curto prazo adotado pelo MME (advindo da plataforma Dcide) , ensejando recomendações ao Ministério a respeito do tema.

433. Também se verificou risco de não estar sendo considerada, na estimativa de valor da energia de longo prazo, previsão da componente de valor do lastro de capacidade de energia, com impactos na avaliação do VAC, o que motivou proposta de recomendação para atendimento do MME em futuros processos de precificação de novos contratos de concessão de usinas hidrelétricas.

434. A última constatação relacionada ao preço da energia adotado na modelagem econômico-financeira se refere à inconsistência no referencial de preço da energia de longo prazo, uma vez que, de acordo com as premissas eleitas pelo próprio MME, busca-se no presente caso o parâmetro de preço que melhor represente o valor dessa energia para os anos de 2028 a 2051, com base no Custo Marginal de Expansão (CME) do sistema. A despeito da existência de um valor associado ao CME do ano de 2033, o mais distante disponível dentre os calculados pela EPE, o parâmetro adotado sofreu influência de anos mais recentes do CME, reduzindo significativamente o preço de longo prazo e, por conseguinte, a avaliação do VAC.

435. Nesse escopo, foi proposta determinação ao MME para que reavalie o preço de energia de longo prazo utilizado, adotando como premissa mínima o valor da projeção mais distante publicado pela EPE, com as devidas correções no VAC e nos valores que dele derivam.

436. Cabe ainda relatar que, durante a análise da planilha do VAC, foram identificados erros nas fórmulas de algumas células, por não seguirem as premissas adotadas pelo MME. Essas inconsistências foram informadas ao MME, que, após avaliação interna, confirmou que eram, de fato, erros de elaboração da planilha.

437. Além das correções dos erros, o MME informou que incorporou no modelo a extensão de prazo relacionada à repactuação do risco hidrológico das outorgas (Lei 14.052/2020) das UHEs Tucuruí, Mascarenhas de Moraes e Itumbiara.

438. Considerando que o Ministério, por meio do Ofício 424/2021/SE-MME, se comprometeu formalmente a ajustar os valores envolvidos, deixa-se de propor a determinação, em consonância com o art. 16, parágrafo único, inciso I, da Resolução-TCU 315/2020.

439. Em outra seara, identificou-se que a reforma tributária atualmente em discussão no Congresso Nacional, consubstanciada nos Projetos de Lei 2.337/2021 e 3.887/2020, pode implicar benefícios financeiros futuros à Eletrobras oriundos, especialmente, das reduções de alíquotas do IRPJ e da CSLL, o que implicaria acréscimo ao VAC e possível valorização das ações da Companhia.

440. Foi, portanto, proposta recomendação no sentido de que, no caso de aprovação da reforma tributária antes da data fixada para a realização da oferta pública de ações da Eletrobras, os benefícios tributários decorrentes da nova legislação sejam incorporados ao valor adicionado dos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021.

441. Também se entendeu pertinente propor que o MME avalie a conveniência e a oportunidade de incluir, nos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021, cláusula de compartilhamento dos benefícios tributários advindos da sanção dos Projetos de Lei 2.337/2021 e 3.887/2020 aos seus valores adicionados.

442. Quanto ao impacto tarifário decorrente da privatização, este trabalho se ateve a avaliar o impacto decorrente da alteração do regime de exploração das usinas da Eletrobras, do regime de cotas de garantia física para o regime de Produtor Independente de Energia (PIE) . Não foram analisados, neste trabalho, os demais impactos decorrentes da aprovação da Lei 14.182/2021, tais como as estabelecidas no art. , § 1º, do referido diploma legal (obrigação de contratação de térmicas a gás natural, de PCHs e a prorrogação de contratos do Proinfa) .

443. O impacto tarifário resultante da descotização tende a ser neutro, haja vista: i) a pouca representatividade da energia oriunda de usinas cotistas da Eletrobras no portfólio das distribuidoras (cerca de 15%) ; ii) os aportes à CDE tendem a compensar a recompra da energia descotizada; e iii) com a alteração do regime de exploração, o risco hidrológico passa a ser do gerador.

444. Conclui-se, portanto, que são razoáveis as premissas adotadas pela Aneel e pelo MME no tocante à estimativa dos impactos tarifários decorrentes da descotização das usinas da Eletrobras.

445. Ressalta-se que o cronograma de aportes à CDE foi estabelecido com o objetivo de neutralizar os impactos de curto a longo prazo com a alteração do regime de exploração. A exceção foi o adiantamento de R$ 5 bilhões solicitado pela Aneel, cujo objetivo é minimizar os impactos tarifários decorrentes de outras causas (pandemia do Covid-19, crise hídrica, câmbio e IGP-M elevado) .

446. Por fim, a utilização de recursos resultantes da nova outorga em políticas públicas, sob a forma de contrapartidas contratuais, sem trânsito no Orçamento Geral da União também foi objeto análise.

447. Essa questão ganhou relevo a partir das discussões ocorridas no âmbito da apreciação pelo Plenário do Tribunal do processo de acompanhamento do leilão do 5G por meio do Acórdão 2032/2021-TCU-Plenário.

448. Diferentemente do constatado naquele feito, as obrigações contratuais a serem abatidas do bônus de outorga dos novos contratos de concessão são especificamente discriminadas na Lei 14.182/2021, o que afasta qualquer necessidade de interpretação quanto ao enquadramento legal dessas obrigações. Assim, ficou afastada a caracterização de ilegalidade das despesas a elas associadas.

449. Entretanto, vislumbraram-se riscos na execução de montantes da ordem de mais de R$ 800 milhões anuais, por um período de dez anos, sem a aplicação dos controles gerencias e financeiros embutidos nas regras orçamentárias e de execução financeira, típicas da Administração Pública Federal, e, ainda, nos sistemas de informação federais como o Siafi, entre outros.

450. Portanto, será proposta recomendação para que o Ministério de Minas e Energia, o Ministério do Desenvolvimento Regional e o Comitê Interministerial de Governança implementem instrumentos de governança nas regras de funcionamento dos comitês gestores dos recursos a fim de que os princípios e as diretrizes do Decreto 9.203/2017 sejam atendidas.

451. Apesar do reconhecimento de que as obrigações contratuais se fundamentam em arranjo institucional derivado de processo legislativo, não se pode olvidar que, no presente caso, a iniciativa de execução de despesas assemelhadas a políticas públicas ao largo do Orçamento Geral da União partiu do próprio Governo Federal, pois constava do texto original da Medida Provisória 1.031/2021.

452. Nesses termos e considerando os riscos associados à proliferação dessa prática, conforme discutido ao longo da instrução, será proposta recomendação à Casa Civil da Presidência da República para que evite o encaminhamento de proposições legislativas que promovam e permitam a execução de políticas públicas que não transitem pelo Orçamento Geral da União.

453. Na próxima fase do processo de desestatização da Eletrobras, serão avaliados o modelo de privatização da Eletrobras, via aumento de capital, e a restruturação societária da empresa, por meio de alterações do seu estatuto social, com vistas a induzir o modelo de controle pulverizado.

454. Também será escrutinizada, na próxima fase do processo, a avaliação econômico-financeira que será elaborada pelos consultores contratados para a definição do preço mínimo, nos termos da Lei 9.491/1997, das ações que serão ofertadas ao público para a capitalização da Eletrobras.

PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

455. Ante todo o exposto, e tendo em vista a previsão de controle concomitante deste Tribunal de Contas da União em processos de desestatização no âmbito do art. 258, inciso II, do Regimento Interno do TCU e da Instrução Normativa TCU 81/2018, submetem-se os autos à consideração superior com a seguinte proposta de encaminhamento:

a) determinar ao Ministério de Minas e Energia (MME) que reavalie o preço de energia de longo prazo utilizado na metodologia de cálculo do VAC dos novos contratos da Eletrobras, adotando como premissa, no mínimo, o valor de R$ 172,14/MWh, referente ao CME-Energia de projeção mais distante publicado pela EPE na Nota Técnica EPE-DEE-NT-081/2021-r0;

b) recomendar ao MME que:

b.1) avalie - à luz das conclusões anteriormente expostas pela EPE na Nota Técnica de Repotenciação e Modernização de Usinas Hidrelétricas, Ganhos de Eficiência, Energia e Capacidade Instalada (contendo os benefícios potenciais com a modernização do parque hidrelétrico brasileiro) , das incertezas associadas à aprovação ou não do projeto de modernização do setor elétrico e do eventual interesse da Eletrobras na realização desses estudos - a oportunidade e a conveniência de se incluir no instrumento contratual de outorga das usinas da Eletrobras cláusula que estabeleça a realização de estudos para a definição dos respectivos aproveitamentos ótimos, fazendo constar os custos associados na modelagem econômico-financeira para o cálculo do valor de outorga, se assim entender necessário;

b.2) futuramente, ao conduzir a celebração de novos contratos de concessão de usinas hidrelétricas, avalie outros referenciais de preços para a venda de energia no ambiente de contratação livre que não sejam voláteis e dependentes das declarações de agentes do setor;

b.3) mantenha a referência para o preço da energia de curto prazo no valor inicialmente adotado, de R$ 233,00/MWh;

b.4) adote, na estimativa de valor da energia de longo prazo, previsão da componente de valor do lastro de capacidade de energia;

b.5) caso os Projetos de Lei 2.337/2021 e/ou 3.887/2020 sejam sancionados antes da data fixada para a realização da oferta pública de ações da Eletrobras, os benefícios tributários decorrentes da nova legislação sejam incorporados ao valor adicionado dos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021;

b.6) avalie a conveniência e a oportunidade de incluir, nos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021, cláusula de compartilhamento dos benefícios tributários advindos da sanção da reforma tributária aos seus valores adicionados;

c) recomendar ao MME, ao Ministério de Desenvolvimento Regional (MDR) e ao Comitê Interministerial de Governança, que instituam instrumentos de governança para o funcionamento dos comitês gestores previstos nos arts. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021 a fim de assegurar, no mínimo, formas de acompanhamento de resultados, soluções para melhoria do desempenho das organizações e instrumentos de promoção de processo decisório fundamentado em evidências, nos termos do Decreto 9.203/2017;

d) recomendar à Casa Civil da Presidência da República que evite o encaminhamento de proposições legislativas que promovam e permitam a execução de políticas públicas que não transitem pelo Orçamento Geral da União; e

e) deixar de determinar ao Ministério de Minas e Energia, com fundamento no inciso Ido parágrafo único do art. 16 da Resolução-TCU 315/2020, a proposta para que corrija os erros apontados no tópico VII já que o Ministério se comprometeu formalmente a ajustar os valores envolvidos por meio do Ofício 424/2021/SE-MME (peça 197) ;

f) dar ciência ao MME quanto à necessidade de classificação das informações encaminhadas em atendimento aos processos de desestatização previstos na IN-TCU 81/2018 pelo tipo de informação exigida nos arts. 3º, 4º e 5º, conforme o caso, fazendo constar justificativa quanto ao não atendimento de algum dos dispositivos mencionados."

2. Esta proposta de encaminhamento contou com a anuência do corpo diretivo da SeinfraElétrica (peças 235 e 236) .

3. Encontrando-se os autos em meu Gabinete, o Ministério Público que atua perante este Tribunal de Contas da União (MPTCU) , representado neste TC Processo XXXXX/2018-2 pelo Procurador Rodrigo Medeiros de Lima, requereu, com respaldo no art. , inciso XV, da Lei Complementar 75, de 20/5/1993, nos arts. 81, inciso II, e 84 da Lei 8.443/1992, e no art. 9º, caput e § 1º, da Portaria MP/TCU nº 2, de 31/8/2020, a oportunidade de oficiar nos autos (peça 238) , o que foi, de pronto, deferido por este relator, consoante despacho autuado como peça 243.

4. O parecer do douto Procurador consta da peça 249 do processo e segue colacionado abaixo, in verbis:

"Em análise, o processo de desestatização das Centrais Elétricas Brasileiras S.A. - Eletrobras, sociedade de economia mista constituída pela Lei 3.890-A, de 25 de abril de 1961, tendo 'por objeto a realização de estudos, projetos, construção e operação de usinas produtoras e linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica, bem como a celebração dos atos de comércio decorrentes dessas atividades' (art. 2º, caput, da Lei 3.890-A/1961) .

2. Originalmente, o art. 1º do Decreto 1.503/1995 inseriu a Eletrobras no Programa Nacional de Desestatizacao ( PND) inaugurado pela Lei 8.031/1990 e atualmente tratado pela Lei 9.491/1997. Em um segundo momento, foi promulgada a Lei 10.848/2004, que em seu art. 31, § 1º, expressamente retirou aquela estatal do rol de entidades a serem privatizadas. Mais recentemente, a Medida Provisória 814/2017 buscou levantar o referido óbice legislativo, ensejando nova inclusão via Decreto 9.351/2018. Todavia, a medida provisória teve sua vigência encerrada nos termos do art. 62, § 3º, da Constituição da Republica e o Decreto 9.351/2018 foi posteriormente revogado pelo Decreto 10.670/2021.

3. No momento atual, observa-se que a Medida Provisória 1.031/2021, convertida na Lei 14.182/2021, suprimiu o aludido art. 31, § 1º, da Lei 10.848/2004, viabilizando a inclusão da Eletrobras no PND pelo Decreto 10.670/2021.

4. Nesse passo, a desestatização em tela rege-se pelas Leis 9.491/1997 e 14.182/2021, conforme dispõe o art. 1º, caput, da citada Lei 14.182/2021. A modalidade operacional para sua concretização, segundo o § 1º daquele dispositivo, é aquela descrita no art. , inciso III, da Lei 9.491/1997 (e reproduzido no art. , inciso III, do Decreto 2.594/1998), a saber: 'aumento de capital, com renúncia ou cessão, total ou parcial, de direitos de subscrição'. A par da subscrição de novas ações, prevê a legislação que 'o aumento do capital social da Eletrobras poderá ser acompanhado de oferta pública secundária de ações de propriedade da União ou de empresa por ela controlada' (art. , § 2º, da Lei 14.182/2021).

5. A relevância da privatização da Eletrobras para o setor elétrico brasileiro é evidente, considerando que suas atribuições extrapolam a provisão direta de serviços públicos (art. 21, inciso XII, alínea 'b', da Constituição) , pois incluem participação ativa no planejamento do setor, consoante seu Estatuto Social (grifamos) :

Art. 4º- A Eletrobras tem por objeto social:

I - realizar estudos, projetos, construção e operação de usinas produtoras e linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica, bem como a celebração de atos de empresa decorrentes dessas atividades, tais como a comercialização de energia elétrica;

II - cooperar com o Ministério, ao qual se vincule, na formulação da política energética do país;

III - promover e apoiar pesquisas de seu interesse empresarial no setor energético, ligadas à geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, bem como estudos de aproveitamento de reservatórios para fins múltiplos; e

IV - participar, na forma definida pela legislação, de programas de estímulo a fontes alternativas de geração de energia, uso racional de energia e implantação de redes inteligentes de energia.

6. Com efeito, o art. 1º da Lei 5.899/1973 revela que a Eletrobras chegou a ocupar o posto de 'órgão de coordenação técnica, financeira e administrativa do setor de energia elétrica', ipsis litteris:

Art 1º Compete a Centrais Elétricas Brasileiras S. A. - ELETROBRÁS -, como órgão de coordenação técnica, financeira e administrativa do setor de energia elétrica, promover a construção e a respectiva operação, através de subsidiárias de âmbito regional, de centrais elétricas de interesse supra-estadual e de sistemas de transmissão em alta e extra-alta tensões, que visem a integração interestadual dos sistemas elétricos, bem como dos sistemas de transmissão destinados ao transporte da energia elétrica produzida em aproveitamentos energéticos binacionais.

(grifamos)

7. Tratando da parte final do dispositivo acima, nota-se que o aproveitamento hidrelétrico dos recursos hídricos do rio Paraná, pertencentes ao Brasil e ao Paraguai em condomínio, é consabidamente explorado pela empresa Itaipu Binacional, constituída pelo Tratado Internacional internalizado pelo Decreto 72.707/1973. Por expressa determinação daquele Tratado, a Eletrobras ('ou o ente jurídico que a suceda') detém participação paritária no capital social de Itaipu e nomeia conselheiros e diretores daquela entidade.

8. Ademais, há exploração de serviços constitucionalmente reservados à União (art. 21, incisos XXIII, da Constituição) por empresa subsidiária da Eletrobras, qual seja, a Eletrobras Termonuclear - Eletronuclear, criada pelo Decreto 76.803/1975 com a denominação original de Nuclebrás Engenharia S.A. (designação alterada pelo Decreto de 23 de dezembro de 1997).

9. Atenta aos tópicos acima, a Lei 14.182/2021 condicionou a desestatização da Eletrobras à aprovação de medidas assecuratórias para que a exploração de energia nuclear e a participação brasileira na empresa Itaipu Binacional permanecessem sob o controle da União:

CAPÍTULO II

DAS CONDIÇÕES PARA A DESESTATIZAÇÃO DA ELETROBRAS

Art. 3º A desestatização da Eletrobras fica condicionada à aprovação, por sua assembleia geral de acionistas, das seguintes condições:

I - reestruturação societária para manter sob o controle, direto ou indireto da União, empresas, instalações e participações, detidas ou gerenciadas pela Eletrobras, especificamente Eletrobras Termonuclear S.A. (Eletronuclear) e Itaipu Binacional;

10. A fim de recepcionar as duas atividades relacionadas acima, foi instituída a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional S.A. (ENBPar) pelo Decreto 10.791/2021, cujo art. assim enuncia:

Art. 2º A ENBpar, nos termos do disposto no art. 9º da Lei nº 14.182, de 12 de julho de 2021, terá por finalidade:

I - manter sob o controle da União a operação de usinas nucleares;

II - manter a titularidade do capital social e a aquisição dos serviços de eletricidade da Itaipu Binacional por órgão ou entidade da administração pública federal para atender ao disposto no Tratado entre a República Federativa do Brasil e a República do Paraguai para o Aproveitamento Hidrelétrico dos Recursos Hídricos do Rio Paraná, Pertencentes em Condomínio aos dois Países, desde e inclusive o Salto Grande de Sete Quedas ou Salto de Guairá até a Foz do Rio Iguaçu, promulgado pelo Decreto nº 72.707, de 28 de agosto de 1973;

11. A par de sua relevância estratégica para o país, a desestatização em apreço envolve cifras vultosas. Conforme se examinará adiante, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) estimou que a principal condicionante estipulada para a privatização da Eletrobras - a saber, a celebração de 'novas outorgas de concessões de geração de energia elétrica sob titularidade ou controle, direto ou indireto, da Eletrobras' (art. 2º da Lei 14.182/2021) - adicionará R$ 62.479.656.370,10 ao valor daqueles direitos de exploração (peça 166) .

12. A destinação do referido montante é disciplinada pela Lei 14.182/2021. Em síntese, 50% daquele valor deverá ser pago pela Eletrobras 'à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) , de que trata a Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002' (art. , inciso I, da Lei 14.182/2021). Os restantes 50% reverteriam ao Erário a título de bonificação, descontadas as relevantes parcelas listadas no art. , inciso II, da Lei 14.182/2021:

a) despesas relacionadas à revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, nos termos da alínea a do inciso V do caput do art. 3º desta Lei;

b) despesas relacionadas ao desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal com vistas a reduzir estruturalmente os custos de geração de energia e para a navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins, de acordo com o disposto na alínea b do inciso V do caput do art. 3º desta Lei;

c) despesas relacionadas aos projetos na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas, cujos contratos de concessão sejam afetados por esta Lei, nos termos da alínea c do inciso V do caput do art. 3º desta Lei; e

d) despesas para ressarcir o valor econômico do fornecimento de energia elétrica para o Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) , conforme tratado no § 6º do art. 6º desta Lei;

13. Assim, dos R$ 62,5 bilhões acrescentados ao valor dos contratos de concessão das 22 usinas hidroelétricas (UHE) 'sob titularidade ou controle, direto ou indireto, da Eletrobras', somente R$ 23.218.488.754,73 (i.e. 37,16% do valor acrescido) ingressariam nos cofres do Tesouro Nacional.

14. Cabe anotar que a privatização da Eletrobras não desponta descontextualizada no setor elétrico, representando, em verdade, o ápice do processo histórico para provisão indireta desse serviço público, tendo sido precedida pela desestatização de inúmeras de suas subsidiárias.

15. Ilustrativamente, nessa seara, o TCU fiscalizou o processo de desestatização das concessionárias distribuidoras de energia elétrica federalizadas pela Lei 9.619/1998, reunidas as competentes análises no TC Processo XXXXX/2016-8, culminantes no Acórdão 1199/2018-TCU-Plenário (Rel. Min. José Múcio Monteiro) . Nomeadamente, compuseram aquela rodada de desestatizações a Companhia Energética do Piauí (Cepisa) , Companhia Energética de Alagoas (Ceal) , Companhia de Eletricidade do Acre (Eletroacre) , Centrais Elétricas de Rondônia (Ceron) , Boa Vista Energia S.A. (Boa Vista) e Amazonas Distribuidora de Energia S.A. (Amazonas Energia) .

16. Precedeu-as a desestatização da Companhia Energética de Goiás - Distribuição S.A. (Celg-D) , examinada no TC Processo XXXXX/2015-5, em que o Colegiado proferiu o Acórdão 2302/2018-TCU-Plenário (Rel. Min. José Múcio Monteiro) , constatando a regular adoção dos trâmites previstos na então vigente Instrução Normativa TCU 27/1998.

17. A avaliação 'sistêmica [d]a sustentabilidade econômico-financeira das concessões' relacionadas acima - ou seja, das distribuidoras anteriormente subsidiárias da Eletrobras, bem assim da regulação sobre elas exercida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) , foi realizada no âmbito do TC Processo XXXXX/2020-4.

18. Naquele processo, concluiu o Tribunal, em adesão ao Voto condutor do Acórdão 1112/2021-TCU-Plenário (Rel. Min. Jorge Oliveira) , que 'A atuação das distribuidoras de energia elétrica aqui examinadas, historicamente contaminada por baixos índices de qualidade e vultosos desequilíbrios econômico-financeiros, passa por momento relevante de maturação a partir das recentes privatizações'.

19. A desestatização sob exame se faz acompanhar de providência ('descotização') a desregular condições da oferta de energia elétrica. Medidas dessa natureza, ao eliminarem inevitáveis distorções decorrentes da regulação de preços, permitem que o valor da energia reflita sua escassez/abundância relativamente a todos os demais bens da economia - e, assim, apresentam a vantagem de contribuir para o aprimoramento da alocação geral das forças produtivas do país.

20. Todavia, a iniciativa carece de semelhante desregulação das condições de demanda por energia elétrica, tal como a expansão do Ambiente de Contratação Livre (ACL) , para que mais consumidores deixem a condição de cativos e passem a escolher os fornecedores que melhor os atendam.

21. Em síntese, a nosso sentir, a iniciativa em tela aproxima o setor do modelo concorrencial, preterindo, porém, o consumidor residencial e pouco contribuindo para que o país deixe a penúltima posição entre os 56 países considerados no ranking de liberdade de energia elétrica.

***

22. A presente fiscalização do Tribunal segue o rito da Instrução Normativa 81/2018, havendo decisão monocrática (peça 97) a afastar a aplicabilidade da IN TCU 27/1998 sobre a matéria, conforme aconselhado pela Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura de Energia Elétrica - SeinfraElétrica (peças 92/94) .

23. A privatização da Eletrobras mediante a subscrição de ações, diluindo-se a participação societária da União, será precedida da reformulação de 22 contratos de concessão firmados com empresas subsidiárias exploradoras de usinas hidrelétricas (vide relação à peça 234, pp. 11/12) . Os novos contratos enfocarão o alinhamento dos prazos - a serem fixados em trinta anos, conforme art. , § 1º, da Lei 14.182/2021 - e a mudança do regime de exploração daquele serviço. Nesse aspecto, o atual regime de cotas, previsto no art. , § 1º, inciso II, da Lei 12.783/2013, cederá passo ao regime de produção independente, disciplinado pelo Decreto 2.003/1996.

24. Referida por 'descotização', a modificação impactará significativamente as receitas associadas, tendo o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) computado em 'R$ 62.479.656.370,10 (...) o valor adicionado pelos novos contratos de concessão (...) em função da desestatização das Centrais Elétricas Brasileiras S.A. - Eletrobras' (peça 166) .

25. Considerando a particularidade dessa dinâmica, bem assim a complexidade inerente à privatização em tela e seus desdobramentos, o Ministro Relator do feito (despacho de peça 97), sob o conselho da SeinfraElétrica (peça 92) , resolveu segmentar a análise do processo segundo pontos de controle priorizados (vide peça 92, pp. 25/26) . Nesse sentido, decidiu o Ministro Relator, in verbis:

c) determinar à SeinfraElétrica que, sem prejuízo à adoção de semelhante providência em outros momentos caso entenda pertinente, submeta os presentes autos ao exame deste relator em pelo menos duas oportunidades, cada uma delas com o objetivo de analisar:

c.1) na primeira dessas duas oportunidades, o valor adicionado com os novos contratos de geração de energia elétrica a que alude a Medida Provisória 1.031/2021 em seu art. , inciso II, e a consequente definição do valor do bônus de outorga;

c.2) na segunda ou última manifestação do Tribunal sobre a matéria, a capitalização propriamente dita da Eletrobras.

26. Seguindo essa organização dos trabalhos, o presente pronunciamento ocupa-se de temas afeitos ao valor a ser adicionado com a reconfiguração dos contratos de concessão em apreço, a exemplo da mais recente instrução de mérito da SeinfraElétrica (peça 234) .

27. Importa registrar que a elaboração desta peça beneficiou-se dos esclarecimentos técnicos recebidos em interações com representantes do MME, Eletrobras, BNDES, Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras (AESEL) , Associação dos Empregados de Furnas (ASEF) , Confederação Nacional dos Urbanitários (CNU) e Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE) , bem assim da SeinfraElétrica e da Semag.

28. A estrutura desta manifestação é tal como representada a seguir:

(...)

II - Principais pontos da instrução de mérito (peça 234)

29. Em sua manifestação conclusiva sobre o tema em discussão (peça 234) , a SeinfraElétrica identificou a necessidade de atuação do Tribunal quanto aos seguintes aspectos do processo de desestatização em tela:

1) documentos e informações encaminhados em atendimento à IN TCU 81/2018, contendo elementos necessários à fiscalização do Tribunal; (peça 234, p. 6/9)

2) medidas favoráveis à definição do chamado 'aproveitamento ótimo' de cada UHE (peça 234, p. 12/15) ;

3) preço da energia elétrica a ser praticado pelas concessionárias (peça 264, p. 23/31) ;

4) impactos tributários decorrentes da eventual aprovação de determinadas propostas legislativas (peça 264, p. 48/60) ; e

5) inclusão, nos novos contratos de concessão precedentes da desestatização da Eletrobras, de obrigações relativas à execução de projetos (revitalização de bacias hidrográficas; fomento à navegabilidade hidroviária etc.) cujo valor será descontado do pagamento do bônus de outorga (i.e. valores que deixarão de ser recolhidos ao erário) .

30. Afora os pontos acima, este parecer se debruça sobre os tópicos adiante:

6) Estimativa da garantia física do sistema e das usinas hidrelétricas abrangidas pela Lei 14.182/2021;

7) Cronograma para descotização do regime de comercialização de energia; e

8) Cronograma dos aportes devidos à CDE.

31. Dedicamos, na sequência, subseções próprias para o debate de cada um dos temas acima.

II.1 - Elementos necessários à fiscalização do Tribunal, conforme a IN TCU 81/2018

32. Conforme adiantado na introdução deste pronunciamento, o processo em debate submete-se ao trâmite de fiscalização previsto na IN TCU 81/2018, cujos arts. 3º, 4º e 5º especificam o conjunto mínimo de informações para análise do Tribunal.

33. Ao conferir a completude da documentação encaminhada (peças 140/147, 178/186 e 188/196) , a SeinfraElétrica identificou 'lacunas em relação a uma série de informações, tais como a metodologia para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro da concessão ou aquelas relacionadas à licença ambiental dos empreendimentos e as suas respectivas condicionantes' (peça 234, p. 8) .

34. Em consequência, propõe ao Tribunal 'dar ciência ao MME quanto à necessidade de classificação das informações encaminhadas (...) , fazendo constar justificativa quanto ao não atendimento de algum dos dispositivos mencionados' (peça 234, p. 64) .

35. O Ministério Público de Contas da União comunga da preocupação externada pela unidade técnica, aduzindo as seguintes considerações.

36. Sobre a envergadura do projeto, pondera a SeinfraElétrica que:

O processo de desestatização da Eletrobras - inicialmente apresentado à SeinfraElétrica em reunião realizada no dia 26/4/2021, com representantes do MME, Ministério da Economia (ME) , BNDES e Eletrobras (peça 92, anexo A) - compreende, além dos procedimentos normalmente previstos em processos de concessões de serviços públicos, as etapas necessárias para a conclusão da privatização de uma empresa estatal.

(peça 234, p. 6)

37. Com as licenças devidas à unidade técnica, entendemos ainda mais pertinente afirmar que o processo de desestatização da Eletrobras compreende, além dos procedimentos normalmente previstos em processos de privatização, as etapas necessárias para a conclusão de concessões de serviços públicos.

38. Isso porque, em realidade, está-se diante de autêntica privatização precedida de (vinte e duas) concessões, submissíveis à análise regulamentada pela IN 81/2018, ainda que na forma disciplinada em seu art. 2º, § 3º (i.e. exame amostral) .

39. Em termos claros: o modo escorreito para obtenção de razoável segurança acerca do valor presente que as novas outorgas de concessões de geração de energia elétrica propiciarão às concessionárias ('valor adicionado') , estimado pelo CNPE em R$ 62,5 bilhões, consiste na análise individual dos estudos de viabilidade técnica, econômico-financeira e ambiental (incluídos os fluxos de caixa projetados com as receitas no regime de produção independente) de cada uma das 22 usinas hidrelétricas alcançadas pelo art. 2º da Lei 14.182/2021.

40. Nos casos em que a análise individual de concessões outorgadas simultaneamente seja entendida como dispensável 'de acordo com os critérios de materialidade, relevância, oportunidade e risco' (art. 2º, § 1º, in fine, da IN TCU 81/2018) , aplica-se a técnica amostral de que trata o § 3º do art. 2º da IN TCU 81/2018, ao talante do Ministro Relator do processo.

41. Eis por que se insistiu, na fase instrutória, para que o MME apresentasse, entre outros, a 'relação de estudos, investigações, levantamentos, projetos, obras e despesas ou investimentos já efetuados, vinculados ao objeto a ser licitado' e a 'minuta contratual e caderno de encargos, já consolidados com os resultados decorrentes de eventuais consultas e audiências públicas' (peça 234, p. 7/8) .

42. No tocante a esse último ponto, causa espécie que o Tribunal tenha sido acionado mediante a oferta de documentação patentemente incompleta, disso fazendo prova a comunicação da Aneel datada de 17 de setembro de 2021, juntada à peça 192:

Atualmente o processo se encontra na fase de análise das contribuições recebidas por meio da Consulta Pública nº 48/2021, com previsão de ser concluída nos próximos dias. Após essa etapa, o processo será encaminhado à Diretoria da Agência para que seja deliberado sobre a versão definitiva da minuta contratual. Logo após a aprovação pela Diretoria, a ANEEL enviará ao MME o processo contendo a versão aprovada da minuta contratual.

43. A jurisprudência do TCU é clara ao rechaçar a submissão prematura de estudos relativos a desestatizações, destacadamente quanto à falha na incorporação do resultado de audiência pública naqueles documentos preparatórios. Emblemático, nesse sentido, o Acórdão 3161/2011-TCU-Plenário (Rel. Min. José Múcio Monteiro) , verbatim:

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, com fundamento no art. 43, inciso I, da Lei nº 8.443/1992 e nos arts. 250, inciso II, e 258, inciso II, do Regimento Interno, c/c os arts. 7º e 8º, inciso I, da Instrução Normativa TCU nº 27/1998, em:

9.1. interromper o prazo de análise do 1º estágio de fiscalização, tendo em vista que a CDRJ irá realizar audiência pública referente ao certame;

9.2. cientificar a CDRJ e a Antaq de que o advento da audiência pública torna necessário o envio da documentação de 1º estágio atualizada com os resultados da referida audiência e aprovada pela agência reguladora, bem como o reinício da contagem do prazo previsto no art. 9º da Instrução Normativa TCU nº 27/1998;

9.3. restituir o processo à Sefid-1.

44. Destacam-se, em idêntico sentido, os Acórdãos 925/2016, 926/2016, 956/2016 e 957/2016, todos do Plenário (Relator Min. Walton Alencar Rodrigues) , pelos quais determinou-se à agência reguladora do transporte aéreo que se abstivesse de encaminhar EVTEAs antes da análise e consolidação das contribuições recebidas em audiência pública.

45. Entendemos procedente o argumento do MME quanto à inaplicabilidade da exigência de instrumento convocatório, por alheio: a) à modalidade de privatização da Eletrobras; e b) à adjudicação direta e não-onerosa dos contratos de concessão às atuais incumbentes, assim autorizada pela Lei 14.182/2021.

46. Nada obstante, entendemos irregular a prematura apresentação dos estudos para privatização da Eletrobras - isto é, sem que o Tribunal possa se debruçar sobre a versão definitiva dos novos contratos de concessão -, bem assim a omissão em apresentar documentos necessários.

47. O Parquet de contas, nesse passo, opina por que se confira a este caso solução semelhante aos antecedentes mencionados, isto é, que se determine ao MME que se abstenha de encaminhar, ao Tribunal de Contas, estudos de viabilidade antes que haja a devida documentação formal da análise e consolidação das contribuições recebidas em audiência pública, sob pena de reinício da contagem do prazo de análise tratado na IN TCU 81/2018.

II.2 - Novos contratos de concessão e a definição do 'aproveitamento ótimo' de cada usina

48. A Lei 9.074/1995, em seu art. , traz a definição do objeto da concessão na seara hidrelétrica, aduzindo definição essencial à eficiência e sustentabilidade do serviço público a ser prestado - qual seja, o de aproveitamento ótimo do potencial hidrelétrico:

Art. 5º São objeto de concessão, mediante licitação:

I - o aproveitamento de potenciais hidráulicos e a implantação de usinas termoelétricas de potência superior a 50.000 kW (cinquenta mil quilowatts) destinados a execução de serviço público;

II - o aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 50.000 kW (cinquenta mil quilowatts) destinados a produção independente de energia elétrica;

III - de UBP, o aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 50.000 kW (cinquenta mil quilowatts) destinados a uso exclusivo de autoprodutor, resguardado direito adquirido relativo às concessões existentes.

§ 1º Nas licitações previstas neste e no artigo seguinte, o poder concedente deverá especificar as finalidades do aproveitamento ou da implantação das usinas.

§ 2º Nenhum aproveitamento hidrelétrico poderá ser licitado sem a definição do 'aproveitamento ótimo' pelo poder concedente, podendo ser atribuída ao licitante vencedor a responsabilidade pelo desenvolvimento dos projetos básico e executivo.

§ 3º Considera-se 'aproveitamento ótimo', todo potencial definido em sua concepção global pelo melhor eixo do barramento, arranjo físico geral, níveis d'água operativos, reservatório e potência, integrante da alternativa escolhida para divisão de quedas de uma bacia hidrográfica.

49. Por exigência de vetores constitucionais básicos, os serviços públicos devem ser prestados de modo compatível com o interesse público, o que envolve sua provisão tecnicamente apropriada, sem desperdícios, desequilíbrios ou ônus exorbitantes aos usuários. Para os casos em que a exploração dessas atividades é concedida a particulares, o art. 6º da Lei 8.987/1995 esclarece que:

Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

§ 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.

50. Ainda quanto à forma de prestação desses serviços, nota-se haver requisitos de qualidade e desempenho em contratos para concessão da exploração de espectros de radiofrequência (viz. requisitos de cobertura e abrangência) , subconcessão (arrendamento) de terminais portuários (Movimentação Mínima Contratual - MMC) , concessão de trechos rodoviários (duplicação de pistas de rodagem, correção da geometria da via, níveis de serviço) .

51. Nesse sentido, torna-se compreensível a exigência de que os principais fatores envolvidos na prestação do serviço (eixo do barramento, arranjo físico geral, níveis d'água operativos, reservatório e potência) sejam objeto de otimização em termos definidos pelo Poder Público de forma periódica - tendo em conta que diversas das UHEs consideradas operam desde as décadas de 1980 (v.g. Tucuruí) e 1990 (e.g. Xingó) .

52. A responsabilidade pela fixação do aproveitamento ótimo para cada UHE, no entanto, tem recebido tratamento cambiante por parte da legislação.

53. De acordo com o art. , inciso III, da Lei 9.427/1996 (Lei de criação da Aneel), tal encargo competia à agência reguladora do setor, muito embora os estudos para estimativa daquela configuração ideal pudessem ser desenvolvidos pela própria concessionária (art. 5º, § 2º, in fine, da Lei 9.074/1995) .

54. Com o advento da Lei 10.848/2004, a referida atribuição da Aneel foi expressamente suprimida (art. 32, in fine, daquele diploma) , tendo sido destinados recursos da Reserva Global de Reversão (RGR) para que o MME custeasse 'estudos e pesquisas (...) de viabilidade necessários ao aproveitamento dos potenciais hidroelétricos' (art. 6º da Lei 10.848/2004) . Não há menção, nos normativos subsequentes, à destinação de recursos específicos para custeio daqueles estudos.

55. O Decreto 9.415/2018, em seu art. , restituiu à Aneel a competência quanto à 'definição do 'aproveitamento ótimo' de que tratam os §§ 2º e 3º do art. 5º da Lei nº 9.074, de 1995', sem embargos da faculdade conferida pelo art. , § 4º, do Decreto 2.003/1996:

§ 4º O órgão regulador e fiscalizador do poder concedente poderá autorizar o interessado a realizar, por sua conta e risco, os estudos técnicos necessários para a definição do aproveitamento ótimo, ficando assegurado, no caso de aprovação desses estudos e sua inclusão no programa de licitações do poder concedente, o ressarcimento dos custos incorridos, pelo vencedor da licitação, nas condições e valores estabelecidos no edital.

56. Nesse quadrante, a agência reguladora, por meio da Resolução Normativa 875/2020, estabelece que as concessões para aproveitamento de potencial hidrelétrico superior a 50.000 kW devem ser antecedidas pela elaboração de estudos de viabilidade (EVTE) , a serem avaliados, entre outros, por sua capacidade de estimar o dimensionamento ótimo do projeto:

Art. 47. Os EVTE (s) serão objeto de avaliação quanto aos seguintes aspectos:

I - desenvolvimento dos EVTE (s) fundamentados em estudos básicos consistentes e adequados à etapa e ao porte do empreendimento;

II - atendimento à boa técnica em nível de projetos e soluções para o empreendimento, especialmente quanto às condições de atualidade, eficiência e segurança, e apresentação de custos com precisão adequada às diversas etapas de desenvolvimento dos EVTE (s) , de modo a garantir uma correta definição do dimensionamento ótimo, de acordo com as normas técnicas e procedimentos instituídos pela ANEEL;

(grifamos)

57. No vertente caso, a SeinfraElétrica indagou a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) 'acerca da conveniência e oportunidade na inclusão de exigências para a definição do aproveitamento ótimo desses empreendimentos nos respectivos contratos de concessão' (peça 176, p. 2) .

58. O questionamento embasou-se nas conclusões do documento intitulado 'Repotenciação e Modernização e Usinas Hidrelétricas - Ganhos de eficiência, energia e capacidade instalada', publicado pela própria EPE em 2019, que relaciona uma série de prováveis benefícios na repotenciação do parque hidrelétrico brasileiro, em especial no tocante a ativos mais antigos, tais como as usinas da Eletrobras contempladas na Lei 14.182/2021.

59. A percepção da unidade técnica foi reforçada, ademais, pelo fato de que exigências similares foram incluídas nos contratos de concessão da UHE Porto Primavera (TC Processo XXXXX/2018-0) e das usinas hidrelétricas da Companhia Estadual de Geração e Transmissão de Energia Elétrica (CEEE-GT) (TC Processo XXXXX/2020-7) .

60. Sobre o tema, a EPE confirmou que o documento mencionado pela SeinfraElétrica 'tem por objetivo 'quantificar e avaliar economicamente, em nível preliminar, os ganhos de energia e de potência, individuais e sistêmicos do parque hidrelétrico brasileiro, obtidos pela recapacitação do conjunto de usinas de estudo',' mas que declaradamente não poderia 'ser utilizado como uma ferramenta decisória única e exclusiva' (peça 202, p. 4) .

61. Outrossim, no sentir daquela empresa pública, 'avanços legais e regulatórios, inclusive no que tange à definição de aproveitamento ótimo' seriam necessários para 'orientar investimentos em repotenciação e modernização de usinas hidrelétricas' (peça 202, p. 4) , de modo que a EPE desaconselhou instituir-se obrigação contratual para que as concessionárias providenciassem tais estudos, até porquanto inexistiriam 'informações suficientes para indicar a viabilidade financeira e técnica sobre o investimento' nesse tipo de trabalho (peça 202, p. 4) .

62. Por meio de estimativa do custo para elaboração de tais estudos a partir das diretrizes normativas aplicáveis (mormente das regras de ressarcimento de EVTE contidas na Resolução Normativa Aneel 934/2021), a SeinfraElétrica logrou demonstrar que tal despesa 'representa menos de 1,5% do valor adicionado com os novos contratos de concessão (VAC) , motivo pelo qual não há o que se falar em inviabilidade econômica sobre o investimento em novos estudos para todas as usinas em questão, como alegado pela EPE' (peça 234, p. 14) .

63. Assim, dissentindo das ponderações da EPE, propõe recomendar ao MME 'incluir no instrumento contratual de outorga das usinas da Eletrobras cláusula que estabeleça a realização de estudos para a definição dos respectivos aproveitamentos ótimos' (peça 234, p. 63) .

64. O Ministério Público de Contas, com as vênias devidas à empresa pública, também diverge das ponderações trazidas no Ofício 1631/2021/PR/EPE e seu anexo (peças 201 e 202) .

65. Primeiramente, vislumbramos que a diretiva proposta pela unidade técnica do Tribunal não emprega a publicação em tela, da lavra da própria EPE, como 'ferramenta decisória única e exclusiva', e sim como qualificado indicativo de haver margem para otimização do aproveitamento hidrelétrico que ora se repactua. Tanto é assim que contratos de concessão recentemente firmados - e.g. UHE Porto Primavera e da CEEE-G - contemplam cláusulas nesse sentido, verbatim:

CONTRATO DE CONCESSÃO nº 01/2019 - ANEEL - UHE PORTO PRIMAVERA

(...)

CLÁUSULA QUARTA - OBRIGAÇÕES E ENCARGOS DA CONCESSIONÁRIA

Para possibilitar a exploração do potencial hidráulico referido na Cláusula Primeira, a Concessionária assume todas as responsabilidades e os encargos relacionados com a operação e a manutenção da UHE, devendo observar as normas técnicas e exigências legais aplicáveis.

Subcláusula Primeira - Sem prejuízo do disposto nas demais Cláusulas deste Contrato, constituem encargos gerais da Concessionária na exploração da UHE:

(...)

II. Elaborar estudos de viabilidade técnica e econômica para identificação do aproveitamento ótimo da UHE, considerando as estruturas civis existentes, e submetê-los à avaliação da ANEEL no prazo de 24 (vinte e quatro) meses após a assinatura deste Contrato, observando a legislação e a regulamentação específicas, e promover a eventual ampliação da UHE, se assim determinado pelo Poder Concedente, observado o disposto na Subcláusula Sexta da Cláusula Terceira deste Contrato;

(negrito retirado)

66. Tampouco merece prosperar o argumento levantado pela EPE em seguida (necessidade de avanços na definição do 'aproveitamento ótimo') . Nesse quadrante, verificamos que tanto a legislação (art. , § 3º, da Lei 9.074/1995) quanto a literatura técnica especializada oferecem parâmetros suficientes para a operacionalização daquele conceito. Relegar a eficácia imediata do referido preceito equivaleria, grosso modo, a negar aplicabilidade ao requisito de 'serviço adequado' (art. , § 1º, da Lei 8.987/1995) por falta de ulterior detalhamento na descrição de seus componentes.

67. No mais, partilhamos da opinião técnica de que, a priori, os custos com estudos para otimização do aproveitamento hidrelétrico - estimado pela unidade técnica como representativo de 1,5% do valor adicionado pela recontratação das concessões (peça 234, p. 14) - justificam-se por sua reversão em prol do sistema. Consultando publicações na área, lê-se que esforços de repotenciação mínima, correspondentes à recuperação dos desempenhos originais de turbinas e geradores, resultam em ganhos referenciais de 2,5% de rendimento (VEIGA e BERMANN, 2002) , e que a experiência internacional demonstra que o momento de renovação das concessões é ideal para promoção dessas medidas (CASTRO et al., 2019: 3) :

3.1 - O caso sueco

O país nórdico aproveitou o período de renovação das concessões de usinashidrelétricas como uma oportunidade para a modernização e a repotenciação das instalações. O saldo energético foi positivo, com uma geração adicional de 337 GWh/ano.

Destaca-se que as usinas de mais de 10 MW que participaram da renovação das concessões e realizaram investimentos em recapacitação tiveram um aumento médio de produção de, aproximadamente, 4,7%. Desse modo, percebe-se que a janela de oportunidades para o caso escandinavo foi o momento de renovação das concessões.

68. Assim, considerando que o 'aproveitamento ótimo', verificado em estudos submetidos ao Poder Público para cada empreendimento hidrelétrico, é requisito legal para exploração do potencial de geração de energia;

68.1. Considerando que os estudos necessários para aquilatar os termos do mencionado 'aproveitamento ótimo' em cada UHE podem ser desenvolvidos diretamente pelo 'órgão regulador e fiscalizador do poder concedente' ou, indiretamente, pelo interessado em assumir a concessão (art. , § 4º, do Decreto 2.003/1996);

68.2 Considerando que a elaboração de estudos para identificação do 'aproveitamento ótimo' (para avaliação decisória da agência reguladora) foi exitosamente incluída em recente conjunto de concessões para geração de energia hidrelétrica, na forma de obrigação contratual do incumbente;

68.3. Considerando que falece razão à EPE em suas explanações contrárias à inserção de obrigação dessa natureza nos contratos de concessão de que trata o art. 2º da Lei 14.182/2021 (peças 201/202) ;

68.4. Considerando que a literatura técnica aponta haver ganhos efetivos (eficiência, potência e até capacidade instalada) com medidas para 'aproveitamento ótimo' ('intervenções nos equipamentos hidrogeradores, de automação e de controle, capazes de incorporar técnicas e concepções avançadas de projetos de engenharia', cf. CASTRO et al., 2019: 1) ;

68.5 Considerando que as boas práticas internacionais recomendam que medidas tendentes a promover o 'aproveitamento ótimo' sejam aventadas em momentos de repactuação das respectivas concessões;

68.6. O Ministério Público opina por que o Colegiado delibere no sentido de determinar ao MME que inclua, no instrumento contratual das 22 novas concessões previstas pela Lei 14.182/2021, cláusula que estabeleça obrigação da concessionária em contratar estudos para a definição dos respectivos aproveitamentos ótimos, a serem submetidos à aprovação da agência reguladora, fazendo constar os custos associados na modelagem econômico-financeira no cálculo do valor de outorga, se assim entender necessário.

II.3 - Estimativa de receitas: preço da energia elétrica a ser praticado pelas concessionárias

69. Uma vez que o regime de comercialização da energia produzida nas 22 UHE será 'descotizado' (ex vi do art. 2º da Lei 14.182/2021) , permitindo sua venda no Ambiente de Contratação Livre (ACL) , entende-se que o valor adicionado pelos novos contratos de concessão deve necessariamente considerar receitas obteníveis naquele ambiente de mercado.

70. A estimativa dos preços futuros foi realizada pela EPE (peça 205) - que, defrontando-se com o dilema entre extrapolar valores a partir da série histórica disponível e valer-se da expectativa de agentes setor, optou pelo segundo método.

71. Desse modo, porquanto 'os contratos de comercialização no ambiente livre são sigilosos e apenas as partes envolvidas sabem de fato o preço de venda da energia' (peça 234, p. 24) , a EPE buscou referência em entidade privada (consultoria Dcide) detentora de banco de dados no qual agentes supostamente representativos do setor 'cadastram, semanalmente, suas referências de preços forwards individuais para o horizonte de até cinco anos' (peça 234, p. 23) .

72. As limitações dessa metodologia de estimativa foram bem percebidas pela SeinfraElétrica, que identificou vulnerabilidades de duas sortes:

a) as projeções de longo prazo produzidas pela consultoria Dcide padecem de excessiva volatilidade, aparentando fundar-se não apenas em fatores estruturantes do setor (peça 234, p. 25) , como possivelmente englobando considerações especulativas; e

b) as estimativas para determinados valores de curto prazo foram extraídas de 'janela de tempo' caracterizada por instabilidade de preços, em detrimento do período em que 'se mantiveram estáveis por vários meses' (peça 234, p. 26) .

73. A par daquelas impropriedades metodológicas, a unidade técnica detectou irregularidade consistente na incompletude das receitas consideradas, é dizer:

c) omissão da EPE em incluir relevante componente da receita futura a ser auferida pelas concessionárias em tela: o Custo Marginal de Expansão (CME) relativo ao aumento da demanda máxima instantânea, isto é, o CME-Potência.

74. A respeito da questão tratada no ponto 'c' acima, a bem delineada explanação da SeinfraElétrica merece translado (peça 234, p. 26-28) :

158. O CME é composto por dois aspectos relacionados: CME-Energia e CME-Potência. O CME-Energia é resultado da adição de uma unidade de demanda em cada um dos meses de um ano e observação do custo adicional de atendimento dessa unidade, valor que posteriormente é convertido para a unidade de R$/MWh. Já o CME-Potência é o incremento de uma unidade de demanda no atendimento da capacidade máxima do sistema, considerando a reserva operativa. A divisão em dois valores é feita apenas para facilitar a exposição e permitir a identificação do quanto do total do CME se dá pelo aumento da demanda média mensal de energia e quanto se dá pelo aumento da demanda máxima instantânea (peça 207, p. 12) .

159. A EPE, por intermédio do documento EPE-DEE-NT-081/2021-r0 (peça 205) , adotou como valor da energia de longo prazo (a partir de 2028 até o termo final dos novos contratos a serem celebrados) o CME-Energia, desconsiderando a componente do CME-Potência, motivo pelo qual foi questionada quanto a sua escolha por meio de Ofício de Requisição 108/2021-TCU/SeinfraElétrica (peça 176) .

(...)

168. Para ilustrar a diferença quantitativa entre o CME, que, como dito, expressa as componentes CME-Energia e CME-Potência, e apenas uma de suas componentes, o CME-Energia, pode-se avaliar a Tabela 7. Nota-se que a componente de potência representa um valor agregado significativo no CME, o qual foi todo ignorado pelo Poder Concedente em seus estudos do VAC.

Tabela 7 - Custo Marginal de Expansão

CME (R$/MWh)

Ano

2026

2027

2028

2029

2030

2031¹

2032¹

2033¹

CME-Energia

46,43

61,53

110,33

144,90

165,09

169,50

170,19

172,14

CME

128,35

143,50

192,01

226,67

246,79

Fonte: Peça 205, p. 13 (CME-Energia) e peça 207, p. 14 (CME)

1 Os CME dos anos de 2031, 2032 e 2033 não constam na NT da EPE de cálculo do CME e não foram trazidos no estudo da EPE relativo a essa modelagem.

169. Nesse aspecto, conclui-se que, ao se desconsiderar completamente a componente de potência e seu potencial de receita futura, o VAC das novas concessões pode estar sendo indevidamente subavaliado, mesmo que seja necessária certa ponderação por conta do prazo ainda necessário para essas alterações impactarem de fato o caixa da empresa.

75. A quarta fragilidade verificada pela SeinfraElétrica quanto à estimativa de receitas das 22 UHEs em referência - e, por conseguinte, no valor adicionado a ser equacionado via aportes ao erário e à CDE - pode ser descrita nos seguintes termos:

d) emprego incoerente de 'valores mais recentes do CME como estimativa de preço de longo prazo, resultando em um preço no patamar de R$ 155,00/MWh', quando o adequado seria utilizar 'os CMEs mais distantes projetados, que se situam no patamar de R$ 172,14/MWh (CME 2033) , ou, ao menos, a média dos anos que apresentam uma tendência de estabilização de valor, ou seja, de 2030 a 2033 (R$ 169,23/MWh) ' (peça 234, p. 29) .

76. Com efeito, apurou a secretaria que o preço considerado nos fluxos de caixa usados para cálculo do valor adicionado situa-se aquém de projeções do próprio MME e de todos os parâmetros aventados pela SeinfraElétrica (peça 234, p. 29-30) , conforme resultados adiante transcritos:

185. A Tabela 8 resume os valores considerados.

Tabela 8 - Diferentes referenciais para o valor da energia de longo prazo 1

R$/MWh

EPE (CME - Energia XXXXX-2033)

155,00

CME-Energia 2033

172,17

Média CME-Energia XXXXX-2033

169,23

CME 2030

246,79

PLD desde jan/2010

316,11

PLD últimos 3 anos (setembro/2018 a agosto/2021)

236,65

Fonte: Elaboração própria.

1 O valor adotado pela Eletrobras (peça 209) também foi considerado na análise.

186. Analisando a Tabela 8, verifica-se que o valor adotado pela EPE, de R$ 155,00/MWh, está subestimado em relação a qualquer outro parâmetro apresentado.

(...)

189. Assim, não se mostra razoável, sob o ponto de vista do resguardo ao erário, a escolha do gestor de um referencial com visão de futuro mais recente. De forma prática, essa escolha, dentre as opções apresentadas na referida tabela, representa a de menor valor para se definir o valor a ser pago como bônus de outorga.

190. Reforça-se que o valor da energia de longo prazo é um dos parâmetros que mais impactam nos cálculos em análise. No caso concreto, ao se adotar o CME-Energia 2033 como referencial (ainda que sem a componente de potência explanada acima) , o VAC seria acrescido de aproximadamente R$ 10,6 bilhões, sendo R$ 5,3 bilhões pagos à União no bônus de outorga e R$ 5,3 bilhões aportados na CDE para redução da tarifa de energia dos consumidores do mercado regulado.

77. Os fatores acima levaram a secretaria a propor a adoção das seguintes recomendações:

a) ao conduzir a celebração de novos contratos de concessão de usinas hidrelétricas, avalie outros referenciais de preços para a venda de energia no ambiente de contratação livre que não sejam voláteis e dependentes das declarações de agentes do setor; (peça 234, p. 63) ;

b) a fixação do preço referencial de energia elétrica no valor de R$ 233,00/MWh para o período ali considerado (peça 234, p. 26; 63) - preço que, embora superior àquele carreado ao modelo, representa mais fielmente a expectativa de mercado; e

c) adoção, na estimativa de valor da energia de longo prazo, previsão da componente de valor do lastro de capacidade de energia (peça 234, p. 28; 63) .

78. Quanto à subestimativa dos preços de venda de energia elétrica no longo prazo (item 'd', mencionado no parágrafo 75 deste parecer) , a unidade técnica propôs ao Tribunal 'determinar ao Ministério de Minas e Energia (MME) que reavalie o preço de energia de longo prazo utilizado na metodologia de cálculo do VAC dos novos contratos da Eletrobras, adotando como premissa, no mínimo, o valor de R$ 172,14/MWh, referente ao CME-Energia de projeção mais distante publicado pela EPE na Nota Técnica EPE-DEE-NT-081/2021-r0' (peça 234, p. 63) .

***

79. O Ministério Público inicialmente registra que ambas as alternativas inicialmente disponíveis à EPE - projeção de série histórica de valores já observados (refletindo 'expectativas adaptativas', assim denominadas no campo da economia) , e estimativa a partir do conhecimento sobre cenários futuros ('expectativas racionais') - habilitam-se, a princípio, a proporcionar parâmetros juridicamente válidos para a desestatização em tela. Ademais, cumpre reconhecer que o mercado de curto prazo (mercado spot) apresenta volatilidade intrínseca, constatável independentemente da fonte de informações escolhida.

80. Registradas essas considerações, o Parquet de Contas compartilha das preocupações da unidade técnica quanto à deficiente acuidade das previsões de receitas contidas no modelo, aderindo parcialmente às soluções propostas a título de encaminhamento.

81. Mais especificamente, concordamos que as fragilidades metodológicas comentadas nos pontos 'a' e 'b' acima podem ser endereçadas mediante recomendações tendentes a robustecer o processo de estimativa.

82. Trata-se, indubitavelmente, de indicar as amplas oportunidades de melhoria quanto ao método para a projeção pretendida - entre as quais se podem aduzir, por exemplo, a comparação com valores constantes de outras plataformas fornecedoras de previsão de preços futuros de energia; a interpolação de tais valores etc.

83. O item 'd' (subestimativa dos preços de energia no longo prazo, ao equipará-los a valores mais recentes) , no sentir deste Parquet, revela-se bem endereçado pela proposta de determinação elaborada pela unidade técnica (peça 234, p. 63) .

84. Já quanto à irregularidade descrita no item 'c' (omissão em incluir o componente CME-Potência na projeção de receita do modelo, mencionada no parágrafo 73 deste parecer), entendemos inexistir margem de discricionariedade para manutenção da situação apontada pela unidade técnica. Porquanto a subestimativa de valores devidos ao erário afronta diretamente o interesse público, concluímos ser defeso à unidade jurisdicionada optar por não saná-la.

85. Nesse sentido, o Ministério Público opina por que o teor da diretriz formulada no item b.4 da proposta de encaminhamento da unidade técnica (peça 234, p. 63) seja veiculada de forma cogente. Em outros termos, propugnamos por que seja determinado ao Ministério de Minas e Energia (MME) que inclua, na estimativa de valor da energia de longo prazo constante no projeto de desestatização da Eletrobras e descotização de suas subsidiárias, previsão das receitas auferíveis com o componente de valor do lastro de capacidade de energia (CME-Potência) .

86. Conjugando as soluções cogitadas para saneamento das irregularidades narradas nos pontos 'c' e 'd' acima, ambas relativas à subestimativa de receitas das concessionárias, entendemos bastante que se reúnam em um mesmo encaminhamento, com redação análoga à ora sugerida:

a) determinar ao Ministério de Minas e Energia (MME) que reavalie o preço de energia de longo prazo utilizado na metodologia de cálculo do VAC dos novos contratos da Eletrobras, por meio da:

a.1) adoção do valor mínimo de R$ 172,14/MWh, referente ao CME-Energia de projeção mais distante publicado pela EPE na Nota Técnica EPE-DEE-NT-081/2021-r0;

e, cumulativamente,

a.2) inclusão de valores relativos ao CME-Potência na composição do referido preço.

II.4 - Impactos tributários decorrentes da eventual aprovação de determinadas propostas legislativas

87. Sobre o assunto, recorda a unidade técnica que tramitam nas Casas Legislativas, sob a égide da reforma tributária, os Projetos de Lei 2.337/2021 e 3.887/2020. A secretaria descreve competentemente o cerne daquelas propostas, realçando a potencial influência que exerceriam sobre o valor adicionado das concessões em epígrafe, se e quando promulgadas.

88. A secretaria enfatiza o intento daquele segundo projeto em substituir o PIS/Confins pela Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) . Nessa seara, revela que o Poder Concedente chegou a estudar o impacto que teria:

277. Independentemente da implementação futura da sistemática de cálculo da CBS, realizaram-se simulações na planilha de cálculo do Valor Adicionado (peças 143 e 199) a respeito dos impactos dos dois projetos de lei na modelagem econômico-financeira adotada para o valor de outorga das novas concessões. (peça 234, p. 40)

89. Diante da constatação de que, em determinado cenário hipotético e a depender da interpretação que se confira à sistemática de cálculo de tributo ainda em discussão, haveria impacto aproximado de R$ 3 bilhões no valor adicionado em causa, a secretaria houve por bem formular as seguintes propostas de encaminhamento:

b.5) caso os Projetos de Lei 2.337/2021 e/ou 3.887/2020 sejam sancionados antes da data fixada para a realização da oferta pública de ações da Eletrobras, os benefícios tributários decorrentes da nova legislação sejam incorporados ao valor adicionado dos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021;

b.6) avalie a conveniência e a oportunidade de incluir, nos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021, cláusula de compartilhamento dos benefícios tributários advindos da sanção da reforma tributária aos seus valores adicionados;

(peça 234, p. 63)

90. O Ministério Público entende louvável o acompanhamento, pela unidade técnica especializada, das proposições legislativas pertinentes ao setor, reconhecendo tratar-se de medida proativa que já viabilizou atuações preventivas de extrema relevância por parte do Tribunal, a exemplo do TC Processo XXXXX/2010-4 (levantamento para avaliação das ações preparatórias ao vencimento de contratos de concessões do setor elétrico em 2015) .

91. Quanto ao presente caso, todavia, ponderamos que repousam significativas incertezas sobre os contornos do evento considerado - ao contrário do exemplo acima fornecido, em que se avizinhava o vencimento de prazo contratual futuro e certo. Nada obstante, prestigiando o habitual zelo da secretaria quanto ao tema, o Ministério Público deixa de opinar pela exclusão das recomendações em tela.

II.5 - Obrigações contratuais de projetos custeados com parte do bônus de outorga

92. A Lei 14.182/2021, ao condicionar a desestatização da Eletrobras, entre outras medidas, à adjudicação direta de novos contratos de concessão para aproveitamento hidrelétrico às atuais incumbentes, prescreve não apenas a alteração no regime de comercialização por parte daquelas concessionárias, mas também o custeio e execução de programas de notório interesse público:

Art. 3º A desestatização da Eletrobras fica condicionada à aprovação, por sua assembleia geral de acionistas, das seguintes condições:

(...)

V - desenvolvimento de projetos que comporão os programas de:

a) revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, diretamente pela Eletrobras ou, indiretamente, por meio de sua subsidiária Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) ou de unidades do Exército brasileiro;

b) redução estrutural de custos de geração de energia na Amazônia Legal e para navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins, diretamente pela Eletrobras ou, indiretamente, por meio de sua subsidiária Eletronorte; e

c) revitalização dos recursos hídricos das bacias hidrográficas, definidas conforme o inciso V do caput do art. 1º da Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas, cujos contratos de concessão são afetados por esta Lei, diretamente pela Eletrobras ou, indiretamente, por meio de sua subsidiária Furnas;

(...)

Art. 4º São condições para as novas outorgas de concessão de geração de energia elétrica de que trata o art. 2º desta Lei:

(...)

II - o pagamento pela Eletrobras ou por suas subsidiárias de bonificação pela outorga de novos contratos de concessão de geração de energia elétrica correspondente a 50% (cinquenta por cento) do valor adicionado à concessão pelos novos contratos abatidos das seguintes parcelas:

a) despesas relacionadas à revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, nos termos da alínea a do inciso V do caput do art. 3º desta Lei;

b) despesas relacionadas ao desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal com vistas a reduzir estruturalmente os custos de geração de energia e para a navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins, de acordo com o disposto na alínea b do inciso V do caput do art. 3º desta Lei;

c) despesas relacionadas aos projetos na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas, cujos contratos de concessão sejam afetados por esta Lei, nos termos da alínea c do inciso V do caput do art. 3º desta Lei; e

d) despesas para ressarcir o valor econômico do fornecimento de energia elétrica para o Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) , conforme tratado no § 6º do art. 6º desta Lei;

93. Trazendo preocupações similares às discutidas no âmbito do TC Processo XXXXX/2021-4 (Leilão do 5G) , a unidade técnica questionou a Secretaria Especial do Tesouro e Orçamento (STN) do Ministério da Economia (ofício de peça 138) quanto à:

i) 'legalidade, sob a óptica orçamentária, do procedimento de abatimento dessas despesas anteriormente ao recolhimento do bônus de outorga aos cofres do Tesouro' (peça 234, p. 47) ; e

ii) 'relação das obrigações contratuais em questão com a concessão do serviço de geração de energia elétrica' (peça 234, p. 48) .

94. No tocante à primeira indagação acima (i) , a STN redarguiu pela inocorrência de afronta aos preceitos que informam a elaboração do orçamento público, já que: 1) as despesas com o desenvolvimento dos programas em apreço têm natureza de gastos privados; e 2) os valores necessários ao custeio das aludidas despesas não consistem em receitas da União, porquanto a Lei 14.182/2021 não previu seu ingresso nos cofres públicos.

95. Ainda sobre o primeiro assunto, a Coordenação-Geral de Receita Pública da STN (peça 219, p. 1/2) ofertou o seguinte arrazoado:

9. Novamente, nota-se que a premissa implícita à classificação em receita de capital de parte das alienações do Estado, bem como a submissão à regra do art. 44 da LRF dos recursos resultantes, difere da circunstância material existente nas receitas de concessões. Em concessões, não há transferência da propriedade de bens de capital, tampouco a receita é obtida uma única vez. Ao contrário, espera-se que a prestação do serviço gere periodicamente receitas públicas, à medida que os contratos sejam renovados.

10. (...) Quando centralizada, a prestação do serviço público gera uma receita corrente ao Estado, que pode ser aplicada em gastos correntes com manutenção do serviço ou outros dispêndios de custeio da Administração. No segundo momento, realizada a descentralização, não haveria razão para alterar a classificação por categoria econômica da receita que ingressasse no orçamento devido à concessão, assim como não seria razoável exigir que os recursos resultantes fossem aplicados necessariamente na formação ou aquisição de bens de capital. A mera conversão da prestação de um serviço público da modalidade 'direta' para a modalidade 'indireta mediante delegação' não tem o condão de acarretar mudança na classificação econômica.

11. Por essas razões, as receitas decorrentes de concessão ou permissão de serviços públicos são classificadas ao longo dos diversos desdobramentos da receita '13300000 - Delegação de Serviços Públicos Mediante Concessão, Permissão, Autorização ou Licença'. Dessa forma, é uma prática consolidada no orçamento público a classificação desse tipo de arrecadação como Receita Corrente.

96. Apontou-se, sobretudo, que o Acórdão 2032/2021-TCU-Plenário (Rel. Min. Raimundo Carreiro, proferido no TC Processo XXXXX/2021-4, referente ao Leilão do 5G) decidiu que o regramento orçamentário não é automaticamente ofendido pela previsão de obrigações contratuais a serem custeadas com recursos que, de outra forma, ingressariam no erário.

97. Sobre o tópico seguinte (relação entre as obrigações contratuais e a exploração do serviço de geração de energia) , a STN bem argumentou (peça 216, p. 2/3) que o presente caso difere essencialmente da situação debatida no TC Processo XXXXX/2021-4 (Leilão do 5G) , a qual centrou-se na eventual subsunção das obrigações contratuais (Amazônia Integrada e Rede Privativa) aos ditames da Lei 9.472/1997 ( Lei Geral de Telecomunicações - LGT).

98. Concluiu, em vista disso, que 'no caso da desestatização da Eletrobras, as obrigações [contratuais da concessionária, atinentes ao desenvolvimento de programas de revitalização de bacias hidrográficas etc.] estão previstas de forma expressa na Lei 14.182/2021' (peça 216, p. 3) .

99. Examinando as justificativas trazias pela STN (peça 216) e MME (peça 218) , a unidade técnica registra, sobre o tópico 'i' acima, que 'considerando (...) o encaminhamento adotado pelo Tribunal, por meio do Acórdão 2032/2021-TCU-Plenário, em que foram debatidos eventuais descumprimentos de regras orçamentárias, não serão propostos encaminhamentos em relação à infringência de princípios orçamentários ou normas de direito financeiro' (peça 234, p. 57) .

100. Relativamente ao segundo ponto (relação das obrigações contratuais em apreço com o serviço concedido) , a secretaria reconhece ser 'árduo infirmar a pertinência temática dos projetos' de revitalização de bacias hidrográficas (peça 234, p. 55) . Todavia, prossegue sua exposição afirmando que:

398. (...) não é possível identificar claramente os benefícios que os usuários e consumidores de energia elétrica poderiam deles usufruir. Assim, a pertinência temática desses projetos não é suficiente para configurá-los como políticas setoriais de energia elétrica.

(...)

406. Embora possa ser questionada a relação direta dessas despesas com o serviço de geração de energia elétrica das usinas, não se pode afastar a pertinência temática dos programas previstos nos arts. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021 tais como a revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, a redução estrutural de custos de energia na Amazônia Legal e a revitalização dos recursos hídricos das bacias hidrográficas na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas frente aos potenciais benefícios que possam ocasionar ao setor elétrico.

407. Contudo, remanesce a previsão legal de projetos a serem aplicados na navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins, que não guardam relação com a temática do setor elétrico.

(peça 234, p. 56/57)

101. Conjugando as preocupações declinadas nos itens i e ii acima, e extrapolando-as para a generalidade da atuação administrativa estatal e da dinâmica orçamentária, a unidade técnica propôs 'recomendação para que a Casa Civil da Presidência da República evite o encaminhamento de proposições legislativas que promovam e permitam a execução de políticas públicas que não transitem pelo Orçamento Geral da União' (peça 234, p. 59) , a fim de aplacar:

(...) riscos potenciais de proliferação dessa prática legislativa de retirar da esfera do Orçamento Público despesas que poderiam ou deveriam ser executadas pelo Estado e transferir a responsabilidade do aporte desses recursos para a esfera privada via depósitos em contas correntes que, na sequência, seriam geridos por prepostos nomeados pelo próprio Estado. (peça 234, p. 57)

102. Ainda nesse quadrante, recordando-se de que a forma de aplicação dos recursos destinados à execução dos programas em tela (revitalização de bacias hidrográficas etc.) será estabelecida pelos comitês gestores previstos no art. , § 1º, da Lei 14.182/2021, pugnou a secretaria por que o Tribunal emita:

(...) recomendação ao Ministério de Minas e Energia, ao Ministério do Desenvolvimento Regional e ao Comitê Interministerial de Governança para que instituam instrumentos de governança para o funcionamento dos comitês gestores previstos nos arts. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021 a fim de assegurar, no mínimo, formas de acompanhamento de resultados, soluções para melhoria do desempenho das organizações e instrumentos de promoção de processo decisório fundamentado em evidências, nos termos do Decreto 9.203/2017.

(peça 234, p. 58/59 - ênfase suprimida)

103. A nosso sentir, a previsão de instrumentos de governança para os comitês gestores em apreço (acompanhamento de resultados, estruturação do processo decisório etc.) representa lídima oportunidade de fomentar o bom funcionamento daqueles colegiados, motivo pelo qual acolhemos a oportuna diretiva alinhavada pela secretaria.

104. Entretanto, quanto à proposta imediatamente anterior (item 'd' da proposta de peça 234, p. 63) , o Ministério Público de Contas da União conta com as vênias devidas à unidade técnica para opor-se àquele encaminhamento por sua generalidade.

105. Ponderamos que a relatada 'prática legislativa de retirar da esfera do Orçamento Público despesas que poderiam ou deveriam ser executadas pelo Estado e transferir a responsabilidade do aporte desses recursos para a esfera privada' (peça 234, p. 57) abrange, no limite, a própria descentralização do provimento de serviços públicos, modalidade expressamente consagrada pela Constituição de 1988, e que tantos avanços possibilitou nas esferas das telecomunicações, transporte rodoviário etc..

106. Com efeito, repara-se que os contratos para 'concessão de serviço público precedida da execução de obra pública' (art. , inciso III, da Lei 8.97/1995) vêm acoplando a seu escopo obras ancilares que, a despeito de não integrarem o cerne do serviço a ser explorado, potencializam suas possibilidades de fruição. Cite-se, como exemplos dessa evolução nos componentes do investimento, os seguintes casos já placitados pelo TCU:

a) na concessão da chamada Rodovia da Integração do Sul - RIS (TC Processo XXXXX/2017-4, Acórdão 1777/2021-TCU-Plenário, Rel. Min. Bruno Dantas) , a construção de alças e acessos aos municípios no Programa de Exploração da Rodovia - PER (peça 8 daqueles autos) ;

b) no arrendamento de terminais portuários STS 08 e STS 36 (TC Processo XXXXX/2013-3, Acórdão 2413/2015-TCU-Plenário, Rel. Min. Ana Arraes) , a construção de linhas e ramais ferroviários para acesso aos respectivos terminais; e

c) na mais recente concessão da Ponte Rio-Niterói (TC Processo XXXXX/2014-2, Acórdão 86/2015-TCU-Plenário, Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues) , a construção de acesso à Linha Vermelha e de viaduto na aproximação do município de Niterói/RJ.

107. Anote-se que a inclusão dos chamados 'projetos ancilares' entre as obrigações das concessionárias originalmente veio solucionar situações fáticas em que, por incapacidade do poder público em prover a infraestrutura circundante necessária ao pleno desenvolvimento da atividade descentralizada, houve óbices totais ou parciais à prestação do próprio serviço concedido.

108. Como exemplos de situações preveníveis pela inclusão de 'projetos ancilares' entre as obrigações das concessionárias, cite-se o caso de municípios sem acesso adequado e seguro à rodovia a que margeiam, e mesmo o caso de aeródromo concedido que, apesar de erigido no prazo contratual, restou 'ilhado' por falta de interligação às vias circundantes.

109. Neste caso concreto, o Parquet acompanha a secretaria no entendimento de que a adequada manutenção das bacias hidrográficas relaciona-se intimamente com a atividade de geração de energia hidrelétrica. Mais especificamente, as referidas medidas de revitalização contribuem para a resiliência e a sustentabilidade da atividade de exploração do potencial hidrelétrico e assim para o robustecimento da segurança energética.

110. Todavia, ao contrário do que sugere a unidade técnica, entendemos que semelhante pertinência se estende aos projetos para 'garantir a navegabilidade do Rio Madeira e (....) do Rio Tocantins' (art. , inciso II, 'b', in fine, da Lei 14.182/2021). A preservação dos usos múltiplos da água pode e até deve estar entre as obrigações do concessionário dos serviços de geração hidroelétrica, diante da natural interferência da sua atividade na vazão dos rios e na sua própria transponibilidade, à qual as barragens constituem óbice mitigável por meio, por exemplo, de sistemas de eclusas.

111. Sublinhamos que, em fiscalização sobre o Programa de Manutenção de Hidrovias, deliberou o Tribunal, via Acórdão 3244/2012-TCU-Plenário (Rel. Min. Augusto Nardes) :

9.5. enviar cópia do presente relatório, bem como do voto e do acórdão que o fundamentam à Casa Civil da Presidência da República, a fim de que aquela pasta de coordenação interministerial tome conhecimento do desentendimento possivelmente existente entre os setores hidroviário e elétrico acerca dos procedimentos assecuratórios dos usos múltiplos dos corpos hídricos, especialmente a produção de energia e navegabilidade, e possa exercer o adequado arbitramento das principais questões, alertando a autoridade ministerial que tal disputa pode estar prejudicando a construção dos dispositivos de transposição de níveis das usinas de Jirau e Santo Antônio, no Estado de Rondônia;

112. Nessa toada, ciente de que as obrigações contratuais devem guardar relação de pertinência com o serviço concedido, o Ministério Público de Contas da União opina por que seja elidida a proposta de recomendação inscrita no item 'd' da instrução de mérito da diligente unidade técnica (peça 234, p. 63) , sem prejuízo de seu inegável mérito, por a consideramos impertinente à situação em tela.

113. Não questionamos, porém, que soluções heterodoxas e pouco justificáveis, ainda que legislativas, que visem a retirar a execução de determinadas políticas públicas do Orçamento Geral da União, podem sim configurar ofensa à universalidade orçamentária e mecanismo de fuga às regras fiscais, particularmente ao teto de gastos consagrado no texto constitucional. Dessa forma, sua proliferação pode vir a configurar meio de corrosão da força normativa da referida norma constitucional, o que recomenda, de fato, que sejam evitadas.

III - Apontamentos adicionais

114. Em complemento à análise de mérito lançada pela unidade técnica, destacamos três temas merecedores de atenção:

1) O cálculo da capacidade real de geração do sistema hidrelétrico, a impactar a 'garantia física' das UHEs consideradas e, assim, o 'valor adicionado à concessão pelos novos contratos' (art. , inciso I, da Lei 14.182/2021);

2) O cronograma para descotização do regime de comercialização de energia por parte das concessionárias; e

3) A atuação da CDE visando mitigar o impacto tarifário da descotização.

115. Embora os temas acima tenham sido devidamente averiguados pela unidade técnica na instrução de peça 234, entendemos cabível reexaminar aspectos controvertidos das questões postas, registrando opinião pelo aprimoramento dos pontos mencionados.

III.1 - Irregularidades na estimativa da garantia física do sistema

116. Com especial didatismo, a unidade técnica recorda-nos o conceito de 'garantia física' no campo da geração de energia elétrica:

88. (...) A garantia física de uma usina, correspondente ao lastro físico que determina o quanto de sua energia é possível de ser comercializada, é resultado do rateio da garantia física de energia do Sistema Interligado Nacional (SIN) , definida na Portaria MME 101/2016 como a quantidade máxima de energia que o sistema pode suprir, dado um critério de garantia de suprimento.

(...)

123. De acordo com a Portaria MME 101/2016, a garantia física de energia do Sistema Interligado Nacional (SIN) pode ser definida como aquela correspondente à máxima quantidade de energia que este sistema pode suprir a um dado critério de garantia de suprimento. Essa quantidade de energia pode, então, ser rateada entre todos os empreendimentos de geração que constituem o sistema. O valor assim atribuído pelo rateio a cada empreendimento constitui-se em sua garantia física, que é o lastro físico desses empreendimentos com vistas à comercialização de energia.

(peça 234, p. 16 e 21)

117. Percebe-se, de plano, que a correta estimativa do potencial de gerar receitas ('garantia física') assume papel crucial na estimativa do valor adicionado (art. , inciso I, da Lei 14.182/2021)- e, portanto, do montante a ser aportado ao erário e à CDE pela Eletrobrás e suas subsidiárias.

118. A unidade técnica, prosseguindo em sua exposição sobre o tema, reporta que a EPE atualizou os cálculos relativos à garantia física das UHEs contempladas no processo de desestatização da Eletrobras (peça 204) , a fim de conferir maior acuidade aos estudos em tela:

90. Outrossim, após um novo cálculo efetuado pela EPE - detalhado no tópico V.2.1 desta instrução -, haverá uma redução média de 982,2 MW médios (7,34%) na garantia física do rol de usinas com contratos a serem renovados.

(...)

125. No âmbito da privatização da Eletrobras, o MME solicitou à EPE (Ofício 41/2021/DPE/SPE-MME, de 22/3/2021) que realizasse o recálculo da garantia física das usinas hidrelétricas da estatal contempladas pela Lei 14.182/2021.

126. Em resposta, a Empresa de Pesquisa Energética apresentou o estudo EPE-DEE-RE-086/2021-r0 (peça 204) com a metodologia de cálculo e o resultado das novas garantias físicas para as UHEs da Eletrobras que terão um novo contrato de concessão celebrado.

(peça 234, p. 16 e 21) .

119. O exame crítico da SeinfraElétrica revela dois aspectos positivos entrelaçados nesse processo de atualização da garantia física promovido pelo MME com apoio da EPE:

a) ao verificar que a capacidade existente é inferior à anteriormente considerada, a atualização promovida contribui para o enfrentamento de consabida fragilidade do setor, porquanto:

130. Ressalta-se que já é um problema conhecido do setor elétrico brasileiro que as garantias físicas de muitas hidrelétricas estão superestimadas. Tal problema traz consequências sistêmicas, pois majora indevidamente a capacidade produtiva de energia, trazendo erros aos modelos computacionais de previsão de geração e de necessidade de expansão do parque gerador. Ademais, afeta diretamente as hidrelétricas, ao provocar uma produção média inferior ao esperado e consequente necessidade de compra de energia a PLD, aumentando o risco dos geradores hidráulicos não cotizados.

131. Com a adequação nas GFEs [garantias físicas de energia] das usinas da Eletrobras, o sistema passará a ter o total de garantia física mais próximo à capacidade de geração real, mitigando os problemas citados.

(peça 234, p. 22)

b) uma vez que a Lei 14.182/2021, em seu art. , § 1º, prevê que serão firmados contratos de concessão novos, concluiu-se por inaplicáveis as limitações percentuais de revisão previstas no Decreto 2.655/1998, art. 21, § 5º, as quais se restringem ao 'valor de base constante do respectivo contrato de concessão, durante a vigência deste'. Nesse passo, teria sido 'possível adequar as garantias físicas diretamente à realidade fática, mesmo com [rectius: devido às] reduções superiores a 10%' naquelas estimativas (peça 234, p. 22) .

120. Apesar das vantagens acima, a atualização realizada no cálculo da garantia física não pode ser considerada plenamente adequada, pois padeceu da defasagem de:

(...) parâmetros importantes como (i) série de vazões dos empreendimentos; (ii) usos consuntivos da água; e (iii) parâmetros de aversão a risco dos modelos computacionais de planejamento da operação (CVAR) .

(peça 234, p. 22)

121. Novamente recorrendo à análise da unidade especializada, lê-se que as informações faltantes ao modelo hão de ser providas pela Agência Nacional de Águas (ANA) e 'não foram disponibilizados a tempo de serem usados pela EPE nos cálculos' (peça 234, p. 22) .

122. Muito embora a SeinfraElétrica tenha identificado o risco de que o superdimensionamento das UHEs em comento perpetue-se - pois aos contratos a serem firmados aplicar-se-ão as restrições de correção previstas no Decreto 2.655/1998 -, a unidade deixou de propor solução para o tema, sob entendimento de que o processo de recálculo de garantias físicas desbordaria do escopo desta análise.

123. Este Parquet, ao endossar integralmente a análise técnica da Seinfra (peça 234, p. 21/23) , considerando que a importância da questão ultrapassa o adequado cálculo do valor adicionado para alcançar o funcionamento do mercado de energia no país, e tendo em mente a oportunidade ímpar de promover o necessário ajuste em variável central do sistema, opina por que o TCU atue no sentido de recomendar ao MME e à EPE que complementem os cômputos registrados no 'Cálculo de Montante de Garantia Física de Energia' (peça 204 deste processo) , passando a considerar valores atualizados para: (i) série de vazões dos empreendimentos; (ii) usos consuntivos da água; e (iii) parâmetros de aversão a risco dos modelos computacionais de planejamento da operação (CVAR) .

III.2. Cronograma para descotização do regime de comercialização de energia

124. Conforme mencionado anteriormente, a Lei 14.182/2021, em seu art. , inciso II, condiciona a privatização da Eletrobras à 'celebração dos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica (...) com a alteração do regime de exploração para produção independente'.

125. A essa alteração de regime, referida por 'descotização', associa-se perspectiva de impacto nas tarifas de energia cobradas dos consumidores, uma vez que os preços atualmente praticados no Ambiente de Contratação Regulada (ACR) mostram-se sistematicamente inferiores àqueles praticados no Ambiente de Contração Livre (ACL) , para o qual somente as concessionárias geradoras (e não os consumidores) ora ficam autorizados a migrar.

126. A fim de mitigar o impacto tarifário advindo dessa desregulação, foram concebidas duas soluções paliativas:

I. implementação do novo regime 'de forma gradual e uniforme, no prazo mínimo de 5 (cinco) anos e máximo de 10 (dez) anos' (art. , inciso III, da Lei 14.182/2021); e

II. atuação da CDE em prol da modicidade tarifária, valendo-se dos recursos e seguindo os ditames que a Lei 14.182/2021 acrescentou ao ato de criação da CDE (Lei 10.438/2002), in verbis:

Art. 13. Fica criada a Conta de Desenvolvimento Energético - CDE visando ao desenvolvimento energético dos Estados, além dos seguintes objetivos:

(...)

XV - prover recursos para fins de modicidade tarifária no Ambiente de Contratação Regulada (ACR) por meio de créditos em favor das concessionárias e permissionárias de distribuição de energia elétrica;

(...)

§ 1º Os recursos da CDE serão provenientes:

(...)

V - das quotas anuais pagas por concessionárias de geração de energia elétrica cuja obrigação esteja prevista nos respectivos contratos de concessão de que trata a lei resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.031, de 23 de fevereiro de 2021;

(...)

§ 15. Os recursos de que trata o inciso V do § 1º deste artigo somente poderão ser destinados à finalidade especificada no inciso XV do caput deste artigo, na forma do § 2º do art. 4º da lei resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.031, de 23 de fevereiro de 2021.

127. A presente seção trata da primeira medida acima registrada - de forma mais específica, da fundamentação do ato administrativo que fixou o prazo para descotização no mínimo legal (i.e. 5 anos) . A segunda medida - atuação da CDE em prol da modicidade tarifária - será comentada em seção subsequente.

128. Nesse diapasão, repara-se que a Resolução CNPE 15/2021, em seu art. 2º, § 10 (peça 166, p. 3) , preconiza que a descotização correrá na proporção de 'vinte por cento por ano, com início em 1º de janeiro de 2023', resultando no cronograma apresentado no Anexo II daquele normativo:

Anexo II

Ano

Percentual de Garantia Física Alocada na Forma de Cotas de Garantia Física de Energia e de Potência das UHEs da Eletrobras às Concessionárias e Permissionárias de Serviço Público de Distribuição de Energia Elétrica

2022

100%

2023

80%

2024

60%

2025

40%

2026

20%

2027

0%

De 2028

em diante

0

(peça 166, p. 4)

129. O mesmo art. 2º, § 10, da Resolução CNPE 15/2021, estabelece, como exceções ao cronograma transcrito acima, o caso 'das UHEs Tucuruí, Curuá-Una e Mascarenhas de Moraes, com disponibilidade de energia a partir da assinatura dos novos contratos de concessão' (peça 166, p. 3) .

130. Em verdade, a UHE Tucuruí já se encontra sob o regime de produção independente de energia, e não no regime de cota, conforme consta da resposta do MME ao Requerimento de Informação 519/2020 da Câmara dos Deputados:

Segue transcrita resposta encaminhada pela ANEEL por meio do Ofício nº 121/2021-DR/ANEEL, de 21 de maio de 2021, anexo:

A UHE Tucuruí encontra-se no regime de produtor independente de energia e não no regime de cota, razão pela qual não há impacto tarifário associada à usina com a desestatização da Eletrobras. 6. Por essa razão, a usina não possui receita e tarifa definidas pela ANEEL nos termos das usinas cotistas (...) - (peça 215, p. 4)

131. Portanto, haveria a descotização imediata apenas da UHEs Curuá-Una e Mascarenhas de Moraes, de representatividade bem menos expressiva que a UHE de Tucuruí.

132. A respeito do referido cronograma não identificamos os motivos que levaram às opções pela livre disposição imediata da integralidade da energia gerada pelas UHEs de Curuá-Una e Marcarenhas de Moraes, em acréscimo ao que já ocorre com a UHE de Tucuruí; e pelo escalonamento da descotização das demais UHEs no prazo mínimo definido legalmente, em vez de qualquer outro prazo contido naquele intervalo.

133. Sindicáveis os atos administrativo em função de seus requisitos, entre os quais o legítimo motivo, sublinhamos que a falta de exposição das razões que o justifiquem (é dizer, sua motivação) prejudica a fiscalização do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público de Contas. Preleciona a doutrinadora Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

O princípio da motivação exige que a Administração Pública indique os fundamentos de fato e de direito de suas decisões. Ele está consagrado pela doutrina e pela jurisprudência, não havendo mais espaço para as velhas doutrinas que discutiam se a sua obrigatoriedade alcançava só os atos vinculados ou só os atos discricionários, ou se estava presente em ambas as categorias. A sua obrigatoriedade se justifica em qualquer tipo de ato, porque se trata de formalidade necessária para permitir o controle de legalidade dos atos administrativos.

(DI PIETRO, 2020, p. 110)

134. Nesse sentido, assim registra o Boletim de Jurisprudência do TCU, edição 372/2021, a partir do decidido via Acórdão 2061/2021-TCU-Plenário (Desestatização, Revisor Ministro Vital do Rêgo) :

O conteúdo de ato administrativo discricionário pode se submeter à apreciação do TCU quando o órgão ou a entidade jurisdicionada afasta-se dos princípios constitucionais implícitos e explícitos a que se submete, entre os quais os da motivação, da eficiência e da economicidade.

135. Diante da situação reportada nos autos, o Ministério Público de Contas - ainda que não vislumbre, a princípio, ilegalidade nas opções - opina por que o Tribunal determine ao CNPE que apresente, no prazo regimental, a motivação para as referidas escolhas públicas, trazidas na sua Resolução 15/2021, quais sejam:

a) O imediato 'livre dispor da energia' oriunda das usinas de Curuá-Una e Mascarenhas de Moraes, antes de todas as demais UHEs contempladas no projeto em tela, considerando, inclusive, a diretriz legal de descotização 'gradual e uniforme' (art. , § 1º, III, da Lei 14.182/2021); e

b) O escalonamento da descotização no prazo mínimo definido legalmente, em vez de qualquer outro prazo contido naquele intervalo.

III.3. Cronograma de aportes à CDE: adiantamento de R$ 5 bilhões

136. Como visto na subseção anterior, para amainar o impacto tarifário da descotização das 22 UHEs abrangidas pela Lei 14.182/2021 foram concebidos dois principais mecanismos: I. implementação daquela medida 'de forma gradual e uniforme, no prazo mínimo de 5 (cinco) anos e máximo de 10 (dez) anos' (art. , inciso III, da Lei 14.182/2021); e II. mobilização da CDE em prol da modicidade tarifária.

137. Verifica-se que, para o atendimento daquele segundo propósito, as atribuições da CDE foram atualizadas (art. 13, inciso XV, da Lei 10.438/2002), bem assim foram-lhe destinadas substanciais quantias, a saber, '50% (cinquenta por cento) do valor adicionado à concessão pelos novos contratos' (art. 4, inciso I, da Lei 14.812/2021).

138. Ao contrário do quinhão de receita pública que adentrará efetivamente o erário - isto é, da bonificação pela outorga, deduzidas as parcelas listadas no art. 4º, inciso II, da Lei 14.821/2021 - o valor a ser pago pela Eletrobras à CDE não será devido em parcela única, mas sim 'na forma definida pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) ' (art. 4º, inciso I, da Lei 14.812/2021)

139. Atendendo o comando legal, o CNPE emitiu a Resolução 15/2021 (peça 166) , na qual fixou o seguinte cronograma para recebimento do valor em questão:

Anexo III

Data

Pagamento à CDE

Até trinta dias contados do ato da assinatura dos novos contratos de concessão

R$ 5.000.000.000,00

2023

R$ 526.098.864,13

2024

R$ 1.052.197.728,26

2025

R$ 1.578.296.592,39

2026

R$ 2.104.395.456,52

2027

R$ 2.630.494.320,65

De 2028 a 2047

R$ 2.630.494.320,65

(peça 166, p. 4)

140. À primeira vista, chama atenção a magnitude do aporte a ser recebido 'Até trinta dias contados do ato da assinatura dos novos contratos de concessão' - que, segundo previsões correntes, deve ocorrer em 2022. Destaca-se não apenas a expressão do aporte inicial, correspondente a 9,5 vezes o valor do pagamento devido no ano seguinte, como também seu descasamento em relação ao cronograma de descotização, fenômeno cujos efeitos tais aportes deveriam enfrentar.

141. Voltamos a transcrever o cronograma elaborado pelo CNPE, de forma a demonstrar que a descotização - e, por conseguinte, seu impacto tarifário - inicia-se apenas em 2023 (ressalvada a descotização imediata das UHEs Curuá-Una e Mascarenhas de Moraes) , enquanto o pagamento de R$ 5 bilhões, equivalente a 32,2% do valor nominal total devido à CDE, será adiantado para 2022.

Anexo II

Ano

Percentual de Garantia Física Alocada na Forma de Cotas de Garantia Física de Energia e de Potência das UHEs da Eletrobras às Concessionárias e Permissionárias de Serviço Público de Distribuição de Energia Elétrica

2022

100%

2023

80%

2024

60%

2025

40%

2026

20%

2027

0%

De 2028

em diante

0%

(peça 166, p. 4)

142. Reporta a unidade técnica (peça 234, p. 47) que o referido adiantamento teria sido 'solicitado pela Aneel, cujo objetivo é minimizar os impactos tarifários decorrentes de outras causas (crise hídrica, câmbio e IGP-M elevado) '. Em vista de encontrar-se em trâmite, nessa Corte de Contas, o TC Processo XXXXX/2021-6, que versa sobre Auditoria Operacional na Política Tarifária do Setor Elétrico, a secretaria nada propôs em desfavor do adiantamento em causa.

143. Apontamos, contudo, que as disposições da Lei 10.438/2002 sobre o montante arrecadado junto à Eletrobras para robustecer o caixa da CDE são claros:

Art. 13. Fica criada a Conta de Desenvolvimento Energético - CDE visando ao desenvolvimento energético dos Estados, além dos seguintes objetivos:

(...)

XV - prover recursos para fins de modicidade tarifária no Ambiente de Contratação Regulada (ACR) por meio de créditos em favor das concessionárias e permissionárias de distribuição de energia elétrica;

(...)

§ 1º Os recursos da CDE serão provenientes:

(...)

V - das quotas anuais pagas por concessionárias de geração de energia elétrica cuja obrigação esteja prevista nos respectivos contratos de concessão de que trata a lei resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.031, de 23 de fevereiro de 2021;

(...)

§ 15. Os recursos de que trata o inciso V do § 1º deste artigo somente poderão ser destinados à finalidade especificada no inciso XV do caput deste artigo, na forma do § 2º do art. 4º da lei resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.031, de 23 de fevereiro de 2021.

(grifamos)

144. O '§ 2º do art. 4º da lei resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.031' (isto é, da Lei 14.182/2021), a seu turno, traz a seguinte redação:

§ 2º O disposto no art. 7º da Lei nº 9.648, de 27 de maio de 1998, não se aplica aos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica de que trata este artigo, e a quota de que trata o inciso I do caput deste artigo será creditada integralmente em favor das concessionárias e permissionárias de distribuição de energia elétrica, para fins de modicidade tarifária no Ambiente de Contratação Regulada (ACR) , distribuída de forma proporcional aos montantes descontratados em decorrência da alteração do regime de exploração para produção independente de que trata o inciso III do caput deste artigo.

(grifamos)

145. A inteligência das regras acima é unívoca: a 'quota de que trata o inciso I do caput' do art. 4º da Lei 14.182/2021 - isto é, a quota de 50% do valor adicionado a ser paga à CDE pela Eletrobras - deve ser necessariamente distribuída às concessionárias 'de forma proporcional aos montantes descontratados em decorrência da alteração do regime de exploração'.

146. A redação atribuída ao texto legal torna hialina a intenção do legislador no sentido de vincular o emprego daquela importância (50% do valor adicionado devido à CDE) ao impacto tarifário esperado 'em decorrência da alteração do regime de exploração', na proporção da qual deverá a verba ser repassada às geradoras. Pretendesse a lei (ou, mesmo, a medida provisória que lhe deu origem) que a quantia arrecadada àquele título assumisse qualquer outra função, ainda que relacionada à promoção da modicidade tarifária, teria legado indicação nesse sentido.

147. Não havendo, portanto, autorização legal para o uso daqueles recursos da CDE para 'minimizar os impactos tarifários decorrentes de outras causas (crise hídrica, câmbio e IGP-M elevado) ' - resta avaliar se o adiantamento de R$ 5 bilhões à CDE, preconizado pelo CNPE, encontra amparo na proporcionalidade 'aos montantes descontratados em decorrência da alteração do regime de exploração'.

148. Com efeito, observa-se que o cronograma de descotização estabelecido pelo CNPE prevê a descontratação gradual de todas as UHEs alcançadas pela Lei 14.812/2021, excetuando-se a UHE de Tucuruí, terceira maior usina do país em termos de capacidade e geração, a qual já se encontra sob o regime de produção independente de energia, e as UHEs de Curuá-Una e Mascarenhas de Moraes.

149. A esse respeito, reitera-se a informação trazida pelo MME, em resposta ao Requerimento de Informação 519/2020 da Câmara dos Deputados (transcrita no tópico anterior) , de que inexiste impacto tarifário associado à UHE Tucuruí, por inexistir previsão de alteração de regime em relação a ela.

150. Assim, considerando que o art. , § 2º, da Lei 14.182/2021 estabelece que o valor pago à CDE pela Eletrobras, no importe de 50% do valor adicionado, deve ser creditado às geradoras 'de forma proporcional aos montantes descontratados em decorrência da alteração do regime de exploração' (grifamos) ;

150.1. Considerando que a descontratação se iniciará em 2023, consoante normativo publicado pelo CNPE, à exceção das UHEs de Tucuruí, Mascarenhas e Curuá-Una, que desfrutarão da 'disponibilidade de energia a partir da assinatura dos novos contratos de concessão' (art. 2º, § 10, da Resolução CNPE 15/2021 - peça 166, p. 2), prevista para 2022;

150.2. Considerando que, segundo o MME, 'não há impacto tarifário associado à usina [de Tucuruí] com a desestatização da Eletrobras' (peça 215, p. 4) - e, portanto, não haveria autorização do art. , § 2º, da Lei 14.182/2021 para crédito às distribuidoras sob tal fundamento;

150.3. Considerando que a capacidade de geração das UHEs de Mascarenhas e Curuá-Una, considerado o conjunto das UHEs 'descotizadas', não justifica o adiantamento de parcela tão expressiva dos valores devidos à CDE;

150.4 O Ministério Público opina por que o Tribunal determine ao CNPE que revise o cronograma presente no Anexo III da Resolução 15/2021, especialmente quanto ao adiantamento de R$ 5 bilhões devidos à CDE ainda em 2002, à luz do art. , § 2º, in fine, da Lei 14.182/2021 e do art. 13, § 15, da Lei 10.438/2002, em vista das considerações traçadas neste pronunciamento.

IV - Considerações finais

151. A privatização da Eletrobras, originalmente intentada com sua inclusão no Programa Nacional de Desestatizacao ( PND) em 1995, representa decisivo passo na consolidação, pelo país, do modelo de Estado Regulador do setor elétrico, caracterizado por intervenção qualitativamente distinta na atividade econômica.

152. Sucedendo as diversas rodadas de concessões nas áreas de transmissão e distribuição de energia, a desestatização da Eletrobras (bem assim a recente privatização de várias subsidiárias geradoras) representa o ápice da tendência de provisão indireta de energia elétrica no país - a qual só não se mostra expansível no tocante à energia de matriz nuclear (usinas de Angra) .

153. A iniciativa vem ao encontro, ainda, de vários preceitos das reformas estruturais do setor observadas internacionalmente, ao menos nos últimos três dos quatro vetores doutrinariamente consagrados: regulação, reestruturação, participação do setor privado e competição (Foster et al., 2017) .

154. Quanto a esse último componente (competição) , e seguindo a linha de renomados pesquisadores da área, anotamos que a privatização em tela, ao descotizar o regime de comercialização da energia produzida nas 22 usinas abrangidas pela Lei 14.182/2021, contribui para consolidar a posição do Brasil no penúltimo estágio de desenvolvimento estrutural do setor - caracterizada pela competição no mercado atacadista de energia - falhando a iniciativa em avançar medidas tendentes a nos incluir no mais elevado daqueles estágios:

Figure 5.1.: Definition of stages of competition of competition reform

Model classification

Sector structure characteristics

1. Monopoly

A single company has responsibility for generation, transmission, distribution and retail sales

(...)

(...)

5. Wholesale market competition

Power market of multiple generation companies selling directly to multiple distribution companies and other large customers, supported by an independent system operator and market operator. Small customers can buy only from their local distributor.

6. Retail market competition

As above, but allowing all customers - large and small - to purchase power directly from retail companies, entailing prior vertical unbundling of distribution and retail companies, with distribution companies providing open access wheeling services to numerous power retailers.

Fonte: Foster et al., 2017 (p. 22) .

155. Conforme exaustivamente comentado ao longo deste parecer, o Ministério Público se alinha, no essencial, à análise desenvolvida pela unidade técnica, destoando pontualmente do encaminhamento proposto.

156. Mais especificamente, opinamos por que o ajuste sugerido pela secretaria na proposta de determinação à peça 234 (p. 63) englobe não apenas a referência para o preço considerado (CME-Energia) , como também passe a incluir, na estimativa de receita, o componente CME-Potência, até então omitido. Entendemos, ademais, haver base legal expressa para se exigir os estudos avaliativos do 'aproveitamento ótimo' e para se reconsiderar o cronograma de aportes à CDE.

V - Proposta de encaminhamento do Parquet

157. Diante das razões apresentadas neste pronunciamento - as quais se alinham, repita-se, à essência do proposto pela unidade técnica (peça 234/236) - o Ministério Público de Contas da União opina por que o Colegiado delibere no sentido seguinte:

a) determinar ao Ministério de Minas e Energia (MME) , com supedâneo no art. 43, inciso I, da Lei 8.443/1992, no art. 250, inciso II, do Regimento Interno do TCU, e no art. da Resolução-TCU 315/2020, que:

a.1) abstenha-se de encaminhar, ao Tribunal de Contas, estudos de viabilidade antes que haja a devida documentação formal da análise e consolidação das contribuições recebidas em audiência pública, sob pena de reinício da contagem do prazo de análise tratado na IN TCU 81/2018;

a.2) inclua, no instrumento contratual das concessões previstas pela Lei 14.182/2021, cláusula que estabeleça obrigação da concessionária de contratar estudos para a definição dos respectivos aproveitamentos ótimos, a serem submetidos à aprovação da agência reguladora, fazendo constar os custos associados na modelagem econômico-financeira no cálculo do valor de outorga, se assim entender necessário;

a.3) reavalie o preço de energia de longo prazo utilizado na metodologia de cálculo do valor adicionado pelos contratos (VAC) dos novos contratos da Eletrobras, de modo a:

a.3.1) adotar como premissa, no mínimo, o valor de R$ 172,14/MWh, referente ao CME-Energia de projeção mais distante publicado pela EPE na Nota Técnica EPE-DEE-NT-081/2021-r0;

a.3.2) incluir, na estimativa de valor da energia de longo prazo constante no projeto de desestatização da Eletrobras e descotização de suas subsidiárias, previsão das receitas auferíveis com o componente de valor do lastro de capacidade de energia (CME-Potência) ;

b) determinar ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que:

b.1) apresente, no prazo regimental, a motivação para as seguintes escolhas públicas trazidas na sua Resolução 15/2021:

b.1.1) O imediato 'livre dispor da energia' oriunda das usinas de Curuá-Una e Mascarenhas de Moraes, antes de todas as demais UHEs contempladas no projeto em tela, considerando, inclusive, a diretriz legal de descotização 'gradual e uniforme' (art. , § 1º, III, da Lei 14.182/2021); e

b.1.2) O escalonamento da descotização no prazo mínimo definido legalmente, em vez de qualquer outro prazo contido naquele intervalo; e

b.2) revise o cronograma presente no Anexo III da Resolução 15/2021, especialmente quanto ao adiantamento de R$ 5 bilhões devidos à CDE ainda em 2002, à luz do art. , § 2º, in fine, da Lei 14.182/2021 e do art. 13, § 15, da Lei 10.438/2002, em vista das considerações traçadas neste pronunciamento;

c) recomendar ao MME, com espeque no art. 250, inciso III, do Regimento Interno do TCU c/c o art. 11 da Resolução-TCU 315/2020, que:

c.1) ao conduzir a celebração de novos contratos de concessão de usinas hidrelétricas, avalie outros referenciais de preços para a venda de energia no ambiente de contratação livre que não sejam voláteis e dependentes das declarações de agentes do setor;

c.2) mantenha a referência para o preço da energia de curto prazo no valor inicialmente adotado, de R$ 233,00/MWh;

c.3) caso os Projetos de Lei 2.337/2021 e/ou 3.887/2020 sejam sancionados antes da data fixada para a realização da oferta pública de ações da Eletrobras, os benefícios tributários decorrentes da nova legislação sejam incorporados ao valor adicionado dos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021;

c.4) avalie a conveniência e a oportunidade de incluir, nos novos contratos celebrados referentes às usinas constantes do art. 2º da Lei 14.182/2021, cláusula de compartilhamento dos benefícios tributários advindos da sanção da reforma tributária aos seus valores adicionados;

d) recomendar ao MME, ao Ministério de Desenvolvimento Regional (MDR) e ao Comitê Interministerial de Governança, que instituam instrumentos de governança para o funcionamento dos comitês gestores previstos nos arts. 6º, 7º e 8º da Lei 14.182/2021 a fim de assegurar, no mínimo, formas de acompanhamento de resultados, soluções para melhoria do desempenho das organizações e instrumentos de promoção de processo decisório fundamentado em evidências, nos termos do Decreto 9.203/2017;

e) recomendar ao MME e à EPE que complementem os cômputos registrados no 'Cálculo de Montante de Garantia Física de Energia' (peça 204 deste processo) , passando a considerar valores atualizados para: (i) série de vazões dos empreendimentos; (ii) usos consuntivos da água; e (iii) parâmetros de aversão a risco dos modelos computacionais de planejamento da operação (CVAR) ;

f) deixar de determinar ao Ministério de Minas e Energia, com fundamento no inciso Ido parágrafo único do art. 16 da Resolução-TCU 315/2020, a proposta para que corrija os erros apontados no tópico VII já que o Ministério se comprometeu formalmente a ajustar os valores envolvidos por meio do Ofício 424/2021/SE-MME;

g) dar ciência ao MME quanto à necessidade de classificação das informações encaminhadas em atendimento aos processos de desestatização previstos na IN-TCU 81/2018 pelo tipo de informação exigida nos arts. 3º, 4º e 5º, conforme o caso, fazendo constar justificativa quanto ao não atendimento de algum dos dispositivos mencionados."

5. Em despacho proferido no dia 1º/12/2021 (peça 258) , determinei a realização de diligência ao MME para que fossem prestados esclarecimentos acerca de algumas questões suscitadas nos autos após o encerramento da fase de instrução, tendo a referida pasta ministerial atendido à diligência no mesmo dia (peças 261 a 265) , possibilitando a inclusão do presente processo na pauta de julgamento dessa sessão extraordinária de Plenário.

6. Posteriormente a isso, alguns parlamentares e entidades vieram aos autos solicitar que fossem reconhecidas neste TC Processo XXXXX/2018-2 como como partes interessadas para que, entre outras prerrogativas processuais, lhes fosse permitido produzir sustentação oral por ocasião do julgamento do feito. Outras entidades solicitaram simplesmente a possibilidade de atuação na condição de amici curiae.

7. Tais pedidos foram analisados por este relator em despacho datado de 14/12/2021.

É o Relatório.

Conforme consignado no Relatório precedente, tratam os autos de Acompanhamento do processo de desestatização da Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras) delineada pela Lei 14.182, de 12/7/2021, na qual foi convertida, com alterações, a Medida Provisória 1.031, de 23/2/2021.

2. A presente etapa processual tem como foco as ações coordenadas pelo Ministério de Minas Energia (MME) para a definição das premissas utilizadas nos estudos e na modelagem econômico-financeira desenvolvidas para calcular o valor que será adicionado aos novos contratos de concessão de energia elétrica, a serem celebrados entre a União e a Eletrobras, relativos às usinas hidrelétricas (UHEs) enquadradas no que dispõe o art. 2º da mencionada Lei 14.182/2021.

3. Destaque-se que o valor total adicionado aos referidos contratos (VAC) servirá de base para a definição dos pagamentos que, nos termos do art. 4º, incisos I e II, daquele mesmo diploma, deverão ser arcados pela empresa a título de depósito na Conta de Desenvolvimento Energético - CDE (inciso I) e de pagamento de bônus de outorga (inciso II) .

4. Permito-me colacionar abaixo os dispositivos legais acima referenciados:

"Art. 2º Para a promoção da desestatização de que trata esta Lei, a União fica autorizada a conceder, pelo prazo previsto no § 1º do art. 1º desta Lei, contado da data de assinatura dos novos contratos, novas outorgas de concessões de geração de energia elétrica sob titularidade ou controle, direto ou indireto, da Eletrobras, que:

I - tenham sido prorrogadas nos termos do art. 1º da Lei nº 12.783, de 11 de janeiro de 2013;

II - sejam alcançadas pelo disposto no inciso II do § 2º do art. 22 da Lei nº 11.943, de 28 de maio de 2009;

III - sejam alcançadas pelo disposto no § 3º do art. 10 da Lei nº 13.182, de 3 de novembro de 2015;

IV - tenham sido outorgadas por meio do Contrato de Concessão nº 007/2004-Aneel-Eletronorte; e

V - tenham sido outorgadas por meio do Contrato de Concessão nº 004/2004-Aneel-Furnas, especificamente para a UHE Mascarenhas de Moraes.

(...)

Art. 4º São condições para as novas outorgas de concessão de geração de energia elétrica de que trata o art. 2º desta Lei:

I - o pagamento pela Eletrobras ou por suas subsidiárias, na forma definida pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) , à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) , de que trata a Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002, correspondente a 50% (cinquenta por cento) do valor adicionado à concessão pelos novos contratos;

II - o pagamento pela Eletrobras ou por suas subsidiárias de bonificação pela outorga de novos contratos de concessão de geração de energia elétrica correspondente a 50% (cinquenta por cento) do valor adicionado à concessão pelos novos contratos abatidos das seguintes parcelas:

a) despesas relacionadas à revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, nos termos da alínea a do inciso V do caput do art. 3º desta Lei;

b) despesas relacionadas ao desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal com vistas a reduzir estruturalmente os custos de geração de energia e para a navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins, de acordo com o disposto na alínea b do inciso V do caput do art. 3º desta Lei;

c) despesas relacionadas aos projetos na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas, cujos contratos de concessão sejam afetados por esta Lei, nos termos da alínea c do inciso V do caput do art. 3º desta Lei; e

d) despesas para ressarcir o valor econômico do fornecimento de energia elétrica para o Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) , conforme tratado no § 6º do art. 6º desta Lei;

III - a alteração do regime de exploração para produção independente, nos termos da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, inclusive quanto às condições da extinção das outorgas, da encampação das instalações e das indenizações; e

IV - a assunção da gestão do risco hidrológico, vedada a repactuação nos termos da Lei nº 13.203, de 8 de dezembro de 2015."

5. Levantamento de dados realizado pela equipe de auditoria da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura de Energia Elétrica (SeinfraElétrica) a partir de informações constantes dos autos e consolidado na tabela que segue transcrita a seguir, mostra que são vinte e duas as usinas hidrelétricas da Eletrobras enquadradas nas disposições do art. 2º da Lei 14.182/2021. Segue a relação dessas UHEs:

Usina

Subsidiária

Regime de exploração

Termo final da concessão vigente

Potência instalada (MW)

Boa Esperança

Chesf

Serviço público (cotas)

31/12/2042

237,3

Apolônio Sales (Moxotó)

31/12/2042

4.279,6

Paulo Afonso I

31/12/2042

Paulo Afonso II

31/12/2042

Paulo Afonso III

31/12/2042

Paulo Afonso IV

31/12/2042

Luiz Gonzaga (Itaparica)

31/12/2042

1.479,6

Xingó

31/12/2042

3.162,0

Funil

31/12/2042

30,0

Pedra

31/12/2042

20,0

Sobradinho

Serviço público (regime especial)

09/02/2052

1.050,3

Coaracy Nunes

Eletronorte

Serviço público (cotas)

31/12/2042

78,0

Tucuruí

Serviço público

30/08/2024

8.535,0

Curuá-Una

08/05/2038

42,8

Corumbá I

Furnas

Serviço público (cotas)

31/12/2042

375,0

Estreito (Luís Carlos B. de Carvalho)

31/12/2042

1.050,0

Funil - RJ

31/12/2042

216,0

Furnas

31/12/2042

1.216,0

Marimbondo

31/12/2042

1.440,0

Porto Colômbia

31/12/2042

320,0

Itumbiara

Serviço público (regime especial)

26/02/2020

2.082,0

Mascarenhas de Moraes (Peixoto)

Serviço público

29/01/2024

476,0

Total

26.089,6

Fonte: Elaboração a cargo da própria SeinfraElétrica, com base nas informações da Nota Técnica nº 46/2021 (peça 144) elaborada pela Assessoria Especial de Assuntos Econômicos (ASSEC) do MME.

6. Informa a unidade instrutiva em seu Relatório de Acompanhamento que a potência instalada das usinas referidas no art. 2º da Lei 14.182/2021 é de 26.089,6 MW, ou seja, 91,67% da potência total instalada de usinas hidrelétricas geridas pelas empresas do Grupo Eletrobras (30.828,15 MW) , segundo o Formulário de Referência 2021, p. 211-213, publicado pela estatal (https://eletrobras.com/pt/ri/DemonstracoesFinanceiras/Formulario%20de%20Referencia%202021.pdf) .

7. Anta, Balbina, Barra do Rio Chapéu, Batalha, Curemas, João Borges, Manso, Gov. Jayme Canet Jr. (Mauá) , Passo São João, Samuel, São Domingos, Serra da Mesa e Simplício são as hidrelétricas concedidas às empresas do Grupo Eletrobras que não são abrangidas pela Lei 14.182/2021.

8. A elevada representatividade, tanto em termos absolutos quanto relativos, da potência total instalada das vinte e duas usinas hidrelétricas da Eletrobras enquadradas nas disposições do art. 2º da Lei 14.182/2021 fundamentam uma das ressalvas feitas pela equipe técnica deste Tribunal de Contas da União (TCU) ao analisar as premissas utilizadas nos estudos e na modelagem econômico-financeira desenvolvidas para calcular o chamado VAC, ou seja, o valor que será adicionado aos novos contratos de concessão de energia elétrica, tema ao qual me dedicarei mais adiante.

9. Por enquanto, ao tempo em que encerro esse breve resumo do tema em discussão nos presentes autos, ratifico, em essência, o exame técnico empreendido pela SeinfraElétrica, cujos argumentos e conclusões incorporo às minhas razões de decidir, sem prejuízo às ressalvas que buscarei fundamentar no decorrer deste Voto.

10. Também antecipo meu essencial alinhamento às pertinentes e substanciosas preocupações aventadas pelo Ministério Público junto a este Tribunal de Contas da União (MPTCU) , representado nestes autos pelo douto Procurador Rodrigo Medeiros de Lima (peça 249) .

11. Outrossim, agradeço aos eminentes Ministros Benjamin Zymler e Jorge Oliveira as valiosas considerações que Suas Excelências fizeram chegar a meu Gabinete, as quais por certo contribuíram para o aperfeiçoamento dos fundamentos e desfechos processuais que passo a defender. Procurarei, ao longo desse voto, trazer esclarecimentos em relação às considerações desses pares, mesmo estando um deles, por motivo de afastamento legal, ausente dessa sessão.

- II -

12. O primeiro ponto que pretendo adentrar diz respeito à incompletude das informações prestadas pelo Poder Concedente, o que, segundo apontou a unidade instrutiva, inviabiliza uma análise conclusiva sobre a desestatização em todos os seus aspectos, obstando, por conseguinte, o início da contagem do prazo normativo previsto no art. 9º da Instrucao Normativa-TCU 81, de 20/6/2018, haja vista o disposto no § 1º desse mesmo artigo.

13. Referida incompletude de informações está detalhadamente descrita na Tabela 1 do Relatório de Acompanhamento da SeinfraElétrica (peça 234, p. 7-8) e deverá ser alvo de atenção por parte das autoridades competentes, cabendo repisar o entendimento que fiz constar do despacho de peça 97, encaminhado à Agência Nacional de Energia Elétrica (peça 98) , à Eletrobras (peça 99) , ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (peça 100) e ao Ministério de Minas e Energia (peça 107) , com o alerta de que, "dada a complexidade e relevância nacional do processo de desestatização em comento, não serão relevadas no presente caso as regras estipuladas pela IN-TCU 81/2018, em especial por seu art. 9º, §§ 1º, 4º, 5º, 7º e 9º, relativamente a critérios de contagem de prazo para manifestação do TCU, assim como as hipóteses de suspensão desse prazo".

14. Nessa mesma linha de raciocínio, embora tenha a equipe de fiscalização, "visando a um formalismo moderado e considerando o escopo do presente trabalho, [concluído que] a documentação encaminhada atende, de uma forma geral, às exigências específicas para a análise da matéria, não havendo prejuízo ao prosseguimento do feito" (peça 234, p. 9, item 45) , convém ressaltar que essa conclusão não pressupõe eventual atendimento aos aspectos da tempestividade, completude e suficiência técnica do acervo documental apresentado a esta Corte de Contas acerca da desestatização da Eletrobras.

15. Em outras palavras, a inexistência de "prejuízo ao prosseguimento do feito" aventada pela SeinfraElétrica diz respeito, por óbvio, não aos procedimentos a cargo do Poder Executivo com vistas à desestatização propriamente dita, mas ao andamento deste TC Processo XXXXX/2018-2, no âmbito deste Tribunal de Contas, relativamente à presente fase processual, restrita a uma primeira e preliminar análise e submissão dos autos à deliberação deste Plenário.

16. O MPTCU também apresentou algumas ponderações acerca da incompletude documental em comento.

17. Na percepção do douto representante do Parquet especializado, "o modo escorreito para obtenção de razoável segurança acerca do valor presente que as novas outorgas de concessões de geração de energia elétrica propiciarão às concessionárias ('valor adicionado') , estimado pelo CNPE em R$ 62,5 bilhões, consiste na análise individual dos estudos de viabilidade técnica, econômico-financeira e ambiental (incluídos os fluxos de caixa projetados com as receitas no regime de produção independente) de cada uma das vinte e duas usinas hidrelétricas alcançadas pelo art. 2º da Lei 14.182/2021", aplicando-se aos"casos em que a análise individual de concessões outorgadas simultaneamente seja entendida como dispensável 'de acordo com os critérios de materialidade, relevância, oportunidade e risco' (art. 2º, § 1º, in fine, da IN TCU 81/2018) (...) a técnica amostral de que trata o § 3º do art. 2º da IN TCU 81/2018, ao talante do Ministro Relator do processo" (peça 249, p. 7, itens 39 e 40) .

18. Com base nesse entendimento, o Ministério Público de Contas sugere que seja expedida determinação ao MME para que "se abstenha de encaminhar, ao Tribunal de Contas, estudos de viabilidade antes que haja a devida documentação formal da análise e consolidação das contribuições recebidas em audiência pública, sob pena de reinício da contagem do prazo de análise tratado na IN TCU 81/2018" (peça 249, p. 8, item 47) .

19. Compartilho, na íntegra, das preocupações do MPTCU acerca da necessidade de se buscar precificar da forma mais fidedigna possível o valor que será adicionado aos novos contratos de concessão de energia elétrica a serem celebrados entre a União e a Eletrobras.

20. Trata-se de premissa básica para atuação dessa Corte de Contas em defesa da boa e regular aplicação dos recursos públicos federais sob a ótica contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, recursos esses protegidos, entre outros, pelo princípio da indisponibilidade do interesse público, importante limite ao igualmente relevante poder discricionário atribuído a administradores públicos e governantes.

21. Creio, por outro lado, que a tramitação processual sui generis adotada neste TC Processo XXXXX/2018-2 - contemplando a presente apreciação prévia da matéria por parte deste Colegiado Pleno - possibilita que, em lugar da determinação proposta pelo ilustre representante do Parquet especializado, este Tribunal simplesmente exija do Poder Concedente, por enquanto, a adoção das providências necessárias à adequada quantificação do VAC, mais precisamente o saneamento das falhas de precificação até aqui apontadas pela SeinfraElétrica.

22. Com essas ponderações e sem prejuízo ao encaminhamento de determinações ou recomendações voltadas à correção das falhas de precificação apontadas nesta etapa processual, acolho a proposição da unidade instrutiva no sentido de se cientificar o MME quanto à necessidade de classificação, por parte dos órgãos gestores, das informações encaminhadas em cumprimento às disposições da IN-TCU 81/2018 pelo tipo de informação exigida em seus arts. 3º, 4º e 5º, conforme o caso, com a justificativa quanto ao não atendimento integral de algum desses dispositivos.

- III -

23. Também acolho a proposta de recomendação voltada à realização de estudos para a definição dos respectivos aproveitamentos ótimos, fazendo constar os custos associados na modelagem econômico-financeira para o cálculo do valor de outorga, se assim entender necessário, tudo isso à luz das conclusões anteriormente expostas pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) na Nota Técnica de Repotenciação e Modernização de Usinas Hidrelétricas, Ganhos de Eficiência, Energia e Capacidade Instalada (contendo os benefícios potenciais com a modernização do parque hidrelétrico brasileiro) , das incertezas associadas à aprovação ou não do projeto de modernização do setor elétrico e do eventual interesse da Eletrobras na realização desses estudos.

24. Apenas entendo não ser o caso - divergindo nesse ponto do MPTCU - de determinação, parecendo-me suficiente simplesmente expedir recomendação, cujo eventual não acolhimento, de todo modo, deverá ser devidamente justificado pelo Poder Concedente.

25. Peço vênias para não acolher as razões de divergência apresentadas pelo eminente Ministro Jorge Oliveira em relação a esse tema. Primeiro porque minha proposição não alberga a tese de Sua Excelência no sentido de que a viabilidade financeira a ser considerada não é apenas relacionada à capacidade de pagamento pelos estudos, mas sobretudo ao retorno econômico decorrente de eventual modernização das usinas.

26. Esclareço que minha proposta de recomendação - absolutamente alinhada na essência com as proposições da SeinfraElétrica e do MPTCU - está restrita à realização de estudos para definição de aproveitamentos ótimos, não havendo qualquer obrigatoriedade ou mesmo recomendação acerca da efetiva implementação das melhorias que porventura venham a ser aventadas quando da conclusão desses estudos.

27. Nesse ponto, em consonância com o art. 75-A, inciso II, do Decreto 5.163, de 30/7/2004, caberá à Aneel aprovar os estudos de aproveitamento ótimo, posicionando-se, inclusive, quanto à viabilidade econômica da implementação das melhorias sugeridas nesses estudos. E para que não restem dúvidas sobre isso, acrescento expressa previsão nesse sentido à proposta de determinação em comento.

28. Faço também uma ressalva em relação à argumentação do nobre Ministro Jorge Oliveira no sentido de que, diante das características do setor elétrico, especialmente daquelas relacionados aos produtores independentes de energia, que produzem e comercializam energia por sua conta e risco, não seria forçoso concluir que esses agentes possuem, por natureza, interesse em ampliar seu lastro de energia para venda.

29. Inobstante a pertinente linha de raciocínio desenvolvida pelo nobre par, há hipóteses em que o aproveitamento ótimo de um reservatório não enseja necessariamente ampliação de lastro de energia para venda, não se mostrando, portanto, nesses casos, financeiramente atrativo para o concessionário promover qualquer investimento em busca de melhorias. Cite-se como exemplo a ocorrência de alívio de deplecionamento de reservatórios mediante implementação de determinadas medidas de repotenciação e modernização, ocasionando ganhos de eficiência energética para o sistema.

30. Considerando que no Ambiente de Contratação Livre (ACL) cada concessionária administra seu próprio risco, esse olhar de ganho de eficiência sistêmica geralmente acaba sendo ignorado, trazendo prejuízo aos consumidores. Nesses casos, somente a obrigatoriedade quanto à realização de estudos para definição do aproveitamento ótimo garantirá que se possa vir a ter o ganho de eficiência sistêmica ora utilizado como exemplo.

31. Por essas razões, peço vênias ao eminente Ministro para manter, em essência, minha proposição inicial.

- IV -

32. No que tange ao valor adicionado pelos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica, ele foi estabelecido por meio da Resolução-CNPE nº 15, de 31/8/2021, no valor de R$ 62.479.656.370,10, tendo o Ministério de Minas e Energia apresentado os cálculos, as premissas e os valores detalhados na peça 144 (NT nº 46/2021/ASSEC) , a qual tem como anexo a planilha com a modelagem econômico-financeira realizada para obtenção do valor adicionado à Eletrobras pelos novos contratos de concessão.

33. A metodologia adotada pelo MME e pelo Ministério da Economia para precificar o valor adicionado das usinas hidrelétricas que serão recontratadas foi o fluxo de caixa descontado, que utilizou valores em moeda constante na data-base de janeiro de 2022. O objetivo foi avaliar qual a diferença de valor que seria adicionado ao contrato dessas UHEs sob o regime de produção independente de energia (PIE) em relação às suas concessões atuais, no formato de cotas.

34. Assim, dadas as diversas premissas legais, econômicas e setoriais, foi estimado o valor presente líquido incremental das novas concessões frente às antigas e calculado o desembolso à CDE que faria com que esse valor presente líquido incremental fosse zerado. Isso significa que, dada uma taxa de remuneração regulatória definida em 7,31%, o valor dos dispêndios previstos na Lei 14.182/2021 se igualaria ao incremento de valor dos novos contratos, sem alterar o equilíbrio financeiro teórico desses contratos da estatal, mas ampliando a liberdade de comercialização da Eletrobras privatizada.

35. Dos R$ 62.479.656.370,10 definidos pela Resolução-CNPE nº 15/2021, deverá ser deduzido o valor de R$ 2.906.498.547,37 relativo ao reembolso pelas despesas comprovadas com aquisição de combustível (dedução da Conta de Consumo de Combustíveis - CCC) incorridas até 30/6/2017 pelas concessionárias que foram controladas pela Eletrobras e que tenham sido comprovadas, porém não reembolsadas, por força das exigências de eficiência econômica e energética de que trata o § 12 do art. 3º da Lei 12.111, de 9/12/2009.

36. Do saldo restante (R$ 59.573.157.822,73) , de acordo com o inciso I do art. 4º da Lei 14.182/2021, 50% (R$ 29.786.478.912,00) deverá ser pago pela Eletrobras à CDE, havendo ainda a previsão de destinação de recursos para as seguintes finalidades:

a) Programa de Revitalização dos Recursos Hídricos das Bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba, ao qual deverão ser destinados R$ 350 milhões por ano, ao longo de dez anos, conforme art. 6º da Lei 14.182/2021;

b) desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal para redução estruturante dos custos de geração de energia e para navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins, para o que foram previstos, nos termos do art. 7º da Lei 14.182/2021, R$ 295 milhões por ano, ao longo de dez anos;

c) implementação de Programa de Revitalização dos Recursos Hídricos das Bacias Hidrográficas na área de influência das usinas hidrelétricas de Furnas, no qual deverão ser aplicados R$ 230 milhões por ano, ao longo de dez anos, por força do art. 8º da Lei 14.182/2021;

d) disponibilização, pelas concessionárias de geração localizadas na bacia do Rio São Francisco, do montante anual de 85 megawatts-médios (MWmed) pelo prazo de vinte anos, pelo preço de R$ 80,00 por megawatt-hora (MWh) , ao Operador do Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) , disponibilização esta cujo custo, trazido a valor presente pela taxa de remuneração real de 7,31%, totaliza R$ 509.563.867,00, representado pela diferença entre os valores de mercado e o valor subsidiado de R$ 80/MWh;

e) pagamento do valor remanescente (R$ 23.218.488.755,00) pela Eletrobras ou suas subsidiárias para o Tesouro Nacional, a título de bonificação pela outorga de novos contratos de concessão.

37. Ao analisar a modelagem adotada, a SeinfraElétrica verificou que o MME utilizou as premissas legais, quando disponíveis, criadas principalmente pela Lei 14.182/2021 e pela Lei 13.182, de 3/11/2015, que institui o Fundo de Energia do Nordeste e o Fundo de Energia do Sudeste e do Centro-Oeste.

38. Para os demais critérios necessários a esse cálculo, foram adotadas as premissas apresentadas na Nota Técnica nº 46/2021/ASSEC-MME (peça 144) , as quais, após detalhado exame a cargo da equipe técnica da Secretaria do TCU, foram alvo de algumas críticas e ressalvas por parte da referida equipe, algumas delas imediatamente reconhecidas pelo MME, que, por intermédio de sua Secretária Executiva, comprometeu-se formalmente, nos termos do Ofício nº 424/2021/SE-MME (peça 197) , a fazer os devidos ajustes, o que será verificado por ocasião da próxima apreciação deste TC Processo XXXXX/2018-2 por este Tribunal de Contas.

39. Com esses ajustes, especialmente considerando a extensão de prazo relacionada à repactuação do risco hidrológico, reduz-se em aproximadamente nove por cento a estimativa de Valor Adicionado aos Contratos (VAC) . Segundo planilha encaminhada pelo MME (peça 199) , os novos valores propostos seriam:

a) VAC: redução de R$ 62.479.656.370,10 para R$ 56.860.677.918,77;

b) CDE: redução de R$ 29.786.478.912,00 para R$ 26.977.089.685,88; e

c) bônus de outorga: redução de R$ 23.218.488.755,00 para R$ 20.344.200.523,26.

40. Quanto às demais críticas e ressalvas feitas pela unidade instrutiva em relação às premissas de cálculo apresentadas na Nota Técnica nº 46/2021/ASSEC-MME, pretendo abordar algumas delas mais adiante, mas não sem antes apresentar algumas - a meu ver essenciais - ponderações a respeito do cenário em que se pretende levar adiante a desestatização em tela.

- IV.1 -

41. Registro, de início, minha preocupação em relação ao modo com que está sendo levada a termo essa privatização. E assim o faço não por me opor a esse tipo de medida. Ao contrário.

42. Tive o privilégio de acompanhar com admiração inúmeras privatizações havidas na Alemanha à época em que lá residi, o que me serviu de exemplo de desestatizações bem sucedidas sob a ótica dos principais interessados: poder público, iniciativa privada e consumidores.

43. Muito há o que ser aprendido lá como modelo para o Brasil, a começar pela escolha do que será privatizado inicialmente. Enquanto em nosso país os empreendimentos mais rentáveis tem sido os primeiros a ser desestatizados, restando pouco ou nenhum interesse em relação aos demais - veja-se o caso dos aeroportos brasileiros -, na Alemanha, ao menos no que tange às privatizações que pude acompanhar, foi adotado rito absolutamente contrário.

44. Também merecem destaque naquele país europeu (i) o respeito, por todos os interessados, ao tempo de maturação do processo de privatização, (ii) o incentivo à ampla e efetiva participação dos interessados e (iii) a harmonização - provavelmente como consequência lógica das outras duas primeiras características - entre a desestatização que se pretende levar adiante e outros interesses nacionais.

45. Infelizmente, no Brasil, nenhuma dessas boas práticas alemãs tem se mostrado presente.

46. Em relação à desestatização objeto deste TC Processo XXXXX/2018-2, por exemplo, representantes de alguns setores (peças 269, 271, 273 e 278) questionam a lisura de determinados procedimentos a cargo do Poder Concedente e dos demais órgãos e entidades envolvidos, que parecem desconsiderar relevantes propostas de mudança regulatória que estão em discussão, assim como etapas tidas como importantes e necessárias para o adequado trâmite da privatização em foco.

47. Especial destaque foi dado por alguns desses setores a possíveis falhas na condução da Consulta Pública 48/2021 por parte da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) .

48. Quanto às propostas de mudança regulatória que estão em discussão, as quais estariam sendo ignoradas no curso da privatização da Eletrobras, foi citado o Projeto de Lei (PL) nº 414/2021, originário do Projeto de Lei do Senado Federal nº 232/2016 e destinado a promover alterações em diversos dispositivos legais relacionados ao setor elétrico tendo, entre outras finalidades, a de "aprimorar o modelo regulatório e comercial do setor elétrico com vistas à expansão do mercado livre".

49. Também a Aneel tem dedicado especial atenção à modernização do setor elétrico, conforme se verifica, por exemplo, nos procedimentos adotados pela agência reguladora com vistas à Revisão da Resolução Normativa nº 697/2015, que regulamenta a prestação e remuneração de serviços ancilares no Sistema Interligado Nacional (SIN) , assim denominados os serviços complementares necessários ao funcionamento dos serviços básicos do aludido sistema, quais sejam, geração, transmissão, distribuição e comercialização.

50. Tais iniciativas - legislativa e regulatória - por certo têm razão de ser nas cada vez mais significativas alterações havidas no Setor Elétrico Brasileiro (SEB) nas últimas décadas em decorrência principalmente dos efeitos das mudanças climáticas, do crescimento das fontes de energias renováveis variáveis (ERVs) e da escassez de oferta de energia elétrica frente ao aumento da demanda.

51. De acordo com o Relatório de Análise de Impacto Regulatório nº 006/2019-SRG/Aneel, "A matriz elétrica brasileira tem passado por transformações marcadas pela redução da regularização dos reservatórios de usinas hidrelétricas e forte penetração de fontes renováveis com geração intermitente concentradas em regiões geoelétricas específicas, especialmente na região Nordeste. Esse movimento conduz à necessidade de prestação de serviços ancilares ao sistema elétrico que venham a compensar as variações das grandezas elétricas, cujos padrões não sejam atendidos pela produção energética programada." (https://www.aneel.gov.br/tomadas-de-subsidios?p_auth=Mje0E5ru&p_p_id=participacaopublica_WAR_participacaopublicaportlet&p_p_lifecycle=1&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-2&p_p_col_count=1&_participacaopublica_WAR_participacaopublicaportlet_ideParticipacaoPublica=3396&_participacaopublica_WAR_participacaopublicaportlet_javax.portlet.action=visualizarParticipacaoPublica) .

52. Nesse cenário de grandes transformações e de transição energética, as usinas hidrelétricas assumem preponderante papel sob a ótica da regulação, acompanhamento de carga e planejamento para o enfrentamento de oscilações sazonais de geração, sendo consideradas por especialistas do setor, em conjunto com as linhas de transmissão que integram nosso país de dimensões continentais, instrumento ótimo de sustentação para a transição energética.

53. Tais iniciativas - legislativa e regulatória - têm razão de ser nas cada vez mais significativas alterações havidas no Setor Elétrico Brasileiro (SEB) nas últimas décadas em decorrência do crescimento das fontes de energias renováveis variáveis (ERVs) , da digitalização das redes e dos sistemas, da escassez de oferta de energia hidrelétrica e de outras fontes de geração convencional frente ao aumento da demanda.

54. Paralelamente a isso, e não menos importante, há a necessidade de regulação quanto ao uso dos reservatórios dessas hidrelétricas com vistas a assegurar máxima eficiência, não somente aos usos múltiplos da água, mas também à transição energética ora em curso, cabendo frisar que o Brasil encontra-se atualmente em condição privilegiada no cenário mundial para levar adiante essa transição, haja vista dispor de grande capacidade de armazenamento de energia potencial em reservatórios d'água, 50% deles, aproximadamente, sob concessão da Eletrobras.

55. O Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico (Ilumina) , admitido nestes autos como amicus curiae e representado pela Dra. Clarice Campelo de Melo Ferraz - a quem cumprimento e agradeço pelas relevantes contribuições apresentadas -, trouxe importante e fundamentada reflexão sobre o tema, a qual me permito colacionar abaixo:

"(...) A Eletrobras controla ativos estratégicos dos pilares de sustentação para a transição energética: os reservatórios e as linhas de transmissão. Sua gestão será determinante para a garantia do abastecimento e para evitar choques tarifários.

(...)

Urge destacar as graves consequências que o desconhecimento dos processos de reformas de mercados de eletricidade acarreta, onde tais processos são mal estruturados. A análise dos processos de reforma de mercados iniciados há 30 anos (inglês, europeu, californiano, entre tantos outros) , visando maior abertura para a concorrência, mostra que há uma ordem a ser seguida para que seja garantida a segurança de abastecimento. Primeiro deve se definir o marco regulatório, pois é ele quem determina as regras do setor e o papel - direitos e obrigações - dos agentes. Este conjunto de regras claramente definidas por arcabouço legal previamente instituído é que irá determinar o valor dos ativos existentes. Somente depois de bem estabelecido o marco regulatório setorial entra em discussão a ocorrência de eventuais privatizações. Desestatização e mudança de marco regulatório não são ações a serem feitas em paralelo. Existe ampla literatura sobre o tema, baseada nas experiências de reformas de mercados de eletricidade realizadas nos anos 1990. Destacamos alguns importantes autores que discutiram o tema em diversas publicações. Jamasb[footnoteRef:2] (Copenhagen Business School) nos mostra que as reformas do setor elétrico em vários países variam de acordo com a disponibilidade de seus recursos e seus contextos políticos, econômicos e institucionais. No entanto, apesar da multiplicidade de combinações possíveis, uma espécie de rota seria estabelecida, quanto à ordem das etapas necessárias para abrir um mercado de energia elétrica à concorrência. O autor apresenta as principais etapas na seguinte ordem: [2: Jamasb,"Between the state and the market: Electricity sector reform in developing countries", Utilities Policy, nº 14, 2006, p. 14-30]

(i) Estabelecimento do quadro legal e regulamentar;

(ii) Reestruturação do setor - reorganização das atividades e atores do setor;

(iii) Desestatização de empresas públicas, quando for desejável.

O Professor emérito David Newbery, um dos maiores especialistas sobre o tema, é categórico sobre essa questão. Ele é Diretor do Grupo de Política Energética da Universidade de Cambridge, ex-membro da Comissão de Concorrência e presidente do Comitê de Vigilância do Mercado de Eletricidade da Holanda, ex-presidente da Associação Internacional de Economistas da Energia, membro do Fundo da Rede de Baixo Carbono de Ofgem e recente conselheiro sobre Reforma do Mercado de Eletricidade para o Comitê Seleto da Câmara dos Comuns sobre Mudanças Climáticas.

Newbery também argumenta que a ordem com que são feitas as reformas de mercado são essenciais para seu sucesso. Segundo ele, as privatizações nunca podem preceder a separação das atividades e a corporatização das empresas produtoras, redes nacionais e distribuidoras. Assim, as privatizações, que envolvem mudanças significativas tanto na estrutura de propriedade dos ativos do setor quanto no poder de mercado, só podem ser realizadas quando a estrutura de governança do setor estiver bem estabelecida. Isso é ainda mais verdadeiro se o setor estiver passando por uma transformação na escala da atual transição energética.[footnoteRef:3] [3: Breve discussão se encontra disponível em Ferraz, 2020. « Les difficultés des réformes des marchés électriques : le Brésil, de l'essor industriel à la transition énergétique » Entreprises et histoire 2020/2 (nº 99) , pages 53 à 65.]

(...)

Diversos estudos desenvolvidos pelo Laboratório Nacional de Energia Renovável (NREL) dos Estados Unidos da América que, há mais de 30 anos, se dedica a estudar as novas fontes de geração de eletricidade e sua integração no sistema elétrico, mostram que a diversidade geográfica é uma grande aliada. Quanto maior o território coberto por um sistema elétrico, menor é variabilidade associada às ERVs. Como a geração se dá localmente, a rede pode alimentar o sistema com novas fontes de geração oriundas de outras localidades, em caso de ausência de geração em determinada região. Além disso, a integração de largos territórios permite o melhor aproveitamento das complementaridades diárias e sazonais que frequentemente acontecem entre disponibilidade de recursos eólico e solar etc. Assim, a existência de linhas de transmissão que integrem diferentes regiões mostra-se uma alternativa muito mais barata do que os sistemas de estocagem de eletricidade - em particular, as baterias.

Outro elemento importante para a garantia da segurança de abastecimento é a flexibilidade do próprio parque gerador. Essa flexibilidade inclui a possibilidade de o gerador entrar em operação, aumentando ou reduzindo sua produção, conforme a oferta de eletricidade. Essa capacidade de adaptação à carga e às oscilações de frequência é muito importante, pois pode haver grande variabilidade da geração a partir das ERVs. A quantidade de energia inercial dos geradores a partir de fontes tradicionais também é importante.

A estocagem, ou armazenamento, de energia é outro importante elemento de flexibilidade sistêmico para o setor. Sistemas de armazenamento de energia podem assumir diversas funções, dentre elas a regulação das redes, o acompanhamento da curva de carga diária ou, ainda, atuarem como fonte de flexibilidade para adicionar ou retirar (armazenar) energia do sistema quando houver pouco ou excesso de geração de eletricidade a partir de fontes de ERVs. Existem diversas formas de estocagem, desde reservatórios das centrais hidrelétricas até utilização de baterias. Em grandes sistemas, a necessidade de armazenamento depende da quantidade de ERVs e de sua integração geográfica, entre outros fatores. A melhor fonte, em termos de tempo de resposta e de menor custo, são as centrais hidrelétricas com reservatórios, que são a única tecnologia capaz de exercer as funções de regulação, acompanhamento de carga e planejamento para o enfrentamento de oscilações sazonais de geração.

Os resultados dos principais estudos sobre como realizar a integração física de maior participação da ERV, segundo Koproski (2017) e SEAM (NREL) [footnoteRef:4], mostram que os planejadores devem tentar coordenar suas operações visando o compartilhando de recursos ao longo do sistema; e expandir a capacidade de transmissão para remover gargalos e restrições à integração de mais ERV. Por último, são apontados mecanismos de mercado para melhorar a precificação e incentivar a adição de flexibilidade ao sistema. Os reservatórios são, portanto, remunerados por sua função de armazenamento de eletricidade - sua capacidade de equilibrar o sistema. [4: NREL, Interconnections Seam Study, https://www.nrel.gov/analysis/seams.html ]

(...)

Os recentes eventos meteorológicos extremos impactam severamente o potencial hidrelétrico dos reservatórios tanto em período de escassez de chuva como em períodos de enchentes. Os conflitos entre os usos múltiplos da água crescem e tendem a se agravar. A gestão e a valoração econômica dos reservatórios hidrelétricos estão sendo rediscutidas em diversos países, como os EUA, a Suíça e a China. O sexto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) faz um chamamento ao planejamento para lidar com maiores períodos de seca, maiores temperaturas e eventos climáticos extremos. Os reservatórios, se geridos de forma coordenada, servem para a regularização dos cursos d'água, para constituir estoques de água doce e, ainda, como importante fonte de geração flexível - capaz de compensar as oscilações relacionadas às novas fontes de energias renováveis variáveis. Dessa forma, os reservatórios contribuem para a modicidade tarifária e para a segurança de abastecimento, além de constituir parte importante das estratégias de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Caso sejam vistos como simples usinas de KWh, e geridos de forma individualizada, deverão apenas agravar os problemas mencionados." (peça 278)

56. Resta evidente, à luz desses argumentos, a importância das concessões de transmissão e de geração hidrelétrica sob responsabilidade da Eletrobras, o mesmo podendo ser dito em relação à necessidade de regulação quanto ao uso desses ativos com vistas a assegurar máxima eficiência, não somente aos usos múltiplos da água, mas também à transição energética mundial ora em curso rumo à descarbonização das fontes de fornecimento de energia.

57. Em respaldo a essa preocupação, ressalto que o Brasil, juntamente com o Canadá, China, Estados Unidos da América (EUA) , Noruega, Suécia, Índia, Rússia e Venezuela, é um dos maiores geradores de energia hidráulica do planeta, sendo que, independentemente de correntes ideológicas e políticas, nenhum dos países com matriz energética majoritariamente hídrica abdicou do controle estatal dessa energia. No caso dos EUA, em especial, 67% de sua capacidade de geração hidráulica de reservatórios está nas mãos do Exército, por ser considerada questão essencial para a segurança nacional.

58. Nessas circunstâncias, tenho por deveras temerária a decisão de abdicar do controle estatal sobre as vinte e duas concessões de geração hidrelétrica abrangidas pelo art. 2º da Lei 14.182/2021 sem que, ao menos, sejam previamente estabelecidas normas gerais de regulação e regras específicas contratuais que assegurem ao Estado brasileiro a preservação dos benefícios que essas UHEs propiciam em termos de regulação, acompanhamento de carga e planejamento para o enfrentamento de oscilações sazonais de geração.

59. Não pretendo aqui questionar a decisão dos Poderes Legislativo e Executivo em relação ao futuro da Eletrobras. Sempre me pautei pela rigorosa observância aos limites constitucionais de atuação desta Corte de Contas e não seria agora que agiria de modo diverso.

60. Na verdade, as ressalvas ora apresentadas objetivam exclusivamente chamar a atenção das autoridades competentes para importantes particularidades da desestatização em comento, cuja influência sobre as mais diversas variáveis do sistema elétrico brasileiro será não somente enorme, como também longeva.

61. Feitas - por dever de consciência - essas considerações, passo a tratar das principais críticas e ressalvas feitas pela unidade instrutiva em relação às premissas de cálculo apresentadas na Nota Técnica nº 46/2021/ASSEC-MME.

- IV.2 -

62. A primeira dessas críticas diz respeito à metodologia utilizada para cálculo das novas garantias físicas das UHEs em comento, para a qual não foram revisados parâmetros importantes como (i) série de vazões dos empreendimentos, (ii) usos consuntivos da água e (iii) aversão a risco dos modelos computacionais de planejamento da operação (CVAR) , sendo que para este último parâmetro - aversão a risco nos modelos - foram atualizados apenas os níveis de volume mínimo operativo (VminOp) , aprovados pela Comissão Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais do Setor Elétrico (CPAMP) .

63. De acordo com a unidade instrutiva, os dois primeiros desses parâmetros de entrada para cálculo da garantia física das usinas são de responsabilidade da Agência Nacional de Águas (ANA), estando o terceiro sob responsabilidade do MME, não tendo sido qualquer deles disponibilizado a tempo de serem usados pela EPE nos cálculos, o que dá ensejo ao risco de que a garantia física desses empreendimentos esteja superdimensionada. Em outras palavras, essas UHEs podem não ter a capacidade de geração de energia que lhes está sendo atribuída.

64. Havia uma expectativa de que a referida agência reguladora fornecesse esses dados para a revisão ordinária de garantias físicas das usinas hidrelétricas do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) prevista para 2022. Ocorre que futuras revisões de garantia física estarão limitadas pelo Decreto 2.655, de 2/7/1998, mais precisamente por seu art. 21, § 5º, do qual se depreende que, para as usinas hidrelétricas participantes do MRE, as reduções de garantia física não poderão implicar redução superior a cinco por cento do valor estabelecido na última revisão, limitadas as reduções, em seu todo, a dez por cento do valor de base, constante do respectivo contrato de concessão, durante a vigência deste.

65. Como resultado dessa limitação, vale citar o risco de que os empreendimentos em tela permaneçam com suas capacidades de geração de energia superestimadas por mais trinta anos.

66. A conclusão da SeinfraElétrica sobre esse achado é no sentido de que, "a despeito dos riscos mencionados, o processo de recálculo de garantias físicas envolve atividades que fogem ao escopo do presente trabalho e que poderiam demandar um prazo incompatível com o cronograma de privatização da Eletrobras, motivo pelo qual se entende pela inviabilidade de providências relacionadas ao assunto" (peça 234, p. 22-23, item 135) .

67. Concordo plenamente que seria inviável adotar providências relacionadas a esse tema dentro do cronograma de desestatização pretendido pelo Poder Executivo. Por outro lado, não creio que a observância a esse ou outro cronograma de governo possa ser seguido ou imposto às cegas, parecendo-me imprescindível que seja devidamente motivada pelas autoridades competentes toda e qualquer preferência cronológica dada à desestatização em tela em detrimento de oportunidades de melhoria e de retificação de falhas tecnicamente apontadas como pertinentes.

68. O Ministério Público de Contas também teceu pertinentes críticas à metodologia utilizada para cálculo das novas garantias físicas das UHEs alcançadas pelo art. 2º da Lei 14.182/2021, sugerindo, ao final, o encaminhamento de recomendação ao MME e à EPE para que complementem os cômputos registrados no "Cálculo de Montante de Garantia Física de Energia" (peça 204 deste processo) , passando a considerar valores atualizados para: (i) série de vazões dos empreendimentos; (ii) usos consuntivos da água; e (iii) parâmetros de aversão a risco dos modelos computacionais de planejamento da operação (CVAR) .

69. A meu ver, diante dos argumentos desenvolvidos acima, em especial do risco de que os empreendimentos em tela permaneçam com suas capacidades de geração de energia superestimadas por mais trinta anos, reputo pertinente acolher a proposta do Parquet especializado.

70. Em reforço a esse encaminhamento, lanço mão do seguinte excerto do parecer da SeinfraElétrica, no qual se menciona algumas das consequências desse descasamento entre garantias físicas e respectivas capacidades de geração:

"130. Ressalta-se que já é um problema conhecido do setor elétrico brasileiro que as garantias físicas de muitas hidrelétricas estão superestimadas. Tal problema traz consequências sistêmicas, pois majora indevidamente a capacidade produtiva de energia, trazendo erros aos modelos computacionais de previsão de geração e de necessidade de expansão do parque gerador. Ademais, afeta diretamente as hidrelétricas, ao provocar uma produção média inferior ao esperado e consequente necessidade de compra de energia a PLD [Preço de Liquidação das Diferenças], aumentando o risco dos geradores hidráulicos não cotizados.

131. Com a adequação nas GFEs das usinas da Eletrobras, o sistema passará a ter o total de garantia física mais próximo à capacidade de geração real, mitigando os problemas citados." (peça 234, p. 22)

71. Ademais, convém mencionar que o superdimensionamento de garantias físicas em relação à real capacidade de geração de energia tornou-se especialmente prejudicial ao equilíbrio do setor elétrico a partir de 2014, pois as sucessivas crises hidrológicas havidas desde então têm resultado em saldos anuais sempre negativos entre a soma energia gerada pelas hidrelétricas e a soma das suas garantias físicas. Com isso, as usinas hidrelétricas participantes do Mecanismo de Realocação de Energia não têm conseguido compensar entre si as diferenças existentes entre suas respectivas gerações e garantis físicas, restando-lhes como opção, para conseguirem honrar seus contratos, a compra de energia a preços maiores no ambiente de contratação livre.

72. Nesse cenário, torna-se ainda mais grave abdicar de uma consistente atualização das garantias físicas das usinas da Eletrobras que serão recontratadas com base no art. 2º da Lei 14.182/2021, o que levaria essas usinas - que somam aproximadamente 50% dos reservatórios de hidrelétricas do país - a ficarem limitadas, por mais trinta anos, em termos de revisão dessas garantias, aos percentuais máximos definidos no art. 21, § 5º, do Decreto 2.655/1998.

73. Ainda em reforço à recomendação ora sugerida, convém informar que, dos três parâmetros cuja atualização foi apontada como relevantes pelo Ministério Público de Contas, já se encontram devidamente atualizados os dois sob responsabilidade da ANA - (i) série de vazões dos empreendimentos e (ii) usos consuntivos da água -, temas objeto das Resoluções nº 92 e 93 editadas pela referida agência reguladora em 23/8/2021, apenas quatro dias após a EPE ter concluído o estudo EPE-DEE-RE-086/2021-r0 (peça 204) com a metodologia de cálculo e o resultado das novas garantias físicas para as UHEs da Eletrobras que terão um novo contrato de concessão celebrado.

74. Diante disso, ao menos em relação a esses dois parâmetros recentemente atualizados pela ANA não vislumbro razões para que deixem de ser sopesados de imediato para recálculo das garantias físicas em comento, devendo o MME justificar eventual impossibilidade de se fazer o mesmo em relação ao parâmetro de aversão a risco dos modelos computacionais de planejamento da operação.

75. Ademais, considerando que somente esse parâmetro de aversão a risco permanece com risco de não vir a ser implementado de imediato, acolho uma das sugestões apresentadas pelo eminente Ministro Jorge Oliveira em relação ao tema em comento, qual seja, aquela voltada à exclusão da recomendação que este relator pretendia dirigir ao MME para que essa pasta ministerial avaliasse se realmente seria oportuno e conveniente abrir mão, por mera questão de priorização do cronograma traçado para os procedimentos de desestatização em curso, da possibilidade de que, se vierem a ser firmados somente após atualização de dados destinados a subsidiar a revisão ordinária de garantias físicas das usinas hidrelétricas do MRE prevista para 2022, os novos contratos que se pretende celebrar com amparo no art. 2º da Lei 14.182/2021 possam ter definitivamente solucionado, a depender a amplitude que seja adotada nessa atualização de dados, o problema de descasamento entre as garantias físicas que lhes são atribuídas e as respectivas capacidades reais de geração de energia.

76. Por outro lado, mantenho a recomendação proposta pelo Parquet especializado para que o MME complemente os cômputos registrados no Cálculo de Montante de Garantia Física de Energia, passando a considerar valores atualizados para série de vazões dos empreendimentos, para usos consuntivos da água e para parâmetros de aversão a risco dos modelos computacionais de planejamento da operação (CVAR) .

77. Obviamente, dado o caráter sugestivo da proposição, poderá a unidade jurisdicionada decidir, de maneira devidamente fundamentada, pelo não acolhimento da recomendação.

- IV.3 -

78. Outro ponto criticado tanto pela equipe técnica da Secretaria deste Tribunal quanto pelo MPTCU diz respeito à utilização da Curva Forward da plataforma Dcide como referencial de preços de curto prazo para a venda de energia no ambiente de contratação livre.

79. Segundo foi pontuado no Relatório de Acompanhamento de peça 234 (p. 23, item 142) , "Como os contratos de comercialização no ambiente livre são sigilosos e apenas as partes envolvidas sabem de fato o preço de venda da energia, as referências de preços inseridas no sistema [utilizado pela consultoria Dcide] são meramente declaratórias, sem comprovação efetiva da veracidade dos valores.".

80. Some-se a isso a volatilidade desses valores, tendo a SeinfraElétrica citado como exemplo o fato de que a expectativa da Dcide para o preço da energia ao longo dos próximos quatro anos ter recuado 20% em uma única semana, sem que tenha havido alteração relevante de fatores estruturantes no setor.

81. Nessas circunstâncias, dada a volatilidade dos valores de energia projetados pela Dcide e a dependência deles em relação a declarações de agentes do setor, concluiu a unidade instrutiva haver risco de serem utilizadas, no cálculo do bônus de outorga, variáveis não representativas da expectativa média de mercado e que, por conseguinte, podem não espelhar uma linha de tendência no curto prazo.

82. Isso se torna ainda mais preocupante se for considerado que o referencial de preço em comento está sendo usado para valoração de um bem que não passará por licitação.

83. Por outro lado, reconheceu a equipe técnica que o mercado de curto prazo apresenta volatilidade intrínseca, constatável independentemente da fonte de informações escolhida, e que os valores da curva Dcide se mantiveram estáveis por vários meses, no patamar de R$ 233,00/MWh, o que lhes possibilita serem aceitos, de uma forma minimamente confiável, como parâmetro de preço de curto prazo da energia elétrica.

84. Eis as conclusões da unidade técnica especializada acerca do tema:

"154. Como o preço de curto prazo adotado pelo MME foi derivado dessa janela de tempo em que os valores da Dcide se mostraram mais estáveis, foi afastada a instabilidade indesejável a que se sujeita a curva divulgada pela consultoria. Desse modo, entende-se razoável a adoção valor de R$ 233,00/MWh como parâmetro de preço de curto prazo na modelagem econômico-financeira.

155. Por outro lado, não se constata a mesma estabilidade nos valores mais recentes da curva da Dcide, uma vez que no período de junho a setembro de 2021 estavam no patamar de R$ 239,15/MWh e em 5/9/2021 recuou, repentinamente, para R$ 191,46/MWh.

156. Caso tivessem sido utilizados esses valores mais recentes da curva da Dcide, o MME poderia estar considerando preços influenciados pela instabilidade em questão. Para mitigar esse risco no âmbito da precificação de novos contratos de outorga, propõe-se recomendar ao MME que fixe sua referência no valor inicialmente adotado, de R$ 233,00/MWh." (peça 234, p. 25-26)

85. A exemplo do Parquet especializado, compartilho das preocupações da SeinfraElétrica em relação à adoção da curva Dcide como referencial para o preço da energia no curto prazo (mercado spot) , o que somente se mostrou minimamente aceitável por seus preços terem se mantido estáveis por vários meses, no patamar de R$ 233,00/MWh.

86. Ocorre que o MME, depois de concluída a etapa de instrução do presente feito, veio aos autos (peça 247) solicitar a este Tribunal que leve em consideração, na modelagem econômico-financeira relativa ao valor a ser adicionado aos novos contratos de concessão da Eletrobras, alguns parâmetros mais atualizados, entre eles referida curva Dcide, estando os demais relacionados ao custo médio ponderado de capital (Weighted Average Cost of Capital - WACC) e aos custos de operação, manutenção e investimento.

87. Após reuniões feitas entre minha assessoria, a equipe técnica da SeinfraElétrica e representantes do MME, cheguei à conclusão de que, inexistindo excessivo lapso temporal entre a data-base das premissas adotadas para cálculo do chamado VAC resultante da recontratação de usinas a Eletrobras e o envio da correspondente documentação para este Tribunal, não haveria razão para que, depois de ter sido concluída ampla - e, no caso da desestatização da Eletrobras, especialmente complexa - análise técnica e econômico-financeira a cargo do corpo técnico desta Casa acerca desta desestatização, fosse o Poder Concedente autorizado a promover, inexistindo motivo relevante que o justifique, atualização de parâmetros isolados de precificação sem que haja uma reanálise global da matéria por parte daquele mesmo corpo técnico.

88. Essa preocupação adquire maior relevo se considerarmos a ponderação feita pela unidade instrutiva no sentido de que "o valor da energia é uma das premissas mais sensíveis do modelo em análise, sendo que pequenas variações podem alterar em bilhões de reais o valor acrescentado a cada um dos novos contratos" (peça 234, p. 25, item 150) .

89. Diante disso, em despacho datado de 1º/12/2021 (peça 258) , decidi diligenciar o MME com vistas ao saneamento dos autos, tendo a aludida unidade jurisdicionada, por meio do Ofício nº 539/2021/SE-MME (peça 261) , formalizado sua desistência em relação ao pedido em comento, tendo ainda prestado outros esclarecimentos por mim solicitados acerca de temas aos quais me dedicarei mais adiante.

90. Destarte, considerando a informação prestada pelo Poder Concedente no sentido de que "não será necessário proceder com a atualização dos parâmetros empregados no cálculo do valor adicionado pelos novos contratos de concessão das UHEs da Eletrobras" (peça 261, p. 1, item 4) , retomo minha convicção, na linha dos pareceres precedentes (peças 234 e 249) , no sentido de que, em face da volatilidade intrínseca ao mercado de curto prazo, constatável independentemente da fonte de informações escolhida, e considerando que os valores da curva Dcide se mantiveram estáveis por vários meses, no patamar de R$ 233,00/MWh, mostra-se possível aceitar essa curva, de uma forma minimamente confiável, como parâmetro de preço de curto prazo da energia elétrica.

91. Outrossim, embora pareça estar implícita no esclarecimento acima colacionado a intenção do Poder Concedente de realmente usar esse valor de R$ 233,00/MWh como referência para o preço da energia de curto prazo, parece-me prudente manter o encaminhamento proposto pela SeinfraElétrica e acolhido pelo Ministério Público de Contas de se expedir recomendação ao MME voltada ao uso desse referencial.

- IV.4 -

92. Quanto ao valor adotado como parâmetro de preços da energia elétrica a longo prazo, duas inconsistências foram suscitadas pela unidade instrutiva e ratificadas pelo MPTCU. São elas:

a) adoção de valores mais recentes do Custo Marginal de Expansão de Energia (CME-Energia) como estimativa de preço de longo prazo, resultando em um preço no patamar de R$ 155,00/MWh, quando deveriam ter sido utilizados, sob o ponto de vista metodológico eleito pelo próprio MME, os CMEs mais distantes projetados, que se situam no patamar de R$ 172,14/MWh (CME 2033) , ou, ao menos, a média dos anos que apresentam uma tendência de estabilização de valor, ou seja, de 2030 a 2033 (R$ 169,23/MWh) ; e

b) completa desconsideração da componente de potência - denominada CME-Potência - e de seu potencial de receita futura por meio da venda de lastro de capacidade.

93. Em relação à primeira dessas inconsistências, a Nota Informativa nº 25/2021/ASSEC (peça 254) já havia classificado a adoção do sobredito valor de R$ 172,14/MWh como "um aprimoramento à metodologia aplicada na modelagem do valor adicionado" (peça 254, p. 2, subitem 2.2.12) .

94. Ocorre que a redação do subitem seguinte da aludida Nota Técnica - "Ainda que se adote como premissa, no mínimo, o valor de 172,14 R$/MWh..." (peça 254, p. 2, subitem 2.2.13) - deixava dúvida sobre o acatamento ou não do reconhecido aprimoramento metodológico, o que me levou a questionar a aludida pasta ministerial - em sede de diligência recentemente promovida para sanear essa e outras dúvidas (peça 258) - sobre qual seria sua real percepção acerca das ponderações feitas pela equipe técnica do TCU em relação ao assunto.

95. Em resposta, o MME manifestou "concordância com o aprimoramento metodológico, proposto pela SeinfraElétrica, no sentido de se considerar para a projeção de preço de energia, no longo prazo, o valor de 172,14 R$/MWh referente ao último ano (2033) da série de Custo Marginal de Expansão de Energia (CME-Energia) do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2030", tendo ainda se comprometido "a promover as adequações na metodologia de cálculo do valor adicionado pelos novos contratos da Eletrobras, adotando como premissa o valor de 172,14 R$/MWh, referente ao CME-Energia de projeção mais distante publicado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) na Nota Técnica EPE-DEE-NT-081/2021-r0" (peça 261, p. 1-2, itens 5 e 6) .

96. Tenho por superada, portanto, a questão, cabendo, inclusive, a exemplo do que foi feito relativamente a outros aprimoramentos de cálculos formal e prontamente acolhidos pelo MME por sugestão da SeinfraElétrica, considerar desnecessária a determinação corretiva sugerida pela referida unidade técnica especializada com vistas à adoção do valor de R$ 172,14/MWh como premissa de preço mínimo da energia de longo prazo.

97. Resta abordar a segunda inconsistência ventilada nos autos a respeito do valor referencial para preços da energia elétrica no mercado de longo prazo, qual seja, a completa desconsideração da componente de potência (CME-Potência) e de seu potencial de receita futura por meio da venda de lastro de capacidade.

98. Questionada sobre o tema, a EPE defendeu, à peça 202, em resumo, que:

a) o CME-Potência seria uma proxy (ou seja, uma variável que é utilizada para representar outra variável que não é observável ou não pode ser observada diretamente) de eventual mercado futuro de capacidade de potência associado ao mercado de energia vigente;

b) apesar de já existirem estudos e debates sobre o tema, tal mudança ainda não teria sido efetivamente regulada, não havendo previsão de seu início;

c) os estudos existentes preveem que todos os contratos firmados até a data de início do novo modelo de comercialização serão respeitados, de modo que os geradores terão que esperar o fim de seus contratos vigentes para a venda dos produtos separados de lastro e energia; e

d) sem a existência desse mercado, não haveria preços nem negociações de lastro de capacidade de potência e, consequentemente, não haveria formação de expectativas de preços futuros.

99. Tais argumentos não foram acatados pela SeinfraElétrica, cuja análise permito-me colacionar também neste Voto:

"162. Com relação à utilização do CME-Energia como referencial de preços para o longo prazo, ao invés do CME, em que são consideradas a energia e a potência, identifica-se inicialmente um risco no referencial adotado.

163. A separação entre CME-Energia e CME-Potência se justifica principalmente pela expectativa do setor da alteração do modelo de comercialização de energia vigente. Planeja-se alterar a venda de energia baseada nas garantias físicas das usinas por um modelo em que seja comercializada tanto a energia efetivamente produzida (MWmed ou MWh) , quanto a capacidade de geração, ou seja, a potência associada ao empreendimento (MW) que agregará segurança energética ao SIN. Ou seja, enquanto atualmente a venda de energia abrange os dois produtos em conjunto, após essa reforma os geradores poderão vender separadamente lastro e energia. O objetivo principal é que a expansão do sistema, com a consequente segurança energética, seja financiada igualmente por todos os consumidores, tanto do mercado livre quanto do mercado regulado. No modelo atual, de negociação apenas da energia (com o lastro implícito no preço) , empreendimentos termelétricos são adquiridos apenas pelo mercado cativo, que acaba ficando com o ônus da segurança energética.

164. Assim, existe uma paridade entre o CME-Energia e o CME-Potência e a venda de energia e capacidade, respectivamente. Tal modelo ainda não foi adotado, mas os novos contratos de comercialização firmados após essa alteração já poderão comercializar os dois produtos separadamente. Logo, para o preço de venda da energia pela Eletrobras no longo prazo, ao se considerar apenas o CME-Energia, desconsidera-se o potencial de arrecadação por meio da venda do seu lastro, de modo que a eventual receita dos novos contratos de concessão no regime PIE pode estar sendo subavaliada.

165. Como argumentado pela EPE (peça 202) , esse novo modelo ainda não está totalmente em vigor. Entretanto, o setor já está em processo de mudança. Evidência disso é o Decreto 10.707/2021, que regulamenta a contratação de reserva de capacidade, na forma de potência. Com base nesse decreto, a Aneel já abriu duas consultas públicas ( CP) sobre o tema. A CP 63/2021 trata da sistemática do Leilão 11/2021, conhecido como Leilão de Reserva de Capacidade. O certame, voltado para a contratação de usinas termelétricas, está previsto para o dia 21/12/2021. Nesse leilão serão negociados, pela primeira vez, dois produtos: energia e potência. Já a CP 61/2021 visa obter subsídios para os futuros contratos de reserva de capacidade.

166. Nada obstante essas mudanças regulatórias, pode-se afirmar com razoável segurança que a Eletrobras venderá, além de energia, lastro de capacidade de potência no âmbito dos novos contratos de concessão das usinas em análise, mesmo que a modernização do setor não ocorra no futuro próximo. Logo, considerando que o objetivo do MME é valorar esses contratos durante os trinta anos de concessão, há o risco de não haver qualquer componente da venda de potência, a qual gerará receita à empresa além da venda de energia, o que aumentaria o valor adicionado aos contratos e, consequentemente, o bônus de outorga.

167. Interessante destacar que a premissa instituída pelo próprio MME no Ofício que determinou à EPE que fizesse as projeções de preços de energia no ACL incluía o fator potência (peça 206) :

Tendo em vista as discussões mantidas entre o MME e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) , solicito a emissão de Nota Técnica contendo as projeções de preço de energia, no ACL, informando a data base do estudo, bem considerando as seguintes premissas:

i) Balanço entre oferta e demanda de energia e de potência para a expansão de referência do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2030, ou seja, aquela que considera o caso de referência para projeção da carga de energia elétrica e o cenário 'verão' para a projeção de micro e minigeração distribuída; (grifos nosso)

168. Para ilustrar a diferença quantitativa entre o CME, que, como dito, expressa as componentes CME-Energia e CME-Potência, e apenas uma de suas componentes, o CME-Energia, pode-se avaliar a Tabela 7. Nota-se que a componente de potência representa um valor agregado significativo no CME, o qual foi todo ignorado pelo Poder Concedente em seus estudos do VAC.

Tabela 7 - Custo Marginal de Expansão

CME (R$/MWh)

Ano

2026

2027

2028

2029

2030

2031¹

2032¹

2033¹

CME-Energia

46,43

61,53

110,33

144,90

165,09

169,50

170,19

172,14

CME

128,35

143,50

192,01

226,67

246,79

Fonte: Peça 205, p. 13 (CME-Energia) e peça 207, p. 14 (CME)

1 Os CME dos anos de 2031, 2032 e 2033 não constam na NT da EPE de cálculo do CME e não foram trazidos no estudo da EPE relativo a essa modelagem.

169. Nesse aspecto, conclui-se que, ao se desconsiderar completamente a componente de potência e seu potencial de receita futura, o VAC das novas concessões pode estar sendo indevidamente subavaliado, mesmo que seja necessária certa ponderação por conta do prazo ainda necessário para essas alterações impactarem de fato o caixa da empresa." (peça 234, p. 26-28) .

100. O Ministério Público junto a este Tribunal, por sua vez, ao tempo que concorda essencialmente com a SeinfraElétrica, entende "inexistir margem de discricionariedade para manutenção da situação apontada pela unidade técnica" (peça 249, p. 16, item 84) . Ainda segundo o Parquet especializado, "Porquanto a subestimativa de valores devidos ao erário afronta diretamente o interesse público, [seria] defeso à unidade jurisdicionada optar por não saná-la" (peça 249, p. 16, item 84, in fine) .

101. Diante disso, o douto representante do MPTCU sugere a este Tribunal de Contas que determine ao MME que, na estimativa de valor da energia de longo prazo constante no projeto de desestatização da Eletrobras e descotização de suas subsidiárias, seja incluída previsão das receitas auferíveis com a componente de valor do lastro de capacidade de energia (CME-Potência) .

102. Também o MME, por meio da Nota Informativa nº 25/2021/ASSEC (peça 254) , veio aos autos se manifestar sobre o assunto, argumentando, in verbis:

"Reavaliação do preço de energia de longo prazo - Uso da componente potência no Custo Marginal de Expansão - CME Potência

2.2.12. Especificamente quanto ao preço de energia, a avaliação da área técnico do TCU veio no sentido de se considerar o valor referente ao último ano (2033) da série de custos marginais, ao invés da média dos CME - Energia no período de 2028 a 2033, como inicialmente havia sido feito pelo MME e pelo ME, e que foi utilizado como parâmetro para a definição do valor adicionado estabelecido na Resolução CNPE nº 15, de 2021. Logo, o uso do CME - Energia, de longo prazo, no valor de 172,14 R$/MWh, representa um aprimoramento à metodologia aplicada na modelagem do valor adicionado.

2.2.13. Ainda que se adote como premissa, no mínimo, o valor de 172,14 R$/MWh, referente ao CME - Energia de projeção mais distante publicado, pela EPE, na Nota Técnica nº EPE-DEE-NT081/2021-r0, não é possível, do ponto de vista prático, considerar o valor do CME - Potência para valorar a remuneração das usinas.

2.2.14. Muito embora, nos estudos de planejamento da expansão do sistema elétrico, seja calculado um valor de CME - Potência, que é utilizado para avaliar aos condições de atendimento à ponta do sistema, no arcabouço legal e regulatório que rege o mercado elétrico brasileiro não existe um mercado de potência, haja vista as alterações dos incisos I, II e III do art. , do Decreto nº 5.163, de 30 de julho de 2004, dadas pelo Decreto nº 8.828, de 2 de agosto de 2016, que visaram justamente suprimir a apuração de lastro de potência de agentes compradores e vendedores na comercialização de energia. Deste modo, sem um mercado estabelecido, não há precificação desse serviço, o que, também, corrobora com a inviabilidade técnica acerca do uso do CME - Potência, nos estudos da Eletrobras, pois, assim, não há respaldo para sua utilização."

103. Trata-se de tema sensível, tendo em vista, entre outros pontos, a possibilidade de a componente denominada CME-Potência vir a proporcionar ganhos extraordinários às usinas da Eletrobras abrangidas pelo art. 2º da Lei 14.182/2021, especialmente se for considerado que a comercialização de lastro de capacidade tende a se tornar realidade em nosso país, que não mais conta com a sobra de potência verificada em décadas passadas e que fazia da energia, se não o único, o principal produto comercializado pelas UHEs brasileiras.

104. E como prova dessa transição de mercado, cito o recém-editado Decreto 10.707, de 28/5/2021, que regulamenta a contratação de reserva de capacidade, na forma de potência, e com base no qual já foi agendado um leilão para 21/12/2021.

105. Ocorre que, na visão da EPE e do MME, inexistindo atualmente uma regulamentação para esse mercado de capacidade de potência, não há preços nem negociações desse produto, tornando-se tecnicamente inviável pretender que sejam inseridos na precificação dos novos contratos da Eletrobras eventuais ganhos que suas UHEs possam vir a ter em decorrência de vendas futuras de lastro de capacidade, pois referidos ganhos não poderiam ser mensurados com a precisão e confiabilidade minimamente necessárias.

106. Ainda segundo o Poder Concedente, a dificuldade de se incluir essa variável na precificação em foco também decorre do fato de ainda não se ter ideia de quando essas usinas da Eletrobras que serão recontratadas poderão efetivamente firmar contratos para venda de lastro de capacidade, pois não se sabe quando haverá alteração legislativa ou regulatória que permita esse tipo de comercialização.

107. Por considerar razoáveis todas essas ponderações, tenho por pouco efetiva a expedição de qualquer comando voltado à quantificação, na estimativa de valor da energia de longo prazo, de eventuais ganhos que as UHEs da Eletrobras possam vir a ter em decorrência de vendas futuras de lastro de capacidade.

- V -

108. Passo a tratar rapidamente das determinações que o MPTCU sugere encaminhar ao CNPE nos seguintes termos:

"b) determinar ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que:

b.1) apresente, no prazo regimental, a motivação para as seguintes escolhas públicas trazidas na sua Resolução 15/2021:

b.1.1) O imediato 'livre dispor da energia' oriunda das usinas de Curuá-Una e Mascarenhas de Moraes, antes de todas as demais UHEs contempladas no projeto em tela, considerando, inclusive, a diretriz legal de descotização 'gradual e uniforme' (art. , § 1º, III, da Lei 14.182/2021); e

b.1.2) O escalonamento da descotização no prazo mínimo definido legalmente, em vez de qualquer outro prazo contido naquele intervalo; e

b.2) revise o cronograma presente no Anexo III da Resolução 15/2021, especialmente quanto ao adiantamento de R$ 5 bilhões devidos à CDE ainda em 2002, à luz do art. , § 2º, in fine, da Lei 14.182/2021 e do art. 13, § 15, da Lei 10.438/2002, em vista das considerações traçadas neste pronunciamento;" (peça 249, p. 33)

109. Considerando que os encaminhamentos objeto do item "b.1" e respectivos subitens se consubstanciam em simples pedido de esclarecimentos, acolho a proposição do Parquet especializado sem ressalvas, deixando para me pronunciar sobre a matéria em outro momento processual, mais precisamente após a manifestação da SeinfraElétrica sobre os esclarecimentos que virão a ser prestados pelo CNPE.

110. Quanto à determinação consignada no item "b.2" supra, informações encaminhadas pelo MME (peças 261 e 262) em resposta à diligência recém-promovida por este relator (peça 258) , corroboradas por dados fornecidos pela Aneel (peças 263 e 264) , apontam que o consumidor do mercado regulado - destinatário único dos aportes de recursos que a Eletrobras fará na Conta de Desenvolvimento Energético - se beneficiará com o adiantamento de R$ 5 bilhões questionado pelo Ministério Público de Contas, além do que não haveria maiores benefícios caso houvesse plena paridade, em termos cronológicos e financeiros, entre a descotização das UHEs da Eletrobras e o aporte de recursos na CDE em cumprimento ao art. , inciso I, da Lei 14.182/2021.

111. Nessas circunstâncias, não havendo urgência na resolução do tema, pugno por que a determinação coercitiva sugerida pelo MPTCU seja acolhida sob a forma de pedido de esclarecimentos, permitindo, inclusive, que o tema venha a ser analisado com a devida profundidade no âmbito da SeinfraElétrica.

112. Como não estou propondo ao Tribunal a formulação de qualquer juízo de mérito nesse momento, não vislumbro qualquer prejuízo ao bom andamento do feito em manter a determinação para que o CNPE preste esclarecimentos sobre as questões aventadas pelo Ministério Público de Contas.

113. Peço vênias, destarte, ao nobre Ministro Jorge Oliveira por não o acompanhar quanto à sugestão para que seja excluída essa determinação.

- VI -

114. Um dos últimos pontos que gostaria de abordar diz respeito às críticas feitas pela SeinfraElétrica em relação à utilização de recursos resultantes da nova outorga em políticas públicas, na forma de contrapartidas contratuais, sem trânsito no Orçamento Geral da União.

115. Sobre esse tema, concluiu a unidade instrutiva, em essência, que, em relação a "eventuais descumprimentos de regras orçamentárias, não se pode peremptoriamente afirmar que tenham ocorrido, tendo em vista que a Lei 14.182/2021 especificou detalhadamente o objeto e a forma de aplicação das chamadas obrigações contratuais e atribui esse encargo a entidade privada" (peça 234, p. 56, item 399) .

116. Por outro lado, a equipe técnica ressalvou que, apesar da pertinência temática dos projetos das chamadas obrigações contratuais com o setor elétrico, não foi possível identificar claramente os benefícios que os usuários e consumidores de energia elétrica poderiam usufruir em decorrência desses projetos, que, portanto, não se mostrariam suficientemente caracterizados como políticas setoriais de energia elétrica, especialmente no que tange aos projetos destinados à navegabilidade dos Rios Madeira e Tocantins.

117. Compartilho, embora com ressalvas, das conclusões da SeinfraElétrica.

118. Com efeito, a transferência de responsabilidade a particulares em relação à execução de obras de interesse público é possível em contratos de concessão, não havendo que se falar, destarte, a princípio, em eventual descumprimento de regras orçamentárias em situações da espécie.

119. E valho-me da expressão "a princípio" porque essa afirmação comporta importante ressalva, sendo essa a razão pela qual minha concordância com as conclusões da unidade instrutiva não é absoluta.

120. A ressalva a que me refiro diz respeito à necessidade de que as obras a serem executadas no bojo de contratos de concessão sejam, não apenas de interesse público, mas também inerentes ao respectivo setor - ao setor elétrico, no caso específico deste TC Processo XXXXX/2018-2 - sob a ótica dos conceitos de tarifa ou preço público e de política tarifária, tema sobre o qual esta Corte de Contas se debruçou ao apreciar o TC Processo XXXXX/2017-1 em 29/5/2019, quando foi prolatado sob minha relatoria o Acórdão 1215/2019-TCU-Plenário.

121. De acordo com o Voto condutor do mencionado Acórdão 1215/2019-TCU-Plenário, verifica-se ser imprescindível que eventuais obras a serem executadas no bojo de contratos de concessão de serviço público sejam, não apenas de interesse público, mas também inerentes ao respectivo setor sob a ótica dos conceitos de tarifa ou preço público e de política tarifária, em conformidade com o art. 175, parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal de 1988.

122. Em outras palavras, se essas eventuais obras não tiverem como objetivo manter, expandir ou assegurar continuidade ou sustentabilidade aos serviços afetos ao setor no qual estarão sendo executadas, restarão caracterizados o desvirtuamento e a extrapolação dos conceitos de tarifa ou preço público e de política tarifária constitucionalmente delineados na Carta Magna e interpretados pela Suprema Corte no bojo da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 9/DF e do Recurso Extraordinário (RE) 541.511-2/RS.

123. No caso das vinte e duas concessões da Eletrobras que serão recontratadas por força do art. 2º da Lei 14.182/2021, vale lembrar que, conforme cronogramas definidos no art. , §§ 1º e 10, da Resolução-CNPE nº 15/2021, elas passarão gradativamente do regime de cotas para o regime de produção independente de energia ao longo de cinco anos contados de 2023, sendo que nesse primeiro ano dar-se-á início aos aportes de recursos para custear as despesas previstas no art. 4º, inciso II, alíneas a a d, da referida Lei 14.182/2021.

124. Nessas circunstâncias, considerando que as atuais concessões de serviço público transmutar-se-ão - com período de transição de cinco anos - em concessão de uso de bem público sob o regime de produção independente, não se mostraria automaticamente aplicável ao caso em tela a tese acima rememorada acerca da necessidade de enquadramento, como política tarifária, de execução despesas de interesse público no âmbito de contratos de concessão.

125. Para isso, tornar-se-ia preciso verificar se os aportes de recursos para custear as despesas previstas no art. 4º, inciso II, alíneas a a d, da referida Lei 14.182/2021 realmente irão ensejar sobretarifação dos consumidores do mercado regulado, por exemplo, em decorrência de futuros reajustes anuais tarifários diretamente associados às parcelas ainda cotizadas das UHEs.

126. Essa hipótese, de todo modo, estaria limitada aos cinco anos em que ocorrerá a gradativa descotização das usinas em tela. Após isso, seria difícil conseguir demonstrar que determinado aumento de preço da energia elétrica paga pelos consumidores do mercado regulado estaria de algum modo associado ao custeio de despesas contratuais a cargo de concessionárias de uso de bem público sob o regime de produção independente.

127. Diante dessa dificuldade de precisa associação entre as tarifas de energia elétrica que virão a ser pagas pelos consumidores do mercado regulado e as despesas positivadas no art. 4º, inciso II, da Lei de Desestatização da Eletrobras, acolho - embora por fundamentos distintos - as sugestões advindas dos Gabinetes dos eminentes Ministros Benjamin Zymler e Jorge Oliveira - aos quais agradeço mais uma vez - e me abstenho de sugerir a este Plenário qualquer encaminhamento sobre a matéria.

- VII -

128. Passo agora a tratar do derradeiro tema relacionado à matéria em discussão, relativo à bonificação pela outorga de novos contratos de concessão de geração de energia elétrica correspondente a cinquenta por cento do valor adicionado à concessão por esses novos contratos, abatido das despesas abordadas no tópico anterior do presente Voto.

129. Ao relatar o TC Processo XXXXX/2017-2, em que foi proferido sob minha relatoria o Acórdão 1598/2017-TCU-Plenário, teci críticas à opção do Poder Concedente por aumentar a arrecadação em um ano por meio do uso das outorgas de concessão de serviços públicos, definindo esses valores sem antes analisar detalhadamente as especificidades e as necessidades do setor, o que poderia implicar severos impactos negativos durante décadas para todos os usuários desses serviços.

130. Como resultado, este Tribunal de Contas decidiu, in verbis:

"9.2. com fundamento no art. 250, inciso II, do Regimento Interno do TCU, determinar ao Ministério de Minas e Energia, na qualidade de Poder Concedente, em conjunto com o Conselho Nacional de Política Energética, que:

(...)

9.2.4. nas próximas licitações de concessão envolvendo usinas geradoras de energia elétrica existentes e em operação, a modelagem técnica, econômica e financeira do leilão seja precedida das seguintes avaliações:

9.2.4.1. impactos econômicos e financeiros de médio e de longo prazos resultantes da licitação para o consumidor de energia elétrica dos mercados cativo e livre, bem como para a sustentabilidade do setor elétrico, nos diferentes cenários de critério de julgamento da licitação previstos em lei e de seus respectivos parâmetros técnicos e econômicos de leilão, incluindo o valor de outorga;

9.2.4.2. efeito agregado dos impactos econômicos e financeiros para os consumidores dos mercados cativo e livre, advindos da combinação dos efeitos produzidos pela adoção do critério de julgamento escolhido para o leilão com os efeitos derivados de outras decisões e políticas setoriais de impacto;"

131. No que tange ao objeto deste TC Processo XXXXX/2018-2, há que se destacar a magnitude dos montantes envolvidos na desestatização da Eletrobras. Nas palavras do próprio MME, "tem-se, pela frente, a segunda maior operação do mercado de capitais da história do país" (peça 248, p. 3, subitem 2.10) .

132. Ressalte-se, ainda, o fato de que o bônus de outorga que se estima receber pelos novos contratos das UHEs a que se refere o art. 2º da Lei 14.182/2021 como condição para a privatização da Eletrobras tem como destinação certa e declarada a política fiscal da União. É o que se depreende do seguinte excerto extraído da Nota Técnica SEI nº 43574/2021/ME, elaborada no âmbito da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) :

"16. No caso da Lei 14.182/2021, avalia-se que haverá impacto positivo para a política fiscal e para o cenário macroeconômico em decorrência da previsão de ingresso de novas receitas de concessões, estimadas em R$ 23,2 bilhões pela Resolução CNPE nº 15, de 31 de agosto de 2021, a título de bonificação de outorga pelos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica, associados à desestatização da empresa Eletrobras" (peça 216, p. 2; negritos não constam no original)

133. Para se ter uma ideia de quanto esse bônus de outorga - originalmente estimado em R$ 23,2 bilhões - irá onerar os consumidores de energia elétrica, vale repisar que, no caso das usinas hidrelétricas analisadas no TC Processo XXXXX/2017-2, a previsão era de que os R$ 11,0 bilhões estipulados pelo Poder Concedente a título de bônus mínimo de outorga custariam aos consumidores de energia elétrica algo em torno de R$ 1,34 bilhões ao ano até 2047. Informe-se que, com o ágio verificado no certame, esse bônus acabou sendo de R$ 12,0 bilhões, certamente elevando a carga financeira imposta aos consumidores ao longo de trinta anos.

134. Refuto, de antemão, quaisquer argumentos no sentido de que os R$ 23 bilhões que se pretende arrecadar a título de bonificação de outorga pela privatização da Eletrobras não causariam ônus aos consumidores de energia elétrica, que se veriam supostamente compensados com a parcela de recursos destinada pela Lei 14.182/2021 em seu art. , inciso I, a CDE.

135. Com todo respeito à opinião do Poder Concedente, cabe ressalvar que a neutralidade de preço por ele esperada em decorrência da descotização das usinas da Eletrobras parece estar restrita à tarifa que virá ser paga pelos consumidores cativos.

136. Tanto é assim que a Nota Informativa nº 13/2021 elaborada pela Assessoria Especial de Assuntos Econômicos (ASSEC) do MME (peça 104) , não por acaso, ao se pronunciar sobre os "impactos da descotização e alteração do regime de exploração para produção independente para os consumidores cativos", defendeu (i) que o "consumidor cativo se beneficia da Medida, uma vez que deixa de ser o responsável pelo custo do risco hidrológico dos empreendimentos que terão novos contratos de concessão e por meio do direcionamento de recursos para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) , que reduzirão os encargos pagos pelos consumidores", e (ii) que "as cotas - energia compulsória alocada pelo custo e com risco hidrológico no consumidor - são retiradas das distribuidoras, contribuindo para a redução dos contratos legados que, no fim, são custeados pelos consumidores cativos" (peça 104, p. 1, alínea b, subitens 2.3 e 2.6; negritos não constam no original) .

137. Acrescente-se a isso o destaque dado pela SeinfraElétrica à "pouca representatividade da energia oriunda de usinas cotistas da Eletrobras no portfólio das distribuidoras (cerca de 15%)" (peça 234, p. 46, item 315, alínea d) .

138. A limitada abrangência da neutralidade de preço em comento também se evidencia pelo simples raciocínio de que, se alguém se dispuser a pagar bônus de outorga da ordem de R$ 23 bilhões é porque estará ciente de que esse investimento terá seu devido retorno, o qual necessariamente se originará da venda de energia elétrica aos consumidores brasileiros dos mais variados setores, inclusive do mercado regulado, cuja energia consumida provém em parte de contratos firmados, entre distribuidoras e concessionárias de geração, no ambiente de contratação livre.

139. E aos que acreditam na existência de alguma equação econômico-financeira que realmente permita ao Poder Concedente arrecadar bilhões de reais a título de bônus de outorga pela concessão de determinado serviço público - ou mesmo pela concessão de uso de bem público sob o regime de produção independente - e direcioná-los à política fiscal do Governo Federal sem que isso enseje qualquer custo adicional a todos os consumidores do setor - o que admito apenas para contra argumentar -, permito-me consignar que, ainda assim, esses consumidores estariam sendo prejudicados com a escolha arrecadatória do Governo, pois, nessa improvável hipótese de arrecadação fiscal combinada com absoluta neutralidade de preços e tarifas, o redirecionamento desses bilhões de reais ao próprio setor por certo resultaria em melhoria dos serviços prestados e/ou em redução de preço e tarifa cobrados dos usuários.

140. Tenho plena consciência de que o art. , inciso II, da Lei 14.182/2021 não deixa margem de discricionaridade ao Poder Concedente em relação à destinação do valor adicionado aos contratos que se pretende firmar no bojo da desestatização da Eletrobras.

141. Mas isso não me impede de, na condição de membro integrante deste Tribunal de Contas da União, zeloso pela boa e regular aplicação dos recursos públicos federais, me preocupe em buscar informações que permitam aos consumidores e à sociedade brasileira como um todo avaliar os efeitos da opção da Lei 14.182/2021 em destinar à captação de bonificação de outorga, conforme dito acima, boa parte do valor que será acrescido ao ativo da Eletrobras com a recontratação de vinte e duas de suas usinas hidrelétricas.

142. Nessas circunstâncias, em respeito ao princípio da transparência - ao qual se submete especialmente o Poder Público -, reputo pertinente que este Tribunal de Contas, mantendo a linha de atuação consignada no Acórdão 1598/2017-TCU-Plenário, expeça neste TC Processo XXXXX/2018-2 determinação ao MME com vistas à elaboração de estudos quanto aos impactos econômicos e financeiros de médio e de longo prazo que serão causados aos consumidores de energia elétrica dos mercados cativo e livre em decorrência do bônus de outorga a que se refere o art. , inciso II, da Lei 14.182/2021.

143. Esclareço, de antemão, em especial aos nobres Ministros Benjamin Zymler e Jorge Oliveira - que me enviaram contribuições sobre esse assunto -, que a determinação ora sugerida tem como finalidade única permitir que a sociedade e os consumidores venham a tomar ciência dos impactos econômicos e financeiros de médio e de longo prazo decorrentes do bônus de outorga a que se refere o art. , inciso II, da Lei 14.182/2021, não havendo qualquer pretensão de usar essas informações como obstáculo à desestatização objeto destes autos.

- VIII -

144. Quanto às demais questões ventiladas na presente fase processual e sobre as quais não me manifestei expressamente, adoto como razões de decidir a análise técnica desenvolvida pela SeinfraElétrica (peça 234) , assim como as sugestões adicionais formuladas pelo MPTCU (peça 249) .

145. Aproveito o ensejo para deixar consignada minha convicção de que a desestatização da Eletrobras representa importante medida em direção à eficiência energética nacional. Obviamente, os procedimentos adotados pela União para levar a termo essa desestatização precisam estar alinhados ao interesse público e aos direitos dos consumidores de energia elétrica, principalmente dos consumidores cativos, tantas vezes reféns de decisões açodadas de governo que acabam por gerar aumentos tarifários desarrazoados.

146. E é justamente em resguardo ao interesse público e em defesa dos direitos dos consumidores de energia elétrica que, mantendo minha linha de atuação ao longo de quase quinze anos dedicados a essa Corte de Contas, venho me pautando na condição de relator deste TC Processo XXXXX/2018-2, sendo essas as premissas básicas de todos as críticas e ressalvas apresentadas neste Voto, parte delas consolidadas na minuta de Acórdão que se segue.

147. Outro ponto que eu gostaria de abordar nesse último excerto de voto diz respeito às despesas que se pretende realizar, segundo arts. 3º, inciso V, alínea a, 4º, inciso II, alínea a, e 6º da Lei 14.182/2021, com a revitalização dos recursos hídricos das bacias do Rio São Francisco e do Rio Parnaíba.

148. Mesmo diante da possível inconstitucionalidade alhures cogitada acerca dessa e de outras despesas previstas no art. 4º, inciso II, da referida Lei 14.182/2021, não poderia deixar de registrar uma outra percepção que tenho especificamente relacionada a referida revitalização de recursos hídricos.

149. Considero demasiadamente tímidas - para não dizer irrisórias - as previsões legais, tanto em termos de prazo quanto de valores, relativas às despesas em comento, mesmo sopesando a possibilidade, positivada no art. 22 da Lei 14.182/2021, de ampliação temporal e financeira dos projetos em comento.

150. Entendo que os R$ 350 milhões definidos no art. 6º do referido diploma para serem anualmente destinados, ao longo de dez anos, para revitalização dos recursos hídricos daquelas duas bacias são insuficientes para levar a termo essa relevante ação, sendo imprescindível, portanto, um esforço do Governo Federal não apenas para assegurar a destinação complementar de recursos do orçamento para essa revitalização, mas principalmente para garantir a continuidade da aludida ação ao longo dos anos, sob pena de desperdício, por exemplo, dos recursos previstos naquele art. 6º.

151. Era esse o derradeiro registro que gostaria de fazer, com o que encerro meu pronunciamento, mas não sem antes parabenizar, nas pessoas da Secretária Arlene Costa Nascimento e do Diretor Marcelo Leite Freire, a equipe da SeinfraElétrica pela excelência do trabalho até aqui realizado, o que, aliás, foi feito em tempo exíguo, especialmente quando se leva em conta a complexidade da matéria em exame.

152. Estendo também meus agradecimentos aos representantes do Ministério de Minas e Energia, da Empresa de Pesquisa Energética e da própria Eletrobras, que se mostraram sempre prontamente dispostos a colaborar para o aprimoramento da matéria em análise neste TC Processo XXXXX/2018-2, o mesmo podendo ser dito em relação aos demais agentes e autoridades de quem tive a oportunidade de receber subsídios.

Ante o exposto, VOTO por que o Tribunal adote a deliberação que ora submeto à apreciação deste Colegiado.

TCU, Sala das Sessões, em 15 de dezembro de 2021.

AROLDO CEDRAZ

Relator

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