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26 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Contas da União
ano passado

Detalhes

Processo

Partes

Julgamento

Relator

ANTONIO ANASTASIA

Documentos anexos

Inteiro TeorTCU_RA_6002023_7e16d.pdf
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Inteiro Teor

Trata-se de Relatório de Auditoria realizado pelo Tribunal de Contas da União e pela Controladoria-Geral da União nas Políticas Automotivas de Desenvolvimento Regional (PADR) , sob responsabilidade do então Ministério da Economia, em que foram estabelecidos benefícios tributários montadoras que instalaram plantas fabris nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

2. O objetivo principal da ação de controle foi "avaliar a situação presente da maturidade e dos resultados das PADR, para, com isso, identificar possíveis falhas e lacunas, e assim propor medidas para o aperfeiçoamento da atuação presente do governo federal em políticas públicas".

3. Reproduzo a seguir, com ajustes de forma, o teor principal do relatório produzido pela Secretaria de Controle Externo do Desenvolvimento Econômico - SecexDesenvolvimento (peça147) , o qual contou com a anuência do corpo diretor da unidade (peças 148 e 149) :

"(...)

INTRODUÇÃO

Este é o relatório da auditoria realizada nas Políticas Automotivas de Desenvolvimento Regional (PADR) , introduzidas pelas Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, que estabeleceram benefícios tributários como incentivo econômico para que montadores e fornecedoras de peças automotivas se instalassem nas Regiões Norte (NO) , Nordeste (NE) e Centro-Oeste (CO) , à exceção do Distrito Federal (DF) .

A auditoria foi autorizada pelo Acórdão 671/2022-TCU-Plenário, que circunscreveu o trabalho à avaliação das PADR e de seus resultados. Para tanto, a questão fundamental que norteou a auditoria foi a seguinte:

As políticas automotivas de desenvolvimento regional instituídas pelas Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 foram concebidas e apresentam maturidade que concorram efetivamente para a indução do desenvolvimento regional das regiões brasileiras com indicadores socioeconômicos carentes de melhora estrutural, e estão atendendo a este propósito?

Destaque-se que o ajuste das lentes de análise da auditoria, para verificar o que as PADR conceberam e resultaram em termos de desenvolvimento regional, decorreu do fato de as Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 apresentarem ementas que as justificam para esse propósito.

Diante do contexto estabelecido, a auditoria estabeleceu duas dimensões analíticas que abarcassem a integralidade das PADR e toda trajetória destas, para, com isso, buscar resposta à questão fundamental. A tabela a seguir apresenta essa estruturação.

Tabela 1 - Estruturação Analítica Básica da Auditoria

Questão fundamental

Dimensão analítica

Objetivo

Escopo

As políticas automotivas de desenvolvimento regional instituídas pelas Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 foram concebidas e apresentam maturidade que concorram efetivamente para a indução do desenvolvimento regional das regiões brasileiras com indicadores socioeconômicos carentes de melhora estrutural, e estão atendendo a este propósito?

Maturidade de políticas públicas

Realizar análise completa das PADR, contemplando todos os principais aspectos de formulação, implementação e avaliaçao de políticas públicas

Processos, atividades, produtos, papeis, arranjos organizacionais das PADR

Resultados de políticas públicas

Verificar se as PADR têm comprovado efetividade no tratamento das causas que impedem o necessário desenvolvimento sócio-econômico das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste

Resultados verificáveis nos territórios em que houve intervenção das políticas

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

O processo de trabalho da auditoria e os métodos adotados nas duas dimensões analíticas estão descritos nos Apêndices A[footnoteRef:2] e B[footnoteRef:3]. Resumidamente, registra-se que para chegar ao presente relatório, a auditoria, anteriormente: [2: Processo de Trabalho e Método da Auditoria (peça 146, p. 5) ;] [3: Metodologia do Controle Sintético (peça 146, p. 10) - descreve, especificamente, o método adotado para a avaliação dos resultados das PADR;]

Construiu conhecimento a respeito do objeto e do marco analítico aplicável (Apêndices C[footnoteRef:4], D[footnoteRef:5], E[footnoteRef:6] e F[footnoteRef:7]) ; [4: Visão Geral do Objeto (peça 146, p. 25) ;] [5: Trajetória dos Benefícios e Requisitos das PADR (peça 146, p. 44) ;] [6: Macroprocessos das PADR (peça 146, p. 50) ;] [7: Marco normativo de governança e gestão das PADR (peça 146, p. 75) ;]

Produziu a Matriz de Planejamento com as questões de auditoria e os critérios adotados (Apêndice G - peça 126, p. 81) ;

Levantou as informações que retratavam à realidade dos objetos da auditoria (a maturidade da política e os seus resultados) , analisou essas informações e as estruturou na forma de matriz de achados, submetida a apreciação de especialistas (Apêndice H, peça 126, p. 103) ;

Disponibilizou a versão preliminar deste relatório para os gestores envolvidos, recebeu e analisou as ponderações e perspectivas por eles apresentadas (peça 145) , e as considerou na elaboração deste relatório final (peça 147) .

Em face do objetivo da auditoria, que foi de avaliar a situação presente da maturidade e dos resultados das PADR, para, com isso, identificar possíveis falhas e lacunas, e assim, propor medidas para o aperfeiçoamento da atuação presente do governo federal em políticas públicas; foram adotados tanto critérios que já eram vigentes por ocasião da instituição e renovação das PADR, como outros que foram incorporados ao marco normativo, jurisprudencial e técnicos sobre o tema posteriormente a estes momentos.

Entendimento em sentido contrário implicaria entender que políticas públicas antigas restariam marmorizadas, inalcançáveis e alienadas de processos avaliativos e, assim, de atualizações, na forma aperfeiçoamentos, revisões, expansões ou extinção.

Com relação às conclusões da auditoria, relata-se, de forma sintética, que foi constatado que a maturidade de políticas públicas das PADR apresenta deficiências em aspectos estruturantes, como uma formulação sem objetivos concretos, metas, indicadores e prazos, além de ausência de modelo lógico que explique, de forma justificada, como as PADR interviriam positivamente na realidade social visada; e isso ao menor custo possível para os pagadores de impostos. Tal fragilidade decorre de outra situada na gênese do processo de políticas, igualmente identificada pela auditoria nas PADR: a ausência de diagnóstico prévio a respeito do problema público para fundamentar toda a formulação. A esse respeito, pergunta-se: se não há diagnóstico, como chegar à prescrição confiável? Esses achados a respeito da formulação das PADR são apresentados na Seção 3.1 do relatório (página 20) .

A governança e gestão das PADR também se relevaram incipientes. Na dimensão, foi verificado que as PADR apenas" existem ", embora seus papeis de direção, supervisão e coordenação de implementação, monitoramento e avaliação, quase em sua totalidade, não tenham sido estabelecidos e, assim, não exercidos, enquanto os poucos papeis verificados como existentes destinam-se a checks de compliance das empresas beneficiárias.

Esse quadro carreia para uma situação de ausência de conhecimento por parte do governo federal de há quantas andam as PADR, em especial no que se refere aos efeitos em termos de efetividade e eficiência que as políticas têm gerado, tanto no âmbito da problemática do baixo desenvolvimento regional, como em relação ao setor automotivo brasileiro.

E nesse caso, verificou-se que não é somente o governo federal que não sabe os resultados que as PADR têm gerado, visto que o" apagão "de governança e gestão constatado implica a fissura de um fundamento dos regimes democráticos: de que o agente delegado - Estado - deve prestar contas de sua atuação quanto ao exercício do mandato que lhe foi conferido pelo proprietário (principal) , que é o povo[footnoteRef:8], devendo essa accountability se dar ante o próprio povo e as instituições de governança dessa relação, constituídas para o controle da atuação estatal. [8: Conforme Constituição Federal, art. , parágrafo único;]

Mas, como constatado, a ausência de definição de papeis de direção, supervisão e coordenação das PADR torna turva toda a relação de accountability acima descrita, inviabilizando-a, na prática, ou, no mínimo, dificultando-a bastante.

Por fim, a análise de resultados das PADR realizada pela auditoria, constante da Seção 3.3 do relatório (página 62) , revelou que as políticas, embora custem mais de R$ 5 bilhões por ano para os pagadores de impostos e já tenham consumido mais de R$ 50 bilhões desde 2010, entregam pouco de desenvolvimento regional aos territórios por ela beneficiados, pois foi verificado que, quando comparados aos territórios contrafactuais (que não receberam os benefícios das PADR) , aqueles beneficiados não apresentaram perfil superior de desenvolvimento econômico.

A tabela a seguir apresenta, de forma estruturada, os achados de auditoria em face do objetivo do trabalho e das dimensões analíticas adotadas:

Tabela 2 - Achados de Auditoria

Dimensão Analítica (Tabela 1, página 7)

Matriz de Achados (Apêndice H, peça 126, p. 103)

Categoria

Achados

(Agregação Temática)

Achados

Maturidade de políticas públicas

Formulação de políticas públicas

1. As PADR não são o resultado de um processo de produção de política pública para o tratamento de problema público e possuem falhas profundas em sua formulação

1.1. As PADR não foram estabelecidas para a resolução de um problema público previamente diagnóstico e não são operadas para esse fim

1.2. A União não sabe que resultados quer atingir com as PADR, visto que essas políticas não têm objetivos SMART concretos, indicadores, metas e prazos, que demonstrem como tratarão as causas de um problema público suficientemente diagnosticado e legitimamente decidido a ser introduzido na agenda pública, e que encarreguem agentes e órgãos para a sua consecução

1.3. As PADR não estão alicerçadas em teoria clara, nem em modelo lógico que explique como as políticas tratarão um problema público, ao menor custo possível

Governança e gestão de políticas públicas

2. As PADR apresentam falhas estruturais de governança e o governo federal não demonstra para a sociedade qual a performance das PADR, nem de sua atuação como agente responsável por essas políticas

1.4. As competências e responsabilidades dos agentes e das unidades envolvidas, bem com os principais processos de governança e gestão de implementação, monitoramento e avaliação foram fragilmente estabelecidos, e de forma não clara, no marco normativo das PADR

1.5. As PADR não são accountable em todos os níveis de governança e gestão

1.6. A União não sabe os efeitos e impactos que as PADR têm gerado

Resultados de políticas públicas

Resultados de políticas públicas

As PADR produziram impactos limitados em termos locais e com um alto custo de renúncia de receita por emprego gerado

Fonte: Elaborado pela equipe de Auditoria

Diante dos achados trazidos à tona, e considerando os marcos normativos vigentes de políticas públicas e de controle externo atribuído ao TCU, a equipe de auditoria formulou propostas de encaminhamento para que os órgãos accountable pelas PADR aperfeiçoem a atuação material em políticas públicas, a fim de que o quadro acima revelado seja tratado e revertido. As propostas constam da Seção 4 - Conclusão - do relatório (página 75) .

VISÃO GERAL DAS POLÍTICAS AUTOMOTIVAS DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL - SÍNTESE

Esta seção descreve a síntese das PADR, a partir do registrado nos seguintes apêndices:

Apêndice C - Visão Geral do Objeto (peça 126, p. 25) : descrição geral das PADR, benefícios tributários, objetivos, marco normativo, beneficiários, macroprocessos (descrição) , governança e gestão e custos para os pagadores de impostos;

Apêndice D - Trajetória dos benefícios tributários das PADR (peça 126, p. 44) : descrição das características principais dos benefícios concedidos pelas PADR e dos requisitos gerais estabelecidos, desde a instituição em 1997 até o presente;

Apêndice E - Macroprocessos das PADR (peça 126, p. 50) : descrição dos processos existentes nas PADR, atividades, produtos, regras decisórias e agentes envolvidos;

Apêndice F - Marco normativo de governança e gestão das PADR (peça 126, p. 75) : categorização dos papeis de governança e gestão estabelecidos para agentes e órgãos federais no marco normativo próprio das PADR.

1.1. Benefícios Tributários Concedidos e Beneficiários

Os benefícios concedidos pela Lei 9.440/1997 variaram ao longo dos anos e, desde 2010, consistem apenas do crédito presumido sobre o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) . Já os benefícios da Lei 9.826/1999 têm sido os créditos presumidos sobre o IPI desde a instituição do diploma legal. A trajetória dos benefícios e requisitos dessas leis está disponível no Apêndice D (peça 126, p. 44) . As empresas beneficiárias das PADR são apresentadas a seguir:

Tabela 3 - Empresas beneficiárias das PADR

Empresa

Cidade

Lei

Período

HPE Automotores do Brasil Ltda[footnoteRef:9] [9: Fábrica para montagem de veículos das marcas Mitsubishi e Suzuki;]

Catalão/GO

9.826/1999

Desde 1999

Caoa Montadora de Veículos Ltda[footnoteRef:10] [10: Fábrica para montagem de veículos das marcas Hyundai e Chery;]

Anápolis/GO

9.826/1999

Desde 2003

Troller Veículos Especiais[footnoteRef:11] [11: Adquirida em 2006 pela Ford Motor Company Brasil Ltda, em uma operação que envolveu a mudança de regime da Lei 9.826/1999 para a Lei 9.440/1997. Assim, a partir de 2007, a Ford Motor Company Brasil Ltda. passou a ser beneficiária da Lei 9.440/1997 para as fábricas de Camaçari/BA e Horizonte/CE. As operações ficaram ativas até 2021, quando a Ford encerrou toda a sua atuação no Brasil, embora as duas plantas continuem habilitadas na política;]

Horizonte/CE

9.440/1997

1997 a 2021

Ford Motor Company Brasil Ltda.

Camaçari/BA

9.826/1999

2000 a 2006

9.440/1997

2007 a 2021

Acumuladores Moura S.A.

Belo Jardim/PE

9.440/1997

Desde 1997

Tecnologia em Componentes Automotivos S/A (TCA) [footnoteRef:12] [12: A TCA foi adquirida pela, então, Fiat Chrysler Automóveis Ltda (FCA) em 2010. Essa operação não dava direito ao grupo FCA de usufruir de créditos presumidos sobre o IPI para a fabricação de automóveis. No entanto, a inserção do § 5º no art. 11-B da Lei 9.440/1997 abriu uma janela para alteração de regime até 29/12/2010, o que permitiu que a FCA passasse a dispor do direito de requerer o usufruto dos benefícios estabelecidos pela Lei 9.440/1997 também para a fabricação de automóveis, o que levou à implementação da fábrica da Jeep em Goiana/PE a partir de 2011.]

Jaboatão dos Guararapes/PE

9.440/1997

2002 a 2011

Fiat Chrysler Automóveis Ltda

Goiana/PE

9.440/1997

Desde 2011

Fonte: Nota Informativa SEI 15357/2022/ME (peça 19)

1.2. Marco Normativo

Esta seção traz a síntese do percurso das Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, acompanhada da descrição sucinta da política, conforme os termos vigentes[footnoteRef:13]. [13: Para conhecer a descrição completa do marco normativo das PADR, vide Apêndice C, Seção 4 - Marco Normativo (peça 146, p. 26) ;]

1.2.1. Lei 9.440/1997

Figura 1 - Instituição e Renovações da Lei 9.440/1997

Fonte: Elaborado pela equipe de Auditoria

Conforme o art. 1º, caput, § 1º e incisos, e art. 12, os benefícios tributários da Lei 9.440/1997 visavam a empresas instaladas ou que viessem a se instalar nas regiões NO, NE e CO, desde que habilitados pelo Poder Executivo até 31/5/1997[footnoteRef:14] e afetos a montagem e fabricação de: [14: Conforme Lei 9.440/1997, art. 12, parágrafo único, o prazo foi até 31/3/1998 para as empresas fabricantes de partes, peças, componentes, conjuntos e subconjuntos - acabados e semiacabados - e pneumáticos listados no art. , § 1º, alínea 'h", destinados aos produtos relacionados nesta alínea e nas alíneas anteriores do mesmo parágrafo;]

veículos automotores terrestres de passageiros e de uso misto de duas rodas ou mais e jipes;

caminhonetas, furgões, pick-ups e veículos automotores, de quatro rodas ou mais, para transporte de mercadorias de capacidade máxima de carga não superior a quatro toneladas;

veículos automotores terrestres de transporte de mercadorias de capacidade de carga igual ou superior a quatro toneladas, veículos terrestres para transporte de dez pessoas ou mais e caminhões-tratores;

tratores agrícolas e colheitadeiras;

tratores, máquinas rodoviárias e de escavação e empilhadeiras;

carroçarias para veículos automotores em geral;

reboques e semirreboques utilizados para o transporte de mercadorias;

partes, peças, componentes, conjuntos e subconjuntos - acabados e semiacabados - e pneumáticos, destinados aos produtos relacionados nesta e nas alíneas anteriores.

Como já indicado no parágrafo 17, atualmente, o benefício tributário concedido pela Lei 9.440/1997 é o crédito presumido sobre o IPI.

Já a referência para a apuração do crédito são os valores recolhidos pelas empresas beneficiárias no pagamento de Programa de Integracao Social ( PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) [footnoteRef:15], nas alíquotas definidas pela Lei 10.485/2002, art. , multiplicados por fatores equivalentes, conforme art. 11-C, § 2º da lei, a saber: [15: Orientadas pelas Leis Complementares 7/1970 e 70/1991, respectivamente;]

1,25 até o 12º mês de fruição do benefício;

1,0, do 13º ao 48º mês de fruição do benefício;

0,75, do 49º ao 60º mês de fruição do benefício.

Para fazer jus ao crédito presumido do IPI, os beneficiários devem atestar cumprimento a requisitos de contrapartida e medidas de compensação anuais, os quais segundo os termos da Lei 9.440/1997, com as alterações promovidas pela Lei 13.755/2018, são os seguintes:

Contrapartida (Lei 9.440/1997, art. 11-C, § 1º, e Decreto 10.457/2020, art. , §§ 1º[footnoteRef:16], 2º e 3º) : Investimentos produtivos e em pesquisa e desenvolvimento em projetos e respectivos produtos, em montante superior a R$ 2.500.000.000,00 (dois bilhões e quinhentos milhões de reais) para montadoras de veículos; e a R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais) para fabricantes de autopeças; [16: O Decreto 10.457/2020, que regulamenta a Lei 9.440/1997, art. 11-C, dispõe no art. 2º, § 1º, que produtos constantes dos projetos de que trata o art. 11-B da mesma lei também poderiam ser considerados, desde que atendessem aos prazos estabelecidos no § 2º do mesmo artigo 11-B;]

Medidas de Compensação (art. 11-C, § 4º) : Realização de investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica na região, correspondente a, no mínimo, 10% do valor do benefício.

A apuração descrita nos parágrafos 21 e 22 deve ocorrer "por produto".

A submissão de novos projetos e produtos como contrapartida para a obtenção do direito ao usufruto dos créditos presumidos sobre o IPI deveria ser apresentada pelas empresas habilitadas até 30/10/2020, conforme Lei 9.440/1997, art. 11-C, § 1º.

1.2.2. Lei 9.826/1999

Figura 2 - Instituição e renovações da Lei 9.826/1999

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

A Lei 9.826/1999 estabeleceu o direito a crédito presumido do IPI incidente nas saídas de produtos classificados nas posições 8702 a 8704 da Tabela de Incidência sobre IPI (Tipi) [footnoteRef:17]. Por ocasião da publicação da Medida Provisória (MP) 1.916/1999, a Tipi estava vigente sob o lastro do Decreto 2.092/1996, cujo Anexo, em seu capítulo 87, trazia as regras de alíquotas de IPI para "Veículos automotores, tratores ciclos e outros veículos terrestres, suas partes e acessórios". [17: A Tipi é a tabela oficial publicada pelo Governo Federal que apresenta os códigos e as descrições dos produtos industrializados sobre os quais incide o IPI em suas respectivas alíquotas;]

Especificamente, as posições 8702 a 8704 referiam-se aos produtos descritos a seguir:

Tabela 4 - Descrição dos Códigos 8702 a 8704 da Tipi

NCM

Descrição

87.02

Veículos automóveis para transporte de dez pessoas ou mais, incluindo o motorista.

87.03

Automóveis de passageiros e outros veículos automóveis principalmente concebidos para transporte de pessoas (exceto os da posição 8702) , incluídos os veículos de uso misto (station wagons) e automóveis de corrida.

87.04

Veículos automóveis para transporte de mercadorias.

Fonte: Decreto 2.092/1996

Por ocasião da realização da auditoria, a Tipi vigente era a publicada pelo Decreto 11.055/2022, que mantinha as descrições para as posições 8702 a 8704 indicadas na tabela acima.

A Lei 9.826/1999, art. , caput e § 1º, estabeleceu que o direito ao crédito presumido do IPI ofertado pela política seria aplicável somente para empreendimentos industriais instalados nas áreas de atuação da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) , da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e na região Centro-Oeste, com exceção do DF.

Os §§ 2º e 3º do art. 1º indicaram que o crédito presumido corresponderia a 32% do valor do IPI incidente nas saídas do estabelecimento industrial, com vigência inicial até 31/12/2010.

Além do crédito presumido para as operações das posições 8702 a 8704, a Lei 9.826/1999, art. , caput e § 1º, também trouxe a suspensão do IPI para os produtos, inclusive importados, classificados nas posições 84.29, 84.32, 84.33, 87.01 a 87.06 e 87.11. Destaque-se que essa suspensão do IPI, embora albergada na Lei 9.826/1999, não se destina somente às empresas habilitadas nos termos do art. da lei.

Já o art. 3º da Lei estabeleceu que os benefícios fiscais dessa lei não poderiam ser usufruídos concomitantemente "com outros benefícios fiscais federais, exceto os de caráter regional relativos ao imposto de renda de pessoas jurídicas".

Além disso, para fazerem jus aos benefícios tributários da Lei 9.826/1999, os agentes econômicos precisariam ter apresentado seus projetos até 31/10/1999 (art. 2º) e estes, uma vez aprovados, deveriam entrar em operação em até 42 meses (art. 2º, § 4º) .

A Lei 9.826/1999 não estabeleceu exigências posteriores de realização de investimentos em novos produtos, tal como a Lei 9.440/1997 (vide parágrafos 22 a 24) .

1.3. Operação das PADR (macroprocessos)

De acordo com as normas das PADR e as informações obtidas com os gestores do Ministério da Economia (ME) e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) , são sete macroprocessos estabelecidos para as políticas, conforme síntese apresentada a seguir:

Figura 3 - Macroprocessos da Lei 9.440/1997

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

Figura 4 - Macroprocessos da Lei 9.826/1999

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

Os macroprocessos com a indicação das atividades realizadas, unidades atuantes e produtos gerados, estão apresentados no Apêndice E (peça 126, p. 50) .

1.4. Governança e Gestão das PADR

Esta seção, síntese do capítulo 8 do Apêndice C[footnoteRef:18] (peça 126, p. 34) , descreve os papeis de governança e gestão previstos e em operação nas PADR, tanto a estabelecida pelo marco normativo, como a efetivamente verificada na operação estatal vigente. [18: Visão geral do Objeto;]

1.4.1. Direção

A direção de políticas públicas é encargo intrínseco que recai sobre os agentes investidos dos cargos e mandatos de liderança, sobretudo os da alta administração, conforme dedução elementar, bem como estabelecido no Decreto 9.203/2017.

Nesse contexto, embora as Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, bem como os respectivos Decretos 10.457/2020 e 7.422/2010, e portaria seguintes, tragam papéis para ministérios e secretarias, conforme discriminado no Apêndice F[footnoteRef:19] (peça 126, p. 75) , não é possível concluir ou inferir de tais comandos que a direção dessas políticas esteja atribuída a órgão ou agente público específico. [19: Marco Normativo de Governança e Gestão das PADR;]

Nada obstante, o Decreto 9.834/2019[footnoteRef:20], nos termos de seu art. , informa, no Anexo I, que o "órgão gestor" das PADR é o ME, não havendo corresponsáveis. [20: Instituiu o Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas (Cmap) ;]

Também a respeito da direção das PADR, o Decreto 9.745/2019[footnoteRef:21], Anexo I, art. , caput e inciso XXI, demarca as "políticas de desenvolvimento da indústria, comércio e serviços" como área de competência do ME. [21: Estabelece a estrutura regimental do Ministério da Economia;]

Dessa forma, verifica-se que a direção das PADR está atribuída primeiramente ao ME[footnoteRef:22], embora, por outro lado, o marco normativo para as PADR[footnoteRef:23] não tenha estabelecido prerrogativas (autonomia e capacidade decisória) para o ME pudesse atuar no ofício de direção, nem mecanismos de accountability para que, ordinária e extraordinariamente, o ME pudesse ser chamado a reportar sua atuação dirigente para as PADR. [22: Ressalta-se, neste momento, a título informativo, que, embora as PADR estejam sob responsabilidade do ME, as ementas das Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 as definem como voltadas para o desenvolvimento regional;] [23: No específico, as Leis 9.440/1997 e 9.826/199, seus Decretos e Portarias descritos no Apêndice F (peça 146, p. 75) . No regramento geral, os Decretos 9.203/2017, 9.834/2019 e 9.745/2019;]

A transparência da direção das PADR também não foi prevista no marco normativo aqui avaliado, e não foram identificados mecanismos e instrumentos de transparência que informem a respeito da atuação diretiva das políticas, ainda que a Lei 12.527/2011, art. , inciso VIII, alínea a; e art. 8º, § 1º, inciso V, tragam obrigações de fazer no tema.

A conformidade das características citadas nos parágrafos 41 e 42 acima em relação à regulação existente de governança e gestão pública, bem como os efeitos disso no âmbito das PADR, são apresentadas nos Achados da Seção 3.2 (página 43) deste relatório.

1.4.2. Supervisão

O papel de supervisão é o responsável pela direção operacional da intervenção estatal voltada ao tratamento do problema público, nos termos do Decreto-Lei 200/1967, art. 25, incisos I a IV, estando posicionada em nível intermediário entre os responsáveis pela direção máxima das políticas e a execução em si.

Partindo dessa definição, relata-se que a supervisão das PADR também não é objeto de regulação por parte das leis instituidoras, decretos e portarias decorrentes, como se nota do Apêndice F (peça 126, p. 75) .

Entretanto, o Decreto 9.745/2019, Anexo I, art. 106, inciso II, alínea a, informa que cabe à Secretaria Especial de Produtividade e Competitividade (Sepec) :

II - Supervisionar as seguintes matérias de competência do Ministério:

a) política de desenvolvimento da indústria, do comércio e dos serviços (grifo nosso)

O Decreto 9.745/2019, Anexo I, desfia as competências da Sepec, indicando no art. 112, caput e incisos, a existência e os encargos da Secretaria de Desenvolvimento da Indústria, Comércio e Serviços (Sdic) . Contudo, o artigo não encarta a supervisão das políticas de desenvolvimento da indústria, comércio e serviços dentre as competências da citada secretaria, não obstante o seu nome de batismo.

Já dentro da Sdic, tem-se a Subsecretaria de Estratégias Regionais e Setoriais (Sers) . Segundo o Decreto 9.745/2019, Anexo I, a Sers detém as seguintes atribuições relacionadas às PADR:

Art. 114. A Subsecretaria de Estratégias Regionais e Setoriais compete:

I - apoiar ações integradas que contribuam para o fortalecimento dos setores produtivos, em nível setorial e regional; (Redação dada pelo Decreto nº 11.036, de 2022);

III - elaborar, propor e implementar políticas públicas para fomentar a competitividade do setor produtivo, em nível setorial e regional, com foco na adoção de novas tecnologias, na digitalização da produção e no aumento da produtividade; (Redação dada pelo Decreto nº 11.036, de 2022);

[...]

XV - emitir certificados de habilitação aos Regimes Automotivos de Desenvolvimento Regional, instituídos pela Lei nº 9.440, de 14 de março de 1997, pela Lei nº 9.826, de 23 de agosto de 1999, e pela legislação aplicável; (Redação dada pelo Decreto nº 11.036, de 2022);

Como se vê, os incisos do art. 114 transcritos não trazem comando claro de mandato de supervisão das PADR para a Sers, tal como verificado em relação à Sdic (parágrafo 47) .

Não obstante, é dentro da Sers que se encontra a Coordenação-Geral de Implementação e Fiscalização dos Regimes Automotivos (CGRAU) , a unidade que efetivamente realiza a atuação mais direta e operacional do Poder Executivo no âmbito das PADR.

A todo esse contexto de demarcação de responsabilidade para a Sepec, lacuna nas unidades intermediárias, e existência da CGRAU, traz-se ainda os artigos 180, 181 e 184 do Anexo I do Decreto 9.745/2019, que assim estabelecem:

Art. 180. Aos Secretários Especiais incumbe dirigir, orientar, supervisionar, coordenar e fiscalizar as atividades das unidades que lhe são subordinadas, editar atos normativos e administrativos de caráter genérico e exercer outras atribuições que lhe forem cometidas em regimento interno.

Art. 181. Aos Secretários incumbe planejar, dirigir, coordenar, acompanhar e avaliar as atividades das unidades que integram as suas Secretarias, além de orientar a sua execução e exercer outras atribuições que lhes forem cometidas em regimento interno.

[...]

Art. 184. Ao Chefe de Gabinete do Ministro de Estado, aos Subsecretários, aos Procuradores- Gerais Adjuntos, aos Diretores, ao Secretário-Executivo do CZPE, aos Coordenadores-Gerais, aos Corregedores, aos Superintendentes e aos demais dirigentes incumbe planejar, dirigir, coordenar, acompanhar e avaliar as atividades de suas unidades, além de orientar a sua execução e exercer outras atribuições que lhes forem cometidas pelo Ministro de Estado em suas áreas de competência. (Grifo nosso)

Diante dessa base normativa, constata-se que:

a partir da perspectiva temática é possível identificar a atribuição do papel maior de supervisão das PADR à Sepec (Decreto 9.745/2019, Anexo I, art. 106, inciso II, alínea a);

em decorrência dos encargos e hierarquia das unidades internas da Sepec, constata-se que a supervisão das PADR é atribuição da Sdic e da Sers, dado que a CGRAU se encontra dentro da estrutura organizacional da Sers (Decreto 9.745/2019, Anexo I, artigos 181 e 184).

Dessa forma, verifica-se que a supervisão das PADR está atribuída a Sepec, Sdic e Sers, sendo essa responsabilidade descomprimida a partir daquela até esta.

Com relação às demais caraterísticas do papel de supervisão das PADR, não foram identificadas normas que conferissem prerrogativas para que Sepec, Sdic ou Sers pudessem exercer a supervisão das políticas, e por seu turno, não foram identificadas previsões normativas que accountabilizem o ofício. Ou seja: não está previsto que essas secretarias ou outra unidade tenham que reportar e prestar contas (lato sensu) da supervisão das PADR para algum agente ou instância, de forma ordinária ou a qualquer tempo.

A transparência da supervisão das PADR também não foi prevista no marco aplicável. De igual modo, não foram identificados mecanismos e instrumentos de transparência no âmbito das políticas, que informem sobre a atuação supervisora das PADR, embora o ofício esteja sujeito à Lei 12.527/2011, tal como a direção das políticas (parágrafo 42) .

Tal como reportado em relação à direção (parágrafo 43) , a aderência das características de supervisão das PADR à regulação existente de governança e gestão pública, bem como os efeitos disso no âmbito das políticas, são apresentadas nos Achados da Seção 3.2 (página 43) deste relatório.

1.4.3. Monitoramento

O Monitoramento "é um processo contínuo, que acompanha o que está acontecendo com um determinado programa e usa os dados coletados para informar sobre sua implementação e fornecer subsídios para a gestão e tomada de decisões no dia a dia" (GERTLER et al, 2018, p. 8) .

No Decreto 9.745/2019 e na Portaria MCTI 3.410/202027 não existe previsão de agentes competentes para monitorar as PADR, nos termos destacados no parágrafo anterior, embora, previamente à edição do Decreto 11.036/2022, que alterou o Decreto 9.745/2019, este contasse com comando que atribuía à Subsecretaria da Indústria (antecessora da Sers) o encargo de monitorar suas ações (Anexo I, art. 114, inc. IV) , dentre as quais, tem-se as PADR.

Na base normativa vigente, o único comando que, de fato, impôs obrigação aos gestores das PADR de algo que se aproxima de um monitoramento, foi o § 3º do art. , do Decreto 10.457/2020, que nada fala a respeito de monitoramento no âmbito da Lei 9.826/1999, mas incumbiu à Sepec de verificar se as empresas beneficiárias da Lei 9.440/1997 estão em dia com os requisitos relativos: a) à implementação de projetos e produtos; e b) aos investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica no montante mínimo de 10% dos créditos presumidos de IPI obtidos pelas empresas. O Decreto 10.457/2020, art. , § 3º dispôs assim:

§ 3º A verificação do atendimento aos requisitos que tratam o caput deste artigo e o § 3º do art. 2º será feita diretamente pela Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia ou por intermédio de auditorias realizadas por entidades credenciadas pela União, contratadas pela empresa beneficiária.

Já a Portaria Sepec 10.161/2021 delegou essa competência para a CGRAU, conforme art. 5º, caput e § 1º, conforme se vê a seguir:

Art. 5º A análise dos investimentos, após a apresentação do Memorial de que trata o art. 2º, será realizada pela área técnica da Secretaria de Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação da Secretaria Especial de Produtividade e Competitividade, que emitirá parecer sobre as informações prestadas pelas empresas beneficiárias.

§ 1º O parecer de que trata o caput atestará a conformidade ou não das atividades e dispêndios apresentados com as hipóteses previstas nesta Portaria e no Decreto nº 10.457, de 2020, e a compatibilidade e adequação dos respectivos dispêndios aos projetos apresentados.

A obrigação imposta à Sepec e delegada à CGRAU têm natureza de verificação de compliance¸ que é uma dimensão de análise necessária, mas distinta da que levanta informações em subsídio à condução e à avaliação de políticas públicas, como descrita no parágrafo 57.

A propósito, é nessa linha de compliance que a legislação das PADR estabeleceu a obrigação das empresas beneficiárias de prestar contas, e de encaminhar informações em diversos dispositivos. Este rito, bem como os dados e os agentes responsáveis pelo seu recebimento são discriminados nos macroprocessos das PADR, apresentados no Apêndice E (peça 126, p. 50) e sinteticamente descritos a seguir.

No que se refere aos investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica no montante mínimo de 10% do crédito presumido de IPI, inicialmente, em ambas as leis, essa comprovação se dava perante o MCTI. Com a publicação da Lei 13.755/2018, essa competência no âmbito da Lei 9.440/1997 passou a ser do, então, Ministério do Desenvolvimento da Indústria e Comércio (Mdic) , conforme §§ 4º e 5º do art. 11-C da Lei 9.440/1997.

Já em 2019, com a reorganização do poder Executivo Federal, esse papel foi atribuído ao ME e à Sepec, como se vê da MP 870/2019 e do Decreto 9.745/2019, Anexo I, art. 1º, inciso XXI, e art. 106, inciso II, alínea a, este já transcrito no parágrafo 46.

Relativamente à aprovação de projetos e produtos vinculados (regra estabelecida somente na Lei 9.440/1997), até 2018 essas competências eram do Mdic, que recebia os projetos de investimentos e pesquisa para o desenvolvimento de novos produtos ou de novos modelos de produtos já existentes (inciso V do art. 11-C da Lei 9.440/1997). Com a reestruturação da organização do Poder Executivo federal ocorrida em 2019, essas competências também foram repassadas para o ME.

Quanto aos produtos de cada projeto, à Sers compete o recebimento da solicitação de certificado de produto enviado pelas empresas e a emissão de Certificado Específico por produto, no qual constará o prazo de utilização do benefício e o fator multiplicador a ser utilizado em cada um dos cinco anos de benefício (art. 7º e Cláusula 2ª do Anexo II, da Portaria Sepec 19.793/2020) .

Por fim, relata-se que o regramento de ambas as leis trouxe a obrigação de as empresas apresentarem relatórios trimestrais, que devem ser submetidos à Sdic. Contudo, não foram identificados dispositivos estabelecendo a obrigação de estes relatórios serem analisados e de isso ser internalizado na condução das PADR.

Em síntese, verifica-se que até antes de 2020 não havia previsão de verificação da execução das PADR, nem finalística, nem de compliance. Contudo, com a edição do Decreto 10.457/2020 e da Portaria Sepec 10.161/2021, uma obrigação de verificação passou a existir apenas no âmbito da Lei 9.440/1997, que foi atribuída à Sepec e à CGRAU, sendo algo que se aproxima de um monitoramento sob uma ótica de compliance.

A conformidade dessas características de monitoramento das PADR à regulação existente de governança e gestão pública, bem como os efeitos disso no âmbito dessas políticas, são apresentadas nos Achados da Seção 3.2 (página 43) deste relatório.

1.4.4. Avaliação Ex Post

De acordo com o Banco Mundial, as avaliações são análises periódicas e objetivas acerca da concepção, da implementação ou resultado de políticas públicas, projetos ou programas planejados, em andamento ou concluídos (GERTLER et al, 2018) .

A respeito da avaliação das PADRs, foi tratado no parágrafo 68 deste relatório que somente em 2020 foram instituídas atribuições de verificação das PADR para a Sepec/ME, por meio do Decreto 10.457/2020, art. , § 3º, e Portaria Sepec 10.161/2021, art. 5º, § 1º.

Aqui, mesmo considerando os termos dos dispositivos normativos citados como algo que implica algum tipo de atuação avaliativa (lato sensu) das PADR, registra-se que, tal como informado no parágrafo 61, a verificação ordenada refere-se somente aos benefícios tributários decorrentes da Lei 9.440/1997 (nada informando a respeito da Lei 9.826/1999) e tem como foco uma checagem de compliance, que, como já dito, embora necessária, não abarca uma abordagem finalística, ex post, que perquira a respeito dos aspectos indicados no parágrafo 70.

Complementarmente, relata-se que não foram identificados outros dispositivos do marco normativo das PADR com indicação da necessidade de análises ex post mais abrangentes das políticas, nem de agentes, instâncias ou unidades responsáveis por essa avaliação ou por reportá-la no âmbito de um processo de trabalho afeto ao tema. Também o Decreto 9.745/2019 não informa a respeito de processos e responsáveis pela avaliação ex post das políticas.

A aderência dessas características de avaliação ex post das PADR à regulação existente de governança e gestão pública, bem como os efeitos disso no âmbito dessas políticas, também são apresentadas nos Achados da Seção 3.2 (página 43) do presente relatório.

1.5. Custos dos Pagadores de Impostos para Financiar as PADR

Dados disponíveis em páginas eletrônicas do governo federal e na Nota Informativa SEI 15.537/2022/ME (peça 19) , estimam que desde 2010 as empresas beneficiárias dessas políticas têm sido financiadas indiretamente pelos pagadores de impostos nos seguintes montantes.

Tabela 5 - Recursos renunciados pelo governo federal a bem dos beneficiários

Ano

Benefícios Tributários (R$ bilhões)

VALORES NOMINAIS

Benefícios Tributários (R$ bilhões)

VALORES REAIS[footnoteRef:24] [24: Valores atualizados pelo IPCA até abril/2022, utilizando os dados obtidos na Calculadora do cidadão; (https://www3.bcb.gov.br/CALCIDADAO/público/corrigirPorIndice.do?method=corrigirPorIndice) ;]

Lei 9.440/1997

Lei 9.826/1999

Total

Lei 9.440/1997

Lei 9.826/1999

Total

2010

0,93

0,43

1,36

1,86

0,87

2,75

2011

0,96

0,60

1,56

1,82

1,13

2,95

2012

0,87

0,39

1,26

1,55

0,69

2,24

2013

1,33

0,33

1,66

2,25

0,55

2,80

2014

1,57

0,69

2,26

2,49

1,08

3,57

2015

2,22

0,46

2,68

3,19

0,67

3,86

2016

3,19

0,37

3,56

4,27

0,50

4,77

2017

4,00

0,13

4,13

5,22

0,17

5,39

2018

5,22

0,16

5,38

6,54

0,20

6,74

2019

4,41

0,17

4,58

5,36

0,21

5,57

2020

4,619

0,15

4,76

5,36

0,18

5.,54

2021

4,34

0,28

4,62

4,56

0,30

4,86

Total

33,66

4,17

37,82

44,47

6,55

51,02

Fontes e observações:

Lei 9.440/1997 (2010 a 2020) e Lei 9.826/1999 (2010 a 2019) : página eletrônica das PADR[footnoteRef:25] e Nota Informativa SEI 15.537/2022/ME (peça 19) ; [25: https://www.gov.br/produtividadeecomercio-exterior/pt-br/assuntos/competitividade-industrial/setor- automotivo/regimes-automotivos-regionais;]

Lei 9.440/1997 (2019 e 2020) : DGT Bases Efetivas - 2019 - Série 2017 a 2022 informa valor "0" para a Lei 9.440/1997[footnoteRef:26], enquanto a página eletrônica das PADR informa os valores indicados na tabela; [26: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/acessoainformacao/dados-abertos/receitadata/renuncia- fiscal/demonstrativos-dos-gastos-tributarios/arquivoseimagens/dgt-bases-efetivas-2019-serie-2017a2022-quadrosia-xxxii-1.xlsx (consulta em 1/6/2022) ;]

Lei 9.826/1999 (2020 e 2021) e Lei 9.440/1997 (2021) : DGT Bases Efetivas - 2019 - Série 2017 e 2022 (Quadros XXX e XXXI) .

ACHADOS

Em face dos processos de trabalho descritos nos Apêndices A[footnoteRef:27] e B[footnoteRef:28], a auditoria chegou aos achados reportados a seguir. [27: Processo de Trabalho e Método de Auditoria (peça 146, p. 5) ;] [28: Metodologia do Controle Sintético (peça 146, p. 9) ;]

Primeiramente é demonstrada a contextualização técnica, normativa e jurisprudencial a respeito dos assuntos tratados nos achados. Em seguida, estes são relatados, com a indicação das incongruências encontradas.

Dado o caráter transversal das propostas da auditoria para o tratamento das causas das situações encontradas de cada achado, os encaminhamentos não são apresentados ao fim dos relatos singulares, mas, conjuntamente e de forma circunstanciada, na Seção 4 - Conclusão (página 75) .

Seguem as contextualizações e os achados da auditoria.

1.6. As PADR não são o resultado de um processo de produção de política pública para o tratamento de problema público e possuem falhas profundas em sua formulação

1.6.1. Contextualização técnica, normativa e jurisprudencial

Políticas públicas devem ser formuladas e implementadas para o tratamento de problemas públicos. A respeito destes dois conceitos, o Referencial de Controle de Políticas Públicas (RCPP) do TCU traz definições que sintetizam o que a literatura apresenta sobre o tema:

Problema público (BRASIL, 2020, p. 13)

Problemas coletivos que os governos tomaram para si o seu tratamento (seja na forma de ação ou de deliberada não-ação)

Políticas Públicas (BRASIL, 2020, p. 14)

Conjunto de intervenções e diretrizes emanadas de atores governamentais, que visam tratar ou não, problemas públicos e que requerem, utilizam ou afetam recursos públicos

Para, então, que uma política pública trate de um problema público, sua formulação, que é a modelagem da intervenção estatal, necessita ser orientada à resolução de problemas, de onde se extrai que a formulação deve ser conduzida e elaborada, justamente, a partir de diagnóstico prévio do problema, que compreende o melhor conjunto de conhecimentos possível que pode ser produzido ou adquirido, e reunido a respeito das características desse problema, de suas causas, efeitos e impactos, bem como das populações afetadas e, até, eventualmente, dos grupos que se beneficiam da existência desse problema.

A esse respeito, o Guia Prático de Análise Ex Ante (Guia Ex Ante) esclarece que "um passo importante para a proposição de uma nova política ou para a reformulação ou aperfeiçoamento de política já existente é o diagnóstico do problema que se pretender combater" , e que a "problematização que enseja a ação governamental precisa ser bem feita para que a solução proposta seja adequada e a melhor opção possível" (BRASIL, 2018, p. 53) .

Para ilustrar a importância do diagnóstico de problema público para a formulação de políticas, cita-se que, tal como nos tratamentos de saúde, uma prescrição (formulação de política) baseada em diagnóstico equivocado, incompleto, superficial ou distorcido das condições apresentadas (problema público) pelo paciente ou pela população, tem o potencial de cura ou de mitigação dos efeitos da doença (efetividade) reduzido a possibilidades aleatórias, e não poucas vezes, leva ao agravamento da situação.

Essa compreensão material de que políticas públicas se prestam ao tratamento de problemas públicos, devendo, assim, ser formuladas a partir de diagnóstico maduro, também encontra lastro na legislação brasileira, a começar da Constituição Federal, art. 37, caput, e da Lei 9.784/1999, art. , que estatuem o princípio da eficiência como balizador da atuação estatal.

O Decreto 9.191/2017, art. 27, inciso I, alínea a, art. 30, inciso III, e art. 32, inciso I, de forma específica informa que proposições normativas submetidas à Presidência da República devem ser acompanhadas de justificativa e fundamentação a respeito do problema que visam tratar, com apresentação de parecer de mérito a respeito. O art. 24 do mesmo Decreto estabelece a obrigatoriedade de a Subchefia de Análise Governamental (SAG) da Casa Civil da Presidência da República (CC-PR) examinar o mérito dessas propostas.

Aqui, é necessário realçar que o tratamento do problema público como fundamento para a proposição de atos normativos, bem como a necessidade de apreciação do mérito dessa relação pelos ministérios palacianos, em especial pela CC-PR, na figura da SAG, não foi inovação introduzida pelo Decreto 9.191/2017. De outro modo, os decretos anteriores que versavam sobre o mesmo tema[footnoteRef:29], regularam o feito de forma semelhante, como se vê da tabela a seguir: [29: Normas e diretrizes para elaboração, redação, alteração, consolidação e encaminhamento de propostas de atos normativos ao Presidente da República pelos Ministros de Estado;]

Tabela 6 - Tratamento do Problema Público nos Decretos anteriores ao Decreto 9.191/2017

Decreto

Regulação

Regras para a proposição de atos normativos

Justificativas da proposição para o tratamento de problema público (idêntica nos três decretos e no 9.191/2017)

Obrigatoriedade de análise da justificativa

4.176/2002

Art. 37. As propostas de projetos de ato normativo serão encaminhadas à Casa Civil por meio eletrônico, com observância do disposto no Anexo I, mediante exposição de motivos do titular do órgão proponente, à qual se anexarão:

I - as notas explicativas e justificativas da proposição, em consonância com o Anexo II;

[...]

Art. 38. A exposição de motivos deverá:

[...]

II - explicitar a razão de o ato proposto ser o melhor instrumento normativo para disciplinar a matéria;

Anexo I

Questões que devem ser analisadas na elaboração de atos normativos no âmbito do Poder Executivo

1. Deve ser tomada alguma providência?

[...]

1.2. Quais as razões que determinaram a iniciativa?

1.3. Neste momento, como se apresenta a situação no plano fático e no plano jurídico?

1.4. Que falhas ou distorções foram identificadas?

1.5. Que repercussões tem o problema que se apresenta no âmbito da economia, da ciência, da técnica e da jurisprudência?

1.6. Qual é o conjunto de destinatários alcançados pelo problema, e qual o número de casos a resolver?

1.7. O que poderá acontecer se nada for feito? (Exemplo: o problema tornar-se-á mais grave? Permanecerá estável? Poderá ser superado pela própria dinâmica social, sem a intervenção do Estado? Com que conseqüências?)

2. Quais as alternativas disponíveis?

2.1. Qual foi o resultado da análise do problema? Onde se situam as causas do problema? Sobre quais causas pode incidir a ação que se pretende executar?

[...]

Anexo II

Anexo à Exposição de Motivos do (indicar o nome do Ministério ou Secretaria da Presidência da República) nº ___, de ____, de ____, de 20__]

1. Síntese do problema ou da situação que reclama providências

[...]

3. Alternativas existentes às medidas propostas

Mencionar:

[...]

Outras possibilidades de resolução do problema.

Art. 34. Compete à Casa Civil da Presidência da República:

I - examinar a constitucionalidade, a legalidade, o mérito, e a conveniência política das propostas de projeto de ato normativo;

[...]

Art. 35. Compete à Subchefia de Coordenação da Ação Governamental da Casa Civil:

I - examinar os projetos quanto ao mérito, à oportunidade e à conveniência política, mesmo no tocante à compatibilização da matéria neles tratada com as políticas e diretrizes estabelecidas pelas Câmaras do Conselho de Governo;

2.954/1999

Art. 25. Os projetos de atos normativos, na sua elaboração, deverão observar a orientação constante do Anexo I a este Decreto, e serão encaminhados à Casa Civil da Presidência da República mediante exposição de motivos da autoridade proponente, à qual serão anexados:

I - as notas explicativas e justificativas da proposição, integrantes da exposição de motivos, em consonância com o Anexo II a este Decreto;

Art. 26. As exposições de motivos dos projetos de natureza legislativa, devidamente assinadas, e seus respectivos anexos, serão apresentadas em original, observados os parâmetros do Anexo II.

Parágrafo único. As exposições de motivos deverão explicitar a justificativa da edição do ato e estar de tal forma articuladas e fundamentadas que possam servir como defesa prévia contra qualquer possível argüição de inconstitucionalidade.

Art. 28. Quanto ao mérito, à oportunidade e à viabilidade política das proposições, a Secretaria de Estado de Relações Institucionais e a Subchefia de Coordenação da Ação Governamental da Casa Civil da Presidência da República examinarão os projetos, cabendo a esta última o exame da compatibilização da matéria com as políticas e diretrizes estabelecidas pelas Câmaras do Conselho de Governo, bem assim a articulação com os órgãos interessados para os ajustes necessários.

1.937/1996

Art. 16. Os projetos de atos normativos, na sua elaboração, deverão observar a orientação constante do Anexo I a este Decreto, e serão encaminhados à Casa Civil da Presidência da República mediante exposição de motivos da autoridade proponente, à qual serão anexados:

I - as notas explicativas e justificativas da proposição, integrantes da exposição de motivos, em consonância com o Anexo II a este Decreto;

Art. 17. As exposições de motivos dos projetos de natureza legislativa, devidamente assinadas, e seus respectivos anexos serão apresentadas em original, observados os parâmetros do Anexo II.

Art. 19. Quanto ao mérito das proposições, a Casa Civil da Presidência da República examinará a compatibilidade da matéria com as políticas e diretrizes estabelecidas pelas Câmaras do Conselho de Governo, articulando com os órgãos interessados os ajustes necessários

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria. Grifo nosso

Também o Decreto 9.203/2017, que trata da governança para condução de políticas públicas (art. 2º, inciso I) , estabelece que essa governança deve ser balizada pelas diretrizes, dentre outras, de direcionar as ações para a busca de resultados para a sociedade (art. 4º, inciso I) e de manutenção de processo decisório orientado pelas evidências (art. 4º, inciso VIII) . Essas diretrizes suportam o encargo de que políticas públicas devem ser voltadas para a resolução de problemas públicos, devendo, assim, ser formuladas a partir de diagnóstico confiável.

E nessa seara, a jurisprudência do TCU tem ratificado esse entendimento, como se verifica dos Acórdãos 2.428/2021, 693/2022 e 1.139/2022, todos do Plenário[footnoteRef:30], bem como dos julgados transcritos abaixo: [30: Para a leitura completa dos acórdãos do TCU que versam sobre o tema, vide o Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 107) ;]

Acórdão 3564/2014-TCU-Plenário

4.10. [...] Há um efeito negativo, no entanto, decorrente dessa abrangência: ao não definir de forma precisa os problemas específicos a serem atacados, com os correspondentes objetivos a alcançar, a política não se demonstra capaz de orientar a ação governamental, restringindo não somente as atividades de planejamento e execução, como também a avaliação sobre os resultados atingidos.

Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário

58. Sem conhecimento apropriado do problema, não há como avaliar se a política pública implementada é relevante ou mesmo se faz sentido

59. Como resultado desse desconhecimento, a política é vista como um conjunto de transferências de recursos da União em favor dos municípios [...], sem qualquer critério que permita afirmar que efetivamente a intervenção é realmente necessária, prioritária e que é a mais custo-efetiva (que é a que produz maior melhoria da condição dos pavimentos municipais com o menor custo) .

[...]

12 [...] Quando não se sabe se a decisão de enviar recurso para determinado município é a melhor opção de gasto porque se desconhecem os problemas que precisam ser solucionados, possibilita-se que a formulação da política seja orientada por simples ajuda financeira pontual sem critérios de distribuição dos recursos.

[...]

15. Sem conhecer o problema no qual precisa atuar, os resultados alcançados são meros números, metas que até podem traduzir eficácia, mas não revelam efetividade e, por via de consequência, fogem aos objetivos primordiais da ação. Em outras palavras, não há como estabelecer objetivos ou indicadores que confirmem o sucesso da política naquilo que ela pretende corrigir ou amenizar.

[...]

9.1. determinar ao [...] que apresente a este Tribunal, no prazo de noventa dias, plano de ação [...] contendo, no mínimo, para cada uma das medidas a seguir listadas, os responsáveis pelas ações e o prazo previsto para implementação:

9.1.1. reavalie a Ação 1D73 com base em evidências, considerando a experiência de outros países, observadas as variações regionais, a fim de caracterizar (qualitativa e quantitativamente) a necessidade de intervenção, bem como se a política proposta é a mais custo-efetiva, em contraste com outras alternativas de intervenção;

Acórdão 2608/2018-TCU-Plenário (RePP[footnoteRef:31] 2018) [31: Relatório de Políticas Públicas do TCU produzido anualmente em obediência a comandos dispostos nas Leis de Diretrizes Orçamentárias;]

200. O diagnóstico do problema que se pretende enfrentar por meio da criação, reformulação ou aperfeiçoamento de uma política pública é elemento fundamental para a adequada orientação dos rumos que a política deve seguir para lograr alcançar a solução para o problema identificado.

[...]

42. O correto diagnóstico dos problemas a serem enfrentados constitui elemento essencial para a correta formulação da política pública, de modo a assegurar sua efetividade.

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário (RePP 2019)

121. Para que essas avaliações sejam realizadas há um conjunto de pré-requisitos que precisam ser atendidos, entre eles:

¿ o problema a ser resolvido por meio da ação estatal e o público-alvo da intervenção precisam estar claramente identificados e delineados;

[...]

9. Destaco alguns aspectos abordados que evidenciam oportunidades de aprimoramento do processo de planejamento das políticas públicas, no qual é necessário responder a um problema previamente delimitado e pertinente para só então serem traçados objetivos, ações, público-alvo, estratégias de implementação, análise custo-benefício com impacto orçamentário e financeiro, bem como estratégias de monitoramento, avaliação e controle

[...]

13. [...] Esses instrumentos necessitam de análises ex ante, de forma que se possa verificar se a política pública a ser executada responde a um problema delimitado e pertinente com a melhor otimização dos recursos e com avaliação dos resultados por meio de objetivos e metas bem definidos que permita evidenciar não apenas eficácia, mas também efetividade dos resultados de uma determinada despesa.

Acórdão 2116/2022-TCU-Plenário

5. O diagnóstico do problema público é o processo mais estruturante de qualquer política pública. É de natureza nuclear, dado que é a existência do problema público que justifica a mobilização interventora do Estado, conforme se depreende normativamente da Constituição (arts. 170, caput, II, IV; 173) .

[...]

7. A partir dessa compreensão, logo se verifica que um diagnóstico confiável é essencial para todos os demais processos de políticas públicas, em especial, à formulação de seu desenho, que consiste na proposição e análise de alternativas de intervenção, considerados os custos e resultados possíveis; e a consequente definição pelo Estado quanto à alternativa e seus objetivos e metas, que serão adotadas para tratar do problema público. (Grifos no original)

Como se vê, os referenciais públicos oficiais, o marco normativo aplicado (este desde longa data) e a jurisprudência do TCU são harmônicos ao apontarem que políticas públicas devem ser concebidas para o tratamento de problemas públicos, necessitando que a formulação seja precedida de diagnóstico substancial, o mais confiável possível, a respeito do problema público que a política visará tratar.

Ou seja: o diagnóstico do problema é um processo estruturante em políticas públicas, visto estar na gênese da intervenção estatal, dele dependendo todos os processos seguintes de formulação, implementação, monitoramento e avaliação ex post, a começar pelo desenho da política, que, segundo o RCPP, "contempla a caracterização da política, com base em modelo lógico, que explicita, entre outras coisas, seus objetivos, produtos, atividades e impactos" (BRASIL, 2020, p. 26) .

Sobre o desenho, o Guia Ex Ante destaca que "desenhar a política é visualizá-la antes que ela seja posta em prática". É o começo da caracterização da política, que se dá pela definição dos objetivos, como se vê da figura a seguir:

Figura 5 - Etapas para a Caracterização da Política Pública

Fonte: Guia Ex Ante (BRASIL, 2018, p. 72)

Do realce da figura, e considerando o já dito e fundamentado de que políticas públicas são constituídas para a solução de problemas públicos, depreende-se a relação biunívoca que deve existir entre os objetivos de políticas e as causas do visado problema público.

Por isso que, em se tratando de políticas públicas, não se recomenda que objetivos sejam estatuídos como declarações gerais e figurem desacompanhados de metas, prazos e indicadores de eficácia e efetividade.

Tanto é que o RCPP destaca algo de amplo conhecimento na literatura de estratégia e gestão[footnoteRef:32]: a indicação de que objetivos organizacionais ou de projetos (como o são as políticas públicas) sejam SMART, acróstico da língua inglesa que congrega as iniciais dos atributos específico, mensurável, alcançável, realista e com prazo determinado (BRASIL, 2020, p. 52) . [32: https://scholar.google.com/scholar?hl=pt-BR&as_sdt=0%2C5&q=smart+objectives&btnG= Consulta em 29/8/2022]

Já o Guia Ex Ante relembra que o "objetivo caracteriza-se por ser essencial, controlável, mensurável, operacional, decomposto, conciso e inteligível" (JORDAN; TURNPENNY; 2015 apud BRASIL, 2018, p. 73) .

Vê-se, assim, que também não se revela diligente considerar que a elaboração de objetivos com esses atributos seja tida como uma sofisticação, algo de natureza complementar, podendo ser compreendida como não essencial. Pois, o que se nota, é que fazer os objetivos de políticas públicas disporem de atributos, como os acima descritos, leva-os, tão somente, a apresentar os elementos estruturantes, que lhe darão tangibilidade e concretude, uma vez que:

Permitirão a análise da coerência destes em relação ao diagnóstico do problema;

Subsidiarão a estruturação e operação da governança e gestão da implementação, do monitoramento e da avaliação;

Posicionarão à política pública no devido lócus de sujeição à accountability.

A esse respeito, o Guia Ex Ante (BRASIL, 2018, p. 73 e 74) igualmente destaca que:

Essas caraterísticas permitem maior clareza sobre os resultados previstos da ação, proporcionando avaliar, ao final da ação pública (ex post) , se os resultados efetivos condizem com o objetivo previsto (resultado esperado e meta proposta ex ante) no desenho original da política pública, para a solução do problema diagnosticado.

[...]

Atualmente, a lógica de não expressar os objetivos em termos de resultados de uma política pública, para evitar o comprometimento com o seu alcance, não é mais viável e aceitável. A diretriz da atuação governamental tem sido cada vez mais pautada pelos instrumentos de accountability (prestação de contas) , de transparência, de monitoramento e de avaliação das políticas públicas.

No campo normativo sobre o assunto, o Decreto 9.203/2017, art. , inciso II, e art. 4º, inciso IV, informa que uma das diretrizes da governança pública é a entrega de valor público, o qual é definido nos seguintes termos:

produtos e resultados gerados, preservados ou entregues pelas atividades de uma organização que representem respostas efetivas e úteis às necessidades ou às demandas de interesse público e modifiq uem aspectos do conjunto da sociedade ou de alguns grupos específicos reconhecidos como destinatários legítimos de bens e serviços públicos. (Grifo nosso)

Neste sentido, nota-se que para que o governo entregue valor público para os cidadãos, faz-se necessário que o desenho da política se desenrole tendo como foco a entrega de resultados efetivos, o que não se vislumbra possível, senão a partir de objetivos consistentemente estabelecidos.

Além do trecho do Decreto 9.203/2017 destacado, os fundamentos normativos deste mesmo decreto, bem como da Constituição Federal e da Lei 9.784/1999, informados nos parágrafos 84 e 87, também dão cobertura para o entendimento de que é exigível que políticas públicas sejam formuladas com o estabelecimento de objetivos do tipo SMART, podendo ser acrescentado, ainda, que a Lei 13.971/2019 (PPA[footnoteRef:33] 2020-2023) , art. 3º, inciso II, estabelece a "busca continua pelo aprimoramento da qualidade do gasto público, por meio da adoção de indicadores e metas que possibilitem a mensuração da eficácia das políticas públicas", como uma das diretrizes desse plano. [33: Plano Plurianual do Governo Federal, conforme Constituição Federal, art. 165, inciso I;]

Por fim, o TCU também tem apontado o quão relevante é o estabelecimento de objetivos concretos, com especificidade, além de prazos, metas e indicadores para a atuação do governo federal em políticas públicas. Os Acórdãos 2.513/2109 (RePP 2019) , 994/2020, 693/2022, 869/2022, 1345/2022 e 1376/2022, todos do Plenário[footnoteRef:34], bem como os descritos a seguir, revelam o racional que tem sido privilegiado pela jurisprudência do Tribunal. [34: Para verificar os acórdãos do TCU adotados na auditoria, vide Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 114) ;]

Acórdão 3564/2014-TCU-Plenário

4.9. Ao instituir a Política Nacional de Desenvolvimento Regional ( PNDR), o Decreto 6.047/2007 definiu objetivos genéricos a serem alcançados: a redução das desigualdades de nível de vida entre as regiões brasileiras e a promoção da equidade no acesso a oportunidades de desenvolvimento.

4.10. [...] Há um efeito negativo, no entanto, decorrente dessa abrangência: ao não definir de forma precisa os problemas específicos a serem atacados, com os correspondentes objetivos a alcançar, a política não se demonstra capaz de orientar a ação governamental, restringindo não somente as atividades de planejamento e execução, como também a avaliação sobre os resultados atingidos.

[...]

A análise da lógica de intervenção da PNDR indica que os objetivos da política demandam uma caracterização mais precisa, que o escopo de atuação governamental precisa ser ampliado e que os esforços devem ser direcionados às causas estruturais das desigualdades.

[...]

Recomendar à [...] 9.1.2. estabelecimento dos objetivos, com metas quantificadas e prazos de realização, bem como instrumentos de gestão que permitam enfrentar os problemas e as causas estruturais das desigualdades regionais identificadas pelos técnicos e especialistas em desenvolvimento regional;

Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário

62. A Ação [...] não possui objetivo válido, isto é, não foi definido nenhum objetivo para a Ação 1D73 que seja, ao mesmo tempo: específico, mensurável, atingível, relevante e delimitado no tempo. Isso se deve, entre outras coisas, ao desconhecimento da situação-problema, visto que não há uma linha de um estágio inicial de referência para avaliação dos resultados.

63. Os requisitos de especificidade, mensuração, atingibilidade, relevância e delimitação temporal (SMART) são adotados internacionalmente. Para o TCU (2010: 22) , as metas devem ser SMART, específicas, mensuráveis, apropriadas, realistas e com prazo determinado.

[...]

67. Por não ser específico, não há como estabelecer índices (impossibilidade de mensuração) , [...] Ao não ser mensurável, não se sabe em que medida ele foi atingido. Como não se sabe o que se busca, e em que medida, não importa o que venha a se obter. Outrossim, não será possível afirmar, ou negar, o atingimento do objetivo.

[...]

70. Sem objetivos estabelecidos e sem indicadores que permitam aferir os resultados, perde-se em accountability, transparência e mesmo em legitimidade para política perante a sociedade.

[...]

13. Em consequência, a ação não possui objetivo válido. Não há uma métrica associada ao ato de fomentar transformações urbanísticas e urbanização acessível porque não se sabe de forma clara o que deve ser alcançado. O simples resultado da ação que poderia, por exemplo, traduzir-se em quilômetros de vias pavimentadas não serviria como um objetivo válido porquanto não traduz a efetividade da política pública, uma vez que não se sabe qual problema se quer atingir com esse resultado.

[...]

9.1. determinar ao [...] que apresente a este Tribunal, no prazo de noventa dias, plano de ação [...] contendo, no mínimo, para cada uma das medidas a seguir listadas, os responsáveis pelas ações e o prazo previsto para implementação:

[...]

9.1.6. caso a Ação 1D73 seja mantida na forma atual, avalie a conveniência e a oportunidade de adotar as seguintes boas práticas

[...]

9.1.6.2. defina objetivos precisos o suficiente para permitir uma delimitação nítida do campo de atuação da política, traduzindo-os em metas precisas e objetivamente caracterizadas, que concorram para a consecução dos propósitos mais gerais da intervenção pública, de modo a orientar as ações governamentais e assegurar a transparência sobre metas e resultados;

9.1.6.3. preveja a medição do progresso e conquistas da Ação, com identificação de indicadores-chave de progresso para os principais objetivos da Ação, baseados em dados confiáveis e relevantes, indicadores esses que devem ser específicos, mensuráveis, apropriados, realistas e com prazo determinado;

[...]

9.1.8. identifique os indicadores-chave de progresso para os principais objetivos;

[...]

9.2. dar ciência desta deliberação ao Congresso Nacional, à Casa Civil da Presidência da República e à Secretaria-Executiva do Comitê Interministerial de Governança - CIG para conhecimento e adoção das medidas que entenderem cabíveis, tendo em conta os achados e conclusões da presente auditoria, entre as quais se destacam:

[...]

9.2.3. a política não possui objetivos específicos, mensuráveis, atingíveis, relevantes e delimitados no tempo;

Dessa forma, tal como em relação ao diagnóstico de problema público, os referenciais públicos oficiais, o marco normativo aplicado e a jurisprudência do TCU também assentam sobre a relevância de a formulação das políticas ser conduzida com apreço técnico e zelo na definição de seus objetivos e consequentes metas, prazos e indicadores de eficácia e efetividade.

Por seu turno, é a definição inicial[footnoteRef:35] dos objetivos que permite o avanço para a modelagem e análise das alternativas de intervenção, cada qual apresentando "insumos, processos, produtos, resultados e impactos, assim como as forças e fraquezas, os riscos e as oportunidades envolvidos" (BRASIL, 2018, p. 93) . Por isso que o Guia Ex Ante recomenda que essa etapa no processo de desenho da política se dê a partir do racional do "modelo lógico", que é "um passo a passo estruturado justamente de forma a demonstrar como recursos e atividades geram produtos, resultados e seus respectivos impactos" (BRASIL, 2018, p. 95) , conforme a seguir apresentado: [35: "inicial" porque a relação entre objetivos e modelo lógico (visto a seguir) é, igualmente estreita, e, não poucas vezes é objeto de dinâmica cíclica que refina compreensões e produtos de rodadas anteriores. Para mais informações, ver RCPP, Seção 2.1 - Ciclo de Políticas Públicas, e Guia Ex Ante, Seção 3 - Desenho da Política e Sua Caracterização;]

Figura 6 - Modelo Lógico

Fonte: Guia Ex Ante

É o modelo lógico que deve permitir a expressão da teoria da política, a lógica da intervenção na forma de "se (descreva o desenho do programa) , então (descreva os resultados) , o que então levará a (descreva os impactos)" (BRASIL, 2018, p. 94) .

Assim, verifica-se que é durante esta etapa do desenho das políticas que os modelos lógicos das alternativas de intervenção são postos em comparação, para levar o Estado a decidir por atuar (ou deliberadamente não atuar) por meio da opção que se revele mais eficiente para o tratamento do problema público.

No campo normativo, os fundamentos informados nos parágrafos 84, 87 e 98 também dão cobertura para se entender é exigível que políticas públicas sejam desenhadas de forma a demonstrar como intervirão na realidade do problema público, tratando-o e ao menor custo possível.

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC Processo XXXXX/2022-1

A esse respeito, também o Decreto 9.191/2017, bem como seus antecessores, há tempos estabelecem critérios para que as políticas públicas representem a alternativa de intervenção de menor custo possível, como se verifica da tabela a seguir:

Tabela 7 - Decretos 9.191/2017 e anteriores e análise de alternativas e custos

Decreto

Regras para a proposição de atos normativos

Dimensões reguladas

Alternativas[footnoteRef:36] [36: Critérios de análise de alternativas idênticos nos Decretos 1.937/1996, 2.954/1999, 4.176/2002 e 9.191/2017;]

Custos[footnoteRef:37] [37: Critérios para a análise de custos idênticos nos Decretos 1.937/1996, 2.954/1999 e 4.176/2002; reconfigurados no Decreto 9.191/2017;]

9.191/2017

Art. 13. A elaboração de atos normativos observará o disposto no Anexo.

2. Quais são as alternativas disponíveis?

2.1. Qual foi o resultado da análise do problema? Onde se situam as causas do problema? Sobre quais causas pode incidir a ação que se pretende executar?

2.2. Quais são os instrumentos da ação que parecem adequados para alcançar os objetivos pretendidos, no todo ou em parte? (Exemplo: medidas destinadas à aplicação e à execução de dispositivos já existentes; trabalhos junto à opinião pública; amplo entendimento; acordos; investimentos; programas de incentivo; auxílio para que os próprios destinatários alcançados pelo problema envidem esforços que contribuam para sua resolução; instauração de processo judicial com vistas à resolução do problema.)

2.3. Quais instrumentos de ação parecem adequados, considerando-se os seguintes aspectos:

2.3.1. desgastes e encargos para os cidadãos e a economia;

2.3.2. eficácia (precisão, grau de probabilidade de consecução do objetivo pretendido) ;

2.3.3. custos e despesas para o orçamento público;

2.3.4. efeitos sobre o ordenamento jurídico e sobre as metas já estabelecidas;

2.3.5. efeitos colaterais e outras consequências;

2.3.6. entendimento e aceitação por parte dos interessados e dos responsáveis pela execução; e

2.3.7. possibilidade de impugnação no Poder Judiciário.

6. Existe relação equilibrada entre custos e benefícios? Procedeu-se a análise?

16.1. Qual o ônus a ser imposto aos destinatários da norma?

16.1.1. Que gastos diretos terão os destinatários?

16.1.2. Que gastos com procedimentos burocráticos serão acrescidos? (Exemplo: calcular, ou, ao menos, avaliar os gastos diretos e os gastos com procedimentos burocráticos, incluindo verificação do tempo despendido pelo destinatário com atendimento das exigências formais)

16.2. Os destinatários da norma, em particular as pessoas naturais, as microempresas e as empresas de pequeno porte, podem suportar esses custos adicionais?

16.3. As medidas pretendidas impõem despesas adicionais ao orçamento da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios? Quais são as possibilidades existentes para enfrentarem esses custos adicionais?

16.4. Quais são as despesas indiretas dos entes públicos com a medida? Quantos servidores públicos terão de ser alocados para atender as novas exigências e qual é o custo estimado com eles? Qual o acréscimo previsto para a despesa de custeio?

16.5. Os gastos previstos podem ser aumentados por força de controvérsias judiciais ou administrativas? Qual é o custo potencial com condenações judiciais e com a estrutura administrativa necessária para fazer face ao contencioso judicial e ao contencioso administrativo?

16.6. Há previsão orçamentária suficiente e específica para a despesa? É necessária a alteração prévia da legislação orçamentária?

16.7. Há compatibilidade entre a proposta e os limites individualizados para as despesas primárias de que trata o art. 107 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias?

4.176/2002

Art. 37. As propostas de projetos de ato normativo serão encaminhadas à Casa Civil por meio eletrônico, com observância do disposto no Anexo I, mediante exposição de motivos do titular do órgão proponente, à qual se anexarão:

I - as notas explicativas e justificativas da proposição, em consonância com o Anexo II;

[...]

Art. 38. A exposição de motivos deverá:

[...]

II - explicitar a razão de o ato proposto ser o melhor instrumento normativo para disciplinar a matéria;

12. Existe uma relação equilibrada entre custos e benefícios?

12.1. Qual o ônus a ser imposto aos destinatários da norma (calcular ou, ao menos, avaliar a dimensão desses custos) ?

12.2. Podem os destinatários da norma, em particular as pequenas e médias empresas, suportar esses custos adicionais?

12.3. As medidas pretendidas impõem despesas adicionais ao orçamento da União, dos Estados e dos Municípios? Quais as possibilidades existentes para enfrentarem esses custos adicionais?

12.4. Procedeu-se à análise da relação custo-benefício? A que conclusão se chegou?

12.5. De que forma serão avaliados a eficácia, o desgaste e os eventuais efeitos colaterais do novo ato normativo após sua entrada em vigor?

2.954/1999

Art. 25. Os projetos de atos normativos, na sua elaboração, deverão observar a orientação constante do Anexo I a este Decreto, e serão encaminhados à Casa Civil da Presidência da República mediante exposição de motivos da autoridade proponente, à qual serão anexados:

I - as notas explicativas e justificativas da proposição, integrantes da exposição de motivos, em consonância com o Anexo II a este Decreto;

Art. 26. As exposições de motivos dos projetos de natureza legislativa, devidamente assinadas, e seus respectivos anexos, serão apresentadas em original, observados os parâmetros do Anexo II.

Parágrafo único. As exposições de motivos deverão explicitar a justificativa da edição do ato e estar de tal forma articuladas e fundamentadas que possam servir como defesa prévia contra qualquer possível argüição de inconstitucionalidade.

1.937/1996

Art. 16. Os projetos de atos normativos, na sua elaboração, deverão observar a orientação constante do Anexo I a este Decreto, e serão encaminhados à Casa Civil da Presidência da República mediante exposição de motivos da autoridade proponente, à qual serão anexados:

I - as notas explicativas e justificativas da proposição, integrantes da exposição de motivos, em consonância com o Anexo II a este Decreto;

Art. 17. As exposições de motivos dos projetos de natureza legislativa, devidamente assinadas, e seus respectivos anexos serão apresentadas em original, observados os parâmetros do Anexo II.

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria. (Grifo nosso)

E a jurisprudência do TCU, em especial no que se refere à análise de alternativas e seus custos, ecoa igual entendimento29, como se nota dos Acórdãos 2.608/2018 (RePP 2018) , 994/2020, ambos do Plenário, e do Acórdão 2.359/2018, este transcrito a seguir:

Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário

76. Destaque-se que o princípio constitucional da eficiência demanda que, na formulação das políticas públicas, seja escolhida a alternativa mais eficiente (usualmente avaliadas pelas técnicas de custo-benefício ou custo efetividade) .

77. A ausência desse tipo de análise contraria as boas práticas adotadas como referência para este trabalho. Com efeito, o Tesouro do Reino Unido (2011: 9, 17-36) esclarece que a identificação e avaliação de alternativas, em contraste com a alternativa de nada fazer ou de fazer o mínimo, é uma das partes mais significativa na formulação da política. É então que são considerados os custos e os benefícios de cada alternativa e os seus riscos, entre outros aspectos. Ou seja, é a etapa da formulação da política pública que busca garantir que não haja maneira melhor de atingir o objetivo estabelecido e que não exista nenhum uso melhor para os recursos. Seu objetivo é encontrar a solução mais eficiente (exigência de natureza constitucional) para o problema diagnosticado e que melhor enderece os riscos das intervenções.

78. Sem uma adequada avaliação das alternativas (com base nos seus custos e benefícios) é alta a probabilidade de que a política e a forma definida para sua implementação não sejam a que melhor atenda à sociedade. Outrossim, é durante a avaliação de alternativas que os riscos da política são identificados, avaliados, priorizados e endereçados.

[...]

9.1. determinar ao [...] que apresente a este Tribunal, no prazo de noventa dias, plano de ação [...] contendo, no mínimo, para cada uma das medidas a seguir listadas, os responsáveis pelas ações e o prazo previsto para implementação:

9.1.1. reavalie a Ação 1D73 com base em evidências, considerando a experiência de outros países, observadas as variações regionais, a fim de caracterizar (qualitativa e quantitativamente) a necessidade de intervenção, bem como se a política proposta é a mais custo-efetiva, em contraste com outras alternativas de intervenção;

9.1.2. realize diagnóstico apto a demonstrar a efetiva contribuição da União na Ação 1D73, além da meramente financeira; caracterizar quais municípios efetivamente demandam suporte da União e o tipo de suporte demandado; que a alternativa escolhida é a de melhor relação benefício-custo (inclusive considerando os custos de controle) ;

Assim, tal como em relação ao diagnóstico de problema público e à definição de objetivos, os referenciais públicos oficiais, o marco normativo aplicado e a jurisprudência do TCU igualmente demarcam sobre a importância de a modelagem (insumos, atividades, produtos, resultados e impactos) da política estar voltada para o atingimento de seus objetivos, que é de tratar as causas do problema público, e isso ao menor custo possível.

Como se vê, os processos em políticas públicas possuem relação de dependência imbricada, pois a consistência do que é produzido nos estágios iniciais de formulação opera grandes impactos nas possibilidades da qualidade do que será concebido e executado em seguida.

E essa relação não se verifica somente entre os processos de formulação, mas impacta também a implementação e a avaliação ex post da política. Com efeito, o Guia Ex Ante (BRASIL, 2018, p. 93) destaca que:

Importa dizer que a (boa) implementação da política, assim como a (boa) avaliação ex post, depende essencialmente do seu (bom) desenho, e é baseada na (boa) observância da relação de causa e efeito, considerada na fase anterior.

Por isso que é tão essencial que a formulação de políticas públicas ocorra com bastante apreço técnico, para que os recursos públicos que, inevitavelmente, serão consumidos na implementação, não venham a concretizar ações ineficientes, desperdício de recursos, quando não o agravamento das situações-problema experimentadas pela sociedade.

Este foi o marco analítico adotado na auditoria para a análise dos produtos de formulação de políticas públicas das PADR. Os achados a respeito são apresentados a seguir.

1.6.2. As PADR não foram estabelecidas para a resolução de um problema público previamente diagnóstico e não são operadas para esse fim

Devido à lógica de materialização da intervenção estatal a partir da concertação para o atendimento de grupos de interesse; à condição privilegiada das montadoras nessa concertação; e à não participação dos órgãos e instâncias próprias do Poder Executivo para o tema do desenvolvimento regional na instituição e renovação das PADR; essas políticas não foram formuladas para o tratamento de causas de um problema adequadamente indicado e previamente diagnosticado, o que levou a desenhos de política incompletos e insuficientes para orientar a atuação estatal, e à impossibilidade de a União demonstrar performance eficiente na condução dessas políticas junto à sociedade e às instituições constituídas para o controle da atuação estatal.

1.6.2.1. Situação encontrada, evidências e análises

Conforme apresentado nos parágrafos 80 a 90, as políticas públicas devem ser concebidas para o tratamento de problemas públicos, necessitando que a formulação seja precedida de diagnóstico substancial, o mais confiável possível, a respeito do problema público visado.

No entanto, verificou-se que as PADR não foram gestadas para resolver ou mitigar um problema público devidamente diagnosticado, visto que as Exposições de Motivos que encaminharam as proposições das MP que criaram e renovaram as políticas (Tabela 8, página 33) , não fizeram referência a diagnóstico de problema público que tenha sido adotado para a formulação das PADR.

Perguntados sobre a existência de diagnóstico prévio de problema público que tivesse sido realizado ou adotado para orientar a elaboração das PADR (peça 36, p. 1) , a Sdic informou (Tabela 8, página 33) que as PADR não foram formuladas a partir de diagnóstico de problema público, uma vez que essa precedência para a formulação poderia ser substituída por "fóruns amplos de discussão e apresentação de propostas políticas" (peça 104, p. 1) .

No entanto, a Sdic acrescentou que, no caso concreto das PADR, elas não foram gestadas a partir da lógica acima descrita, pois o que ocorreu, em verdade, foi "a substituição de um processo mais democrático de decisões pelo pragmatismo de atender às demandas de curto prazo da política econômica que passaram a ser tomadas a partir da articulação interna ao governo" (peça 104, p. 4) . A esse respeito, a Sdic também informou (peça 104, p. 18) que:

Pode-se até dizer, que ficou caracterizada uma condição de interlocutor privilegiado das montadoras junto às agências estatais e os parlamentares, em detrimento dos demais segmentos empenhados no desenvolvimento setorial, que possibilitou o exercício de maior influência nas decisões governamentais.

Contudo, a Sdic declarou que o "grande problema público que se busca encaminhar com as PADR é a concentração industrial das regiões Sul e Sudeste, combinada com as históricas desigualdades econômicas e sociais entre as macrorregiões brasileiras" (peça 104, p. 11) .

Porém, a declaração do parágrafo anterior a respeito do problema público tratado pelas PADR não tem como ser tomada de forma substantiva, pois o que se constata é que a referida declaração não foi posicionada como conclusão resultante de diagnóstico prévio que tenha sido adotado pelos formuladores das PADR por ocasião da instituição e das renovações das políticas. Além disso, o reporte da Sdic, registrado nos parágrafos 117 e 118, apresenta fator motriz distinto que levou à instituição das PADR.

Assim, vê-se que as PADR foram concebidas e são operadas sem asseguração razoável de que estejam tratando um problema, em especial o problema do baixo desenvolvimento regional[footnoteRef:38]. [38: A investigação, considerando as PADR como políticas para o tratamento da problemática do baixo desenvolvimento regional, decorre do fato de ambas as leis instituidoras das políticas (9.440/1997 e 9.826/199) apresentarem ementas que as justificam como promotoras do desenvolvimento regional;]

Mais do que isso. A leitura e análise das Exposições de Motivos das MP e das respostas dos gestores (Tabela 8, página 33) também não permite concluir se os benefícios tributários concedidos pelas PADR para indústria automotiva eram um instrumento mais eficiente para a promoção do desenvolvimento regional, porque não há demonstração de como essa instrumentalização atacaria esse problema[footnoteRef:39] ou se visam beneficiar a indústria automotiva em si, e neste caso, igualmente, não houve diagnóstico da problemática da competitividade da indústria automotiva brasileira e de suas causas, que assim deveria ser objeto das PADR. [39: Será tratado no Achado 3.1.4 (página 40) ;]

As evidências coletadas e listadas na tabela à frente corroboram a situação encontrada, pois demonstram a inconsistência e a dubiedade quanto ao problema tão-somente informado.

Tabela 8 - Evidências do Achado 3.1.2.

Documento

Descrição

Nota Informativa SEI 27744/2022/ME (peça 104, p. 11)

Aponta um problema público por ocasião da resposta à auditoria em si, sem carrear evidências de que, quando da instituição e das renovações das PADR, o governo federal chegara à conclusão e ao convencimento quanto à existência e magnitude deste problema e de suas causas e efeitos, a partir de processo estruturado de investigação, para, a partir de então, formular essas políticas.

Demonstram dubiedade quanto à área temática das PADR, se desenvolvimento regional, indústria automotiva ou a combinação disso (neste caso, de que forma) , embora as ementas das Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 sejam explícitas ao afirmar que foram estabelecidas para a promoção do desenvolvimento regional.

Nota Informativa SEI 28426/2022-ME (peça 113, p. 6)

Demonstram dubiedade quanto à área temática das PADR, se desenvolvimento regional, indústria automotiva ou a combinação disso (neste caso, de que forma) , embora as ementas das Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 sejam explícitas ao afirmar que foram estabelecidas para a promoção do desenvolvimento regional.

Ofício 21/2022/SAECO/ SAG /CC/PR (peça 95)

Nota Técnica 76/2018/AS/SAECO/ SAG /CC-PR (peça 100, p. 1-10)

Não evidencia que tenha ocorrido análise de mérito das proposições de instituição e renovação das PADR em 1996, 1999, 2009 e 2010. Por conseguinte, não demonstra que a caracterização evidenciada de um problema público, suas causas e efeitos, tenha sido adotado como critério de análise no parecer de mérito dessas proposições normativas.

L9440 - EM 56/1997-MF (peça 83, p. 11)

Não indica problema público, cujas causas seriam tratadas pelas PADR propostas.

L9440 - EM 166/2009-MF e Anexos (peça 71, p. 6 e 9) ;

L9440 - EM 175/2010-MF/MDIC/MCT e Anexos (peça 72, p. 3-5)

L9826 - EM 661-A/1999-MF/MDIC (peça 70, p. 3-5)

Apontamento formal, impreciso e inconsistente de problema público, sem indicação evidenciada das causas e efeitos deste e de como estas causas serviram como fundamento para a formulação das políticas.

1.6.2.2. Critérios

Os critérios utilizados[footnoteRef:40] para a formação da opinião da equipe foram os seguintes: [40: Para consulta aos excertos dos critérios utilizados, vide Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 107) ;]

Constituição Federal, art. 37, caput;

Lei 9.784/1999, art. ;

Decreto 9.191/2017, art. 27, inciso I, alínea a, art. 30, inciso III, e art. 32;

Decreto 4.176/2002, art. 37, inciso I, art. 38, inciso II, Anexos I e II[footnoteRef:41]; [41: Para detalhes, vide Tabela 6 (página 21) ;]

Decreto 2.954/1999, art. 25, inciso I, art. 26, parágrafo único, Anexos I e II40;

Decreto 1.937/1996, art. 16, inciso I, art. 17, Anexos I e II40;

Decreto 9.203/2017, art. , caput e incisos I e II, art. , caput e incisos I, VII e VIII;

Acórdão 3564/2014-TCU-Plenário;

Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário;

Acórdão 2608/2018-TCU-Plenário (RePP 2018) ;

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário (RePP 2019) ;

Acórdão 2428/2021-TCU-Plenário;

Acórdão 693/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 1139/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 2116/2022-TCU-Plenário;

Guia Ex Ante (p. 60) ;

Guia prático de análise Ex Post - Guia Ex Post (p. 105) ; e

RCPP (p. 13, 30, 32) .

1.6.2.3. Causas e efeitos

As principais causas para o surgimento e perpetuação da situação encontrada foram as seguintes:

Cultura de materialização da intervenção estatal a partir da atuação do governo federal como concertador do atendimento de grupos de interesse, que pressionam por suas pautas (Teoria da escolha pública, Teoria de grupo, Nota Informativa SEI 28426/2022-ME);

Condição privilegiada das montadoras no concerto dos grupos de interesse, "em detrimento dos demais segmentos empenhados no desenvolvimento setorial" (Notas Informativas SEI 27744 e 28426/2022/ME);

Não participação dos órgãos e instâncias próprias do Poder Executivo para o tema do desenvolvimento regional na instituição e renovações das PADR (Lei 13.844/2019, art. 29, inciso I; Decreto 11.065/2022, art. , inciso I; e Decreto 9.810/2019, art. , § 7º, art. 10 e art. 11, inciso I) na formulação das PADR (Nota Informativa 4/2022/SMDRU/MDR).

Afirma-se que os fatos indicados nos itens a e b são causa da situação encontrada, em face das explicações trazidas pelos próprios gestores a respeito do contexto em que se deu a criação das PADR (parágrafos 117 e 118) . A esse respeito, destaca-se essas causas a e b são a descrição empírica do que ocorre nas relações e atuações do governo à luz da largamente estudada[footnoteRef:42] teoria da escolha pública apresentada por Buchanan e Tullock (1962) . Segundo Buchanan e Tullock (1962, p. 282) : [42: Como exemplo, registra-se que na plataforma google.scholar, o livro "The Calculus of Consent", em que Buchanan e Tullock apresentam a teoria da escolha pública, aparece referenciado 14.806 vezes. https://scholar.google.com.br/scholar?hl=pt-BR&as_sdt=0%2C5&q=james+buchanan&btnG= Consulta em 15/9/2022;]

Em grande parte das unidades políticas, a manifestação institucional da promoção ativa de interesses econômicos é o grupo de pressão. A razão da existência de tais grupos se assenta na capacidade destes em promover e endereçar, por meio do processo de escolhas políticas, o interesse funcional particular representado. (Grifo nosso)

As causas a e b também podem ser consideradas demonstração empírica da Teoria do Grupo, visto que, segundo Dye (2013, p. 19) a "política pública em qualquer dado momento é o equilíbrio alcançado na luta de grupos". Ainda segundo o autor, "a política irá se mover na direção desejada pelos grupos que conquistam influência e longe do desejo dos grupos que perdem influência". A figura a seguir, também extraída da obra do autor, ilustra a conceituação.

Figura 7 - Análise de Políticas Públicas segundo o Modelo de Grupo

Fonte: Dye (2013, p. 19)

Por fim, a não participação dos órgãos e instâncias do Poder Executivo para o tema do desenvolvimento regional, como o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) e a Câmara de Políticas de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional, instância estratégica de governança da Política Nacional de Desenvolvimento Regional ( PNDR) [footnoteRef:43], também são consideradas como causa da situação encontrada pelo fato de se considerar que estes órgãos disporiam, em princípio, de entendimento melhor a respeito da problemática do baixo desenvolvimento, podendo assim, ter ofertado diagnóstico para subsidiar a formulação das PADR, ainda que sob os efeitos das causas citadas nos itens a e b. [43: Conforme Decreto 9.810/2019, art. ;]

Como efeito imediato da ausência de diagnóstico prévio de problema público, devidamente evidenciado e caracterizado, tem-se o estabelecimento de dificuldade para o processo de formulação, em si, das PADR, tanto para a definição de objetivos, metas, indicadores e prazo para as PADR, como no que se refere ao estabelecimento do modelo lógico das políticas, a partir da análise e definição da alternativa que se verificasse tratar melhor as causas de um problema público. Essas situações são tratadas nos Achados 3.1.3. e 3.1.4. (páginas 36 e 40) .

Dado o efeito em todo o processo de formulação das PADR, a situação encontrada também carreia consequências para a execução das políticas, como o consumo de mais de R$ 5 bilhões anuais em renúncias fiscais (redistribuído para todos os pagadores de impostos) , para os quais o governo federal não tem como demonstrar perante a sociedade que atende ao princípio constitucional da eficiência, uma vez que estabeleceu as PADR para propósitos outros que não o de efetivamente tratar um problema público.

1.6.3. A União não sabe que resultados quer atingir com as PADR, visto que essas políticas não têm objetivos smart concretos, indicadores, metas e prazos que demonstrem como tratarão as causas de um problema público suficientemente diagnosticado e legitimamente decidido a ser introduzido na agenda pública e que encarguem agentes e órgãos para a sua consecução.

Devido à lógica de materialização da intervenção estatal a partir da concertação para atendimento de grupos de interesses; à condição privilegiada das montadoras no concerto dos grupos de interesse; à não participação dos órgãos e instâncias próprias do Poder Executivo para o tema do desenvolvimento regional nas instituição e renovações das PADR; e à ausência de diagnóstico de problema público para a formulação de políticas, essas políticas não dispõem de objetivos, metas, indicadores e prazos concretos, cujos atingimentos sinalizem com asseguração que as causas de um problema público são tratados, o que levou à inviabilidade de se dirigir, monitorar e avaliar efetivamente as políticas, impossibilitando a União de conhecer quais resultados que se deseja atingir com essas políticas.

1.6.3.1. Situação encontrada, evidências e análises

Retomando o dito nos parágrafos 91 a 102 deste relatório, o estabelecimento de objetivos concretos, com especificidade, além de prazos, metas e indicadores para a atuação do governo federal em políticas públicas é de extrema importância para a efetividade dessas intervenções. Ressalta-se, ainda, que os objetivos estabelecidos devem ser SMART, acróstico da língua inglesa que congrega as iniciais dos atributos específico, mensurável, alcançável, realista e com prazo determinado.

Porém, foi verificado que as PADR foram formuladas sem a definição de objetivos com esses atributos SMART, pois na análise das Exposições de Motivos das MP que instituíram e renovaram as políticas, constatou-se que estes documentos se limitaram a declarar objetivos genéricos, como, por exemplo:

Exposição de Motivos 661-A/1999 - Lei 9.826/1999 (peça 70, p. 4)

a ampliação do parque industrial do país, notadamente em regiões menos favorecidas, atraindo investimentos externos, bem assim a melhoria da capacidade da empresa nacional de competir no mercado internacional"

Exposição de Motivos 166/2009 - Lei 9.440/1997 (peça 71, p. 7)

a preservação do potencial competitivo da indústria brasileira

Exposição de Motivos 175/2010 - Lei 9.440/1997 (peça 72, p. 3)

a proposta de Medida Provisória visa combinar incentivos para o aumento da produção nacional com o reforço de políticas de desenvolvimento regional, com base no que dispõe a própria Constituição Federal

Também no tema, tem-se que as informações trazidas pela Sdic (peça 113, p. 9) apresentaram perfil semelhante, sendo relevante destacar, ainda, que a resposta da Sdic indica a sua compreensão quanto ao que seria o objetivo das PADR, e não a apresentação do que foi estatuído oficialmente, em algum momento passado pelo governo federal, como objetivo dessas políticas, como se vê a seguir:

29. Assim, embora não explícitos nas Leis nº 9.440/1997 e nº 9.826/1999, os Programas dos Regimes Automotivos Regionais têm como objetivo macro a descentralização da produção industrial, com a instalação de montadoras de veículos nas regiões Centro-Oeste e Nordeste (público-alvo do programa) , [...] e paralelamente promover a instalação nessas regiões de um parque de fornecedores aptos a mitigar os custos derivados da instalação das unidades fabris distantes de seus principais mercados fornecedores e consumidores, com a consequente geração de empregos e renda.

30. Com relação aos objetivos específicos, quando do lançamento dos Regimes Automotivos Regionais (final da década de 1990) , estes parecem ser: i) Instalação de unidades da indústria automotiva nas regiões beneficiadas; i) Aumento do desenvolvimento econômico e social das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste; i) Aumento do nível de emprego nas regiões beneficiadas. (Grifo nosso)

Como se vê tanto das Exposições de Motivos das MP, como da manifestação dos gestores, os objetivos apenas declarados não são tangíveis o suficiente para serem geridos, pois não são específicos (S) , não têm como ser medidos (M) , não estão posicionados de forma a serem adotados como referência (A) factível (R) a ser buscada pela administração em um determinado intervalo temporal (T) .

Verificou-se ainda que o conjunto de indicadores informados pela Sdic (peça 91, p. 2-3) , igualmente, não foi estabelecido por meio de documento ou publicação oficial de caráter cogente, além de: a) desconexos, uma vez que não atrelados a objetivos, dada a ausência destes; e b) voltados, majoritariamente, para checks de compliance das empresas beneficiárias[footnoteRef:44], insuficientes, assim, para permitir o bom monitoramento do desempenho e a aferição dos resultados e impactos das intervenções governamentais. [44: Conforme já relatado na Seções 2.4.3 (página 17) e 2.4.4 (página 18) que descreveram as características do monitoramento e da avalição ex post das PADR;]

Além disso, mesmos os objetivos apenas declarados das PADR não representaram desdobramento como encargo de nenhum agente, unidade ou órgão da Administração.

Assim, conclui-se que a formulação das PADR não foi conduzida de modo a dotar-lhes de objetivos fáticos, que pudessem ser referência para a direção das políticas quando dos processos seguintes de implementação, monitoramento e avaliação.

Em síntese, no que se refere aos seus objetivos, as PADR terminam por ilustrar a clássica frase do gato Cheshire dita à Alice na obra de Lewis Carroll:"Se você não sabe para onde ir, qualquer caminho serve"(2022) .

A Tabela 9 apresenta as evidências que sustentam o relato da situação encontrada.

Tabela 9 - Evidências do Achado 3.1.3.

Documento

Descrição

Nota Informava SEI 25922/2022/ME (peça 91, p. 2-3)

Informa indicadores de monitoramento, não oficializados, sem demonstração:

da suficiência dos resultados extraídos destes indicadores para retratar a performance das políticas e as condições de um problema público, suas causas e efeitos;

das providências adotadas em face dos resultados eventualmente verificados nestes indicadores.

Nota Informativa SEI 28426/2022-ME (peça 113, p. 9-12)

Confirma que as Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 não trazem objetivos explícitos para as PADR (o que inviabiliza a cobrança de conduta do agente público neste sentido) e apresenta descritores"que parecem ser"objetivos específicos;

Não demonstra como os objetivos informados (não extraídos de documento oficial das políticas) se conectam com as causas de um suposto problema público; e existem no mundo das PADR de forma estruturada, onerando a atuação dos agentes públicos para a consecução desses objetivos;

Informa que" não se fazia uso de indicadores de impacto para avaliação, os quais serão utilizados a partir da avaliação deste ano de 2022 ", sem indicar:

A forma como a Administração processou e chegou à definição destes indicadores e metas;

Qual agente estatal decidiu que haverá avaliação de impacto doravante, com o acompanhamento dos indicadores relatados;

A relação causal entre o cumprimento das obrigações estabelecidas pelas PADR para as empresas (no caso, somente a Lei 9.440/1997, visto que a Lei 9.826/1999 não tem obrigação vigente para as beneficiárias) e as situações retratadas pelos indicadores e metas que, segundo informado pelos gestores, passarão a ser adotados em avaliação das políticas;

A teoria e o modelo lógico que explica a relação entre as situações retratadas pelos indicadores reportados e objetivos de política e condições de problema público.

L9440 - EM 56/1997-MF (peça 83, p. 11)

L9440 - EM 166/2009- MF (peça 71, p. 6-7)

L9440 - EM 175/2010-MF/MDIC/MCT (peça 72, p. 3-5)

L9826 - EM 661-A/1999-MF/MDIC (peça 70, p. 3-4)

Não apresenta os objetivos e metas que as PADR deveriam pretender, nem remete à regulamentação posterior em que isso seria estabelecido.

1.6.3.2. Critérios

A legislação e jurisprudência apresentada a seguir nortearam a opinião da equipe[footnoteRef:45]: [45: Para consulta aos excertos dos critérios utilizados, vide Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 114) ;]

Constituição Federal, art. 37, caput;

Lei 9.784/1999, art. ;

Decreto 9.191/2017, art. 30, inciso II, e art. 32;

Decreto 9.203/2017, art. , caput e incisos I e II, art. , caput e incisos I, VII e VIII, art. , caput e inciso II;

Lei 13.971/2019, inciso II, do art. (diretrizes PPA XXXXX-2023);

Acórdão 3564/2014-TCU-Plenário;

Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário;

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário (RePP 2019) ;

Acórdão 994/2020-TCU-Plenário;

Acórdão 693/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 869/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 1345/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 1376/2022-TCU-Plenário;

Guia Ex Ante (p. 72-74, 101) ;

Manual de Auditoria Operacional do TCU (p. 19) ; e

RCPP (p. 52) .

1.6.3.3. Causas e efeitos

As principais causas que contribuíram para o surgimento e perpetuação da situação identificada foram:

Cultura de materialização da intervenção estatal a partir da atuação do governo federal como concertador do atendimento de grupos de interesse, que pressionam por suas pautas (Teoria da escolha pública, Teoria dos grupos, Nota Informativa SEI 28426/2022-ME);

Condição privilegiada das montadoras no concerto dos grupos de interesse," em detrimento dos demais segmentos empenhados no desenvolvimento setorial "(Notas Informativas SEI 27744 e 28426/2022/ME);

Não participação dos órgãos e instâncias próprias do Poder Executivo para o tema do desenvolvimento regional na instituição e renovações das PADR (Lei 13.844/2019, art. 29, inciso I, Decreto 11.065/2022, art. , inciso I e Decreto 9.810/2019, art. , § 7º, art. 10 e art. 11, inciso I) na formulação das PADR (Nota Informativa 4/2022/SMDRU/MDR);

Ausência de diagnóstico de problema público objetivo e evidenciado, bem como de suas causas e efeitos, para orientar a formulação das PADR, em especial para fundamentar a estruturação de modelo lógico das PADR, com a explicação da forma como a intervenção estatal incidiria sobre as causas do problema público, ao menor custo possível, promovendo resultados de longo prazo (Achado 3.1.2) .

Aqui, aponta-se que o fato descrito no item d operou efeitos vinculantes na (falta de) qualidade e consistência no processo de definição de objetivos das PADR, pois, uma vez que a formulação dessas políticas não foi pilotada em face de diagnóstico prévio de problema público, por conseguinte, não se teria como dispor de orientação adequada na reflexão e definição de objetivos de política pública consistentes que visassem tratar algum problema que afligia a sociedade.

No contexto, uma vez que que se avalia que o achado presente é decorrente da situação encontrada do Achado 3.1.2, conclui-se que as causas deste, descritas nos itens a, b e c acima e já apresentadas e discutidas nos parágrafos 126 a 128, também operaram efeitos como causadores do presente achado.

A ausência de objetivos concretos, indicadores, metas e prazos, que demonstrem como as causas de um problema público suficientemente diagnosticado seriam tratadas, gerou como efeitos imediatos a formulação das PADR não alicerçadas em teoria clara, nem em modelo lógico gestado para explicar como as políticas tratariam um problema público e ao menor custo possível, situação que será demonstrada no Achado 3.1.4. a seguir.

Na sequência, afirma-se que a situação encontrada também gerou empecilhos para a definição de papeis e responsáveis nas atividades de direção, monitoramento e avaliação das PADR (Achado 3.2.2., página 51) , bem como para o estabelecimento da accountability das políticas (Achado 3.2.3., página 55) . Isso porque a falta de clareza e concretude nos objetivos de política das PADR dificultou a atribuição de mandatos para os agentes ocupantes de papeis de governança e gestão das políticas. A esse respeito, pergunta-se: como atribuir responsabilidade por algo a alguém, se esse algo não está adequadamente definido?

Afirma-se, ainda que a ausência de objetivos concretos pode ser considerada como causa dos mais de R$ 5 bilhões anuais consumidos pelas PADR, com custo redistribuído para os pagadores de impostos, e sem comprovação, por parte do governo federal, da alocação e utilização eficiente destes recursos para o tratamento de causas de problemas públicos que afligem a sociedade.

1.6.4. As PADR não estão alicerçadas em teoria clara, nem em modelo lógico que explique como as políticas tratarão um problema público, ao menor custo possível

Devido à lógica de materialização da intervenção estatal a partir da concertação para atendimento de grupos de interesses; à condição privilegiada das montadoras no concerto dos grupos de interesse; à não participação dos órgãos e instâncias próprias do Poder Executivo para o tema do desenvolvimento regional nas instituição e renovações das PADR; e à ausência de diagnóstico prévio de problema público e de objetivo SMART específicos nas PADR, essas políticas não dispõem de modelo lógico que explique como as intervenções estatais dessas políticas tratarão as causas de um problema público ao menor custo possível, o que leva o governo federal à impossibilidade de demonstrar perante à sociedade que conduz as PADR com eficiência e efetividade.

1.6.4.1. Situação encontrada, evidências e análise

O marco teórico e a jurisprudência do TCU sinalizam que o desenho da política pública deva ser realizado a partir do racional do" modelo lógico ", que, segundo o Guia Ex Ante, é" um passo a passo estruturado justamente de forma a demonstrar como recursos e atividades geram produtos, resultados e seus respectivos impactos "(BRASIL, 2018, p. 95) , e isso, ao menor custo possível, conforme tratado nos parágrafos 102 a 109.

Porém, a formulação das PADR, tanto na instituição em 1996 e 1999, como as renovações em 2010, 2011 e 2018, não se deu com a análise dos modelos lógicos das alternativas de intervenção, para que assim fosse escolhida aquela que demonstrasse melhor atender ao objetivo das políticas, e assim tratar as causas de um problema público.

As respostas apresentadas pelos gestores em relação ao tema (peças 104 e 113) não trouxeram documento produzido ou adotado pelo governo à época da instituição e da renovação das PADR, com a demonstração de como a concessão de benefícios tributários para a indústria automotiva, na forma de crédito presumido sobre o IPI (que impacta o custo de consumo) , seria, ao menor custo possível, a opção que promoveria o tratamento de causas de algum problema público no campo da competitividade da indústria automotiva brasileira ou do baixo desenvolvimento regional das regiões NO, NE e CO, com o legado sustentável decorrente dessas intervenções.

Os documentos listados na tabela a seguir evidenciam o relato do presente achado.

Tabela 10 - Evidências do Achado 3.1.4.

Documento

Descrição

Nota Informativa SEI 27744/2022/ME (peça 104)

Não informa e demonstra:

a) Como a intervenção pretendida pelas PADR deveria tratar as causas de um problema público (nem o apenas declarado pela Nota Informativa);

b) Os resultados esperados a partir das intervenções das PADR;

c) Os custos das PADR, absolutos e comparativamente a alternativas de intervenção) ;

Demonstram dubiedade quanto à área temática das PADR, se desenvolvimento regional, indústria automotiva ou a combinação disso (neste caso, de que forma) , embora as ementas das Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 sejam explícitas ao afirmar que foram estabelecidas para a promoção do desenvolvimento regional.

Nota Informativa SEI 28426/2022-ME (peça 113)

Informam que" a conclusão de que as PADR eram a alternativa mais vantajosa para o tratamento do problema público se deu como resultado de um processo de construção que se desenvolveu no âmbito da Câmara Setorial Automotiva e de seus três acordos setoriais ".

Demonstram dubiedade quanto à área temática das PADR, se desenvolvimento regional, indústria automotiva ou a combinação disso (neste caso, de que forma) , embora as ementas das Leis 9.440/1997 e 9.826/1999 sejam explícitas ao afirmar que foram estabelecidas para a promoção do desenvolvimento regional.

Ofício 21/2022/SAECO/ SAG /CC/PR (peça 95)

Nota Técnica 76/2018/AS/SAECO/ SAG /CC-PR (peça 100, p. 1-10)

Não evidencia que tenha ocorrido análise de mérito das proposições de instituição e renovação das PADR em 1996, 1999, 2009 e 2010. Por conseguinte, não evidencia que a existência de teoria e modelo lógico tenha sido adotado como critério de análise no parecer de mérito dessas proposições normativas

L9440 - EM 56/1997-MF (peça 83)

L9440 - EM 166/2009-MF e Anexos (peça 71)

L9440 - EM 175/2010-MF/MDIC/MCT e Anexos (peça 72)

L9826 - EM 661-A/1999-MF/MDIC (peça 70)

Não indica teoria e modelo lógico que fundamentaram as PADR, no que se refere a como as políticas:

a) incidiriam, ao menor custo possível, sob as causas do problema público;

b) levariam a algum resultado pretendido no longo prazo.

1.6.4.2. Critérios

Os critérios adotados na análise[footnoteRef:46], que levaram à conclusão que as PADR não apresentam modelo lógico, foram os descritos a seguir. [46: Para consulta aos excertos dos critérios utilizados, vide Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 123) ;]

Constituição Federal, art. 37, caput;

Lei 9.784/1999, art. ;

Decreto 9.203/2017, art. , caput e incisos I e II, art. , caput e incisos I, VII e VIII;

Decreto 9.191/2017, art. 13 e Anexo;

Decreto 4.176/2002, art. 37, inciso I, art. 38, inciso II e Anexos I e II;

Decreto 2.954/1999, art. 25, inciso I, art. 26, caput e parágrafo único, e Anexos I e II;

Decreto 1.937/1996, art. 16, inciso I, art. 17 e Anexos I e II;

Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário;

Acórdão 2608/2018-TCU-Plenário (RePP 2018) ;

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário (RePP 2019) ;

Acórdão 994/2020-TCU-Plenário;

Guia Ex Ante (p. 71, 74 e 94) ;

Guia Ex Post (p. 60) ; e

RCPP (p. 48 e 49) .

1.6.4.3. Causas e efeitos

As causas identificadas pela auditoria que contribuíram para o surgimento e perpetuação da situação encontrada foram as seguintes:

Cultura de materialização da intervenção estatal a partir da atuação do governo federal como concertador do atendimento de grupos de interesse, que pressionam por suas pautas (Teoria da escolha pública, Teoria dos grupos, Nota Informativa SEI 28426/2022-ME);

Condição privilegiada das montadoras no concerto dos grupos de interesse," em detrimento dos demais segmentos empenhados no desenvolvimento setorial "(Notas Informativas SEI 27744 e 28426/2022/ME);

Não participação dos órgãos e instâncias próprias do Poder Executivo para o tema do desenvolvimento regional na instituição e renovações das PADR (Lei 13.844/2019, art. 29, inciso I, Decreto 11.065/2022, art. , inciso I e Decreto 9.810/2019, art. , § 7º, art. 10 e art. 11, inciso I) na formulação das PADR (Nota Informativa 4/2022/SMDRU/MDR);

Ausência de diagnóstico de problema público objetivo e evidenciado, bem como de suas causas e efeitos, para orientar a formulação das PADR, em especial para fundamentar a estruturação de modelo lógico das PADR, com a explicação da forma como a intervenção estatal incidiria sobre as causas do problema público, ao menor custo possível, promovendo resultados de longo prazo (Achado 3.1.2) ; e

Ausência de definição de objetivos SMART para as PADR, cujos atingimentos sinalizassem com asseguração que as causas de um problema público seriam tratadas (Achado 3.1.3) .

Os Achados 3.1.2. e 3.1.3., descritos nos itens d e e, são considerados como causas da situação encontrada do achado presente em face da relação de precedência entre aqueles e este, conforme descrito na Figura 8:

Figura 8 - Relação causal entre os Achados de Formulação

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria.

Dada a relação causal apresentada, ratifica-se que as causas do Achado 3.1.2, repetidas nos itens a, b e c acima, bem como já apresentadas e discutidas nos parágrafos 126 a 128, também devem ser consideradas como geradoras da falta de modelo lógico no âmbito das PADR, que demonstrasse como essas políticas resolveriam um problema público ao menor custo possível.

Com relação aos efeitos da ausência de modelo lógico nas PADR, vê-se que a situação é semelhante à descrita no parágrafo 146, visto que, de igual modo, a ausência de teoria clara e de modelo lógico que demonstre como as políticas tratariam um problema público ao menor custo possível também implicou o estabelecimento de dificuldades para a definição de papeis e responsáveis nas atividades de direção, monitoramento e avaliação das PADR, e para o estabelecimento da accountability das políticas, assuntos estes tratados nos Achado 3.2.2. (página 51) e 3.2.3. (página 55) .

Dado o contexto de relações causais no processo de formulação e implementação de políticas, é possível afirmar que a presente situação encontrada das PADR também integra a cadeia de efeitos que, ao fim, deságua no consumo de mais de R$ 5 bilhões anuais, com custo redistribuído para os pagadores de impostos, sem comprovação por parte do governo federal, da alocação e utilização eficiente destes recursos para o tratamento de causas de problemas públicos.

1.7. As PADR apresentam falhas estruturais de governança e o governo federal não demonstra para a sociedade qual a performance das políticas, nem sua atuação como agente responsável por essas

1.7.1. Contextualização técnica, normativa e jurisprudencial

Tendo por fundamento que políticas públicas são o"conjunto de intervenções e diretrizes emanadas de atores governamentais, que visam tratar, ou não, problemas públicos e que requerem, utilizam ou afetam recursos públicos"(BRASIL, 2020, p. 14) , conforme definição do RCPP e visto na contextualização dos achados de formulação (Seção 3.1.1, página 20 deste relatório) , constata-se que para atingir esse fim de resolver problemas públicos, as políticas públicas precisam ser dirigidas, monitoradas e avaliadas enquanto existirem, razão pela qual surge a necessidade de as políticas públicas disporem de estruturas elementares de gestão e governança.

A esse respeito, o RCPP afirma que a estruturação da governança e gestão trata da"definição dos arranjos institucionais e à elaboração da estratégia de implementação da política pública", envolvendo"a definição dos sistemas de governança, de monitoramento e avaliação de processos e operações necessários ao bom funcionamento da política pública"(BRASIL, 2020, p. 57) . O Referencial (BRASIL, 2020, p. 58) acrescenta que" em políticas públicas, um sistema de governança requer a definição em documento público de papeis e responsabilidades ".

A afirmação encapsula sentido prático autoexplicativo, uma vez que o funcionamento da governança e gestão de políticas, com seus inúmeros processos de trabalho, ritos organizacionais e atividades, não é autopropelido ou espontâneo. De outro modo, tem como força motriz o exercício de papeis diversos, como direção, supervisão, coordenação e execução, todos com competências, prerrogativas e encargos distintos, que, por seu turno são atribuídos a cargos ou funções regularmente ocupadas por agentes públicos.

Por isso, o RCPP informa que uma boa prática na estruturação da governança e gestão de políticas públicas é a seguinte (BRASIL, 2020, p. 58) .

A institucionalização de estruturas de coordenação e coerência, gestão operacional, gestão de risco e controle interno, monitoramento e avaliação, accountability, incluindo, para cada uma delas, a definição de: processos de trabalho, arranjos institucionais, papeis e responsabilidades; bem como de instrumentos de apoio como planos, documentos e soluções tecnológicas. (Grifo nosso)

Nessa mesma linha, o Guia Ex Ante (BRASIL, 2018, p. 125) informa que:

Os modelos de governança definem quem comanda, quem coordena, quem acompanha (supervisiona) e quem gere a política. A governança de uma política define as competências e as atribuições de sua execução e a responsabilidade por seus ajustes. Um modelo estabelece quem pode o quê (competências) e quem faz o quê (atribuições) .

Essa compreensão material de que a governança pública existe para atuar com a condução de políticas, compreendendo, necessariamente (mas não se limitando a) , a definição de papeis, com encargos e prerrogativas e a atribuição destes a cargos ou funções desempenhadas por agentes responsáveis também encontra lastro no marco normativo brasileiro, como se nota do Decreto 9.203/2017, art. , inciso I, art. 4º, inciso X, e art. 6º, que, assim, dispõe:

Art. 2º Para os efeitos do disposto neste Decreto, considera-se:

I - Governança pública - conjunto de mecanismos de liderança, estratégia e controle postos em prática para avaliar, direcionar e monitorar a gestão, com vistas à condução de políticas públicas e à prestação de serviços de interesse da sociedade

[...]

Art. 4º - São diretrizes da governança pública:

[...]

X - Definir formalmente as funções, as competências e as responsabilidades das estruturas e dos arranjos institucionais; e

[...]

Art. 6º Caberá a alta administração dos órgãos e entidades, observadas as normas e procedimentos específicos aplicáveis, implementar e manter mecanismos [art. 5º], instâncias e práticas de governança em consonância com os princípios [art. 3º] e diretrizes [art. 4º] estabelecidos nesse decreto. (Grifo nosso)

E a alta administração também é definida pelo art. 2º, inciso III do Decreto, a saber:

Ministros de estado, ocupantes de cargos de natureza especial, ocupantes de cargo de nível 6 do grupo-direção e assessoramento superiores - DAS e presidentes e diretores de autarquias, inclusive as especiais, e de fundações públicas ou autoridades de hierarquia equivalente

Ainda o art. 5º do Decreto, caput e inciso I, informa que a liderança é um dos mecanismos para o exercício da governança pública, a qual" compreende um conjunto de práticas de natureza humana ou comportamental exercida nos principais cargos das organizações, para assegurar a existência das condições mínimas para o exercício da boa governança "(grifo nosso) .

Sobre o tema, igualmente a jurisprudência do TCU é farta no entendimento quanto à essencialidade da governança para a atuação do governo federal no campo das políticas públicas, tanto no que se refere à definição de processos, ritos organizacionais e atividades, como em relação à definição de papeis, com atribuições, prerrogativas, encargos[footnoteRef:47]. Aqui, cita-se, apenas os Acórdãos 2.513/2019 (RePP 2019) , 836/2022 e 1376/2022, todos do Plenário[footnoteRef:48], transcritos abaixo: [47: Pesquisar, por exemplo, por" definição ADJ de ADJ papeis E políticas ADJ públicas "(https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/resultado/acordao-completo/defini%25C3%25A7%25C3%25A3o%2520ADJ%2520de%2520ADJ%2520papeis%2520E%2520pol%25C3%25ADticas%2520ADJ%2520p%25C3%25BAblicas/%2520/%2520) e" monitoramento ADJ e ADJ avaliação E políticas ADJ públicas NAO CMAP "(https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/resultado/acordao-completo/monitoramento%2520ADJ%2520e%2520ADJ%2520avalia%25C3%25A7%25C3%25A3o%2520E%2520pol%25C3%25ADticas%2520ADJ%2520p%25C3%25BAblicas%2520%2520NAO%2520cmap/%2520/%2520) na página de pesquisa integrada do TCU;] [48: A lista completa dos Acórdãos extraídos da jurisprudência do TCU que versam sobre o tema pode ser consultada na Matriz de Achados (Apêndice H, peça 146, página 129) ;]

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário (RePP 2019)

18. [...] de forma a incrementar a capacidade de governança e gestão da Administração Pública, espera-se que, na concepção das políticas públicas, sejam definidos, entre outras coisas: (a) os responsáveis pela coordenação e articulação das ações concernentes à política; (b) as competências das principais partes envolvidas; (c) a formalização dos processos decisórios correlatos, incluindo o registro da motivação e do conjunto de evidências que embasam a escolha política; (d) os marcos de verificação, indicadores-chave e metas para os principais objetivos que permitam a medição do progresso e facilitem a identificação de interdependências e obstáculos; (e) o estabelecimento de formas de revisão, fixando a periodicidade da avaliação de desempenho da política; bem como (f) a formalização de instrumentos de transparência.

[...]

36. De acordo com o Referencial para Avaliação de Governança (RAG-PP) ," espera-se que uma política pública esteja jurídica e oficialmente formalizada, com o estabelecimento de normas, padrões e procedimentos que definam claramente as arenas decisórias, a divisão de competências e as atribuições dos atores envolvidos ".

[...]

89. Assim como nas contratações, uma boa implementação de políticas e programas requer o atendimento de alguns pressupostos básicos: processos de trabalho e competências das partes interessadas (ex.: responsáveis pela gestão, execução e fiscalização) [...]

265. O monitoramento e a avaliação são processos de extrema relevância para o alcance de metas e objetivos do governo, por meio dos quais se busca verificar o desempenho das ações, possibilitando ajustes na intervenção estatal, de forma a utilizar dos meios mais adequados para garantir os resultados esperados. Todavia, fiscalizações do TCU identificaram ausência de indicadores de desempenho e baixa capacidade dos órgãos federais para avaliar e monitorar seus resultados.

Acórdão 836/2022-TCU-Plenário

136. As deficiências na governança da implementação do Decreto 10.139/2019 por parte do CG representam risco significativo para o bom alcance dos objetivos inicialmente almejados. As poucas ações identificadas no sentido de suprir as lacunas de uma governança estruturada, mostraram-se insuficientes e incompletas, enquanto parte importante dos componentes dessa governança simplesmente não foram encontradas.

137. As ações para orientação e monitoramento mostraram-se incompletas por não permitirem uma interação com os órgãos e entidades responsáveis pela implementação do decreto no seu arcabouço normativo.

[...]

138. Já os aspectos da governança relativos à coordenação e avaliação não foram identificados em qualquer iniciativa do CG, o que não permite uma maior homogeneidade nas atividades relacionadas à implementação do decreto. A ausência da previsão de uma avaliação dos resultados obtidos com a consolidação normativa, da forma como vem acontecendo, representa deixar de identificar problemas e soluções que estão ocorrendo no processo de implementação e que poderiam ser muito úteis tanto para correção de rumos deste processo como para ações no futuro, na manutenção e nas outras consolidações previstas no art. 19 do decreto.

139. As consequências das deficiências identificadas na governança resultaram em achados que representam riscos significativos para o alcance a contento dos objetivos previstos pela implementação do decreto.

[...]

9.1. recomendar, com fundamento na Resolução TCU 315/2020, art. 11, §§ 1º e 2º, à Secretaria-Geral da Presidência da República que:

9.1.1. tendo em vista o disposto na Lei 13.844/2019, art. , incisos IV e VI, avalie analiticamente as oportunidades de melhoria na governança da implementação do Decreto 10.139/2019 apontadas no presente relatório e, no prazo de 180 dias, encaminhe ao Tribunal de Contas da União os resultados dessa análise e as eventuais providências adotadas, tais como ações para instituir a adequada coordenação, orientação, monitoramento e avaliação dessa implementação, visando a alcançar os objetivos almejados pelo Decreto 10.139/2019 e o cumprimento pleno do art. 16 da Lei Complementar 95/1998;

[...]

9.1.3. adote medidas com vistas ao aperfeiçoamento do exercício dos seus papéis de governança (avaliação, direção e monitoramento) para a implementação das diretrizes estabelecidas pelo Decreto 10.139/2019 em todo Poder Executivo Federal, conforme disposto na Lei 13.844/2019, art. , III, IV e VI, e no Decreto 9.982/2019, Anexo I, arts. 1º, IV e V; e 7º, I, II, III, IV, V, a, VIII e IX;

Acórdão 1376/2022-TCU-Plenário

286. A carência de uma sistemática estruturada de monitoramento e avaliação tem diversos efeitos negativos. Tende a prejudicar o processo de tomada de decisões baseadas em evidências, o que pode resultar na manutenção de iniciativas ineficientes, ineficazes, não efetivas, antieconômicas ou não sustentáveis. A falta de controle também dificulta a evolução e a otimização das iniciativas e reduz a transparência quanto à qualidade e ao valor público das iniciativas. Além disso, uma política pública que não é monitorada durante a sua execução, nem avaliada posteriormente, possui um maior risco de não atingimento dos objetivos e uma consequente redução de sua eficiência, sua eficácia e seu impacto em favor da sociedade.

[...]

291. Enfim, o estabelecimento de um programa estruturado para monitoramento e avaliação permitirá a identificação mais tempestiva de disfunções na política tarifária e o aperfeiçoamento das políticas públicas corretas. Permitirá saber se a política está alinhada com as demandas da população, se é coerente com outras intervenções públicas, se os objetivos e metas estão sendo ou foram alcançados, se produziram os resultados esperados e se os efeitos são sustentáveis.

Com isso, percebe-se que os referenciais públicos, o marco normativo e a jurisprudência do TCU apontam para a importância da governança e gestão para a efetividade da atuação estatal por meio de políticas públicas, necessitando que processos, ritos organizacionais e atividades, bem como papeis, com atribuições, prerrogativas e encargos sejam definidos e implementados.

Por seu turno, verifica-se que a governança pública, que visa à condução de políticas públicas e à prestação de serviços de interesse da sociedade; também é a estrutura que viabiliza a accountability da atuação estatal e de seus agentes, a fim de que seja possível que os arranjos institucionais de controle, bem como os próprios cidadãos, avaliem a performance do Estado para a promoção do bem-estar por meio de políticas públicas e possam adotar as medidas que lhes cabem.

O Referencial Básico de Governança Organizacional do TCU (RBGO) apresenta a accountability como princípio da governança pública. Segundo o RBGO (BRASIL, 2020, p. 46) :

A accountability diz respeito à obrigação que têm as pessoas ou entidades às quais se tenham confiado recursos, incluídas as empresas e corporações públicas, de assumir as responsabilidades de ordem fiscal, gerencial e programática que lhes foram conferidas, e de informar o cumprimento dessas a quem lhes delegou essas responsabilidades.

O Referencial para Avaliação de Governança de Políticas Públicas do TCU (RGPP) diz que a accountability é um dos pilares da governança de políticas, e discorre sobre o conceito assim (BRASIL, 2014, p. 65) :

Accountability envolve, principalmente, transparência, responsabilização, comunicação e prestação sistemática de contas. Os responsáveis pela política pública devem primar por esses aspectos, de forma a possibilitar a análise e o escrutínio do comportamento e do desempenho dos diversos atores responsáveis pela implementação.

Por ser um pilar dos regimes democráticos, dentro da perspectiva de que o poder primário pertence aos indivíduos de um povo[footnoteRef:49], a accountability, tanto conceitualmente, como seus instrumentos, estão encravados no marco normativo brasileiro, como, por exemplo, na Constituição Federal, art. 37, caput, que encarta a publicidade como um dos princípios aos quais a Administração Pública deve sujeição. [49: No caso brasileiro, formalmente atestado pela Constituição Federal, art. , parágrafo único;]

Da leitura dos artigos 70 e 71 da Carta Maior, também se verifica que o controle externo e o próprio TCU são elementos centrais da macro governança pública federal, cuja existência e competências se deduz em face da necessidade de accountability da atuação estatal.

A Lei 12.527/2011, que regula a transparência, informa que é dever dos órgãos a disponibilização de informações a respeito, por exemplo, dos dados gerais para o acompanhamento de programas, ações, projetos e obras e órgãos e entidades. Isso, independentemente de requerimentos (art. 8º, § 1º, inciso V) .

Sobre o tema, o Decreto 9.203/2017 informa que:

Art. 3º - São princípios da governança pública:

[...]

V - prestação de contas e responsabilidade;

[...]

Art. 4º - São diretrizes da governança pública:

[...]

XI - promover a comunicação aberta, voluntária e transparente das atividades e dos resultados da organização, de maneira a fortalecer o acesso público à informação.

[...]

Art. 5º - São mecanismos para o exercício da governança pública:

I - liderança, que compreende conjunto de práticas de natureza humana ou comportamental exercida nos principais cargos das organizações, para assegurar a existência das condições mínimas para o exercício da boa governança, quais sejam:

[...]

c) Responsabilidade.

Também o Decreto 9.830/2017 (que regulamenta a Lindb[footnoteRef:50], arts. 20 a 30) , no art. 12, § 1º, chama a atenção para a consequente responsabilidade do agente público em face de decisões ou opiniões técnicas tomadas no desempenho de suas funções, quando caracterizado erro grosseiro, que é a ação ou omissão com elevado grau de negligência, imprudência e imperícia. [50: Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - Decreto-Lei 4.657/1942;]

E a jurisprudência do TCU, igualmente, traz deliberações sobre o tema, podendo ser destacados os Acórdãos 2.513/2019 (RePP 2019) , 863/2022 e 1.139/2022, todos do Plenário, e parcialmente transcritos a seguir:

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário (RePP 2019)

133. Há, portanto, uma relação entre a accountability pública e os conceitos de" governo aberto "," prestação de contas "e" responsabilização ". Enquanto o primeiro se estrutura sob os pilares da transparência, da participação e da colaboração; o segundo e terceiro nascem com a assunção por uma pessoa de responsabilidade delegada, da qual se exige a prestação de contas, que pode, ou não, culminar em responsabilização.

Acórdão 863/2022-TCU-Plenário

31. Assim, vê-se que o dever de obediência ao Decreto 10.139/2019 por parte dos órgãos e entidades setoriais não pode ser arguido como excludente de responsabilidade em relação ao exercício dos papeis de governança (avaliação, direção e monitoramento) por parte dos órgãos de CG. São papeis distintos, em que cabe os órgãos de CG a atuação como elementos de governança a bem do sucesso das políticas públicas federais implementadas nos/pelos demais órgãos da administração direta e indireta, a exemplo do Decreto 10.139/2019.

32. Nessa perspectiva, necessário destacar que o exercício dessa atuação condutora de implementação de políticas para dentro do governo seria algo que nem reclamaria estar indicado especificamente, de forma detalhada em relação a cada política, em normativos estatutários que tratam dos encargos dos órgãos de CG, uma vez que estes órgãos estão ali exatamente para isso, sendo accountables em função da devida expectativa de que exerçam este ofício.

[...]

9.1. recomendar, com fundamento na Resolução TCU 315/2020, art. 11, §§ 1º e 2º, à Secretaria-Geral da Presidência da República que:

9.1.1. tendo em vista o disposto na Lei 13.844/2019, art. , incisos IV e VI, avalie analiticamente as oportunidades de melhoria na governança da implementação do Decreto 10.139/2019 apontadas no presente relatório e, no prazo de 180 dias, encaminhe ao Tribunal de Contas da União os resultados dessa análise e as eventuais providências adotadas, tais como ações para instituir a adequada coordenação, orientação, monitoramento e avaliação dessa implementação, visando a alcançar os objetivos almejados pelo Decreto 10.139/2019 e o cumprimento pleno do art. 16 da Lei Complementar 95/1998;

[...]

9.1.3. adote medidas com vistas ao aperfeiçoamento do exercício dos seus papéis de governança (avaliação, direção e monitoramento) para a implementação das diretrizes estabelecidas pelo Decreto 10.139/2019 em todo Poder Executivo Federal, conforme disposto na Lei 13.844/2019, art. , III, IV e VI, e no Decreto 9.982/2019, Anexo I, arts. 1º, IV e V; e 7º, I, II, III, IV, V, a, VIII e IX;

Acórdão 1139/2022-TCU-Plenário

Por essa perspectiva, analisando o conteúdo da EBIA[footnoteRef:51], verifica-se que não está estabelecida nenhuma estrutura de governança e gestão que satisfaça os requisitos acima. Quanto a essa ausência, vale dizer que a publicação da EBIA sem a definição de arranjos institucionais que condicionam a forma pela qual as políticas são formuladas, implementadas e avaliadas prejudica o funcionamento de instrumentos como a accountability (responsabilização e prestação de contas) e transparência da política pública. [51: Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial;]

[...]

Prever a estrutura de monitoramento no corpo do documento que instituí a política é necessário, pois a avaliação das políticas públicas deve assegurar o aprendizado e aperfeiçoamento contínuos, e, também, criar condições para que haja accountability, envolvendo as dimensões de transparência da ação pública e responsabilização perante a sociedade.

Dessa forma, assim como em relação à definição de papeis e responsabilidades no âmbito das políticas públicas, e aos processos de trabalho para o exercício destes (parágrafos 159 a 168) , verifica-se que os referenciais públicos oficiais, o marco normativo e a jurisprudência do TCU são igualmente uníssonos em realçar a essencialidade da accountability da atuação estatal, em especial a que ocorre em e por meio das políticas públicas.

Entrando na parte final dessa contextualização sobre governança e gestão de políticas, destaca-se que: a) a formulação consistente de políticas públicas, com atenção a balizas centrais, como as destacadas na Seção 3.1.1. deste relatório (página 20) ; e b) a definição e o estabelecimento dos papeis, atividades e processos de políticas, e a accountability destes, como apresentado até agora na presente seção (parágrafos 159 a 178) , é o que permitirá que o governo, suas estruturas organizacionais e agentes públicos saibam quais têm sido os resultados da implementação das políticas, em suas distintas dimensões, como por exemplo, eficiência, eficácia e efetividade, sendo sabido que todas essas dimensões de resultados interessam aos pagadores de impostos.

Saber o que está acontecendo na implementação de uma política e os efeitos disso na vida de indivíduos e estratos sociais é viabilizado por meio das atividades e processos de monitoramento e avaliação ex post de políticas, sendo condição sine qua non para: a) a existência material da accountability pública nessa política em todos os níveis relacionais; e b) a promoção dos ajustes necessários, de toda ordem, inclusive extinção, se for o caso; para que a atuação estatal na política não se afaste do trilho ao qual está vinculada: formular e implementar políticas para o tratamento de causas de problemas públicos.

Ou seja: para se prestar contas e para se gerenciar políticas públicas, é preciso monitorá-las e avaliá-las.

A esse respeito, o RCPP destaca que" uma vez em operação, as políticas públicas precisam ser continuamente avaliadas ", pois é neste período que se busca garantir" (i) que as intervenções operem, de fato, conforme o planejado; (ii) que o desempenho destas seja eficiente e adequado - que entregue produtos e serviços de qualidade ao menor custo possível -; e (iii) que os objetivos das intervenções públicas sejam alcançados (eficácia) "(BRASIL, 2020, p. 84) .

O RCPP acrescenta (BRASIL, 2020, p. 87) que uma boa prática em política pública é" monitorar o desempenho da política ", o que inclui: a) avaliar periodicamente a adequação dos insumos e recursos necessários à sua implementação; b) monitorar continuamente seu desempenho físico e financeiro; c) avaliar continuamente a qualidade dos produtos e serviços; d) avaliar periodicamente o desempenho dos processos e ações (projetos, atividades e operações) por meio dos quais a política é implementada; e) avaliar sistematicamente riscos e controles internos; e f) avaliar continuamente a eficiência e a eficácia da política.

Sobre avaliações ex post, o RCPP destaca que:

São instrumentos importantes para medição dos efeitos concretos das políticas públicas, permitindo avaliar seu mérito no que tange à sua relevância, utilidade, resultados, impactos e sustentabilidade e, com isto, trazer transparência quanto à qualidade e ao valor público do gasto, bem como orientar decisões acerca da viabilidade e necessidade de se continuar, otimizar ou extinguir a política pública. (Grifo nosso)

A Constituição Federal, art. 37, caput, ao estabelecer a eficiência como princípio a ser observado pela à Administração Pública, a impôs a necessidade de avaliar suas iniciativas, e, nessa linha, o recente § 16 do mesmo artigo explicitou essa obrigação para a atuação estatal no campo das políticas públicas:"Os órgãos e entidades da administração pública, individual ou conjuntamente, devem realizar avaliação das políticas públicas, inclusive com divulgação do objeto a ser avaliado e dos resultados alcançados, na forma da lei".

A Lei 12.527/2011, art. , caput e inciso VII, coloca as informações relativas à implementação, acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações, como conteúdos que devem disponibilizados ao público em geral, sendo dedutível que a disponibilização de informações honestas a respeito de resultados de programas, por exemplo, requererá a prévia avaliação destes.

Já o Decreto 9.203/2017 assevera que:

Art. 4º - São diretrizes da governança pública:

[...]

III - Monitorar o desempenho e avaliar a concepção, a implementação e os resultados das políticas e das ações prioritárias para assegurar que as diretrizes estratégicas sejam observadas;

[...]

VII - avaliar as propostas de criação, expansão ou aperfeiçoamento de políticas públicas e de concessão de incentivos fiscais e aferir, sempre que possível, seus custos e benefícios;

[...]

Art. 6º - Caberá à alta administração dos órgãos e das entidades, observados as normas e os procedimentos específicos aplicáveis, implementar e manter mecanismos, instâncias e práticas de governança em consonância com os princípios e as diretrizes estabelecidos neste Decreto.

Parágrafo único - Os mecanismos, as instâncias e as práticas de governança de que trata o caput incluirão, no mínimo:

I - formas de acompanhamento de resultados; (Grifo nosso)

Da mesma forma, a jurisprudência do TCU também revela a importância de a Administração monitorar e avaliar políticas públicas, para, assim, saber o que está acontecendo e, a partir de então, prestar contas de sua atuação e adotar as medidas de ajuste necessárias. Como exemplo, seguem transcrições dos Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário lenário.

Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário

147. Não monitorar os resultados acarreta na impossibilidade de conhecimento sobre o êxito ou o fracasso da aplicação dos recursos públicos. Não se sabendo o que é sucesso, não há como aprender com os casos de êxito e, ao não se saber o que é fracasso e como ele ocorre, não há como corrigi-los ou evitá-los.

Acórdão 693/2022-TCU-Plenário

128. [...] Não há instrumento adequado de fornecimento de informações acerca [...] da avaliação de resultados que procurem assegurar a perseguição daqueles objetivos, em conjunto com os valores investidos em cada projeto de modo a prover a gestão transparente da informação.

[...]

31. Cabe ressaltar a importância da disponibilização contínua, para os cidadãos brasileiros, das informações de indicadores de monitoramento e avaliação de resultados.

Dessa forma, assim como em relação à definição de papeis e responsabilidades no âmbito das políticas públicas e processos de trabalho para o exercício destes (parágrafos 159 a 168) , e à accountability das políticas públicas (parágrafos 169 a 178) , os referenciais técnicos, o marco regulador aplicado e a jurisprudência do TCU retratam igual entendimento quanto à importância de a Administração monitorar e avaliar suas políticas públicas, para que saiba no que estas têm resultado, bem como sua atuação, enquanto accountable por essas políticas para, com isso, poder prestar contas de sua atuação e adotar as medidas de ajuste necessárias.

Este foi o marco analítico adotado na auditoria para a análise da maturidade da governança e gestão de políticas públicas das PADR. Os achados são apresentados a seguir.

1.7.2. As competências e responsabilidades dos agentes e das unidades envolvidas, bem com os principais processos de governança e gestão de implementação, monitoramento e avaliação, foram fragilmente estabelecidos, e de forma não clara, no marco normativo das PADR

Devido à lógica de materialização da intervenção estatal a partir da concertação para o atendimento de grupos de interesses; e (b) a fragilidades na formulação das políticas (problema, modelo lógico, objetivos, indicadores e metas) ; as PADR não contam com a definição de papeis e processos básicos de políticas públicas, o que leva ao comprometimento da direção, monitoramento e avaliação das políticas, resultando na inviabilização da accountability e das possibilidades de aprimoramento ou extinção da intervenção estatal.

1.7.2.1. Situação encontrada, evidências e análises

De acordo com o apresentado nos parágrafos 159 a 168, a definição e a operação da governança e gestão de políticas públicas são necessárias para a implementação, o monitoramento e a avaliação dos processos e operações necessários ao bom funcionamento dessas intervenções estatais (BRASIL, 2020) , sendo sabido que," em políticas públicas, um sistema de governança requer a definição em documento público de papeis e responsabilidades "(BRASIL, 2020, p. 58) , visto que a governança e gestão de políticas não dispõem de autopropulsão, mas dependem do exercício de papeis diversos, como direção, supervisão, coordenação e execução, todos com competências, prerrogativas e encargos distintos, que, por seu turno são atribuídos a cargos ou funções regularmente ocupadas por agentes públicos.

No entanto, foi constatado que vários desses papeis não foram definidos para as PADR e, assim, não são executados, como explanado a seguir.

Com relação ao papel de direção das PADR, é possível afirmar apenas que a titularidade foi designada para o ME, de acordo com o Decreto 9.734/2019. De outro modo, conforme relatado na Seção 2.4.1. deste relatório (parágrafos 37 a 43) , o marco normativo das PADR[footnoteRef:52] não estabeleceu prerrogativas (autonomia e capacidade decisória) para o exercício desse papel de direção, que, consequentemente, não ocorre. [52: Vide Apêndice F - Marco Normativo de Governança e Gestão das PADR (peça 146, p. 75) ;]

As respostas da Sdic no tema corroboram essa conclusão, visto que, quando perguntada sobre as unidades que atuavam nas PADR e suas atribuições, responderam o seguinte, por meio da Nota Informativa SEI 15357/2022/ME (peça 19, p. 2) :

Atuam a Subsecretaria de Estratégias Regionais e Setoriais (SERS) e a Coordenação-Geral de Implementação e Fiscalização de Regimes Automotivos (CGRAU) .

A CGRAU é responsável pela análise dos pleitos para emissão de certificado específico de produtos, para fruição dos benefícios previstos na Lei nº 9.440/1997. Também é responsável pela análise de pedidos de renovação do certificado de habilitação ao incentivo fiscal no âmbito da Lei nº 9.826/1999.

A SERS é responsável pela emissão dos certificados acima mencionados, conforme disposto no inciso XV do art. 114 do Decreto nº 9.745/2019.

Como se vê, não houve menção ao exercício do papel de direção das PADR.

Posteriormente, ao se manifestar especificamente a respeito da direção das PADR, a Sdic, por meio da Nota Informativa SEI 25922/2022/ME, informou que"está sendo estruturado um modelo de governança e gestão que segue o padrão ali definido [Decreto 9.203/2017 e RBGO], com os mecanismos de liderança, estratégia e controle"(peça 91, p. 1) .

Sobre o tema, nessa mesma Nota Informativa, a Sdic sinalizou que, nas PADR, o sistema de governança e gestão que está em elaboração deverá estabelecer a atuação da CGRAU como responsável técnica pela execução das políticas; da Sdic ou da Sers (por delegação) , como responsável pela avaliação das políticas, dos compromissos assumidos na formulação, e por levar ao conhecimento do titular da Sepec os resultados e riscos existentes; e da Sepec como responsável por responder pelos resultados das políticas; pelas definições dos requisitos que a política deve atender; e pelas articulações institucionais externas (peça 91, p. 1-2) .

As respostas da Sdic, conquanto atestem implicitamente o constatado, revelam caminho possível a ser adotado para o tratamento da situação. Esse contexto é considerado nas propostas de encaminhamento do relatório (parágrafo 330) .

No que se refere à supervisão das PADR, conforme descrito na Seção 2.4.2. (parágrafos 44 a 56) , foi verificado que este papel está conferido de forma genérica, primeiramente, à Sepec, havendo atuação da Sdic e da Sers em face de hierarquia organizacional, sem, no entanto, disporem de prerrogativas para o exercício desse papel.

De forma geral, o que foi constatado de governança e gestão nas PADR, conforme relatado nas Seções 2.4.3. e 2.4.4. (parágrafos 57 a 74) , foram as circunscritas atuações operacionais da CGRAU e da Sers nos papeis cartoriais para verificações de compliance ante aos pleitos de aprovação de projetos e produtos (somente no âmbito da Lei 9.440/1997) e às prestações de contas da aplicação de recursos em PD&I, apresentadas trimestralmente pelas empresas beneficiadas.

As mesmas seções registram as deficiências de governança e gestão das PADR no que se refere a monitoramento e avaliação ex post, não tendo havido definição de processos e papeis para os feitos, quando compreendidos como voltados para informar sobre a implementação, para o fornecimento de subsídios para a gestão, e para a tomada de decisões a respeito das políticas.

Não tendo sido estabelecida governança e gestão na seara, nem mesmo processo voltado à reavaliação das políticas, decorre que, até hoje, as PADR não foram objeto de avaliação ex post realizada ou contratada pelo Poder Executivo, conforme informado pela Sdic, por meio da Nota Informativa SEI 25922/2022/ME (peça 91, p. 2) . A Nota complementa que"encontra-se em andamento uma análise de diagnóstico amplo das PADR pela nova gestão da Sepec, com a verificação dos indicadores estabelecidos e resultados parciais".

Registra-se que, até como decorrência do relatado, também foi constatado que o marco normativo das PADR não trouxe processos e mecanismos de accountability para as políticas, não havendo previsão nem o exercício de atividades e processos de reportes e prestações de contas por parte dos gestores envolvidos (parágrafos 41, 54, 67 e 73) .

Finalmente, registra-se que, embora as leis instituidoras das PADR declarem que as políticas são voltadas para o desenvolvimento regional, a estrutura de governança e gestão dessas intervenções estatais não conta com órgãos ou instâncias próprias do Poder Executivo que existem especificamente para a promoção do desenvolvimento regional, como o MDR e a Câmara de Integração de Políticas de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional, conforme se extrai de manifestação do MDR, por meio da Nota Informativa 4/2022/SMDRU/MDR (peça 88, p. 6) .

Assim, vê-se que as PADR apresentam quadro geral de apagão de governança e gestão que não se coaduna com o estabelecido pelo marco normativo, pela jurisprudência do TCU e por referenciais oficiais. Esses critérios estão contextualizados na Seção 3.2.1. (parágrafos 159 a 168) e especificados à frente (parágrafo 208) .

As evidências coletadas e listadas na Tabela 11 corroboram a situação encontrada.

Tabela 11 - Evidências do Achado 3.2.2.

Documento

Descrição

Nota Informativa 4/2022/SMDRU/MDR (peça 88, p. 6)

Informa que o MDR não tem participação de qualquer natureza na governança e gestão das PADR, e não é informado de seus resultados;

Nota Informativa SEI 15357/2022/ME (peça 19, p. 2)

Informa papeis operacionais de Sers e CGRAU no âmbito das PADR, sem indicação de previsão e exercício de papeis de direção, supervisão, monitoramento e avaliação ex post.

Nota informativa SEI 25922/22/ME (peça 91, p. 1-2)

Informa que:

"está sendo estruturado um modelo de governança e gestão da Sepec que segue o padrão [do Decreto 9203/2017 e a 3ª Edição do Referencial Básico de Governança Organizacional do TCU";

As PADR não foram objeto de avaliação ex-post até o momento, mas que há análise de diagnóstico amplo das PADR em curso, encomendada pela nova gestão da Sepec, com a verificação dos indicadores estabelecidos e resultados parciais.

Apêndice C - Visão Geral do Objeto (peça 126, p. 25)

Demonstram:

o estabelecimento de processos e papeis de governança e gestão das PADR circunscritos às atividades operacionais cartoriais para verificações de compliance ante aos pleitos de aprovação de projetos e produtos (somente no âmbito da Lei 9.440/1997) e às prestações de contas da aplicação de recursos em PD&I, apresentadas trimestralmente pelas empresas beneficiadas;

o não estabelecimento de produtos, processos e eventos de accountability para as PADR.

Apêndice E - Macroprocessos das PADR (peça 126, p. 50)

Apêndice F - Marco normativo de Governança e Gestão das PADR (peça 126, p. 75)

1.7.2.2. Critérios

Os critérios adotados na análise do achado[footnoteRef:53] foram os seguintes: [53: Para consulta aos excertos dos critérios utilizados, vide Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 129) ;]

Constituição Federal, art. 37, caput e § 16;

Decreto 9.203/2017, art. , caput e incisos I e II, art. , caput e incisos I, VII e VIII;

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário (RePP 2019) ;

Acórdão 693/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 836/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 1345/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 1376/2022-TCU-Plenário;

Guia Ex Ante (p. 124, 125 e 163) ;

Guia Ex Post (p. 215) ;

RBGO (p. 55 e 57) ; e

RCPP (p. 26, 58, 63 e 64) .

1.7.2.3. Causas e efeitos

Dentre as causas das fragilidades identificadas, destacamos as seguintes:

Cultura de materialização da intervenção estatal a partir da atuação do governo federal como concertador do atendimento de grupos de interesse, que pressionam por suas pautas (Teoria da Escolha Pública, Teoria dos Grupos, Nota Informativa SEI XXXXX/ME);

Fragilidades na formulação das PADR, no que se refere à (ao) :

caracterização evidenciada do problema público, suas causas e efeitos, objeto da intervenção (Achado 3.1.2) ;

estabelecimento de objetivos SMART, metas, indicadores e prazos (Achado 3.1.3) ;

adoção de teoria e modelo lógico das políticas, que explique como as causas do problema público serão tratados e indique os resultados de longo prazo pretendidos (Achado 3.1.4) ;

Ausência de marco normativo próprio, e de estatura adequada, para a regulação geral da governança (inclusive accountability) e dos processos de formulação, implementação e avaliação de políticas públicas, que estabeleça, especificamente, dentre outros, a obrigatoriedade de estabelecimento e operação da governança e gestão da intervenção estatal;

Fragilidades na governança de Centro de Governo (CG) do Poder Executivo.

Sobre a causa indicada no item a, aproveita-se a explicação apresentada nos parágrafos 126 a 128, visto que esta pilotou a formulação das PADR e, igualmente, representa fragilização dos incentivos à definição dos processos, atividades e papeis de governança e gestão de políticas públicas, levando a situações como a identificada no presente achado.

Racional semelhante é aplicado às causas indicadas no item b, visto que as fragilidades atinentes aos processos de formulação relatados nas situações encontradas dos Achados 3.1.2. (parágrafos 115 a 123) , 3.1.3. (parágrafos 132 a 140) e 3.1.4. (parágrafos 149 a 152) se colocam como pano de fundo e fatores precedentes em relação ao" desenho "da governança e gestão das políticas, pois uma política sem contornos objetivos representa, na prática, um artefato inviável para ser objeto de concepção e do exercício de estruturas de governança e gestão.

A respeito do item c; avalia-se que, mesmo que o Decreto 9.203/2017 regule alguns aspectos de governança pública, ele não o faz de forma aplicada à atuação em políticas públicas. Por isso, considera-se que a atuação federal no tema não dispõe de regulamentação própria.

Dessa forma, como no Brasil vigora o princípio da Legalidade[footnoteRef:54], de observância obrigatória pela Administração Pública e seus agentes[footnoteRef:55] e, por outro lado, não há esse marco normativo que regule a produção e operação de políticas públicas, os agentes públicos não se enxergam formalmente cobráveis pelo estabelecimento e operação de estruturas de governança e gestão de políticas, conquanto essa estruturação seja materialmente essencial. [54: Constituição Federal, art. , inciso II;] [55: Constituição Federal, art. 37, caput;]

A causa d é trazida ao rol pelo fato de a atuação de CG ser o arranjo próprio de governança que, justamente, endereçaria os desacertos horizontais em políticas públicas no nível federal[footnoteRef:56], como o verificado nas PADR, que não conta com a atuação de órgãos e instâncias federais delegadas para o tratamento do desenvolvimento regional, conquanto suas leis instituidoras a declarem voltadas para esse fim. [56: Para mais sobre o assunto, vide Referencial de Governança de Centro de Governo, Seção 2.2 - Notas Conceituais sobre Centro de Governo (p. 28) ;]

Conclui-se que as fragilidades identificadas neste achado têm como efeitos imediatos o comprometimento da accountability das PADR e dos agentes públicos afetos, como será visto no Achado 3.2.3. em seguida; o estabelecimento de dificuldades para as atividades de direção, supervisão e execução da implementação, do monitoramento e da avaliação das PADR; e para o conhecimento dos efeitos das políticas (Achado 3.2.4., página 59) ; impossibilitando, assim, o aprimoramento dessas intervenções estatais.

Por fim, considera-se que as consequências da situação encontrada também se materializam na forma de consumo de créditos de legitimidade da Administração perante a sociedade, pois conforme os termos do Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário," sem objetivos estabelecidos e sem indicadores que permitam aferir os resultados [manobrados em processos de monitoramento e avaliação de políticas], perde-se em accountability, transparência e mesmo em legitimidade para a política perante a sociedade ".

Afirma-se, ainda que as fragilidades na definição de processos e papeis de governança e gestão nas PADR também concorreu para o consumo dos R$ 5 bilhões anuais pelas PADR, sem comprovação, por parte do governo federal, da alocação e utilização eficiente destes recursos para o tratamento de causas de problemas públicos que afligem a sociedade.

1.7.3. As PADR não são accountable em todos os níveis de governança e gestão

Devido à lógica de materialização da intervenção estatal a partir da concertação para o atendimento de grupos de interesses; à ausência de definição majoritária de posições organizacionais responsáveis pelos papeis de governança e gestão das políticas, e de seus produtos, processos e eventos de accountability; as PADR não são accountable, não havendo consequência estabelecida para os agentes que tomam decisão nas políticas, o que levou ao comprometimento da eficiência das PADR, resultando na inviabilização da transparência e da prestação de contas do governo aos pagadores de impostos e às instituições legalmente constituídas para o controle da atuação estatal.

1.7.3.1. Situação encontrada, evidências e análises

Conforme apresentado nos parágrafos 169 a 178, a accountability pública é um dos pilares dos regimes democráticos, sendo devida pelo aparato estatal e seus agentes aos pagadores de impostos, como também por qualquer agente público que atue a partir de mandato que lhe foi conferido, ainda que por outro agente público.

E no caso das PADR, políticas em vigor há mais de vinte anos com custo estimado em cerca de R$ 5 bilhões por ano, é desnecessário dizer da elementaridade de o Poder Executivo Federal prestar contas dos resultados dessas políticas, o que inclui reportar a performance de sua atuação à frente delas.

Entretanto, uma vez que a governança e gestão das PADR não foram adequadamente estabelecidas, com lacunas de processo e papeis, conforme visto na Seção 3.2.2. (página 51) , a accountability dessas políticas restou inviabilizada.

Essa conclusão é corroborada pelas respostas da Sdic apresentadas na Nota Informativa SEI 25922/2022/ME (peça 91) às perguntas sobre accountability e controles internos ligados aos papeis e processos de trabalho das PADR[footnoteRef:57]. [57: Ofício 0052/2022-TCU/SecexDesenvolvimento, itens a.II, a.IV e b (peça 38) ; ]

Na seara, a Sdic informou que a gestão de riscos das políticas é realizada" por meio de uma sistemática de monitoramento/acompanhamento do cumprimento das obrigações das empresas habilitadas "(peça 91, p. 4) , conforme objetivos e riscos-chave identificados, os quais, sem exceção, referem-se à atuação de natureza cartorial não finalística, já relatada nas Seções 2.4.3. (parágrafos 61, 62 e 68) e 2.4.4. (parágrafo 72) e analisada no Achado 3.2.2., que tratou das deficiências na definição de processos e papeis de governança e gestão das PADR (parágrafos 201 e 202) .

De acordo com a Sdic, a unidade incumbida desse papel com essas características de check de compliance seria a coordenação-geral responsável, no caso, a CGRAU (peça 91, p. 4) .

Já sobre a accountability, em si, relacionada aos processos, mecanismos, instâncias e práticas ligadas aos papeis de direção geral, supervisão, coordenação, monitoramento e avaliação das PADR, a Sdic, em sua resposta, fez menção à atuação operacional da Subsecretaria de Supervisão e Controle (Supe) da Sepec como órgão responsável pelo monitoramento estratégico dos riscos de todas as iniciativas sob responsabilidade dessa secretaria especial, e ratificou a informação de que a Sepec está trabalhando na implementação de um modelo de governança na unidade (peça 91, p. 2) .

Como se percebe, do pouco de atuação em nível de gestão (não de governança) que existe nas PADR, não houve menção a como os agentes públicos reportam o desempenho em suas atividades, bem como o produto dessas. A Sdic, por exemplo, não informou sobre monitoramento e avaliações periódicas (essas, até então, inexistentes, conforme parágrafo 203) feitas e reportadas a instâncias singulares ou colegiadas que, inseridas em processo de trabalho afeto, apreciariam tal produto e deliberariam a respeito.

Ou seja: o quadro geral de accountability das PADR é de ausência de previsão para que os gestores das políticas, em todos os níveis, do ME até a CGRAU, prestem contas dos resultados das suas atuações no âmbito das PADR, a algum agente ou instância superior. No mesmo sentido, qualquer decisão ou omissão dos agentes das PADR não lhes gera consequências claras.

No contexto, aponta-se que uma política formulada sem a orientação de um diagnóstico de problema público (Achado 3.1.2., página 32) ; sem objetivos, metas, indicadores e prazos concretos (Achado 3.1.3., página 36) , sem modelo lógico, que explique como interviria nas causas de um problema ao menor custo possível (Achado 3.1.4., página 40) ; e sem estruturação da governança e gestão, com definição de papeis, processos e atividades para a implementação, monitoramento e avaliação das políticas (Achado 3.2.2., página 51) , não teria como levar a quadro de accountability diferente do relatado.

E essa é uma situação grave, porque aliena os pagadores de impostos de saber o que tem sido feito com os tributos que eles pagam ao Estado, ou que este renuncia receber, no âmbito das PADR, e isso há mais de vinte anos. Além disso, a condição de unaccountable das PADR sedimenta no tempo a alocação de recursos para seus propósitos, em detrimento de toda a discussão cíclica sobre a destinação dos recursos públicos entre as políticas públicas do governo federal.

As evidências que dão suporte à caracterização da situação encontrada do achado são descritas na Tabela 12.

Tabela 12 - Evidências do Achado 3.2.3.

Documento

Descrição

Nota informativa SEI 25922/22/ME (peça 91)

Informa que:

"está sendo estruturado um modelo de governança e gestão da Sepec que segue o padrão [do Decreto 9203/2017 e a 3ª Edição do Referencial Básico de Governança Organizacional do TCU";

As PADR não foram objeto de avaliação ex-post até o momento, mas que há análise de diagnóstico amplo das PADR em curso, encomendada pela nova gestão da Sepec com a verificação dos indicadores estabelecidos e resultados parciais;

Demonstram:

O não estabelecimento e execução de processos, mecanismos e práticas de prestação de contas por parte dos gestores das PADR.

Apêndice C - Visão Geral do Objeto, Seção 8 (peça 126, p. 34)

Demonstram:

o estabelecimento de processos e papeis de governança e gestão das PADR circunscritos às atividades operacionais cartoriais para verificações de compliance ante aos pleitos de aprovação de projetos e produtos (somente no âmbito da Lei 9.440/1997) e às prestações de contas da aplicação de recursos em PD&I, apresentadas trimestralmente pelas empresas beneficiadas;

o não estabelecimento e execução de processos, mecanismos e práticas de prestação de contas por parte dos gestores das PADR.

Apêndice E - Macroprocessos das PADR (peça 126, p. 50)

Apêndice F - Marco normativo de Governança e Gestão das PADR (peça 126, p. 75)

1.7.3.2. Critérios

Os testes realizados neste achado consideraram os seguintes critérios[footnoteRef:58]: [58: Para consulta aos excertos dos critérios utilizados, vide Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 139) ;]

Constituição Federal, art. 37, caput;

Lei 12.527/2011, art. , caput e inciso VII, alínea a, e art. , caput, § 1º, incisos I e V;

Decreto 9.203/2017, art. , caput e inciso V; art. 4º, caput e incisos X e XI, art. 5º, caput, inciso I e alínea c;

Decreto 9.830/2019, art. 12, caput, §§ 1º e 7º;

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário (RePP 2019) ;

Acórdão 863/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 1139/2022-TCU-Plenário;

Guia Ex Ante (p. 74) ;

RCPP (p. 20, 27, 58 e 147) ; e

RBGO (p. 46) .

1.7.3.3. Causas e efeitos

Dentre as causas das fragilidades identificadas, destacamos as seguintes:

Cultura de materialização da intervenção estatal a partir da atuação do governo federal como concertador do atendimento de grupos de interesse, que pressionam por suas pautas (Teoria da Escolha Pública, Teoria dos Grupos, Nota Informativa SEI XXXXX/ME);

Ausência de marco normativo próprio, e de estatura adequada, para a regulação geral da governança (inclusive accountability) e dos processos de formulação, implementação e avaliação de políticas públicas, que estabeleça, especificamente, dentre outros, a obrigatoriedade de estabelecimento e operação da governança e gestão da intervenção estatal.

Falta majoritária de estabelecimento e operação da governança e gestão dos processos de implementação, monitoramento e avaliação das PADR, inclusive no que se refere à mecanismos, produtos e eventos de accountability;

Falta majoritária de definição das posições organizacionais responsáveis pelos papeis de direção, supervisão, execução, monitoramento e avaliação das PADR;

Sobre a causa indicada no item a, aproveita-se a explicação apresentada nos parágrafos 126 a 128, visto que esta condicionante pilotou a formulação das PADR e, dadas as suas características, representa fragilização para o estabelecimento da accountability de políticas públicas.

A ausência de marco normativo próprio para a regulação de governança e gestão de políticas públicas, descrita no item b, também pode ser considerada como causa do presente achado pelos mesmos motivos expostos na Seção 3.2.2.3. do achado anterior (parágrafos 212 e 213) , pois a ausência de norma cogente que imponha a obrigação do estabelecimento de accountability pelos gestores, igualmente, contribui para a situação encontrada relatada neste achado.

As causas registradas nos itens c e d são decorrentes da apontada no item b, sendo o fator imediato que levou a ausência de accountability nas PADR.

Em se tratando das causas b, c e d, pode se afirmar que não havendo marco normativo que tivesse imposto a obrigação do estabelecimento da governança e gestão das PADR, inclusive a accountability das políticas (causa b) ; os processos de trabalho e atividades para implementação, monitoramento e avaliação das PADR não foram adequadamente estabelecidos (causa c) , nem os papeis de governança e gestão das políticas, com suas atribuições, prerrogativas e encargos para a direção, supervisão, coordenação e execução desses processos (causa d) .

E tudo isso concorreu para a falta de accountability das PADR.

Conclui-se que as fragilidades identificadas neste achado têm como efeitos imediatos o estabelecimento de dificuldades para as atividades de direção, supervisão e execução da implementação, do monitoramento e da avaliação das PADR, visto que a falta de accountability não traz somente dificuldades externas à Administração, mas também internas, dadas as longas cadeias hierárquicas existentes dentro das estruturas organizacionais do aparelho do Estado.

Outro efeito imediato é a falta de conhecimento por parte da Administração a respeito dos efeitos das PADR e a consequente impossibilidade de promoção de aprimoramentos nas políticas com base em evidências e análise consistentes, pois se não houve o estabelecimento de processos e papeis de direção e supervisão do monitoramento e avaliação, por exemplo, bem como a designação de responsáveis pelo feito, não há como, ordinariamente, ser possível que a Administração consiga saber o que as PADR têm gerado, como será visto no Achado 3.2.4. a seguir.

Tal como na análise dos efeitos do Achado 3.2.2. (parágrafo 216) , aqui, também se considera que a ausência de accountability nas PADR fragiliza a legitimidade estatal, visto que, neste caso, não são apresentados à sociedade os relatos de uma atuação eficiente em políticas públicas que, assim, contribua para a manutenção dos níveis necessários de confiança da sociedade no Estado, em sua atuação e em seus agentes.

Afirma-se, ainda, que a ausência de accountability nas PADR também concorreu para o consumo dos R$ 5 bilhões anuais pelas PADR, sem comprovação, por parte do governo federal, da alocação e utilização eficiente destes recursos para o tratamento de causas de problemas públicos que afligem a sociedade.

1.7.4. A União não sabe se os poucos efeitos e impactos apontados como resultantes das PADR são efetivos e eficientes para o endereçamento de causas da problemática do baixo desenvolvimento regional.

Devido à lógica de materialização da intervenção estatal a partir da concertação para o atendimento de grupos de interesses; a fragilidades na formulação (problema, modelo lógico, objetivos, indicadores e metas) ; a falhas na estrutura da governança e gestão das políticas; e à ausência de marco normativo que regule toda a atuação estatal em políticas públicas; a União não sabe se os poucos efeitos apontados como resultantes das PADR de que tem conhecimento são efetivos e eficientes para o endereçamento de causas da problemática do baixo desenvolvimento regional, o que leva à inviabilidade de intervenções, ajustes ou redirecionamentos por parte dos condutores das políticas que as aperfeiçoem e as tornem mais eficientes, resultando na consolidação de um fluxo de consumo de recursos públicos financeiros e organizacionais que não se demonstram úteis para o tratamento de causas de problemas públicos que afligem a sociedade.

1.7.4.1. Situação encontrada, evidências e análise

Recapitulando o explanado no parágrafo 179, a formulação consistente de políticas públicas e o desenho e execução de governança e gestão maduras de políticas, é o que permitirá que o governo, suas estruturas organizacionais e agentes públicos saibam quais têm sido os resultados da implementação das políticas em suas distintas dimensões.

No entanto, como não foram estabelecidos processos e papeis também para o monitoramento finalístico e para a avaliação das PADR, como relatado no Achado 3.2.2. (parágrafos 193 a 206) e não há agente público, instâncias colegiadas ou unidades organizacionais accountable por esses ofícios, o ME não monitora a atuação finalista das PADR e, de igual modo, não avalia as políticas, desconhecendo assim os efeitos e impactos, em termos de efetividade e eficiência, que essas intervenções estatais têm gerado no desenvolvimento regional.

No que se refere ao monitoramento, rememora-se que a atuação se reveste de traços cartoriais, com a CGRAU servindo de instância para que as empresas beneficiárias das PADR comprovem estar em compliance com os requisitos estabelecidos pelo marco normativo das políticas, como relatado nas Seções 2.4.3. (parágrafos 61, 62 e 68) e 2.4.4. (parágrafo 72) e analisado no Achado 3.2.2., que tratou das deficiências na definição de processos e papeis de governança e gestão das PADR (parágrafos 201 e 202) . Vale dizer: não há monitoramento finalístico e mesmo o que se tem não é input de eventuais processos avaliativos e decisórios relacionados às PADR.

A avaliação, conforme já registrado neste relatório (parágrafo 203) , não dispõe de processo estruturado e, até setembro de 2022 não havia ocorrido, embora a Sdic tenha informado que uma análise de diagnóstico amplo do PADR, encomendada pela nova gestão da Sepec, estivesse em curso, com a verificação dos indicadores estabelecidos e resultados parciais. Dentre as ações de suporte, há previsão da contratação de consultoria externa com a finalidade de subsidiar a avaliação ex post. (peça 91, p. 2) .

Portanto, é grave constatar que o governo federal não sabe os efeitos, em termos de efetividade e eficiência, que os mais R$ 5 bilhões anuais estão operando nas condições socioeconômicas das regiões beneficiadas com a instalação das plantas fabris da carteira das PADR. De fato, o governo federal não tem como responder, objetivamente, por exemplo, se as PADR estão melhorando (ou não) a competitividade econômica destas regiões; se as políticas induzem (ou não) à formação de capital para sustentar no tempo um desenvolvimento socioeconômico dos territórios; ou se favorecem (ou não) determinados players da indústria automotiva, comprometendo a promoção da competitividade real do segmento.

A situação encontrada reportada está lastreada nas evidências listadas na Tabela 13.

Tabela 13 - Evidências do Achado 3.2.4.

Documento

Descrição

Nota informativa SEI 25922/22/ME (peça 91)

Informa que:

"está sendo estruturado um modelo de governança e gestão da Sepec que segue o padrão [do Decreto 9203/2017 e a 3ª Edição do Referencial Básico de Governança Organizacional do TCU";

As PADR não foram objeto de avaliação ex-post até o momento, mas que há análise de diagnóstico amplo das PADR em curso, encomendada pela nova gestão da Sepec, com a verificação dos indicadores estabelecidos e resultados parciais.

Apêndice C - Visão Geral do Objeto, Seção 8 (peça 126, p. 34)

Demonstram:

o estabelecimento de processos e papeis de governança e gestão das PADR circunscritos às atividades operacionais cartoriais para verificações de compliance ante aos pleitos de aprovação de projetos e produtos (somente no âmbito da Lei 9.440/1997) e às prestações de contas da aplicação de recursos em PD&I, apresentadas trimestralmente pelas empresas beneficiadas.

Apêndice E - Macroprocessos das PADR (peça 126, p. 50)

Apêndice F - Marco normativo de Governança e Gestão das PADR (peça 126, p. 75)

1.7.4.2. Critérios

A análise registrada neste achado foi elaborada com base nos seguintes critérios[footnoteRef:59]: [59: Para consulta aos excertos dos critérios utilizados, vide Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 144) ;]

Constituição Federal, art. 37, caput e § 16;

Lei 9.784/1999, art. ;

Lei 12.527/2011, art. , caput e inciso VII, alínea a, e art. , caput, § 1º, incisos I e V;

Lei 13.971/2019, art. , inciso II (diretrizes PPA XXXXX-2023);

Decreto 9.203/2017, art. , caput e incisos I e II, art. , caput e incisos I, VII e VIII, art. , caput e inciso II;

Decreto 10.609/2021, art. , inciso I;

Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário (RePP 2019) ;

Acórdão 2513/2019-TCU-Plenário;

Acórdão 693/2022-TCU-Plenário;

Acórdão 836/2022-TCU-Plenário;

Guia Ex Ante (p. 72, 94, 98 e 99) ;

Guia Ex Post (p. 241) ;

RBGO (p. 58) ; e

RCPP (p. 97 e 100) .

1.7.4.3. Causas e efeitos

As causas que deram origem à situação encontrada foram as seguintes:

Cultura de materialização da intervenção estatal a partir da atuação do governo federal como concertador do atendimento de grupos de interesse, que pressionam por suas pautas (Teoria da escolha pública, Teoria dos grupos, Nota Informativa SEI XXXXX/ME);

Fragilidades na formulação das PADR, no que se refere à (ao) :

caracterização evidenciada do problema público, suas causas e efeitos, objeto da intervenção (Achado 3.1.2.) ;

estabelecimento de objetivos SMART, metas, indicadores e prazos (Achado 3.1.3.) ;

adoção de teoria e modelo lógico das políticas, que explique como as causas do problema público serão tratados e indique os resultados de longo prazo pretendidos (Achado 3.1.4.) ;

Ausência de marco normativo próprio, e de estatura adequada, para a regulação geral da governança (inclusive accountability) e dos processos de formulação, implementação e avaliação de políticas públicas, que estabeleça, especificamente, dentre outros, a obrigatoriedade de avaliação dede políticas e do estabelecimento e operação da governança e gestão da intervenção estatal;

Falta majoritária de definição das posições organizacionais responsáveis pelos papeis de direção, supervisão, execução, monitoramento e avaliação das PADR;

Falta majoritária de estabelecimento e operação da governança e gestão dos processos de implementação, monitoramento e avaliação das PADR, inclusive no que se refere à mecanismos, produtos e eventos de accountability.

Sobre a causa indicada no item a, novamente aproveita-se a explicação apresentada nos parágrafos 126 a 128, dado ser considerada uma das causas-raiz de todo o estado de coisas identificado na auditoria, culminando na presente situação encontrada de desconhecimento dos efeitos das PADR por parte do governo federal.

As causas indicadas no item b também apresentam a relação de precedência acima citada quanto à situação encontrada do presente achado. De fato, as fragilidades de formulação, relatadas nos Achados 3.1.2., 3.1.3. e 3.1.4., dificultam à condução posterior das políticas, que é o espaço em que se inseririam às atividades de direção, supervisão e execução do monitoramento e da avaliação das PADR, cujas ausências levaram à caracterização da falta de conhecimento quanto aos resultados dessas políticas pelo governo federal.

De igual modo, a ausência de marco normativo para a regulação da governança e gestão de políticas (item"c') , com as consequentes falta de definição de processos e papeis (itens d e e) são consideradas como causas pelos mesmos motivos apresentados nas Seções 3.2.2.3. (parágrafos 212 e 213) e 3.2.3.3. (parágrafos 235 e 236) , visto que não havendo obrigação legal, não há incentivos para que os agentes públicos estabeleçam processos e papeis de monitoramento e avaliação, que executados, caracterizariam situação oposta à verificada neste achado.

A situação encontrada levou ao efeito imediato de concretização: a) do comprometimento da accountability das PADR; b) do estabelecimento de dificuldades para as atividades de direção das políticas; e c) da inviabilidade de aprimoramento dessas intervenções a partir de conclusões e evidências extraídas de processos maduros de monitoramento e avaliação.

O desconhecimento a respeito dos resultados das PADR representa mais um elo que reforça a corrente de fragilização da legitimidade estatal em políticas públicas, em complemento às situações encontradas dos Achados 3.2.2. e 3.2.3., conforme relato dos parágrafos 216 e 240.

Afirma-se, ainda, que a situação encontrada do presente achado fortalece a dinâmica inercial das PADR, com o seu consumo de mais de R$ 5 bilhões anuais, sem que seja possível que o governo comprove perante a sociedade, que estes recursos estão sendo alocados de forma eficiente para o tratamento de causas de um problema público.

1.8. As PADR produziram impactos limitados em termos locais e com alto custo de renúncia de receita por emprego gerado

Devido ao desenho inadequado da política, elaborada para atender a empresas específicas e sem considerar estratégias de desenvolvimento com foco no território, além de desarticuladas da PNDR e das demais políticas para criação de um ambiente de investimentos atrativo; as PADR não promoveram a aglomeração industrial ao redor das fábricas automotivas instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, que adquirem a maior parte de seus insumos de fornecedores das regiões Sul e Sudeste; o que levou ao não alcance do objetivo de descentralizar a indústria automotiva no país e a uma alta renúncia de receita para poucos empregos gerados; sem impacto significativo na promoção do Desenvolvimento Regional.

1.8.1. Situação encontrada, evidências e análise

O impacto da instalação das fábricas automotivas nas regiões NO, NE e CO foi reduzido e localizado. A avaliação realizada mediante a metodologia de controle sintético[footnoteRef:60] indicou que houve um impacto significativo da instalação da fábrica da FCA na região imediata de Goiana-Timbaúba, mais especificamente na própria cidade de Goiana (Gráfico 1) , mas não na Região Intermediária de Recife. O impacto foi medido em termos de Produto Interno Bruto (PIB) per capita, proporção de pessoal ocupado total e de pessoal técnico-científico, e remuneração total, esses três últimos em relação à população. [60: Apêndice B - Metodologia do Controle Sintético (peça 146, p. 10) ;]

No Gráfico 1, é comparada a evolução das quatro variáveis de resultado para a região imediata e a região intermediária. A fábrica da FCA foi inaugurada em 2015. Observa-se que é a partir da chegada da indústria que as três variáveis de resultado na região imediata de Goiana-Timbaúba aumentam e se descolam das variáveis na região imediata sintética. Porém, esse mesmo descolamento não ocorre na região intermediária de Recife.

Gráfico 1 - Resultados das PADR - Método do Controle Sintético

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

A divisão territorial em regiões imediatas e intermediárias se deu conforme estabelecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2017. As regiões imediatas possuem como característica principal a integração na rede urbana, a partir de centros urbanos próximos para a satisfação das necessidades imediatas das populações. Já as regiões intermediárias correspondem a uma escala intermediária entre a unidade da federação e a região imediata, delimitadas pela inclusão de metrópoles, capitais regionais ou centros urbanos representativos para um conjunto de regiões imediatas (IBGE, 2017, p. 20) . Os dois tipos de regiões foram definidos como o território da avaliação de impacto.

A região imediata de Goiana-Timbaúba é formada por onze municípios, entre eles o de Goiana, onde foi instalada a fábrica. A estimativa do IBGE para a população da região imediata em 2019 era de quase 350 mil habitantes. Já a região intermediária de Recife é formada por nove regiões imediatas, com 72 municípios e 5,7 milhões de habitantes.

A conclusão a partir do Gráfico 1 é de que o impacto da instalação da fábrica da FCA foi restrito à região imediata, sem efeitos sobre a região intermediária. Verifica-se que o PIB per capita da região imediata de Goiana-Timbaúba era equivalente ao do controle sintético até 2013. A partir de 2014, em virtude do início das contratações pela FCA, o PIB per capita da região passa a aumentar a uma taxa significativamente maior, até alcançar R$ 38,4 mil em 2019, frente a R$ 15,5 mil do controle sintético.

No caso do pessoal ocupado total, a proporção em relação à população na região imediata de Goiana-Timbaúba chega a 14,64% em 2019, enquanto no controle sintético foi de 11,4%. A diferença de 3,24% sobre a população da região de 347.700 corresponde à 11.258 empregos gerados.

Em 2019, a FCA foi beneficiada com R$ 4,6 bilhões pelo incentivo fiscal da Lei 9.440/1997 (peça 34, Anexo I, p. 6) , que correspondem a R$ 388 milhões por mês. Esse valor, dividido pelos 11.258 empregos gerados, leva a um custo mensal da política por empregado de R$ 34,4 mil, um custo bastante elevado considerando-se os valores transferidos por outros programas, como o Auxílio Brasil com R$ 600,00, ou o Benefício de Prestação Continuada, de R$ 1.212,00. É preciso ressaltar ainda que não estão computados neste custo o valor da renúncia de receita de tributos estaduais e municipais.

No indicador salário e outras remunerações, a região imediata de Goiana-Timbaúba apresentou o valor de R$ 3.689 por habitante em 2019, frente a R$ 2.781 do controle sintético. A diferença de R$ 908 para os 347.700 habitantes da região imediata resulta em um valor de quase R$ 316 milhões de aumento da remuneração como impacto das PADR. Considerando a renúncia fiscal de R$ 4,6 bilhões nesse mesmo ano, entende-se como um alto custo para o Tesouro Federal para um pequeno aumento da renda local.

No caso da variável de resultado pessoal técnico-científico, ela foi usada na avaliação como uma proxy dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) , uma das contrapartidas exigidas pelo § 4º dos arts. 11-A, 11-B e 11-C da Lei 9.440/1997 e § 4º do art. 1º da Lei 9.826/1999. Seguiu-se a metodologia proposta por Araújo, Cavalcante e Alves (2009) , que identificaram elevados coeficientes de correlação entre algumas categorias da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) , classificadas como "pessoal ocupado técnico-científico", e os gastos empresariais em P&D. A partir dos resultados, os autores consideraram tais ocupações como uma variável proxy adequada dos gastos em P&D, e por isso, "na ausência de informações sobre os gastos em inovação, proxies que se apoiem no conceito de pessoal ocupado técnico-científico podem ser construídas para suprir tal deficiência e permitir a avaliação de políticas de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) com base em dados anualizados".

Todos os resultados apresentados no Gráfico 1 (página 63) foram obtidos com a avaliação de impacto realizada por meio do método de Controle Sintético, que segundo Athey e Imbens (2017, p. 9) é "sem dúvida a inovação mais importante na literatura de avaliação de políticas nos últimos 15 anos". A descrição da metodologia utilizada consta do Apêndice B deste relatório (peça 146, p. 10) .

O método de Controle Sintético estima uma unidade de controle semelhante à unidade que recebeu o tratamento, por meio de uma combinação ponderada de unidades do possível grupo de controle (ABADIE, 2021) . A vantagem do método é que elimina a subjetividade na seleção das unidades de comparação, dando pesos a elas de forma a encontrar uma evolução da variável de resultado antes da intervenção governamental que seja a mais semelhante à da unidade tratada.

A Tabela 14 apresenta as regiões imediatas e intermediárias e os respectivos pesos usados para a formação de cada controle sintético, no caso da variável do PIB per capita.

Tabela 14 - Regiões utilizadas para formação do Controle Sintético

Região Imediata

Região Intermediária

Regiões Utilizadas

Pesos (%)

Regiões Utilizadas

Pesos (%)

Porto Calvo/AL

33

Natal/RN

59

São Miguel dos Campos/AL

17

Maceió/AL

26

Maceió/AL

15

Brasília/DF

6

Icó/CE

12

Belém/PA

6

Carpina/PE

11

Aracaju/SE

3

Tauá/CE

9

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

O impacto localizado da instalação da fábrica da FCA em Goiana também pode ser observado pela variação do número de empregados da indústria automotiva nos municípios de Pernambuco e Paraíba, conforme o mapa dos estados no Gráfico 2.

Gráfico 2 - Variação do número de empregados - PE e PB - 2014/2019 (Cnae, divisão 29)

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria, a partir de dados da Rais

O mapa mostra a variação no número de empregados nas empresas com Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae) na Divisão 29 - "Fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias", exceto o grupo 29.5, que abrange o recondicionamento de motores, ou retíficas.

Observa-se que a variação significativa de empregos ocorreu no município de Goiana/PE, onde foi instalada a fábrica da FCA. Os outros municípios com maior variação no número absoluto de empregos na indústria automotiva foram Cabo de Santo Agostinho (269) , Recife (90) e Ribeirão (74) . Todos os demais municípios com variação positiva não tiveram aumento maior do que 10 empregados. Já os municípios com maior variação negativa foram Jaboatão dos Guararapes (-881) e Igarassu (-307) .

A baixa variação do emprego na indústria automotiva nos demais municípios corrobora o resultado do baixo impacto da instalação da fábrica fora da região imediata de Goiana-Timbaúba. Mesmo dentro dessa região, sem considerar o município de Goiana, também não se verifica um impacto relevante, pois o saldo de empregos na indústria automotiva nos demais municípios foi de 3 empregados em Aliança e -41 em Itambé.

É possível verificar que a instalação da fábrica da FCA impactou apenas no município de Goiana, sem efeitos para os municípios da região imediata, como se observa no Gráfico 3, que apresenta a evolução do PIB per capita para os municípios da Região Intermediária de Recife, com as linhas relativas aos municípios da região imediata de Goiana-Timbaúba coloridas. Na região imediata de Goiana, somente este município apresenta crescimento no indicador.

Gráfico 3 - Evolução do PIB per capita nos municípios da Região Intermediária de Recife

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

Linhas coloridas - municípios da Região Imediata Goiana-Timbaúba;

Goiana

Na base de dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) , na região imediata de Goiana-Timbaúba em 2013 existiam duas empresas com Cnae relacionado à fabricação de automóveis, com um total de 143 vínculos em dezembro. Já em 2019, o número de CNPJ aumentou para dezenove, com um total de 10.171 vínculos.

Assim, considerando-se os 11.258 empregos identificados como impacto da instalação da fábrica na região, o aumento de empregos do setor de fabricação de automóveis dentro da região imediata corresponde à 90% do total de empregos gerados considerando os dados de pessoal ocupado do IBGE. Tal fato demonstra novamente um efeito bastante localizado da política, que não teria tido um multiplicador de empregos para outros setores da economia.

Ampliando a análise para a região intermediária de Recife, em 2013 eram 46 CNPJ com 2.809 vínculos; em 2019 eram 61 CNPJ com 12.983 vínculos. A diferença de 10.174 é praticamente igual ao aumento no número de empregos gerados dentro da região imediata de Goiana-Timbaúba, com uma redução de 146 vínculos para o restante da região intermediária, corroborando o resultado da avaliação mediante controle sintético de que a instalação da fábrica não teve efeitos significativos para a região intermediária, restringindo-se à região imediata.

O impacto local limitado das PADR pode ser observado ainda no Gráfico 4, que apresenta a evolução da participação de cada região do país no emprego da indústria automotiva (CNAE 29) entre 2006 e 2020. Verifica-se que há um aumento da participação do Nordeste de 3% para 6% com a implantação da fábrica da FCA em 2015, mas a participação das regiões NO, NE e CO mantém-se bastante limitada, em apenas 8% do emprego total. O mesmo aumento de 3% pôde ser observado na participação da região Sul. O número de empregados das regiões NO, NE e CO aumentou em 16.082 entre 2006 e 2020, enquanto na região Sul o aumento foi de 18.153.

Gráfico 4 - Evolução da participação das regiões no pessoal ocupado na indústria automotiva

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

Já o Gráfico 5 apresenta o mapa do Brasil com a variação do emprego da indústria automotiva no mesmo período para as regiões imediatas. Observa-se que o aumento significativo no emprego nas regiões NO, NE e CO concentrou-se em localidades específicas: apenas quatro regiões imediatas tiveram um aumento superior à 1.000 empregados - Goiana-Timbaúba (10.363) , Aracaju (2.022) , Luziânia-Águas Lindas de Goiás (1.515) e Recife (1.348) . Já no Sul e Sudeste foram 21 regiões imediatas com aumento superior a 1.000 empregados.

Gráfico 5 - Mapa da Variação do pessoal ocupado na indústria automotiva entre 2006 e 2020

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria

Essa concentração da variação do emprego em poucas regiões imediatas nas regiões elegíveis da PADR indica mais uma vez para o impacto localizado da política, que tem como objetivo "descentralizar a indústria automotiva no país".

Um fator que explica a limitação do impacto das PADR é que a política não promoveu a aglomeração industrial ao redor das fábricas beneficiárias. A partir dos relatórios mensais com a base para apuração do crédito presumido de IPI, no âmbito do Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores (Inovar-Auto) , do período entre outubro de 2014 e outubro de 2017, foi identificada a localização dos fornecedores das indústrias beneficiárias das PADR, conforme Tabela 15.

Do total adquirido pelas cinco fábricas, 78% provieram de fornecedores das regiões Sudeste e Sul e apenas 22% das regiões NO, NE e CO. No caso da FCA, apenas 6% foram adquiridos com fornecedores das regiões elegíveis. A HPE foi a que adquiriu a maior proporção nessas regiões, mas 95% das aquisições no estado de Goiás referem-se a compras com empresas das quais a HPE faz parte do quadro societário, e não fica claro se o valor foi realmente adicionado no estado ou se estas outras empresas adquirem de outras regiões.

Tabela 15 - Aquisições (R$ mi) pelas indústrias beneficiárias das PADR, por localização do fornecedor entre 2014 e 2017

Região dos Fornecedores

UF

Total

FCA (PE)

Caoa (GO)

Ford (BA)

HPE (GO)

Valor

%

Valor

%

Valor

%

Valor

%

Valor

%

Sudeste

SP

35.677

38%

16.417

31%

594

84%

17.485

55%

1.174

13%

MG

30.053

32%

27.452

52%

-

0%

2.195

7%

404

5%

RJ

957

1%

820.251

2%

7

1%

130

0%

-

0%

Sul

PR

4.530

5%

3.748

7%

34

5%

681

2%

63

1%

RS

1.855

2%

1.112

2%

1

0%

724

2%

16

0%

SC

516

1%

236

0%

-

0%

276

1%

3

0%

Norte, Nordeste e Centro-Oeste

BA

10.310

11%

174

0%

-

0%

10.135

32%

-

0%

GO

7.138

8%

-

0%

71

10%

-

0%

7.067

81%

PE

2.614

3%

2.500

5%

-

0%

112

0%

1

0%

SE

370

0%

274

1%

-

0%

95

0%

-

0%

AM

265

0%

18

0%

-

0%

246

1%

-

0%

MS

1

0%

-

0%

-

0%

-

0%

-

0%

Total

94.290

52.756

709

32.082

8.730

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria, a partir de dados dos relatórios do Inovar-Auto

Também foi analisada a variação do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) , na dimensão da renda, calculado a partir dos dados do censo em 2000 e 2010, nas localidades beneficiadas com as instalações das fábricas, exceto a FCA, uma vez que esta foi inaugurada apenas em 2015. O objetivo da análise foi verificar se as PADR, instituídas no final dos anos 1990, teriam gerado alguma melhora maior nesse índice de desenvolvimento nas localidades beneficiadas.

O IDHM é uma medida composta de indicadores de três dimensões do desenvolvimento humano: longevidade, educação e renda. O índice varia de 0 a 1 e quanto mais próximo de 1, maior o desenvolvimento humano. O Gráfico 6 apresenta a variação entre 2000 e 2010 do IDHM na dimensão renda para as regiões imediatas e intermediárias, respectivamente, tanto as beneficiadas (linhas coloridas) quanto as elegíveis (linhas brancas) . O que pode ser observado é que as localidades beneficiadas pelas PADR não apresentam uma variação mais significativa que as demais nas regiões NO, NE e CO.

Regiões ImediatasRegiões IntermediáriasGráfico 6 - IDHM Renda entre 2000 e 2010 nas Regiões Imediatas e Intermediárias - NO, NE e CO

Fonte: Elaborado pela equipe de auditoria, a partir de dados do Atlas Brasil

Portanto, considerando que a implantação da fábrica da FCA em Goiana-PE apresentou impacto no PIB per capita, no pessoal ocupado total e no pessoal ocupado técnico-cientifico na região imediata, mas não na região intermediária (parágrafos 259 a 266) ; que a variação do emprego na indústria automotiva nas regiões NO, NE e CO foi bastante concentrada em poucas regiões imediatas (parágrafos 270 a 280) ; que as indústrias beneficiárias adquirem quase 80% de seus insumos junto a fornecedores das regiões Sudeste e Sul (parágrafos 281 e 282) ; e que as localidades beneficiadas pela política apresentaram variação do IDHM pior do que a média das regiões elegíveis (parágrafos 283 e 284) , é possível afirmar que o impacto das PADR foi limitado e localizado, com um alto custo por emprego gerado (parágrafo 264) e sem contribuir com algum impacto consistente para o desenvolvimento regional.

1.8.2. Critérios

A análise registrada neste achado foi elaborada com base nos seguintes critérios[footnoteRef:61]: [61: Para consulta aos excertos dos critérios utilizados, vide Apêndice H - Matriz de Achados (peça 146, p. 151) ;]

Constituição Federal, art. 43, caput, § 1º e inciso I;

Decreto 9.810/2019, art. , inciso III, e art. ;

Evaluating the Costs and Benefits of Corporate Tax Incentives: Methodological Approaches and Policy Considerations - Banco Mundial (KRONFOL; STEENBERGEN, 2020, p. 1) ;

Policy Framework for Investment - OCDE (2015, p. 58) ;

The role of public services and taxes in attracting 'foreign' direct investment (GOODSPEED; MARTINEZ-VAZQUEZ; ZHANG, 2008, p. 152) . In Public Policy for Regional Development;

Place-Based Policies (NEUMARK; SIMPSON, 2015, p. 1206) . In Handbook of urban and regional economics;

Identifying Agglomeration Spillovers: Evidence from Winners and Losers of Large Plant Openings (GREENSTONE; HORNBECK; MORETTI, 2010, p. 537) . In Journal of Political Economy;

Local Labor Market (MORETTI, 2010a, p. 1296, 1297, 1304 e 1305) . In Handbook of Labor Economics;

Cluster Analysis as mode of inquiry; Its use in science and technology policy making in North Carolina (FESER; LUGER, 2003, p. 11 e 12) .

Segue-se breve descrição dos fundamentos materiais dos critérios e os apontamentos quanto aos enquadramentos das PADR em relação a eles.

Segundo a Constituição Federal de 1988:

Art. 43. Para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação em um mesmo complexo geoeconômico e social, visando a seu desenvolvimento e à redução das desigualdades regionais.

§ 1º Lei complementar disporá sobre:

I - as condições para integração de regiões em desenvolvimento; (Grifo nosso)

Este dispositivo constitucional é simples e direto: o desenvolvimento regional tem como foco o território e é promovido a partir da articulação da ação governamental. O desenvolvimento é uma variável multifacetada, e os problemas de uma determinada região não podem ser pensados isoladamente. Assim, em se tratando de desenvolvimento regional, o foco do gestor público deve estar no território, e não em funções governamentais específicas e estanques. Além disso, a Constituição Federal estabelece a integração das regiões em desenvolvimento.

Segundo a Política Nacional de Desenvolvimento Regional (Decreto 9.810/2019):

Art. 2º São princípios da PNDR:

[...]

III - planejamento integrado e transversalidade da política pública;

Entretanto, as PADR não estão articuladas com as demais políticas que poderiam corrigir as desvantagens naturais das regiões NO, NE e CO.

Segundo a literatura de organismos internacionais como o Banco Mundial e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) , os incentivos fiscais, por si só, não possuem a capacidade de atrair os investimentos, outros fatores são tão ou mais importantes na tomada de decisão da alocação de plantas fabris pelos agentes privados. Segundo a OCDE (2015, p. 58) :

Apesar da análise indicar uma resposta limitada do investimento a uma carga tributária menor devido à renúncia de receita, os incentivos fiscais são rotineiramente escolhidos pelos governos para atrair investimentos em geral e o investimento estrangeiro direto (IDE) em particular. A lógica por trás dessa prática generalizada é óbvia, particularmente no contexto dos países em desenvolvimento. É muito mais fácil conceder incentivos fiscais do que corrigir deficiências, por exemplo, de infraestrutura ou mão de obra qualificada. (Grifo nosso)

Para a entidade, a carga tributária é um de diversos fatores considerados pelos potenciais investidores na decisão acerca da localização. Entre os fatores críticos considerados estão "os custos e riscos associados a condições macroeconômicas e de negócios, o custo de conformidade com leis, regulamentos e práticas administrativas, tamanho do mercado, condições da força de trabalho e, acima de tudo, oportunidades de lucro específicas de cada local" (OCDE, 2015, p. 58) .

Para o Banco Mundial (KRONFOL; STEENBERGEN, 2020, p. 1) , "evidências globais sobre decisões de localização de investimentos sugerem que, embora os incentivos fiscais possam ajudar a atrair investimentos, outros fatores, como o clima de investimento mais amplo e as oportunidades de mercado, são mais importantes". Por conseguinte, para a entidade, os incentivos fiscais devem ser concebidos como "parte da estrutura mais ampla da política de investimento de um país".

Essa visão é corroborada por Goodspeed, Martinez-Vazquez e Zhang (2008, p. 152) , que verificaram que:

É muito improvável que as empresas estejam dispostas a pagar impostos que não correspondam ao nível e qualidade desejados dos serviços públicos e que, tudo o mais constante, é improvável que impostos mais baixos per se atraiam IDE [investimento direto estrangeiro], a menos que certo nível e qualidade de serviços públicos serviços estejam em vigor.

Segundo Neumark e Simpson (2015, p. 1206) , as políticas baseadas no local, entre as quais estão as políticas voltadas para as regiões menos desenvolvidas, possuem como um dos seus principais argumentos a maior eficiência decorrente das economias de aglomeração. Para Greenstone, Hornbeck e Moretti (2010, p. 537) , ao analisarem as externalidades de plantas industriais atraídas a partir de subsídios governamentais:

A principal justificativa econômica para esses incentivos depende se a atração de novas plantas industriais gera externalidades de aglomeração. Na ausência de externalidades positivas, é difícil justificar o uso do dinheiro do contribuinte para subsídios com base em razões de eficiência econômica.

Moretti (2010a, p. 1296) afirma que, em geral, os economistas afirmam que existem duas possíveis racionalidades para a intervenção governamental: equidade e eficiência. E as políticas de desenvolvimento local e regional não são exceções. No caso da equidade, o autor afirma que "é tentador para os formuladores apoiarem políticas destinadas a ajudar as áreas desfavorecidas. O principal argumento a favor dessas políticas é que, ao ajudar as áreas desfavorecidas, o governo ajuda as pessoas desfavorecidas" (MORETTI, 2010a, p. 1297) .

Porém, segundo os modelos de equilíbrio espacial propostos por Moretti (2010a) , esse argumento é, pelo menos em parte, falho, uma vez que é improvável que os mais pobres capturem totalmente os benefícios dos subsídios baseados na localização. "Em um mundo onde os trabalhadores são móveis, segmentar locais em vez de indivíduos é uma maneira ineficaz de ajudar indivíduos desfavorecidos" (MORETTI, 2010a, p. 1297) .

Quando à segunda racionalidade, da eficiência, "a questão-chave a este respeito é: existem falhas de mercado que sugerem que os governos devem usar o dinheiro dos contribuintes para fornecer subsídios de aumento de eficiência para as empresas se instalarem em sua jurisdição?" (MORETTI, 2010a, p. 1304) .

A lógica de eficiência mais importante para incentivos baseados em localização é a existência de externalidades de aglomeração significativas. Esse raciocínio depende de a atração de novos negócios gerar algum tipo de benefício externo para outras empresas na mesma localidade. Se a atração de novos negócios gera externalidades de aglomeração positivas, então a provisão de subsídios pode ser capaz de gerar a alocação eficiente de recursos na economia local.

A intervenção do governo na forma de subsídios para que as empresas se instalem na jurisdição tem o potencial de iniciar um processo de aglomeração que pode, em última análise, mudar uma localidade de um equilíbrio ruim (pequena aglomeração, baixa produtividade) para um bom equilíbrio (grande aglomeração, alta produtividade) . A concessão de um subsídio pode ter efeitos substanciais e duradouros sobre o nível de equilíbrio da atividade econômica em uma localidade (MORETTI, 2010a, p. 1305) .

Segundo Feser e Luger (2003, p. 11) , a importância da formação de "clusters" industriais é um consenso entre cientistas e economistas do desenvolvimento regional. Tanto que os autores propõem que o modelo de aglomeração seja usado como um método para a tomada de decisão acerca da política industrial, pois a "análise de cluster é semelhante à análise custo-benefício, que se tornou popular nas décadas de 1970 e 1980 como uma forma de entender as complexas compensações entre investimentos iniciais e benefícios de longo prazo" (FESER; LUGER, 2003, p. 12) .

Portanto, para um incentivo fiscal voltado para a atração de novas plantas industriais ser justificado, é necessário que ele gere externalidades de aglomeração, que são os efeitos positivos decorrentes da aproximação da nova planta com outras empresas na mesma região.

Porém, o que se observa é que as PADR estão desarticuladas das políticas de investimentos e de desenvolvimento regional. Ao serem pensadas para incentivar empresas específicas individualmente, sem considerar a necessidade de formação de cadeias produtivas, as PADR não atacam as alegadas "desvantagens naturais" das regiões NO, NE e CO.

As PADR estão distantes das demais estratégias usadas pela PNDR que elege como um de seus objetivos (art. 3º do Decreto 9.810/2019)

IV - fomentar a agregação de valor e a diversificação econômica em cadeias produtivas estratégicas para o desenvolvimento regional, observados critérios como geração de renda e sustentabilidade, sobretudo em regiões com forte especialização na produção de commodities agrícolas ou minerais [grifo nosso].

Enfim, o que se observa, tanto da Constituição Federal, quanto da PNDR, além da literatura nacional e internacional acerca do desenvolvimento regional, é que os incentivos fiscais por si só não são capazes de atrair investimentos. As PADR, ao se distanciarem da estratégia de criação de cadeias produtivas, focando em empresas específicas, não foram capazes de promover a aglomeração industrial e contribuir para o desenvolvimento regional.

1.8.3. Causas e efeitos

As causas que deram origem à situação encontrada foram as seguintes:

Condição privilegiada das montadoras no concerto dos grupos de interesse, "em detrimento dos demais segmentos empenhados no desenvolvimento setorial" (Notas Informativas SEI 27744 e 28426/2022/ME);

Não participação dos órgãos e instâncias próprias do Poder Executivo para o tema do desenvolvimento regional na instituição e renovações das PADR (Lei 13.844/2019, art. 29, inciso I, Decreto 11.065/2022, art. , inciso I, e Decreto 9.810/2019, art. , § 7º, art. 10 e art. 11, inciso I) na formulação das PADR (Nota Informativa 4/2022/SMDRU/MDR);

Fragilidades na formulação das PADR, no que se refere à (ao) :

caracterização evidenciada do problema público, suas causas e efeitos, objeto da intervenção (Achado 3.1.2) ;

estabelecimento de objetivos SMART, metas, indicadores e prazos (Achado 3.1.3) ;

adoção de teoria e modelo lógico das políticas, que explique como as causas do problema público serão tratados e indique os resultados de longo prazo pretendidos (Achado 3.1.4) .

A situação descrita no item a pode ser apontada como causa de as PADR não terem promovido aglomeração industrial pelo fato de estas políticas terem sido formuladas para atender a empresas específicas, como registrado na situação encontrada do Achado 3.1.2 (parágrafos 117 e 118) e analisado na seção de causas e efeitos do mesmo achado (parágrafos 126 e 127) ; e não como parte de uma política integrada de desenvolvimento regional que efetivamente buscasse corrigir as "desvantagens naturais" e que visasse a criação de cadeias produtivas.

A respeito da parte final do parágrafo anterior, a causa apontada no item b é indicada pelos mesmos motivos declarados na análise das causas do Achado 3.1.2 (parágrafo 128) , por se considerar, em princípio, que a participação dos órgãos e instâncias federais com mandato em desenvolvimento regional nas discussões iniciais de formulação das PADR, poderia ter trazido entendimento mais qualificado sobre a problemática do baixo desenvolvimento (o que poderia ter levado até a outros desdobramentos em formulação) , e, se fosse o caso, para a necessária atuação integrada das PADR dentro da carteira de iniciativas do governo federal no tema.

Refém do contexto das causas anteriores, o baixo impacto das PADR também se deve a sua formulação inadequada descrita no item c.

A esse respeito, pode-se afirmar que a formulação das PADR, que se deu sem lastro em diagnóstico de problema público (Achado 3.1.2) , sem definição de objetivos concretos, metas, indicadores e prazos (Achado 3.1.3) , e sem modelo lógico que demonstrasse como as políticas tratariam um problema público ao menor custo possível (Achado 3.1.4) , condicionaram a performance inefetiva das PADR relatadas no presente achado.

Com relação aos efeitos, vê-se que as PADR foram concebidas sob o alegado objetivo de promover o desenvolvimento regional, ao atrair a instalação de indústrias automotivas por meio de incentivos fiscais de forma a "neutralizar das desvantagens naturais" das regiões NO, NE e CO (BRASIL, 1996b, p. 1) . Entretanto, os documentos da política não mencionam quais seriam estas desvantagens e quais fatores levariam as empresas a se concentrarem nas regiões Sudeste e Sul.[footnoteRef:62] [62: Alegações como essa, de "desvantagens naturais" de uma região, certamente que poderiam figurar como "problema público" e, assim, subsidiar a formulação de política pública. Contudo, conforme relatado no Achado 3.1.2, no caso concreto, o que se nota é a existência de uma declaração, desacompanhada de evidenciação, tanto do alegado, como de suas causas e efeitos. De igual modo, não se tem o registro de uma atividade estruturante também desse momento de gênese de políticas, que seria a análise do racional desse alegado problema público por parte da Administração, para, assim, decidir por inseri-lo, ou não, na agenda de políticas;]

No entanto, a partir da avaliação aqui apresentada, verificou-se que as PADR tiveram impacto limitado e localizado, principalmente porque não promoveram a aglomeração industrial ao redor das fábricas beneficiárias da política, que adquirem a maior parte de seus insumos de fornecedores das regiões Sul e Sudeste.

Em virtude disso, a instalação das fábricas beneficiárias não promoveu a aglomeração industrial e apenas 22% de seus insumos são adquiridos dentro das regiões elegíveis, a maior parte é adquirida de fornecedores das regiões Sudeste e Sul. Como resultado, as PADR representam um elevado custo de renúncia de receitas de cerca de R$ 34 mil mensais por emprego gerado, considerando o caso da instalação da fábrica da FCA em Pernambuco.

CONCLUSÃO

O mandato conferido pelo Acórdão 671/2022-TCU-Plenário à auditoria estabeleceu que o trabalho deveria "avaliar as políticas de desenvolvimento regional estabelecidas para o setor automotivo pelas Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, além dos resultados da concessão de benefícios tributários dos regimes automotivos regionais", denominados PADR em todo esse relatório.

A partir desse objetivo de auditoria foram estabelecidos: a questão fundamental do trabalho (parágrafo 2, página 7) , uma estrutura analítica com duas dimensões (maturidade de políticas públicas e resultados) , desdobrada em questões de auditoria que investigaram sobre a formulação das políticas (diagnóstico de problema público, desenho e institucionalização) , governança e gestão (desenho e operação) ; e resultados das PADR[footnoteRef:63]. [63: As questões de auditoria estão descritas no Apêndice G - Matriz de Planejamento (peça 146, p. 81) , e de forma estruturada no Apêndice A - Processo de Trabalho e Método de Auditoria - Tabela 2 (peça 146, p. 6) ;]

As investigações e análises seguintes levaram à conclusão da auditoria pela existência dos achados relatados na Seção 3 (página 20) .

Como reportado, as PADR não foram concebidas a partir de diagnóstico de problema público e de suas causas, mas em face de atuação concertadora do governo na conciliação de grupos de interesse, em que se teve a prevalência de um destes (Achado 3.1.2, página 32) .

Na ausência de diagnóstico, a formulação das PADR ocorreu sem se fundamentar em evidências, nem orientada à resolução de um problema público, por meio do tratamento de suas causas. Isso levou à instituição das PADR como políticas que não têm objetivos concretos (Achado 3.1.3, página 36) , nem um modelo lógico que demonstre o que está tratando, de que maneira, demonstrando fazer isso ao menor custo possível (Achado 3.1.4, página 40) .

No campo da governança e gestão, a auditoria também identificou deficiências graves.

Boa parte da definição de papeis de direção, supervisão e coordenação da implementação, do monitoramento e da avaliação das políticas não ocorreu nem é executada nas PADR, senão a atuação cartorial da CGRAU, dada as obrigações de compliance das empresas beneficiárias (Achado 3.2.2, página 51) . Este contexto gerou duas outras situações: a falta de accountability das PADR e dos agentes (Achado 3.2.3, página 55) e o desconhecimento por parte do governo federal quanto ao endereçamento de causas da problemática do baixo desenvolvimento regional a partir dos poucos efeitos e impactos de que se tem conhecimento e que são apontados como resultantes das políticas (Achado 3.2.4, página 59) .

A respeito dos achados que tratam da maturidade de políticas públicas das PADR, é interessante perceber as relações causais que eles apresentam, demonstrando que se a política pública não é concebida para o tratamento de um problema de relevância pública, cujas causas tenham sido previamente diagnosticadas[footnoteRef:64], as etapas seguintes na formulação ficam sem os subsídios técnicos e os incentivos necessários para que sejam produzidas com qualidade, como revelado na Figura 8, na descrição das causas do Achado 3.1.4. (página 42) . [64: Sem prejuízo de que o tratamento das causas desse problema, eventualmente, também seja parte da agenda de grupos de interesses. Não se trata de caminhos antagônicos;]

Igual contexto de falta de subsídios técnicos e de incentivos necessários chega como efeito para o desenho e operação da governança e gestão das políticas, com os resultados listados no parágrafo 320. Ou seja: não tendo sido bem formulada, as PADR se revelaram um objeto difícil de ser tratado como alvo de estruturação e operação de governança e gestão de políticas.

Esse perfil de maturidade de políticas públicas é que levou as PADR a gerar baixos resultados, como o alto custo mensal de R$ 34,4 mil por "emprego gerado" na planta fabril do Grupo Stelantis em Goiana/PE (parágrafo 264) , sem que, com isso, tenham ocorrido alterações significativas na realidade socioeconômica desse município. O Achado 3.3. (página 62) revela que esse perfil de falta de impacto socioeconômico também se deu nos demais territórios que tiveram plantas instaladas sob o lastro dos benefícios tributários das PADR, e tudo isso, ao custo anual de mais de R$ 5 bilhões, conforme estimativas da RFB (Tabela 5, página 19) . Um custo que é redistribuído para todos os demais pagadores de impostos.

A compreensão quanto às causas dos Achados das PADR e à relação causal entre eles, é que fundamenta os escritos a seguir, focados no tratamento das causas das situações encontradas desses achados. Tudo ponderado à luz da Resolução TCU 315/2020.

Aqui, primeiramente, destaca-se que; embora a ausência de marco normativo regulatório geral da governança (inclusive accountability) e processo de políticas públicas tenha sido identificada como causa do conjunto de achados sobre governança e gestão de políticas (Seção 3.2, página 43) ; a auditoria não propõe medida no tema, dado que o escopo do trabalho foi somente o das PADR e não o panorama das políticas públicas federais, cujos responsáveis pela regulação seriam outros agentes, que não os designados para essas políticas.

Nada obstante, registra-se, por oportuno, que a eventual regulação da governança e gestão de políticas não seria uma inovação. O governo federal dos Estados Unidos da América, por exemplo, desde 1993, ou seja, há quase trinta anos, adota o Government Performance and Results Act, que foi estabelecido para "melhorar o gerenciamento dos programas de todo o governo federal", em que "agências são obrigadas a desenvolver um plano estratégico, desdobrando sua missão, os objetivos de longo prazo para as suas principais funções, medidas de desempenho e prestações de contas dos resultados"[footnoteRef:65] [65: https://www.dol.gov/agencies/eta/performance/goals/gpra. Consulta em 29/9/2022;]

Quanto às demais causas, seguem as propostas.

Duas propostas de ciência são apresentadas para fazer com que o eventual processo de renovação das PADR[footnoteRef:66] ocorra com atenção estrita ao regramento de encaminhamento e análise de proposições normativas (há tempos vigente) e às normas que regulam a conduta, conforme a seguir: [66: A vigência corrente estende-se até 31/12/2025, conforme Lei 9.440/1997, art. 11-C e Lei 9.826/1999, art. , § 3º;]

Dar ciência aos agentes titulares dos cargos de Ministro de Estado Chefe da Casa Civil e de Subchefe da Subchefia de Análise Governamental, com fundamento na Resolução TCU 315/2020, art. 9º, de que a análise quanto ao mérito, oportunidade e compatibilidade das propostas normativas com as políticas e diretrizes do governo, diretamente ou mediante delegação, sem manifestação expressa, conclusiva e fundamentada tecnicamente quanto à existência e ao conteúdo dos documentos descritos no Decreto 9.191/2017, art. 27 e 32 (anteriores Decretos 1.937/1996, art. 19 e Anexo I; 2.954/1999, art. 28 e Anexo I; e 4.176/2002, art. 35 e Anexo I) , como verificado nas propostas normativas das Medidas Provisórias XXXXX-2/1997, 471/2009, 512/2010 e 843/2018) , caracteriza conduta irregular em relação ao princípio da eficiência disposto na Constituição Federal, art. 37, caput; e, ainda, ao estabelecido na Lei 13.844/2019, art. , inciso I, alínea c; no Decreto 10.907/2021, Anexo I, art. , incisos II, III e IV, art. 10, incisos I, II, III e IV; e pelo Decreto 9.191/2017, art. 24, inciso I; comprometendo a eficiência da atuação do governo federal em políticas públicas, as quais devem ser estabelecidas para a solução de problemas públicos (Decreto 9.191/2017, art. 27, inciso I, alínea a, e art. 32, incisos I, II, III e IV);

Dar ciência aos agentes titulares dos cargos de: a) Ministro da Economia ou do futuro titular da pasta ministerial incumbida do papel de órgão gestor das PADR, nos termos do Decreto 9.834/2019; b) Ministro Chefe da Casa Civil; c) Subchefe de Análise Governamental; d) Subchefe de Articulação e Monitoramento; e) Secretário Especial de Relações Governamentais; f) Ministro Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República; e g) Subchefe da Subchefia de Assuntos Jurídicos, nos termos da Resolução TCU 315/2020, art. 9º, de que o envio de proposta normativa ao Congresso Nacional visando à prorrogação das Políticas Automotivas de Desenvolvimento Regional (PADR) , instituídas pelas das Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, sem a revisão e alteração estrutural destas no que se refere a: a) formulação fundamentada em diagnóstico objetivo e evidenciado de problema público que irá tratar; b) definição de objetivos específicos, mensuráveis, alcançáveis, realistas e aferíveis no tempo, além de indicadores, prazos e metas nas dimensões de efetividade, eficácia e eficiência; c) teoria e modelo lógico adotado que explique como as PADR tratarão o problema público e trará resultados no longo prazo, ao menor custo possível, conforme comprovação evidenciada de análise de alternativas; d) estabelecimento da governança, inclusive accountability, e gestão estratégica, tática e operacional para a direção, supervisão, coordenação e operação de todos os processos, eventos e produtos de formulação/revisão, implementação, monitoramento e avaliação; poderá caracterizar conduta irregular ante ao estabelecido na Constituição Federal, art. 37, caput, e § 16, Decreto 9.203/2017, Decreto-Lei 4.657/1942 c/c Decreto 9.830/2019, art. 12, caput, §§ 1º e 7º;

A auditoria avalia que as ciências propostas tratam das causas raiz das fragilidades de formulação das PADR, estabelecendo clareza para a Administração quanto aos critérios e demais aspectos materiais que devem ser observados pelos agentes públicos accountable pelas proposições e análise de propostas normativas no âmbito dessas políticas, notadamente quanto à renovação dessas.

Visando à melhora da governança e gestão das PADR, e considerando, de igual modo, o marco normativo vigente no tema, bem como as manifestações iniciais de Sepec e Sdic a respeito (peça 91, p. 1-2) , é proposto que seja endereçada determinação ao ME para que atue em favor do amadurecimento de sua condução, enquanto órgão gestor das PADR.

Determinar, nos termos da Resolução TCU 315/2015, art. 2º, inciso I, art. , inciso I, art. , § 3º, inciso I, ao Ministério da Economia ou ao ministério que o suceder como órgão gestor das PADR, conforme Decreto 9.834/2019, para que, em face dos termos da Constituição Federal, art. 37, § 16, da Lei 9.784/1999, art. , do Decreto 9.203/2017, do Decreto 9.834/2019, art. e Anexo I; e com base nos achados deste relatório de auditoria, apresente, em até noventa dias a este Tribunal, Plano de Ação, com designação de medidas, responsáveis (nível estratégico) e prazos de implementação, para a/o:

avaliação das PADR a partir da realização de diagnóstico atualizado do problema público nos territórios (não somente municípios e região imediata) em que se teve instalação de projetos beneficiados pelas Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, tendo como referência o posicionamento estabelecido, adotado ou aprovado pelas instâncias legítimas do Poder Executivo para tratar da problemática do baixo desenvolvimento regional, contemplando também, tudo com base em evidências: a análise de alternativa de interrupção ou redução da intensidade da intervenção estatal; e, se for o caso, o redesenho das PADR;

estabelecimento de todos os papeis de direção, supervisão, coordenação, operação e outros que se identificarem necessários; instâncias decisórias (individuais ou colegiadas) , bem como os processos, atividades e produtos afetos e necessários à formulação/revisão, monitoramento e avaliação das PADR;

amadurecimento da governança e gestão estratégica, tática e operacional das PADR, com a designação dos agentes responsáveis por cada um dos papeis definidos como resultado do atendimento do item anterior.

Um último encaminhamento é proposto: que seja dada ciência dos achados da auditoria nas PADR para todas as comissões afetas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. Aqui, o objetivo é contribuir para o necessário e premente aperfeiçoamento das políticas públicas do governo federal, a bem dos pagadores de impostos, do presente e do futuro, que subsidiam todas as intervenções estatais.

PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

Ante o exposto, apresentamos as seguintes propostas de encaminhamento à consideração superior.

Dar ciência aos agentes titulares dos cargos de Ministro de Estado Chefe da Casa Civil e de Subchefe da Subchefia de Análise Governamental, com fundamento na Resolução TCU 315/2020, art. 9º, de que a análise quanto ao mérito, oportunidade e compatibilidade das propostas normativas com as políticas e diretrizes do governo, diretamente ou mediante delegação, sem manifestação expressa, conclusiva e fundamentada tecnicamente quanto à existência e ao conteúdo dos documentos descritos no Decreto 9.191/2017, art. 27 e 32 (anteriores Decretos 1.937/1996, art. 19 e Anexo I; 2.954/1999, art. 28 e Anexo I; e 4.176/2002, art. 35 e Anexo I), como verificado nas propostas normativas das Medidas Provisórias XXXXX-2/1997, 471/2009, 512/2010 e 843/2018) , caracteriza conduta irregular em relação ao princípio da eficiência disposto na Constituição Federal, art. 37, caput; e, ainda, ao estabelecido na Lei 13.844/2019, art. , inciso I, alínea c; no Decreto 10.907/2021, Anexo I, art. , incisos II, III e IV, art. 10, incisos I, II, III e IV; e pelo Decreto 9.191/2017, art. 24, inciso I; comprometendo a eficiência da atuação do governo federal em políticas públicas, as quais devem ser estabelecidas para a solução de problemas públicos (Decreto 9.191/2017, art. 27, inciso I, alínea a, e art. 32, incisos I, II, III e IV);

Dar ciência aos agentes titulares dos cargos de: a) Ministro da Economia ou do futuro titular da pasta ministerial incumbida do papel de órgão gestor das PADR, nos termos do Decreto 9.834/2019; b) Ministro Chefe da Casa Civil; c) Subchefe de Análise Governamental; d) Subchefe de Articulação e Monitoramento; e) Secretário Especial de Relações Governamentais; f) Ministro Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República; e g) Subchefe da Subchefia de Assuntos Jurídicos, nos termos da Resolução TCU 315/2020, art. 9º, de que o envio de proposta normativa ao Congresso Nacional visando à prorrogação das Políticas Automotivas de Desenvolvimento Regional (PADR) , instituídas pelas das Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, sem a revisão e alteração estrutural destas no que se refere a: a) formulação fundamentada em diagnóstico objetivo e evidenciado de problema público que irá tratar; b) definição de objetivos específicos, mensuráveis, alcançáveis, realistas e aferíveis no tempo, além de indicadores, prazos e metas nas dimensões de efetividade, eficácia e eficiência; c) teoria e modelo lógico adotado que explique como as PADR tratarão o problema público e trará resultados no longo prazo, ao menor custo possível, conforme comprovação evidenciada de análise de alternativas; d) estabelecimento da governança, inclusive accountability, e gestão estratégica, tática e operacional para a direção, supervisão, coordenação e operação de todos os processos, eventos e produtos de formulação/revisão, implementação, monitoramento e avaliação; poderá caracterizar conduta irregular ante ao estabelecido na Constituição Federal, art. 37, caput e § 16, Decreto 9.203/2017, Decreto-Lei 4.657/1942 c/c Decreto 9.830/2019, art. 12, caput, §§ 1º e 7º;

Determinar, nos termos da Resolução TCU 315/2015, art. 2º, inciso I, art. , inciso I, art. , § 3º, inciso I, ao Ministério da Economia ou ao ministério que o suceder como órgão gestor das PADR, conforme Decreto 9.834/2019, para que, em face dos termos da Constituição Federal, art. 37, § 16, da Lei 9.784/1999, art. , do Decreto 9.203/2017, do Decreto 9.834/2019, art. e Anexo I; e com base nos achados deste relatório de auditoria, apresente, em até noventa dias a este Tribunal, Plano de Ação, com designação de medidas, responsáveis (nível estratégico) e prazos de implementação, para a/o:

a.1. avaliação das PADR a partir da realização de diagnóstico atualizado do problema público nos territórios (não somente municípios e região imediata) em que se teve instalação de projetos beneficiados pelas Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, tendo como referência o posicionamento estabelecido, adotado ou aprovado pelas instâncias legítimas do Poder Executivo para tratar da problemática do baixo desenvolvimento regional, contemplando também, tudo com base em evidências: a análise de alternativa de interrupção ou redução da intensidade da intervenção estatal; e, se for o caso, o redesenho das PADR;

a.2. estabelecimento de todos os papeis de direção, supervisão, coordenação, operação e outros que se identificarem necessários; instâncias decisórias (individuais ou colegiadas) , bem como os processos, atividades e produtos afetos e necessários à formulação/revisão, monitoramento e avaliação das PADR;

a.3. amadurecimento da governança e gestão estratégica, tática e operacional das PADR, com a designação dos agentes responsáveis por cada um dos papeis definidos como resultado do atendimento do item anterior;

Encaminhar cópia deste acórdão, acompanhado do voto e relatório que o fundamentam: a) ao Congresso Nacional; b) às Comissões Permanentes da Câmara dos Deputados: de Fiscalização Financeira e Controle; de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços; de Finanças e Tributação; e de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia; e c) às Comissões Permanentes do Senado Federal: de Assuntos Econômicos; de Desenvolvimento Regional e Turismo; e de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor; informando-lhes dos seguintes achados da presente auditoria, como subsídio para as discussões e decisões legislativas de aperfeiçoamento do marco normativo federal de políticas públicas (processos, produtos, atividades, governança, gestão e accountability de direção, supervisão, coordenação e operação da formulação, revisão, coordenação, implementação, monitoramento e avaliação de políticas) , em especial daquele que regula as Políticas Automotivas de Desenvolvimento Regional (PADR) , instituídas pelas Leis 9.440/1997 e 9.826/1999:

a.4. As PADR não foram estabelecidas para a resolução de um problema público previamente diagnosticado e não são operadas para esse fim. As PADR não foram gestadas para resolver ou mitigar, objetivamente, um problema público verificado no seio da sociedade, e que tenha tido seus contornos, causas e efeitos, identificados, evidenciados e estudados. As políticas foram concebidas e, até hoje, são operadas sem lastro confiável, em termos lógico-racionais, do que seja a problemática do baixo desenvolvimento regional e de suas múltiplas causas, de modo que atua de forma incerta no tema. Além disso, não se sabe se os benefícios tributários concedidos pelas PADR para indústria automotiva são um instrumento para a promoção do desenvolvimento regional (porque não há demonstração de como essa instrumentalização atacaria esse problema) ou se visam beneficiar a indústria automotiva em si, e neste caso, igualmente, não houve diagnóstico da problemática da competitividade da indústria automotiva brasileira e de suas causas, que assim deveria ser objeto das PADR;

a.5. A União não sabe que resultados quer atingir com as PADR, visto que essas políticas não têm objetivos SMART concretos, indicadores, metas e prazos, que demonstrem como tratarão as causas de um problema público suficientemente diagnosticado e legitimamente decidido a ser introduzido na agenda pública, e que encarguem agentes e órgãos para a sua consecução. As PADR não possuem objetivos concretos, que sejam SMART (específicos, mensuráveis, atingíveis, realistas e delimitados no tempo) . O conjunto de indicadores não está oficializado e é insuficiente para permitir o bom monitoramento do desempenho e a aferição dos resultados e impactos das intervenções governamentais. Os indicadores existentes não possuem metas, nem estão atrelados aos objetivos. Além disso, não representaram desdobramento como encargo de nenhum agente, unidade ou órgão da Administração, de modo que, ao fim, não operam efeito prático como algo a ser visado pela Administração;

a.6. As PADR não estão alicerçadas em teoria clara, nem em modelo lógico que explique como as políticas tratarão um problema público, ao menor custo possível. As PADR não possuem teoria e modelo lógico claros que expressam, de forma objetiva e evidenciada, como a intervenção estatal irá incidir, ao menor custo possível, sobre as causas de um problema que aflige a sociedade, nem os resultados e impactos de longo prazo esperados. Tanto a instituição das políticas, em 1996 e 1999, como as renovações em 2010, 2011 e 2018, não se deram com o subsídio de modelo lógico que demonstrasse como a concessão de benefícios tributários para a indústria automotiva e, incidente sobre o IPI (que impacta o custo de consumo) , promoveria tratamento de causas de algum problema público no campo da competitividade da indústria automotiva brasileira ou do baixo desenvolvimento regional das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, com o legado sustentável decorrente dessas intervenções;

a.7. As competências e responsabilidades dos agentes e das unidades envolvidas, bem com os principais processos de governança e gestão de implementação, monitoramento e avaliação foram fragilmente estabelecidos, e de forma não clara, no marco normativo das PADR. A governança e gestão das PADR não estabeleceram papeis e responsáveis específicos (inclusive para o Ministério do Desenvolvimento Regional, titular do tema do desenvolvimento regional no Poder Executivo) , com prerrogativas e encargos para o exercício das atividades de direção geral, supervisão e coordenação da implementação, do monitoramento e da avaliação das políticas. As poucas atividades relacionadas ao monitoramento (parcialmente, carentes de lastro normativo) não são input de processos avaliativos e decisórios relacionados às políticas, além de restringirem-se à verificação do cumprimento de obrigações por partes dos beneficiários das PADR, tendo, assim, natureza cartorial. Não há previsão de que a efetividade das políticas, em si, seja parâmetro para a conduta do alto escalão do Ministério da Economia, na direção, monitoramento e avaliação das PADR, não obstante o Decreto 9.834/2019 apontar o ME como órgãos gestor das PADR;

a.8. As PADR não são accountable em todos os níveis de governança e gestão. As PADR não contam com definição de produtos, processos e eventos de accountability. Não há previsão de que os gestores das políticas, em todos os níveis (do Ministro da Economia até a Coordenação-Geral de Implementação e Fiscalização dos Regimes Automotivos) , prestem contas dos resultados das suas atuações no âmbito das PADR, a algum agente ou instância superior. Qualquer decisão ou omissão dos agentes das PADR não lhes gera consequência de nenhuma natureza;

a.9. A União não sabe se os poucos efeitos e impactos apontados como resultantes das PADR são efetivos e eficientes para o endereçamento de causas da problemática do baixo desenvolvimento regional. O Ministério da Economia não monitora os resultados das PADR, nem realizou processo de avaliação ex post das políticas, desconhecendo, assim, se os poucos efeitos e impactos apontados como resultantes das PADR de que tem conhecimento tratam, de alguma maneira e ao menor custo possível, as causas do baixo desenvolvimento regional;

a.10. As PADR produziram impactos limitados em termos locais e com um alto custo de renúncia de receita por emprego gerado. As PADR, ao custo de mais de R$ 5 bilhões anuais e mais de R$ 50 bilhões desde 2010, tiveram impacto pequeno e localizado no PIB per capita, no emprego geral e no emprego técnico-científico, não contribuindo assim para o desenvolvimento regional, seu maior objetivo. A instalação das fábricas beneficiárias não resultou em aglomeração industrial ao seu redor, e as empresas compram a maior parte de seus insumos de fornecedores das regiões Sudeste e Sul. (...) "

É o Relatório.

Trata-se de Relatório de Auditoria voltado a avaliar a situação presente da maturidade e dos resultados das Políticas Automotivas de Desenvolvimento Regional - PADR, introduzidas pelas Leis 9.440/1997 e 9.826/1999, que estabeleceram benefícios tributários como incentivo econômico para que montadores e fornecedoras de peças automotivas se instalassem nas Regiões Norte (N) , Nordeste (NE) e Centro-Oeste (CO) , à exceção do Distrito Federal (DF) .

2. A auditoria foi autorizada pelo Acórdão 671/2022-TCU-Plenário (Rel. Min. André Luís de Carvalho) , proferido em apreciação de proposta de fiscalização, de março/2022, de iniciativa da então Secretaria de Controle Externo do Desenvolvimento Econômico - SecexDesenvolvimento, com o aval da Secretaria Geral de Controle Externo (TC Processo XXXXX/2022-1) . Atuo neste processo de Relatório de Auditoria em sucessão ao relator originalmente designado, Ministro André Luís de Carvalho, conforme termo de sorteio de 22/9/2022 (peça 124) .

3. Os benefícios da Lei 9.440/1997 visavam empreendimentos instalados ou que viessem a se instalar nas regiões N, NE e CO, desde que habilitados pelo Poder Executivo até 31/5/1997 (ou 31/3/1998, em casos que especifica) e com atividades afetas à montagem e fabricação de tipos diversos de veículos terrestres (p. ex. transporte de mercadorias, de passageiros ou uso misto; tratores, colheitadeiras, máquinas rodoviárias, empilhadeiras; carroçarias, reboques) , além de partes, peças, componentes e pneumáticos destinados aos referidos veículos.

4. A Lei 9.440/1997 exigiu dos beneficiários o cumprimento de requisitos de contrapartida (investimentos produtivos e em pesquisa e desenvolvimento em projetos e respectivos produtos, em montante superior a R$ 2,5 bilhões para montadoras de veículos e a R$ 500 milhões para fabricantes de autopeças) e medidas de compensação anual (investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação na região, superior a 10% do valor do benefício) .

5. A Lei 9.826/1999, por sua vez, estabeleceu, entre outros, o direito a crédito presumido do IPI incidente nas saídas de produtos (automóveis para transporte de passageiros, de mercadorias ou uso misto) , de empreendimentos industriais instalados nas áreas de atuação das Superintendências de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) , do Nordeste (Sudene) e na região Centro-Oeste, em relação a projetos apresentados até 31/10/1999, e que, após aprovação, entrassem em operação em até 42 meses.

6. Os benefícios concedidos pela Lei 9.440/1997 (alterada pelas Leis 9.532/1997, 12.218/2010, 12.407/2011 e 13.755/2018) variaram ao longo dos anos e, desde 2010, consistem apenas do crédito presumido sore o IPI. Já os benefícios da Lei 9.826/1999 (alterada pelas Leis 12.218/2010, 12.407/2011, 12.973/2014, 13.755/2018 e 14.076/2020) têm sido os créditos presumidos sobre o IPI desde a instituição do diploma legal.

7. As empresas beneficiárias das PADR são as seguintes (peça 147, p. 10) :

Empresa

Cidade

Lei

Período

HPE Automotores do Brasil Ltda [Mitsubishi e Suzuki]

Catalão/GO

9.826/1999

Desde 1999

Caoa Montadora de Veículos Ltda [Hyundai e Chery]

Anápolis/GO

9.826/1999

Desde 2003

Troller Veículos Especiais

Horizonte/CE

9.440/1997

1997 a 2021

Ford Motor Company Brasil Ltda.

Camaçari/BA

9.826/1999

2000 a 2006

9.440/1997

2007 a 2021

Acumuladores Moura S.A.

Belo Jardim/PE

9.440/1997

Desde 1997

Tecnologia em Componentes Automotivos S/A (TCA)

Jaboatão dos Guararapes/PE

9.440/1997

2002 a 2011

Fiat Chrysler Automóveis Ltda

Goiana/PE

9.440/1997

Desde 2011

8. Dados obtidos no curso da fiscalização, com valores atualizados até abril/2022, indicam que desde 2010 o volume de recursos direcionado a essas políticas automotivas superou o montante acumulado de R$ 50 bilhões, tendo resultado em custo anual superior a R$ 5 bilhões nos últimos exercícios, recaindo esse custo redistributivo aos pagadores de impostos.

**

9. O presente trabalho, conduzido pela SecexDesenvolvimento em parceria com a Controladoria-Geral da União - CGU, no período de 12/4 a 29/9/2022, buscou tratar a seguinte questão fundamental de auditoria: as PADR foram concebidas e apresentam maturidade que concorram efetivamente para a indução do desenvolvimento das regiões brasileiras com indicadores socioeconômicos carentes de melhora estrutural, e estão atendendo a esse propósito?

10. Em resposta à questão, foram apontados três achados principais, agregados a partir de dimensões analíticas e categorias adotadas:

Achado 1: As PADR não são o resultado de um processo de produção de política pública para o tratamento de problema público e possuem falhas profundas em sua formulação;

Achado 2: As PADR apresentam falhas estruturais de governança e o governo federal não demonstra para a sociedade qual a performance das PADR, nem de sua atuação como agente responsável por essas políticas; e

Achado 3: As PADR produziram impactos limitados em termos locais e com um alto custo de renúncia de receita por emprego gerado.

11. No contexto do Achado 1, associado a falhas na formulação de políticas públicas, três relevantes constatações foram verificadas.

12. Em primeiro, a equipe observou que as PADR não foram estabelecidas para a resolução de um problema público previamente diagnosticado e não são operadas para esse fim (item 3.1.2 do Relatório de Auditoria) .

13. Segundo o Relatório, as Exposições de Motivos das Medidas Provisórias que criaram e renovaram as políticas (e resultaram na edição das leis em questão e respectivas alterações) não fizeram referência a qualquer diagnóstico nesse sentido.

14. Arguidos sobre o assunto, os gestores da Secretaria de Desenvolvimento da Indústria, Comércio e Serviços (Sdic/ME) declararam que"o grande problema público que se busca encaminhar com as PADR é a concentração industrial nas regiões Sul e Sudeste, combinada com as históricas desigualdades econômicas e sociais entre as macrorregiões brasileiras"(peça 104, p. 11) .

15. A declaração contrasta com outras afirmações da mesma Sdic no sentido de que na gestação das PADR teria ocorrido, em verdade,"a substituição de um processo mais democrático de decisões pelo pragmatismo de atender às demandas de curto prazo da política econômica que passaram a ser tomadas a partir da articulação interna ao governo"(peça 104, p. 4) .

16. Em outra passagem, a Sdic admite a caracterização de"uma condição de interlocutor privilegiado das montadoras junto às agências estatais e os parlamentares, em detrimento dos demais segmentos empenhados no desenvolvimento setorial, que possibilitou o exercício de maior influência nas decisões governamentais"(peça 104, p. 18) .

17. Conforme destaca a equipe de fiscalização, a análise das Exposições de Motivos das Medidas Provisórias que resultaram na edição das leis em questão, bem como das respostas dos gestores (evidências à peça 147, p. 33) , não permitiu à equipe de fiscalização concluir se os benefícios tributários concedidos pelas PADR eram o instrumento mais eficiente para a promoção do desenvolvimento regional, visto não haver demonstração de como essa instrumentalização atacaria o problema. Sob outra perspectiva, caso as PADR visassem a beneficiar a indústria automotiva em si, igualmente não teria havido diagnóstico da problemática da competitividade da indústria automotiva brasileira e de suas causas.

18. Uma segunda constatação foi a ausência de indicativos de quais resultados a União busca atingir com as PADR. Tais políticas não têm objetivos SMART concretos, indicadores, metas e prazos, que demonstrem como serão tratadas as causas de um problema público suficientemente diagnosticado e legitimamente decidido a ser introduzido na agenda pública, e que encarreguem agentes e órgãos para a sua consecução (item 3.1.3 do Relatório de Auditoria) .

19. De forma análoga à constatação anterior, o Relatório de Auditoria apontou que, da análise das Exposições de Motivos das MP e das manifestações dos gestores, os objetivos apenas declarados não são suficientemente tangíveis para serem geridos, visto que não são específicos (S) , não são mensuráveis (M) , não estão posicionados de forma a serem adotados como referência (A) e não são factíveis (R) a ponto de serem buscados em determinado intervalo temporal (T) .

20. Dessa forma, concluiu-se que a formulação das PADR não foi conduzida de modo a que fosse dotada de objetivos fáticos, que pudessem ser referência para a direção das políticas quando dos processos seguintes de implementação, monitoramento e avaliação.

21. Ainda sobre as falhas na formulação, a auditoria apontou que as PADR não estão alicerçadas em teoria clara, nem em modelo lógico que explique como as políticas tratarão um problema público, ao menor custo possível (item 3.1.4 do Relatório de Auditoria) .

22. Observou a equipe de fiscalização que a formulação das PADR, tanto no momento da instituição por medidas provisórias em 1996 e 1999, como por ocasião das renovações em 2010, 2011 e 2018, não se deu com a análise dos modelos lógicos das alternativas de intervenção, para que fosse escolhida aquela que demonstrasse o melhor atendimento (com menor custo) ao objetivo das políticas e, assim, tratar as causas de um problema público.

23. A partir do exame das manifestações dos gestores em relação ao assunto, o Relatório de Auditoria concluiu pela ausência de demonstração de como a concessão de benefícios tributários para a indústria automotiva, na forma de crédito presumida sobre o IPI seria, ao menor custo possível, a opção que promoveria o tratamento de causas de um problema público no campo da competitividade da indústria automotiva brasileira ou do baixo desenvolvimento regional das regiões N, NE e CO, com o legado sustentável decorrente dessas intervenções.

24. Relativamente ao Achado 2, associado a falhas estruturais de governança e de gestão das PADR, o Relatório de Auditoria apontou outras três deficiências graves.

25. Primeiramente, a equipe constatou que as competências e responsabilidades dos agentes e das unidades envolvidas, bem como os principais processos de governança e gestão de implementação, monitoramento e avaliação foram fragilmente estabelecidos, e de forma não clara, no marco normativo das PADR (item 3.2.2 do Relatório de Auditoria) .

26. Apontou a fiscalização que o marco normativo das PADR não definiu claramente os papéis e processos básicos de políticas públicas, resultando em comprometimento da direção, monitoramento e avaliação das políticas, bem como na inviabilização da accountability e das possibilidades de aprimoramento ou extinção da intervenção estatal.

27. A despeito de haver designação do papel de direção das PADR ao então Ministério da Economia (Decreto 9.734/2019), não houve o estabelecimento de prerrogativas (autonomia e capacidade decisória) para o exercício do papel de direção, que, na prática, não se tem evidências de que tenha ocorrido.

28. Consta das manifestações da Sdic informação dando conta da atuação da Subsecretaria de Estratégias Regionais e Setoriais (Sers) e da Coordenação-Geral de Implementação e Fiscalização de Regimes Automotivos (CGRAU) . No entanto, a equipe de fiscalização observou que, em relação à governança e gestão, a atuação se restringiu a aspectos operacionais em papéis meramente cartorais para verificações de compliance ante os pleitos de aprovação de projetos e produtos e às prestações de contas da aplicação de recursos em PD&I.

29. Sob o ponto de vista de monitoramento e avaliação ex post, não consta definição de processos e papéis, o que conduziu à grave constatação de que, em decorrência desse não estabelecimento de governança e gestão, até o momento da conclusão do Relatório, as PADR não haviam sido objeto de avaliação ex post realizada ou contratada pelo Poder Executivo. Isso revela a ausência de informações sobre a implementação e de subsídios para a gestão e tomada de decisões a respeito das políticas.

30. O segundo apontamento foi no sentido de que as PADR não são accountable em todos os níveis de governança (item 3.2.3 do Relatório de Auditoria) .

31. Sobre esse aspecto, a equipe de fiscalização verificou que, em virtude do não estabelecimento adequado da estrutura de governança e gestão, a accountability das PADR restou inviabilizada.

32. Desse modo, concluiu o Relatório que o quadro geral de accountability das PADR é de ausência de previsão para que os gestores das políticas, em todos os níveis, do ME até o CGRAU, prestem contas dos resultados de suas atuações no âmbito das políticas a algum agente ou instância superior, além da ausência de consequências claras, em caso de decisões equivocadas ou omissão dos agentes.

33. A terceira deficiência apontada foi de que a União não sabe os efeitos e impactos que as PADR têm gerado (item 3.2.4 do Relatório de Auditoria) .

34. Verificou a equipe de fiscalização que a União desconhece se os poucos efeitos apontados como resultantes das PADR de que tem conhecimento são efetivos e eficientes para o endereçamento de causas da problemática do baixo desenvolvimento regional, o que leva à inviabilidade de intervenções, ajustes ou redirecionamentos por parte dos condutores das políticas que as aperfeiçoem e as tornem mais eficientes.

35. Tal situação, observou o Relatório, resulta na consolidação de um fluxo de consumo de recursos públicos financeiros e organizacionais, da ordem de R$ 5 bilhões anuais, que não se demonstram úteis para o tratamento de causas de problemas públicos que afligem a sociedade.

36. Em outras palavras, concluiu a equipe que não há como se responder, objetivamente, se as PADR estão melhorando ou não a competitividade econômica nas regiões alvo, se as políticas induzem ou não à formação de capital para sustentar no tempo um desenvolvimento socioeconômico dos territórios, ou se favorecem ou não determinados atores da indústria automotiva, comprometendo a promoção da competitividade real do segmento.

37. Por fim, sob a dimensão analítica dos resultados das políticas públicas, o Relatório indicou no Achado 3 que as PADR produziram impactos limitados em termos locais e com alto custo de renúncia de receita por emprego gerado.

38. A equipe de fiscalização apontou, em síntese, que, em virtude do desenho inadequado da política, que teria sido elaborada para atender a empresas específicas e sem considerar estratégias de desenvolvimento com foco no território, além de desarticuladas da Política Nacional de Desenvolvimento Regional ( PNDR) e outras políticas de atração de investimentos, as PADR não promoveram a aglomeração industrial ao redor das fábricas automotivas instaladas nas regiões N, NE e CO, que adquirem a maior parte de seus insumos de fornecedores situados nas regiões Sul e Sudeste.

39. A situação verificada, no entendimento da equipe, levou ao não alcance dos objetivos de descentralizar a indústria automotiva no país e a uma alta renúncia de receita para poucos empregos gerados, sem impacto significativo na promoção do almejado desenvolvimento regional.

40. A avaliação de impacto, em âmbito geral, foi realizada pela equipe a partir da análise da evolução da participação, no emprego da indústria automotiva, de cada região do país e das localidades imediatas às regiões elegíveis das PADR (peça 147, p. 67-68) . Constatou a equipe que o aumento no emprego nas regiões N, NE e CO concentrou-se em localidades específicas, próximas às instalações dos empreendimentos beneficiados.

41. Segundo o Relatório, um fator que explica a limitação do impacto das PADR é o fato de que a política não promoveu a aglomeração industrial ao redor das fábricas beneficiárias. A partir de dados do Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores (Inovar-Auto) , a equipe identificou que do total adquirido pelas cinco fábricas beneficiárias das PADR, 78% provieram de fornecedores instalados nas regiões Sudeste e Sul.

42. Os apontamentos acima foram corroborados pela equipe com a aplicação de metodologia de controle sintético (Apêndice B, peça 146, p.10-24) ao caso específico da fábrica automotiva da empresa Fiat-FCA (Jeep) , instalada em 2015 no município de Goiana-PE. A seleção do empreendimento se deu em virtude de ser o único que possuía dados dos indicadores selecionados para períodos anteriores à instituição dos programas (PIB per capita; pessoal ocupado total/população; pessoal ocupado técnico científico/população; e salários/população; disponíveis apenas a partir de 2006) .

43. As principais constatações da aplicação da metodologia ao caso concreto da FCA foram as seguintes:

a) o impacto da instalação da fábrica da FCA (PIB per capita, pessoal ocupado total, pessoal ocupado técnico-científico, variação do emprego na indústria automotiva) foi restrito à região imediata, sem efeitos sobre a região intermediária;

b) considerando que a FCA foi beneficiada com R$ 4,6 bilhões em 2019 (R$ 388 milhões por mês) , e que no período teriam sido gerados 11.258 empregos na região, o custo mensal da política por empregado foi estimado em R$ 34,4 mil, valor esse considerado bastante elevado, em comparação com outros programas, a exemplo do Auxílio Brasil de R$ 600,00 e do Benefício de Prestação Continuada de R$ 1.212,00; e

c) sob o ponto de vista do aumento de remuneração como impacto das PADR, a auditoria levantou que na região imediata de Goiana-Timbaúba, o indicador de salário apresentou o valor de R$ 3.689 por habitante em 2019, comparativamente ao valor de R$ 2.781 obtido pela metodologia do controle sintético. A diferença de R$ 908 (R$ 3.689 - R$ 2.781) para os 347.700 habitantes da região resulta num montante estimado de R$ 316 milhões de aumento de remuneração em 2019. Considerando a renúncia fiscal de R$ 4,6 bilhões nesse mesmo ano, a equipe ressaltou a desproporcionalidade entre o alto custo para o Tesouro face ao pequeno aumento da renda local.

44. Em conclusão, ante ao quadro de baixa maturidade das PADR, associado a falhas na formulação, na governança e na gestão das políticas, que culminaram por produzir impactos limitados e com alto custo de renúncia de receita por emprego gerado, a equipe de fiscalização encaminhou propostas de ciência aos titulares das pastas ministeriais relacionadas acerca das causas raiz das fragilidades de formulação das PADR, de modo a estabelecer clareza para a Administração quanto aos critérios e demais aspectos materiais que devem ser observados pelos agentes públicos accountable pelas proposições e análise de propostas normativas no âmbito dessas políticas, em especial quanto à sua renovação.

45. Adicionalmente, visando à melhora da governança e gestão das PADR, à luz do marco normativo vigente no tema e considerando as manifestações dos gestores apresentadas no curso da auditoria, a equipe propôs o endereçamento de determinação à pasta ministerial incumbida do papel de gestor das referidas políticas públicas, que apresente plano de ação, com designação de medidas, responsáveis e prazos de implementação, para avaliação das políticas a partir de diagnóstico atualizado do problema público nos territórios, com estabelecimento de todos os papéis, respectivos agentes responsáveis, instâncias decisórias, processos, atividades e produtos afetos e necessários à formulação/revisão, monitoramento e avaliação das PADR.

46. Foi proposto também o encaminhamento de inteiro do teor da deliberação decorrente da apreciação deste processo a todas as comissões afetas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, de modo a contribuir para o aperfeiçoamento das políticas públicas do governo federal, em prol dos pagadores de impostos, do presente e do futuro, que subsidiam as intervenções federais.

***

47. Feito esse breve relato, declaro minha concordância com o exame empreendido no Relatório de Auditoria, cujos fundamentos acolho como minhas razões de decidir.

48. De início, enalteço a abrangência e profundidade com que o assunto foi tratado pela equipe da SecexDesenvolvimento, por sua atual Unidade de Auditoria Especializada em Agricultura, Meio Ambiente e Desenvolvimento Econômico - AudAgroAmbiental, em parceria com auditores da Diretoria de Auditoria de Políticas Econômicas e de Desenvolvimento da CGU.

49. A concessão de benefícios tributários para redução de desigualdades regionais é tema recorrente em avaliações desta Corte de Contas. Do mais recente Parecer das Contas do Presidente da República, referente ao exercício de 2021, apreciado em junho/2022 ( Acórdão 1481/2022-TCU-Plenário, Rel. Min. Aroldo Cedraz) , retiro o seguinte excerto:

Destaca-se que os benefícios tributários, financeiros e creditícios objetivam o desenvolvimento econômico de diversas áreas do país, bem como a redução das desigualdades regionais e sociais. Por outro lado, em geral, representam distorções ao livre mercado e resultam, de forma indireta, em sobrecarga fiscal maior para os setores não beneficiados. Além disso, em um contexto de restrição fiscal, como o enfrentado pela União em 2021, os valores associados a esses benefícios devem ser considerados com maior atenção em virtude do seu impacto nas contas públicas.

50. Naquela oportunidade, registrei Declaração de Voto, consignando percepções em relação às políticas de regionalização de benefícios tributários:

Regionalização dos Benefícios Tributários, Financeiros e Creditícios

O último ponto que considero importante comentar refere-se ao exame do demonstrativo da regionalização dos benefícios tributários, financeiros e creditícios, exigido no art. 165, § 6º, da Constituição Federal. Conforme preceituam os arts. , inciso III, e 43 da nossa Lei Maior, a ação governamental deve buscar a redução das desigualdades regionais.

Nesse esquadro, as apurações historicamente realizadas por este Tribunal revelam que a Região Sudeste - a mais desenvolvida economicamente - concentra o maior montante de renúncias fiscais, 43,9% em 2021.

(...) Também digno de nota é a análise dos valores per capita por Região. Em 2021, o menor valor coube ao Nordeste, inferior à metade da média nacional, o que revela a necessidade de maiores esforços governamentais para melhorar a distribuição regional das renúncias tributárias, de modo a aumentar essa alocação na Região Nordeste, cujos índices de desenvolvimento econômico e social são inferiores aos do Centro-Oeste, Sul e Sudeste. Já a Região Norte foi a maior beneficiada em termos per capita (2,31 vezes o valor médio nacional) .

(...) Tais informações reclamam a continuidade dos esforços governamentais no aprimoramento das políticas de gestão das renúncias fiscais, para melhor adequá-las aos propósitos republicanos de redução das desigualdades regionais.

51. Nesta oportunidade, verifico que, no caso concreto das Políticas Automotivas de Desenvolvimento Regional, mesmo em se tratando de benefícios tributários voltados às regiões menos desenvolvidas economicamente (N, NE e CO) , mais uma vez não foi plenamente alcançado o objetivo constitucional de reduzir as desigualdades regionais.

52. Conforme bem observado pela unidade técnica, para que uma política pública trate, de forma minimamente eficiente, de um problema público, a formulação dessa intervenção estatal precisa ser orientada à resolução de problemas, devendo ser conduzida e elaborada a partir de diagnóstico prévio do problema. Tal diagnóstico deve contemplar o melhor conjunto de conhecimentos possível a respeito das características desse problema, de suas causas, efeitos e impactos, bem como das populações afetadas e, se for o caso, inclusive dos grupos que se beneficiam da existência desse problema.

53. O tratamento do problema público inspira a devida definição dos objetivos da política pública para enfrentamento das causas levantadas, devendo ser específicos, mensurável, alcançável, realista e com prazo determinado (Objetivos SMART; Referencial de Controle de Políticas Públicas - RCPP; Portaria-TCU 188/2020) .

54. A adequada definição dos objetivos, dotadas dos atributos acima, permitirá a análise de sua coerência em relação ao diagnóstico do problema e subsidiará a estruturação e operação da governança e gestão da implementação, do monitoramento e da avaliação, viabilizando a accountability da política pública.

55. Essa modelagem requerida de políticas públicas (insumos, atividades, produtos, resultados e impactos) vem sendo repercutida há tempos pelo Tribunal, conforme farta jurisprudência nesse sentido (p. ex. Acórdão 3564/2014-TCU-Plenário, Rel. Min. Aroldo Cedraz; Acórdão 2359/2018-TCU-Plenário, Rel. Min. Vital do Rego; Acórdão 2116/2022-TCU-Plenário, Rel. Min. Weder de Oliveira) .

56. As análises conduzidas pela equipe de fiscalização na auditoria em exame revelaram que as PADR não foram concebidas a partir de diagnóstico de problema público e de suas causas, de modo que sua formulação ocorreu sem se fundamentar em evidências, nem orientada à resolução de um problema público conhecido, por meio do tratamento de suas causas. A situação conduziu à instituição de política sem objetivos concretos e sem modelo lógico que demonstre" o que "/" de que maneira "está sendo tratado, nem se está sendo feito sob o menor custo possível.

57. A situação se agrava a partir da constatação de que não foram suficientemente definidos os papéis de direção, supervisão e coordenação da implementação, do monitoramento e da avaliação das políticas. Essas graves falhas estruturais de governança e gestão revelam: i) a falta de accountability das PADR e dos agentes; e ii) o desconhecimento por parte do governo federal quanto ao endereçamento de causas da problemática do baixo desenvolvimento regional a partir dos baixos impactos de que se tem conhecimento, associados à execução dessas políticas.

58. Ainda com ênfase nas falhas de concepção, destaco exame da equipe sobre a desarticulação das PADR em relação às políticas de investimentos e de desenvolvimento regional:

302. Portanto, para um incentivo fiscal voltado para a atração de novas plantas industriais ser justificado, é necessário que ele gere externalidades de aglomeração, que são os efeitos positivos decorrentes da aproximação da nova planta com outras empresas na mesma região.

303. Porém, o que se observa é que as PADR estão desarticuladas das políticas de investimentos e de desenvolvimento regional. Ao serem pensadas para incentivar empresas específicas individualmente, sem considerar a necessidade de formação de cadeias produtivas, as PADR não atacam as alegadas" desvantagens naturais "das regiões N, NE e CO.

304. As PADR estão distantes das demais estratégias usadas pela PNDR que elege como um de seus objetivos (art. 3º do Decreto 9.810/2019)

IV - fomentar a agregação de valor e a diversificação econômica em cadeias produtivas estratégicas para o desenvolvimento regional, observados critérios como geração de renda e sustentabilidade, sobretudo em regiões com forte especialização na produção de commodities agrícolas ou minerais [grifo nosso].

305. Enfim, o que se observa, tanto da Constituição Federal, quanto da PNDR, além da literatura nacional e internacional acerca do desenvolvimento regional, é que os incentivos fiscais por si só não são capazes de atrair investimentos. As PADR, ao se distanciarem da estratégia de criação de cadeias produtivas, focando em empresas específicas, não foram capazes de promover a aglomeração industrial e contribuir para o desenvolvimento regional.

59. Nesse sentido, anuindo ao exame empreendido pela equipe de fiscalização, acolho, com breves ajustes de forma, a proposta de encaminhamento constante do Relatório de Auditoria.

60. Por derradeiro, informo que tomei conhecimento das declarações de voto dos Ministros Augusto Nardes e Jorge Oliveira, apresentadas nesta data. Registro minha anuência às pertinentes considerações trazidas pelo Ministro Augusto Nardes acerca do adequado cumprimento das premissas da Governança Pública e sua importância para a avaliação, direcionamento e monitoramento da gestão, com vistas ao aprimoramento da condução de políticas públicas e da prestação de serviços de interesse da sociedade.

61. Endosso, igualmente, as ponderações do Ministro Jorge Oliveira quanto à relevância de fiscalizações como esta como subsídio para os estudos em curso no âmbito do projeto de lei complementar 428/2017, em tramitação na Câmara dos Deputados, que objetiva a instituição de Plano de Revisão Periódica de Gastos, bem como para o atendimento a comando da Lei de Diretrizes Orçamentárias para o exercício de 2023, no sentido da"elaboração de metodologia de acompanhamento e avaliação dos benefícios tributários, financeiros e creditícios (...) , com base em indicadores de eficiência, eficácia e efetividade". Desse modo, incorporo a proposta de encaminhamento de inteiro teor da deliberação ao Ministério do Planejamento e Orçamento, como subsídio às ações da Pasta.

Do exposto, VOTO por que seja adotado o acórdão que ora submeto à apreciação desse Colegiado.

TCU, Sala das Sessões, em 29 de março de 2023.

ANTONIO ANASTASIA

Relator

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tcu/1799522527/inteiro-teor-1799522533

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